sexta-feira, 28 de abril de 2017

Mesmo com nova lei, estatais sofrem com interferência política


Quanto tempo demora para mudar 200 anos de promiscuidade partidária nas Empresas Estatais? Mais de nove meses. Pelo menos é o que está ficando claro pouco mais de 270 dias depois de sancionada a Lei 13.303, popularmente conhecida como a lei das estatais. A lei foi anunciada como um marco no país, capaz de acabar com as interferências políticas nas Empresas Estatais. Ela estabelece regras mais rígidas para compras, Licitações e para a nomeação de diretores, presidentes e membros do conselho de administração de empresas públicas. A nova legislação trouxe avanços, mas está longe de resolver o problema da interferência política nas 159 estatais federais.
'O que nós vimos nos últimos 20 anos foi uma cultura de patrimonialismo. A cultura da indicação não vai deixar de existir de uma hora para a outra, ela continua e isso só vai diminuir se continuarmos brigando por isso', diz o consultor Vicente Falconi, colunista de EXAME e conselheiro da estatal de energia Eletrobras.
A companhia de energia, com faturamento de 60 bilhões de reais, é um exemplo de como as estatais são entes complexos demais para serem mudados numa canetada. Segundo executivos e conselheiros da companhia ouvidos por EXAME Hoje, as indicações políticas continuam acontecendo - tanto na Eletrobras quanto em outras companhias estatais. A diferença é que agora os políticos estão preocupados em indicar pessoas que possuem carreira na área e se enquadram na lei.
Na Eletrobras, o desafio acaba sendo mais complexo devido ao seu tamanho: são 17 empresas sob seu controle e ainda 178 Sociedades de Propósitos Específicos (SPEs), empresas criadas para um projeto específico. Na maioria delas, a Eletrobras possui participação minoritária, e por isso a lei não se aplica. Uma de suas controladas, a hidrelétrica Itaipu, também não se enquadra na nova legislação e tem regras próprias para as nomeações.
Segundo executivos da companhia, as SPEs continuam recebendo inúmeras sugestões de nomes dentro dos estados, na maioria das vezes de pessoas sem nenhuma qualficação para os cargos. As indicações continuam sendo analisadas caso a caso.
Mesmo assim, a ordem dentro da companhia é seguir a lei das estatais em todos os casos. 'O problema da lei é que ela não se aplica a participações minoritárias. Mas as empresas podem fazer uma política de governança própria a partir dela e incorporar a lei para todas as empresas em que possuem, participação. Foi isso que nós fizemos', diz Elena Landau, conselheira da Eletrobras.
Desde que o engenheiro Wilson Ferreira assumiu o comando da estatal, em junho do ano passado, foram realizadas 52 alterações em conselhos de administração e 58 em diretorias nas 17 empresas controladas pelo grupo - o que representa quase 70% das vagas passíveis de alteração pela Eletrobras. A nova legislação determina que os nomeados para diretorias e membros dos conselhos tenham experiência mínima profissional de dez anos na área de atuação da empresa e veda a possibilidade de qualquer um que tenha participado em direção partidária ou campanha eleitoral nos últimos 36 meses. Na maioria dos casos, a Eletrobras tem nomeado executivos de carreira da companhia. Mas, segundo EXAME Hoje apurou, alguns apadrinhamentos continuam acontecendo. 'Isso é de praxe no setor elétrico. Para ganhar visibilidade e avançar mais rápido na carreira, os funcionários se conectam com políticos. Não que isso seja uma coisa sempre ruim. Muitos nomes são realmente qualificados e são pessoas honestas', diz um executivo do setor.
As maiores suspeitas recaem sobre uma das empresas que ficou de fora da lei: a Itaipu. No fim de fevereiro o conselho de administração da Eletrobras analisou as indicações do presidente Michel Temer para a diretoria a Itaipu a pedido do próprio governo. O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que o governo aplicaria a legislação das estatais nas nomeações e o conselho da Eletrobras recomendou apenas quatro dos seis candidatos escolhidos pelo governo. Ficaram de fora os nomes do ex-secretário-geral do PPS no Paraná, Rubens Penteado, para diretoria técnico executiva e o advogado Marcos Vitório Stamm para a diretoria financeira. Os nomes foram reprovados, segundo a Eletrobras, pela falta de comprovação de qualificação técnica.
Em um primeiro momento, o governo Temer ignorou as recomendações e seguiu com todas as nomeações. Mas após críticas, o presidente voltou atrás em dois nomes que descumpriam a lei das estatais por terem integrado partidos políticos em 2016: Rubens Penteado, que não foi recomendado pela Eletrobras, e Ramiro Wahrhaftig, que fez parte do diretório do PSD paranaense até maio do ano passado.
O nome de Marcos Vitório Stamm, que não havia sido recomendado pela Eletrobras, permaneceu. Stamm já trabalhou no gabinete do deputado Sérgio Souza (PMDB) e em 2012 foi acusado de ser funcionário fantasma. Ao invés de dar expediente no Congresso, ele era presidente da Associação Brasileira dos Advogados Públicos (Abrap). Em nota, Stamm afirmou na época que exercia a presidência da Abrap por não haver qualquer impedimento legal e afirmou que cumpria suas atividades em Brasília e no Paraná.
As polêmicas de Itaipu foram decisivas para a troca da presidência do conselho da Eletrobras. Em 27 de março ,no mesmo dia em que a Eletrobras anunciou seu primeiro lucro anual desde 2011, José Luiz Alquéres, um dos executivos mais respeitados do setor, deixou o cargo. Executivos próximos à Eletrobras afirmam que a confusão com os cargos de Itaipu foi decisiva para a saída. Alquéres nega. 'Fui para a Eletrobras com o objetivo de socorrer uma companhia em que trabalhei por 22 anos. A empresa teve suas ações nos Estados Unidos suspensas e estava para quebrar, se não publicasse os balanços de 2014 e 2015. Nós publicamos o balanço, tivemos um lucro anual, as ações voltaram a ser negociadas. Estou completando 73 anos, o papel de resgatar a companhia foi cumprido, era hora de sair', diz Alquéres.
