segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Irresponsabilidade em cadeia ou Políticos-anões e humores da natureza.

Meus queridos leitores, a tragédia que assola o Brasil - e particularmente o Rio de Janeiro - é uma gritante denúncia de que, na república de banânia, o planejamento foi completamente intrumentalizado. Na terra brasilis, as eficazes ferramentas da boa gestão só têm servido para municiar os que diuturnamente tungam o erário público. Leiam, abaixo, o editorial do Estadão:  

Irresponsabilidade em cadeia

Não passa de escapismo político a tentativa de alguns governantes de atribuir a fenômenos naturais os dramas que, periodicamente, afligem as populações de determinadas áreas e às vezes se transformam em imensa tragédia humana, como ocorreu na região serrana do Rio de Janeiro. As pessoas não morrem por causa das chuvas, disse ao Estado a diretora do Centro para a Pesquisa da Epidemiologia de Desastres, Debarati Guha-Sapir, considerada uma das maiores especialistas do mundo em desastres naturais. As pessoas morrem porque "não há vontade política para resolver seus dramas, que se repetem ano após ano". A principal causa de tantas mortes em desastres naturais é o descaso político, resume ela.

Um exame das políticas públicas - ou da falta delas - de proteção de populações contra desastres naturais mostra, de fato, uma extensa cadeia de imprevidência, incompetência administrativa, incapacidade técnica e irresponsabilidade política. Trata-se de um problema antigo. Espera-se que as dimensões da tragédia do Rio de Janeiro finalmente alertem as autoridades para a questão e as forcem a elaborar políticas e projetos que evitem sua repetição.

As falhas são nítidas na esfera municipal, onde programas de defesa civil foram negligenciados e a intensa ocupação de áreas de risco foi tolerada. Cabe às prefeituras impedir a ocupação dessas áreas. Mas isso é só o começo dos problemas. Na área federal, quando há dinheiro, só uma parte, às vezes ínfima, é aplicada. É injustificável que, mesmo após a tragédia em Angra dos Reis, em 2010, quando um deslizamento provocou a morte de 53 pessoas - em todo o Estado do Rio, as chuvas causaram 74 mortes no ano passado -, apenas R$ 1 milhão tenha sido liberado para o governo fluminense pelo Programa de Prevenção e Preparação para Emergência e Desastres, do governo federal.

O governo Lula caracterizou-se, entre outros aspectos negativos, pela notória dificuldade de administrar os recursos de que dispôs para investir em programas como os de prevenção de desastres naturais. Mas o problema não se limitou à esfera federal. Governos estaduais não se habilitaram a receber a parcela que lhes poderia ser destinada, e alguns governadores, como o do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, ainda se declaram satisfeitos com o apoio que recebem do governo federal.

Por falta de quadros técnicos, muitas prefeituras não conseguem avaliar a extensão dos danos causados por desastres naturais nem elaborar projetos de recuperação das áreas atingidas. Nesse caso, tem razão o Ministério da Integração Nacional ao alegar que, sem projetos adequados, não pode liberar as verbas. Afinal, há um procedimento legal que precisa ser seguido - a apresentação de um projeto, a realização de licitação para a contratação de obras, entre outras providências - para que a operação não seja depois objeto de restrições por parte do Tribunal de Contas da União (TCU).

Apesar de este ser um problema conhecido há muito tempo, não há nenhum programa de capacitação técnica dos municípios, de modo a lhes permitir ter acesso a recursos de outras esferas de governo. Falta articulação entre os três níveis de governo. E falta até num mesmo nível, é o caso do federal, que só agora está programando uma ação conjunta dos Ministérios da Integração, das Cidades e de Ciência e Tecnologia para a elaboração de um programa eficiente de prevenção de enchentes.

Quando houver informações relevantes, é preciso que elas fluam. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais dispõe de um supercomputador para previsão do tempo e estudos climáticos. Se necessário, suas previsões devem chegar rapidamente, e com clareza, aos órgãos de prevenção e ao público, como ocorre na Austrália.

Horas antes da catástrofe do Rio, o Instituto Nacional de Meteorologia divulgou boletim alertando que havia "condições meteorológicas favoráveis à ocorrência de chuvas moderadas ou fortes". É uma informação relevante, sem dúvida, mas insuficiente para forçar as autoridades a remover as pessoas das áreas de risco. Em que situação ficariam as autoridades se tivessem determinado a remoção dessas pessoas e, no fim, as chuvas tivessem sido "moderadas"?

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Ainda no Estadão, Júlio Castro denuncia que
Dois anos depois, desalojados de SC ainda esperam ajuda do governo

Passados dois anos da maior catástrofe climática de Santa Catarina, que terminou oficialmente com 135 mortos e dois desaparecidos, parte dos 78 mil habitantes atingidos, entre desalojados e desabrigados, ainda aguarda pela ajuda governamental. As pessoas mais prejudicadas estão na região do Vale do Rio Itajaí.

O déficit habitacional é o maior problema. Muitas famílias que tiveram suas casas destruídas ainda vivem em acomodações improvisadas em abrigos coletivos ou na casa de parentes. Das 6,5 mil casas prometidas, cerca de 4 mil foram construídas. Até o fim do ano passado, segundo dados da Defesa Civil, cerca de 2 mil famílias se mantinham desabrigadas e outras 3 mil desalojadas nos municípios afetados.

Algumas dessas famílias serão contempladas com o último lote de 70 casas que estão sendo construídas na cidade de Ilhota. As unidades estão em fase final de acabamento e foram patrocinadas pelo governo da Arábia Saudita que, em dezembro de 2008, doou cerca de US$ 5 milhões exclusivamente para a construção de casas populares aos flagelados. Por parte do governo federal, R$ 1,8 milhão ainda precisa ser repassado para a compra de terrenos.

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E, finalmente, o artigo que escrevi dois anos atrás:
Políticos-anões e humores da natureza.

O Brasil não tem uma boa tradição de gestão pública. A máquina estatal encontra-se ainda com um elevado grau de engessamento, o que possibilita que a administração se prostre, ficando à mercê do político-anão de plantão. E quando refiro-me a político-anão, falo dos poucos, especializados na arte da oratória, da enganação, da trapaça e da corrupção. Não são todos, evidentemente, porque, felizmente, a maioria dos políticos é constituída por gente honesta, abnegada, que busca, com persistência e obstinação, corresponder às expectativas e ansiedades da população. Ocorre que os políticos-anões são como ervas-daninhas, são dotados da destruidora capacidade de colocar toda a plantação a perder. E o que tem resultado da inóspita equação “estado engessado-político anão” é um país que vivencia problemas que muitas nações já superaram séculos atrás.

A tragédia recente de Santa Catarina é um caso que exemplifica, à perfeição, o pressuposto.

O Estado amargou calvário parecido no ano de 1984, portanto deveria estar devidamente preparado para não se deixar surpreender com as “peças que a natureza prega”.

“Peças que a natureza prega”, “o volume de chuvas foi descomunal”; “as precipitações superaram todas as previsões”, “os temporais castigaram o Estado”, “foi uma fatalidade, imprevisível e inevitável”, apressaram-se em justificar políticos-anões, autoridades-anãs e responsáveis-anões, atribuindo a desgraça aos humores dos deuses dos vapores condensados na atmosfera. Para ler o artigo completo, clique aqui.