Soluções integradas
A agenda de
segurança jurídica no Brasil reclama soluções integradas das diversas
instâncias reguladoras. Um dos problemas mais graves é a incoerência estatal na
tutela dos mesmos fatos ilícitos, na medida em que uma instituição decide um
mesmo fato de modo diverso de outra, e isso acarreta divergências de
entendimentos e contradições, eternizando conflitos. Não é raro, portanto, que
o arquivamento de um inquérito criminal, longe de significar a pacificação de
um problema, traduza apenas o início de uma ação de outras naturezas, como
improbidade administrativa, ou de processos disciplinares.
No entanto, avanços
tecnológicos e normativos, inclusive jurisprudenciais, têm proporcionado
experiências interessantes de integração entre instituições de Estado, permitindo
uma perspectiva mais avançada de segurança jurídica. O conceito de
'força-tarefa', muito em voga atualmente, reflete essa espécie de visão
gerencial focada na temporariedade e em objetivos específicos e claramente
definidos, alicerçados na especialização e na divisão de atribuições, de acordo
com as faixas de atuação de cada instituição pertencente ao grupo de trabalho.
Assim, diante de
uma 'força-tarefa', um ato ilícito terá o olhar sistêmico de diversas
instituições públicas. E, mesmo quando não se está no terreno desses grupos de
trabalho, a tendência deve ser a integração das instituições numa visão
sistêmica e harmônica de atuação.
Para exemplificar,
uma oferta de vantagem indevida a agente público, em âmbito de organização
ilícita, por parte de um dirigente empresarial, pode ensejar atuação simultânea
de instituições federais, tais como: Receita Federal (cobrança de tributos
sonegados); Ministério Público (áreas criminal e de improbidade); Tribunal de
Contas da União (aplicação de sanções a pessoa jurídica e pessoa física); Banco
Central (lesão ao sistema financeiro nacional) e/ou Comissão de Valores
Mobiliários (se atingir o mercado de capitais); Conselho Administrativo de
Defesa Econômica (lesão à livre concorrência); Ministério da Transparência
(aplicação da Lei Anticorrupção); Advocacia-Geral da União (defesa do Erário
federal e aplicação da Lei de Improbidade).
Há, ainda, outras
entidades fiscalizadoras que podem atuar e aplicar sanções. São múltiplas
investigações paralelas e simultâneas, que atingem pessoas físicas e jurídicas.
As soluções,
coercitivas ou consensuais, igualmente podem ou devem ser vistas de modo
integrado: termos de ajustamento de conduta; acordos de leniência; termos de
compromisso ou de cessação de práticas ilícitas; colaborações premiadas;
delações; efeitos de uma decisão sobre a outra e vedação à falta de
proporcionalidade das penas.
Para além da
'força-tarefa', o Estado precisa adaptar-se à ideia de inteligência e de
comunicabilidade das instâncias. E a advocacia contemporânea deve atuar com
visão integrada e transdisciplinar, buscando fórmulas que estabilizem as
soluções aos conflitos, sobretudo quando existem diferentes instituições
atuando frente ao mesmo fato e às mesmas pessoas. Evidente que nenhuma
instituição abrirá mão de suas atribuições ou prerrogativas. Mas é necessário
que todas dialoguem entre si e busquem caminhos coerentes.
Por Fábio Medina Osório, em O Globo