Para Elena Landau, que deve ser indicada pelo governo à presidência do conselho no lugar de Alquéres, o maior desafio da Eletrobras é cuidar da governança dentro das empresas do grupo. 'O problema da lei é que ela não tem a capacidade de avaliar os funcionários. Isso nós temos trabalhado na Eletrobras. Não dá para entrar lá e demitir todo mundo porque se acredita que são nomeações políticas, é preciso mostrar a visão, a governança da nova gestão', diz. 'Indicação política, se preencher a questão técnica, não é problema. Muita gente boa vem indicação política. O problema é se a pessoa vai tentar usar o cargo politicamente. A lei é apenas um filtro, mas a partir dela é preciso pensar: que procedimentos de governança eu preciso adotar para controlar isso?'.
As outras estatais
Fora da Eletrobras, as nomeações políticas de pessoas aparentemente técnicas continuam acontecendo. 'A lei tem regras bem precisas, como a exigência de uma experiência profissional de 10 anos, mas não resolve o mecanismo clássico de indicações políticas. As indicações continuarão acontecendo, cabe ao conselho decidir se aceita ou não', diz Carlos Ari Sundfeld, professor da escola de direito da Fundação Getúlio Vargas.
Entre algumas nomeações recentes estão os nomes de seis vice-presidentes da Caixa Econômica Federal. Nomeados pelo presidente Michel Temer em dezembro, os cargos estariam atendendo aos partidos PMDB, PSDB, DEM, PR, PRB, PP e PSB. Um dos nomeados é considerado, inclusive, braço direito do presidente Temer. Roberto Derziê, que assumiu a vice-presidência de governo da Caixa, já foi vice-presidente de operações corporativas da empresa, mas deixou o cargo em junho de 2015 para trabalhar como secretário executivo de Temer. O governo nega que o tenha indicado para a Caixa.
Em janeiro deste ano Derziê foi citado em relatório da operação Cui Bono?, da Polícia Federal, como participante do esquema de concessão de financiamentos da Caixa - que funcionava mediante pagamento de propinas, em 2012.
Segundo informações do jornal O Estado de São Paulo, Paulo Henrique Angelo Souza, nomeado para a superintendência regional da Caixa na baixada santista chegou a ser vetado pelo Ministério da Fazenda, que queria um nome mais técnico. O objetivo era blindar a área do banco que é responsável pelo cumprimento dos acordos internacionais de exigência de capital. A indicação, no entanto, foi bancada pelo deputado Pauderney Avelino (DEM-AM).
No Banco do Brasil, José Eduardo Pereira Filho teria sido indicado pelo deputado Heráclito Fortes (PSB). Pereira Filho foi secretário chefe de gabinete de Heráclito na Prefeitura de Teresina, entre 1889 e 1992. Estatal a estatal, os exemplos se acumulam.
Modelo Ambev?
Nos Correios, o próprio presidente, Guilherme Campos, não se enquadra na lei das estatais. Campos assumiu a instituição 20 dias antes de o governo sancionar a nova legislação. Até junho do ano passado, antes de assumir Campos exercia a presidência do PSD. Em janeiro, uma liminar da Justiça Federal em Brasília afastou seis vice-presidentes dos Correios indicados em agosto, por suposto descumprimento da nova legislação. 'A empresa pública está sendo gerida por diretores que não comprovaram a qualificação técnica exigida em lei', escreveu o juiz Márcio de França Moreira na decisão. Os Correios recorreram e o afastamento foi revertido em menos de 48 horas. A ação civil que provocou os afastamentos segue aguardando julgamento. Após o afastamento, os Correios afirmaram que uma comissão foi criada para verificar os currículos dos executivos e saber se é preciso fazer alguma substituição.
Alguns críticos alertam para a dificuldade de se investigar até mesmo se a lei das estatais está sendo cumprida. 'A lei ainda não deixou claro quem vai fiscalizar as nomeações, isso já deveria estar definido com muita clareza. É o TCU? A CVM? O Departamento de Coordenação e Governança das Empresas Estatais? A Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais?', diz Sérgio Lazzarini Ph.D. em administração pela Washington University e professor da Insper. No caso dos Correios, os nomes foram afastados devido a uma ação civil movida pela Associação dos Profissionais dos Correios.
O ministro do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, reconhece a dificuldade. Ele diz que o órgão vai fiscalizar as nomeações, mas afirmou que ainda não foi feito um levantamento para saber como ocorreram as contratações e indicações após a aprovação da lei das estatais. 'Mesmo com a lei, a interferência política sempre vai acontecer porque as decisões na administração pública como um todo podem ser, ao mesmo tempo, técnicas e políticas. O que precisamos fazer é criar uma governança mais rígida, avaliando os diretores dessas empresas', diz Nardes.
Segundo ele, a falta de governança nas Empresas Estatais e a corrupção fizeram o país perder 466 bilhões de reais no Produto Interno Bruto nos anos de 2015 e 2016. 'Estamos discutindo uma lei que será complementar a essa das estatais, para fiscalizar e regulamentar a governança das estatais', diz Nardes.
Neste contexto, a lei das estatais não teria por si só evitado a corrupção em empresas como a Petrobras. 'A lei das estatais é pouco eficaz. Se ela existisse há alguns anos, mesmo nomes como Nestor Cerveró e Renato Duque poderiam ser indicados para a Petrobras', diz Sérgio Praça, cientista político da FGV e colunista de EXAME Hoje. Cerveró, que chegou à diretoria da Área Internacional da Petrobras, era funcionário de carreira da Petrobras desde 1975. O ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa entrou na estatal em 1977, após se formar em engenharia mecânica na Universidade Federal do Paraná. Ao todo, as empresas federais têm mais de 1.800 cargos de chefia que podem ser ocupados sem a necessidade de realização de concursos - ou seja, que podem chegar lá com base em indicações.
Na Eletrobras, executivos reconhecem que ainda há muito a ser feito. O objetivo deste ano é enxugar a empresa - com a venda das problemáticas distribuidoras, parte das SPEs e um programa de demissão voluntária. A partir disso, garante Falconi, será possível implementar processos meritocráticos, avaliações e estipular metas aos executivos. 'O objetivo é montar uma fábrica de líderes nos moldes da Ambev. No final, os melhores serão indicados para as diretorias', afirma. Ele explica que o processo deve ser iniciado já no começo de 2018 em um processo que deve levar cerca de sete anos. 'Essas coisas não se constrói de um dia para o outro. Há muito trabalho a ser feito', afirma. Se a empresa conseguir cortar as indicações políticas pela raiz já seria um bom começo.

