terça-feira, 31 de agosto de 2021

O controle da Administração municipal e a implementação de uma controladoria

 


A Constituição da República, promulgada em 1988, estipula, para salvaguardar os princípios regentes da Administração e promover o interesse público como norteador da atuação governamental, a adequada organização e o funcionamento de um sistema de controle interno em âmbito municipal...

 

... conforme determinado em seu artigo 31, com atribuições fundamentais definidas no artigo 70: fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, quanto a legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas.

Assim, interessa a todos os cidadãos que as prefeituras contem com estruturação adequada do seu controle interno, de modo a possuírem condições reais para incentivar a eficiência, prevenir irregularidades, promover transparência, zelar pela probidade e reduzir os riscos da nefasta corrupção, sempre tão presente e renitente.

Para a concretização desse salutar propósito democrático, a tendência observada em nosso país é a de organização do controle interno no formato de controladoria-geral, a contemplar, em sua estrutura e atividades, as chamadas "quatro macrofunções do controle interno": ouvidoria, auditoria, correição e controladoria, essa a envolver as tarefas de promoção da integridade, da transparência e da prevenção da corrupção.

Daí a importância de se considerar a experiência em curso na cidade de Ribeirão Preto (SP), tida por muitos como a capital do agronegócio, e conhecer os caminhos percorridos para a implementação de uma controladoria municipal, desde a sua criação na lei local até as primeiras providências adotadas em seus dois meses iniciais de funcionamento, com diagnóstico, atualizações normativas e planejamento das atividades operacionais.

A Controladoria-Geral do Município de Ribeirão Preto (CGM-RP) foi instituída pela Lei Complementar Municipal nº 3.062, de 29 de abril de 2021. Órgão inédito na organização administrativa ribeirão-pretana, a CGM assumiu a atribuição de unidade central do sistema de controle interno do Poder Executivo e compôs-se, no seu organograma, de quatro departamentos, cada qual incumbido de uma macrofunção do controle interno: auditoria-geral do município, corregedoria-geral do município, ouvidoria-geral do município e departamento de promoção da integridade.

Há, também, o conselho de controle interno do município, colegiado máximo de deliberação da controladoria e investido do status de instância recursal final para procedimentos correcionais e requerimentos de acesso à informação, integrado pelos diretores de departamento da CGM-RP e presidido pelo controlador-geral do município.

A citada norma municipal bem definiu as balizas institucionais para o funcionamento da CGM, subordinando-a diretamente ao prefeito e contemplando-a da prerrogativa de requisitar documentos, informações ou quaisquer providências aos órgãos e entidades da Administração municipal direta e indireta, com prioridade em sua tramitação, sob pena de responsabilidade funcional grave dos responsáveis em caso de não observância do prazo fixado. Há requisitos de formação, além da exigência de notório conhecimento e reputação ilibada, para o provimento de todos os cargos em comissão e funções de confiança de direção da CGM. controlador-geral, auditor-geral, corregedor-geral e ouvidor-geral devem ser servidores públicos ocupantes de cargo efetivo e terão mandato de dois anos, permitida uma única recondução por igual período.

Em 30 de junho, o prefeito Antônio Duarte Nogueira Júnior empossou a primeira equipe dirigente da CGM-RP: o advogado Renato Cláudio Martins Bin, controlador e corregedor-geral do município; a contadora Cibelle Maria do Amorim Ferreira, auditora-geral do município; o técnico em contabilidade João Paulo de Brito, ouvidor-geral do município; o advogado Óthon Castrequini Piccini, diretor do Departamento de Promoção da Integridade. Compondo os recursos humanos do órgão, há a secretaria de gabinete do controlador-geral, servidores públicos (agentes de administração) na auditoria e na corregedoria, que também cooperam com o Departamento de Promoção da Integridade, e sistemas terceirizados, sob a supervisão da ouvidoria, contratados para a gestão de canais de comunicação com o munícipe.

Em dois meses de trabalho, a CGM-RP concentrou-se em realizar diagnósticos circunstanciados das respectivas áreas de atuação, com o objetivo de mapear as demandas, providências e ajustes normativos ou operacionais necessários à plena consecução de suas finalidades legais. Para tanto, o principal vetor foi a elaboração do regimento interno da controladoria-geral do município, produzido a partir de referências e parâmetros normativos da legislação federal e em instituições de reputação global, observando-se comando expresso da LC nº 3.062/2021.