Por Letícia Toledo, no Portal Exame

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Coleção Quasar K+: 

Livro 1: Quasar K+ Planejamento Estratégico;
Livro 2: Shakespeare: Medida por medida. Ensaios sobre corrupção, administração pública e administração da justiça;
Livro 3: Nikolai Gogol: O inspetor geral. Accountability pública; Fiscalização e controle;
Livro 4: Liebe und Hass: nicht vergessen Aylan Kurdi. A visão de futuro, a missão, as políticas e as estratégias; os objetivos e as metas.


O que é a metodologia Quasar K+ de planejamento estratégico?

QUASAR K+ é uma metodologia que procura radicalizar os processos de participação cidadã através de três componentes básicos:
a.Planejamento;
b.Educação e Teatro;
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Para quem se destina a ferramenta?

A metodologia QUASAR K+ foi desenvolvida para se constituir em uma base referencial tanto para as pessoas, os indivíduos, como para as organizações. Portanto, sua utilização pode ensejar a modernização desde o simples comércio de esquina ao grande conglomerado corporativo. Mas, também, os projetos de crescimento e desenvolvimento individuais, a melhoria das relações familiares...

Fazendo uso da metodologia QUASAR K+ poderemos descortinar novos horizontes nos habilitando a fazer mais e melhor com menor dispêndio de recursos.

Qual a razão desta metodologia?

Nas democracias modernas as sociedades se mostram tanto mais evoluídas e sustentáveis quanto mais aprimoram a qualidade da participação na vida organizacional, política e social.

Para que a participação se revista de qualidade se faz necessário dominar um conjunto de técnicas e instrumentais capazes de impregnar o processo de maior eficácia.

É deste contexto que emerge a metodologia QUASAR K+: disponibilizar técnicas específicas ancoradas em valores e princípios da educação e do teatro, incorporando - como eixo estruturante - as ferramentas do planejamento.

Portanto, é uma metodologia que busca assegurar qualidade à consecução dos objetivos, estratégias e metas traçados.

Por conseguinte, a aplicação da tecnologia possibilitará que nossa inserção e participação nos ambientes de estudo, trabalho, entretenimento e moradia, se verifique de maneira progressivamente mais satisfatória. Ao mesmo tempo em que nos empodera:

- eleva a autoestima – na medida em que tomamos consciência da evolução de nossa capacidade produtiva, da habilidade adquirida para interagir e contribuir com a família, o grupo social, a organização, a sociedade;

- incorpora ganhos sociais para a família, a escola, a instituição em que trabalhamos e a comunidade onde moramos, considerando que os produtos e resultados de nossa intervenção direta passam a ostentar qualidade diferenciada, mais fina, apurada e consentânea com as aspirações por um mundo melhor e mais justo.

De maneira estruturada, o livro enfoca:

- Planejamento e Administração
- O setor público
- Empreendedorismo & iniciativa privada
- Participação intensiva & terceiro setor
- Cidadania
- Qualidade Total
- Educação & Teatro

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quinta-feira, 27 de abril de 2017

A hora e a vez dos bancos



Eis que a Lava Jato não será tão veloz como o seu nome sugere. Se for aceita a oferta do exministro Antonio Palocci, ao juiz Sérgio Moro - e tudo indica que sim -, de abrir nova vertente de denúncias, focada no sistema financeiro, mais um ano de investigações e escândalos se descortina. É o que Palocci avalia.
Todo o alvoroço até aqui provocado na vida pública brasileira envolveu basicamente agentes públicos (parlamentares, prefeitos, governadores, presidente e ex-presidentes da República, juízes) e empresas do setor de infraestrutura. Roubalheira monstruosa, cuja devassa equivale a uma revolução desarmada.
Mas há mais, muito mais.
O que se depreende da Era PT (que inclui seus parceiros do PMDB e PP - e, em graus variados, todo o espectro partidário) é que, em síntese, nenhum cofre público restou ileso. Fundos de pensão, imposto sindical, bolsa família, verbas da cultura, reforma agrária, Receita Federal, merenda escolar, presídios - nada escapou.
O secretário de Saúde de Sérgio Cabral, por exemplo, contrabandeava prótese e material cirúrgico; no mesmo segmento, descobriu-se contrabando de sangue em Pernambuco, ao tempo em que o Ministério da Saúde estava sob o comando do hoje senador petista Humberto Costa. O ex-senador Gim Argelo lavava dinheiro de propina com doações a uma igreja em Brasília; idem o ex-deputado Eduardo Cunha, ambos reconhecidamente homens de fé.
Paulo Bernardo, quando ministro do Planejamento de Dilma, cobrava um adicional dos empréstimos consignados aos aposentados. A roubalheira, com apoio logístico do PT, rendeu R$ 100 milhões.
Mas tudo isso é varejo. Nada se compara em extensão e profundidade ao que ocorria na área das empreiteiras, onde reinou um cartel, em que pontificava a Odebrecht. Destroçou, entre muitas outras, a Petrobras, a Eletrobras, o Dnit, os Correios e respectivos fundos de pensão. Ali, a roubalheira era na escala dos bilhões.
Mas o mundo das finanças, em que Palocci, exministro da Fazenda de Lula e da Casa Civil de Dilma, circulou com total desenvoltura - e que conhece como poucos -, ainda carece de devassa. O que se sabe não passa de vislumbres.
Há dias, por exemplo, o Ministério Público denunciou falcatrua na aquisição pela Caixa Econômica de ações do Banco Panamericano (cerca de R$ 800 milhões), em 2011 - governo Dilma.
A Caixa Econômica está quebrada, idem o Banco do Brasil. O TCU examina contratos irregulares do BNDES, a maior parte em obras no exterior, que somam R$ 1,3 trilhão. O governo Temer acenou com o saneamento da máquina estatal, mas o máximo que conseguiu - se é que conseguiu - foi estancar a sangria.
Nada revelou sobre o que houve, de como se chegou a esse resultado. As caixas pretas continuam lacradas. O que se sabe veio das delações premiadas e das investigações da Lava Jato.
É compreensível. O governo Temer é o segundo escalão do PT. E a lei permite que o réu se poupe de fornecer informações que o comprometam. Os esclarecimentos estão vindo pela via judicial. Os petistas roubavam em nome da causa revolucionária, que, mesmo não se consumando, oferecia-lhes pretexto moral; os peemedebistas prescindiam de causa e pretexto; bastava-lhes o produto.
Enquanto os interesses convergiram, mantevese a aliança, que não recusava auxílio eventual aos adversários, o que explica a ausência de oposição ao longo de todo esse período.
Tudo iria bem se o país, a certa altura, não tivesse falido, na reta final do primeiro governo Dilma. A Lava Jato já estava em ação, mas poucos a percebiam, o que permitiu a reeleição de Dilma.
Deve-se à Força Tarefa e ao juiz Sérgio Moro a reviravolta que se operou na política brasileira, colocando em cena a população, em megamanifestações sem precedentes na história.
O PT foi apeado do governo pela pressão das ruas, não de seus adversários políticos. O impeachment veio apesar deles. PSDB e PT se uniram para evitá-lo. FHC, por exemplo, avalizou a honestidade de Dilma com uma veemência superior à dela própria.
O desmentido veio pelas delações dos parceiros: empreiteiros, parlamentares e exministros. O estrago da Odebrecht ainda está sendo assimilado e o STF anuncia que terá de pedir auxílio a outros magistrados para lidar com a montanha de inquéritos que dali resulta. Mas há ainda as delações da Andrade Gutierrez, OAS, Queiroz Galvão, UTC, Delta etc. O país oficial está no banco dos réus.
Em meio a isso, Palocci entra em cena - e com ele os bancos.

Por Ricardo Noblat, em O Globo

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O livro contém o texto original de Nicolai Gogol, a peça teatral “O inspetor Geral”. E mais um ensaio e 20 artigos discorrendo sobre a realidade brasileira à luz da magnífica obra literária do grande escritor russo. Dessa forma, a Constituição brasileira, os princípios da administração, as referências conceituais da accountability pública, da fiscalização e do controle - conteúdos que embasam a política e o exercício da cidadania – atuam como substrato para o defrontar entre o Brasil atual e a Rússia dos idos de 1.800. 
Para saber mais, clique aqui

A relevância do fim do imposto sindical


A extinção da contribuição compulsória, se confirmada pelo Senado, será a concretização de proposta de Lula para a modernização das entidades
Num bom exemplo de como agir enquanto fervilham delações na LavaJato envolvendo políticos, a Câmara aprovou ontem, em comissão, a reforma trabalhista. Assim, ela poderá passar logo pelo plenário e seguir ao Senado, para votação final, e ir à sanção do presidente Temer. Não há maiores riscos, porque o quorum exigido para este projeto é simples.
É enorme a importância desta reforma para desatravancar o mercado de trabalho, por meio da redução, em larga escala, do risco jurídico do empregador.
A simples instituição do conceito de que o acertado entre patrões e empregados tem prevalência sobre o cipoal da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), salvo alguns direitos, é um forte sopro de renovação numa regulação que vem da ditadura Vargas do Estado Novo, na década de 40 do século passado.
Como, durante todo esse tempo, mantiveram-se inamovíveis normas feitas para um Brasil ainda pouco industrializado, a litigância jurídica em torno do trabalho se tornou norma no país. Há na Justiça do Trabalho oito milhões de ações, uma exorbitância.
Outro avanço, este mais institucional, é o fim da contribuição sindical compulsória, equivalente a um dia de salário do trabalhador.
Aquilo mesmo que Lula, ao surgir como jovem líder metalúrgico no ABC paulista, defendeu para oxigenar o movimento sindical. Sem a garantia de receber dinheiro público - pois ele é do contribuinte -, os sindicatos precisam de fato representar as respectivas categorias, exercendo uma liderança legítima.
Ao chegar ao poder, o presidente Lula - a 'metamorfose ambulante' - praticou o oposto: nada fez para realizar o que pregava nas décadas de 70 e 80 e ainda reconheceu a existência das centrais sindicais, para que elas também passassem a receber este dinheiro fácil.
São aproximadamente R$ 3 bilhões por ano, gastos de forma obscura, sem exigência de prestação de contas ao Tribunal de Contas da União (TCU). Sindicatos aprovam seus gastos em assembleias de associados, nem sempre representativas da categoria.
Não surpreende que haja cerca de 1.100 sindicatos registrados no Ministério do Trabalho. Esta é uma boca rica daquelas que o Estado cartorial brasileiro proporciona a grupos que sabem se organizar nas imediações do Tesouro. Nos 13 anos de lulopetismo, houve pelo menos uma denúncia de que existia um balcão de venda de cartórios no ministério.
Se o mundo sindical já tem forte cultura corporativista, o fato de ser, no Brasil, uma espécie de mina de outro, ele exerce grande poder de atração sobre militantes e oportunistas, que agem, às vezes com violência, na defesa de interesses específicos de categorias, sem preocupações sobre se o país tem como sustentálos. Tudo financiado por dinheiro público.

O Globo

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quarta-feira, 26 de abril de 2017

Cientista brasileira está entre as cem pessoas mais influentes do mundo



Entre as 100 pessoas mais influentes do mundo escolhidas este ano pela revista norte-americana Time figuram dois brasileiros. Um deles é o mundialmente conhecido jogador de futebol Neymar Jr. A outra é a médica epidemiologista Celina Turchi, de 64 anos, cientista brasileira nascida em Goiás que atua como pesquisadora convidada na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Pernambuco.
Citada na categoria Pioneiros, Celina, é professora aposentada da Universidade Federal de Goiás (UFG) e ganhou o título de influenciadora mundial pelo papel que desenvolveu na investigação dos casos de microcefalia e a relação com o vírus Zika. Foi ela a responsável por formar uma rede, com cerca de 30 de profissionais de diversas especialidades e instituições, reunidos no Merg – Microcephaly Epidemic Research Group (Grupo de Pesquisa da Epidemia de Microcefalia). O grupo de pesquisadores conseguiu identificar como o vírus Zika e a microcefalia estavam associados em apenas três meses – em janeiro de 2016 os estudos começaram e em abril já havia fortes indícios da relação.
No fim do ano passado, Celina Turchi foi citada na lista dos dez cientistas mais importantes de 2016 da revista Nature (uma das publicações científicas mais importantes do mundo), pelo mesmo motivo. Apesar da notoriedade no meio científico, a pesquisadora se considera apenas uma “representante” do setor, que até hoje trabalha em conjunto para responder as tantas questões ainda em aberto sobre o vírus Zika e suas consequências.
Em entrevista à Agência Brasil, a cientista fala sobre o reconhecimento que recebe hoje (25), no Lincoln Center, em Nova Iorque, defende a manutenção de recursos para o meio científico, opina sobre o setor público de saúde no Brasil, além, é claro, de comentar sobre o assunto que lhe rendeu fama internacional: o vírus Zika e a síndrome congênita causada por essa arbovirose.
Agência Brasil: Você foi um dos destaques da revista Nature em 2016 e agora está entre as 100 pessoas mais influentes do mundo, segundo a revista Time. O que passa pela sua cabeça ao ser reconhecida dessa forma? Até pensando de outro jeito: uma mulher cientista é uma das representantes brasileiras em listas de pessoas que fazem a diferença no mundo.
Celina Turchi: Eu gosto quando você coloca “representante”. É isso que eu me sinto, uma representante do grupo de investidagores e profissionais de saúde brasileiros que se empenharam tanto, desde o início dos acontecimentos extraordinários, do ponto de vista científico, que ocorreram no Brasil no segundo semestre de 2015 e que estamos acompanhando até agora.
Agência Brasil: E para o meio científico brasileiro como um todo, esse reconhecimento influencia?
Celina Turchi: Eu acho que todo o reconhecimento de algum dos pares é bem-vindo, porque traz à tona essa possibilidade de visibilidade. Normalmente o grupo de cientistas almeja, quando muito, o reconhecimento entre os próprios cientistas. Dificilmente existe esse reconhecimento social. Mas eu acho que esse reconhecimento é importante principalmente em momentos onde se há menção de retirada de recursos para a pesquisa. Para que se entenda que a manutenção e o aprimoramento de instituições de ensino e pesquisa públicas, não só no Brasil, mas no mundo, são essenciais para dar respostas a ameaças em saúde, como essa que ocorreu.
Agência Brasil: Você é pesquisadora convidada da Fiocruz e, em outras entrevistas, falou que tem consciência do investimento feito pelo Estado brasileiro na formação da sua carreira, já que teve bolsa para estudar no exterior, trabalhou na Federal de Goiás. Seria possível avançar tão rápido nas descobertas com o seu grupo, o MERG, sem que o Brasil tivesse uma estrutura pública na área de saúde que tem atualmente? Como você avalia o setor público de saúde no país?
Celina Turchi: Eu acho que as evidências que tivemos nessa epidemia é que o setor público de saúde do Brasil, não só de atendimento, como de pesquisa, ele têm áreas de excelência. Basta lembrar que os primeiros casos foram notificados por neurologistas, a doutora Ana Van der Linden e a doutora Vanessa Van der Linden, que trabalhavam em hospitais públicos do Recife. Também teve a contribuição enorme do doutor Carlos Brito, um médico infectologista que formulou essa primeira hipótese, da possibilidade de que uma epidemia [de Zika] pudesse estar causando microcefalia. E a quantidade de pesquisadores que tinham uma experiência, um trânsito internacional muito grande com laboratórios produzindo antígenos, testes laboratoriais que pudessem ser aplicados.
Então, eu vejo que a manutenção de institutos de saúde públicos, de centros de excelência no país, isso é parte esssencial até de uma estratégia de segurança. Porque as epidemias, principalmente de saúde pública, são uma ameaça local e podem ser uma ameaça global, como foi essa, que ainda persiste. E também por uma de redução do impacto econômico que as epidemias causam, acho que a gente tem que no mínimo manter e reforçar essas instituições e a formação de pessoal.
Agência Brasil: O setor privado não conseguiria substituir essa rede?
Celina Turchi: As estruturas que eu conheço de pesquisa no mundo inteiro são – principalmente em áreas de doenças infecciosas – de responsabilidade e considerada estratégicas para o país. Os Estados Unidos têm uma rede, um Centro para Controle e Prevenções de Doenças, o CDC [na sigla em inglês], que é quem dá as diretrizes e normativas, que é uma instituição pública gerenciada pelo governo, porque isso faz parte da segurança do país.
Agência Brasil: Você falou sobre a epidemia de vírus Zika como uma ameaça que ainda persiste. Como ela está se configurando atualmente? A gente pode considerar que houve um pico no passado e existem menos casos de fato, ou ainda não chegou o tempo de uma nova epidemia?
Celina Turchi: Acho, sim, que houve uma redução de casos, em relação ao Nordeste. As epidemias virais se traduzem por aumentos e depois reduções do número de casos, então essa redução pós epidêmica é esperada. Mas como isso vai evoluir, se a gente vai ter outros picos epidêmicos, só vamos saber com um monitoramento. Nós não temos ainda todos os elementos para fazer uma predição: população infectada, introdução de outros vírus que podem potencializar a ação deste, quantidade de vetores, como as pessoas se mobilizam.
Agora, eu não tenho dúvida nenhuma de que as arboviroses [como a dengue e a zika] passaram a ser uma ameça nas cidades pela desigualdade, por esse mosaico que a gente tem nas nossas cidades, de ilhas de riqueza rodeadas por extrema pobreza e habitação muito precária, o que facilita a proliferação de vetores em áreas urbanas.
Agência Brasil: Essa seria uma das questões para entender como foi o surgimento da microcefalia em diferentes regiões do país? Porque o Nordeste foi mais afetado, registrou mais casos.
Celina Turchi: Nós não temos ainda muita clareza... esse parece ser um dos fatores, mas não temos ainda evidências muito sólidas. Temos alguns estudos que mostram que existem diferenças intraurbanas na distribuição dos casos da síndrome de zika congênita, sendo que os locais com mais casos têm piores condições socioeconômicas. Isso ficou muito claro pra cidade do Recife.
Agência Brasil: Quais as outras questões que o grupo que você coordena estão tentando responder atualmente? Existe alguma resposta nova? Por exemplo: por que o vírus afeta alguns bebes e outros não?
Celina Turchi: Atualmente tem um grupo coordenado pelo doutor Ricardo Ximenes [professor da Universidade Federal e da Universidade Estadual de Pernambuco] que está acompanhando um grupo grande de gestantes para responder perguntas em relação a que semestre ou trimestre gestacional a infecção viral afeta mais o bebê. Essas crianças nascidas de mães infectadas durante a gestação, independente de ter ou não microcefalia, estão sendo acompanhadas em outros projetos. Esses projetos são grandes consórcios internacionais. Um deles é o Zika Plan, com 25 universidades e instituições de pesquisa públicas do mundo. Outro grupo - o CNPQ junto com o Ministério da Saúde e a Capes - também fez um grande esforço colaborativo para projetos que estão sendo coordenados em diferentes áreas por outros membros desse grupo, que estão investigando o que acontece com essas crianças nascidas de mães infectadas, independentemente se apresentam alterações ou não no momento do nascimento, para saber se, a longo prazo, serão afetadas.
Agência Brasil: As descobertas feitas pelo grupo que você coordena ajudaram os serviços de saúde do mundo e, no Brasil, a gente teve um momento de expansão de serviços do SUS para atender gestantes e bebês que não estavam somente na capitais. Mas ainda há limitações. Mães que entrevistei este ano falam da dificuldade de encontrar serviços especializados no interior, por exemplo, ainda mais porque novas consequências do vírus são descobertas na medida em que os bebês vão crescendo.
Celina Turchi: Exatamente.
Agência Brasil: Que resposta o Estado brasileiro, pensando em governo federal, estadual e municipal, devem dar daqui pra frente? Qual o grande desafio da organização do atendimento?
Celina Turchi: Eu acho que é inserir o atendimento às crianças não só com infecção congênita por zika, mas também por sífilis. Um programa de atendimento que tenha continuidade, que seja adequado e entenda também essa necessidade de apoio aos familiares. Essas crianças são um impacto de grande monta na vida das famílias, principalmente das mulheres.
Agência Brasil: E uma pergunta para inspirar pessoas, especialmente mulheres fora do eixo Rio-São Paulo, que queiram seguir carreira científica: como foi sua trajetória até se deparar com esse desafio histórico?
Celina Turchi: Eu diria que a vida das mulheres da minha geração não foi diferente. Eu casei, tive filhos, tive que em algum momento interromper a minha formação. Contei, durante a minha trajetória acadêmica, com o apoio incondicional dos meus familiares e dos meu filhos. Fui bolsista do CNPq na London School como o que eles chamam de “mature student”, um estudante não tão jovem. Então eu diria para os mais jovens e, especialmente para as mulheres, que embora as carreiras femininas possam não parecer às vezes tão linerares quanto às masculinas, por causa da gestação, de alguns anos de menor produtividade, que a vida é sempre surpreendente.
É isso, não sei se... não me sinto exemplo, mas sinto muito orgulho de fazer parte desse grupo de pessoas que trabalha, na maioria das vezes no anonimato, e que vez por outra se vêem em situações extraordinárias. Poder contribuir numa situação extraordinária, do ponto de vista científico, e numa situação trágica, do ponto de vista social, e se sentir fazendo parte dos eventos, acho que é tudo que a gente pode almejar de uma trajetória profissional.
Por Sumaia Villela, da Agência Brasil

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O homem que desafiou tudo e todos: Giordano


Bruno



Ex monge dominicano, nos oito anos em que padeceu na prisão foi submetido a todo tipo de violência e opressão para que se retratasse, renegando suas convicções. O brutalizaram em vão. A congregação católica não logrou o êxito que obteria, poucos anos depois, com Galileu Galilei. Este, para não morrer na fogueira, teve que, de joelhos, abjurar toda a sua consistente obra científica e filosófica.

A ortodoxia da Igreja Católica de então concebia a terra como um planeta único no universo, resultado da intervenção direta de Deus. Um axioma que – em hipótese alguma – poderia ser questionado.

Mas, Giordano Bruno descortinou, antes da invenção do telescópio, a infinitude do universo. E que na imensidão do cosmos, existia não um, mas um número infinito de planetas. Sendo assim – questionaram os guardiões da fé – “cada planeta teria o seu próprio Jesus? Heresia! Blasfêmia! Sacrilégio! ”.

Suas ideias, formulações e livros foram proibidos, incinerados e incluídos no Index Librorum Prohibitorum, o Índice dos Livros Proibidos. 

Num ato de misericórdia, os condenados, antes de arderem no fogo da santa fogueira, eram estrangulados e mortos. Mas com Giordano Bruno foi diferente. Suas formulações representavam uma ameaça de tal dimensão aos alicerces da doutrina católica que a sentença estabeleceu que morresse diretamente em decorrência das chamas, línguas de fogo e labaredas originárias da fogueira. Seu pecado? Declarar que a terra não era o único planeta criado por Deus.

Este é o esteio de onde emerge a peça teatral “Giordano Bruno, a fogueira que incendeia é a mesma que ilumina”.

trama se desenrola no intervalo entre a condenação do filósofo italiano e a aplicação da pena de morte. A ficção contextualiza o ambiente de transição entre a baixa idade média e a idade moderna. O ambiente de ‘caça às bruxas’, o absolutismo e o autoritarismo políticos, a corrupção endêmica, o feudalismo e a ascensão da burguesia, a ortodoxia e os paradigmas religiosos, o racionalismo e o iluminismo compõem o substrato por onde se movimentam as personagens da peça.

O conselheiro do papa Clemente VIII, o octogenário Giovanni Archetti, comanda - do Palácio do Vaticano - uma intrincada rede de corrupção e, através dela, planeja desposar a mais bela jovem da Europa, Donabella de Monferrato. A formosa mulher admira e integra um grupo de seguidores de Giordano Bruno. Para convencê-la acerca do matrimônio, o poderoso velhaco tenta ludibriá-la e mente, afirmando que promoverá a revisão do julgamento do famoso filósofo, anulando a pena de morte imposta. Sem ser correspondido, o poderoso Giovanni Archetti ama Donabella, que é amada pelo noviço Enrico Belinazzo, um jovem frade de corpo atlético que, por sua vez, é amado pelo vetusto padre Lorenzo, o diretor do seminário. 

De modo que conflitos secundários são explorados evidenciando os paradigmas da baixa idade média, os fundamentos dos novos modelos, dos novos arquétipos que surgiam em oposição ao poder do imperador do Sacro Império, do Papa e dos reis; o ocaso do feudalismo, suplantado pela burguesia que emerge como a nova classe dominante; a degeneração da política e a degradação moral e dos costumes. 

Adentre este universo povoado por conflitos, disputas, cizânias e querelas. Um enredo que, lançando mão de episódios verídicos da narrativa histórica, ambienta novelos densos e provocativos instigando os leitores a responder se o autoritarismo e a corrupção que vincaram o interim entre os séculos XVI e XVII não seriam equivalentes – em extensão, volume e vilania - aos verificados nos dias de hoje.
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