Aprovado pelo conselho de controle interno do município no último dia 11, o texto-base do regimento interno da CGM-RP foi encaminhado para se tornar parte integrante de decreto municipal, que lhe conferirá força regulamentar do topo da hierarquia dos atos normativos secundários. Em formato inédito no Direito Municipal brasileiro, o regimento interno da CGM-RP tem o condão de disciplinar, num documento único, os procedimentos de auditoria, ouvidoria, correição e integridade pública, proporcionando notável salto qualitativo ao ordenamento jurídico.

No regimento interno, incorporou-se o método das três linhas de defesa, em sintonia com as melhores práticas internacionais de controle interno, a conferir perspectiva sistêmica e integrada ao controle interno, sob a coordenação da CGM (terceira linha de defesa), com fulcro no artigo 169 da Lei Federal nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Para a Auditoria Geral do município, trouxeram-se referências da Instrução Normativa nº 03 da Controladoria-Geral da União (CGU), de 9 de junho de 2017, das Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBCASP) e das Instruções nº 01/2020 do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), com a previsão de um Plano Anual de Auditoria Interna (Paint), bem como das formas de apoio ao TCE-SP no processo de fiscalização das contas anuais, monitoramento de alertas e cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, partindo-se da estrutura e rotina de auditoria interna até então existentes na Secretaria Municipal da Fazenda.

Para a ouvidoria-geral do município, previu-se a adequação dos fluxos informacionais dos canais de comunicação com o munícipe aos trâmites da Lei Federal nº 13.460, de 26 de junho de 2017 - Código de Defesa dos Usuários de Serviços Públicos -, consolidou-se a plena supervisão do ouvidor geral sobre o desempenho dos sistemas informacionais e de comunicação com o cidadão, determinou-se a publicação da Carta de Serviços ao Usuário, estabeleceu-se o conselho de controle interno do município como a última instância recursal para requerimentos de acesso à informação - Lei Federal nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 -, e criou-se o Plano Municipal de Ouvidoria, a ser aprovado pelo conselho de controle interno em um ano, e cujo conteúdo versará, dentre outros assuntos, sobre transparência ativa e dados abertos.

Em relação à corregedoria-geral do município, o regimento interno compatibilizou os procedimentos correcionais às classificações empregadas pela Instrução Normativa nº 14, de 14 de novembro de 2018, da CGU, a saber, sindicância investigativa, sindicância patrimonial, sindicância acusatória, processo administrativo disciplinar e processo administrativo de responsabilização. A LC nº 3.062/2021, além de criar as comissões permanentes sindicante e processante e transferir as atribuições da Lei Anticorrupção à CGM, já havia promovido alterações no Estatuto dos Servidores Públicos de Ribeirão Preto - Lei Municipal nº 3.181/1976, que tornaram o conselho de controle interno do município competente para apreciar recursos e autorizar a instauração de processos administrativos disciplinares e de responsabilização de pessoas jurídicas. A CGM-RP também iniciou estudos para viabilizar a digitalização e tramitação eletrônica de sindicâncias e processos administrativos disciplinares, em atendimento ao programa Prefeitura Sem Papel.

O Departamento de Promoção da Integridade, por sua vez, ficou regimentalmente autorizado a formular programas de compliance para órgãos e entidades do município, a partir de informes da auditoria-geral. É a unidade incumbida da produção de normas técnicas da CGM, devendo estabelecer uma grade anual de capacitação nos temas de controle interno e respectivas atualizações legislativas nas áreas de Direito Público, Administrativo e Financeiro, além de propor regulamentações da Lei de Proteção de Dados Pessoais e Lei do Governo Digital. Coordenará a interlocução da CGM com instituições públicas de notória expertise em controle interno, para fins de iniciativas cooperadas de capacitação, intercâmbio de experiências e aprimoramentos institucionais.

No bimestre inaugural, a CGM-RP providenciou solicitação de adesão à Rede Paulista de Controladorias Municipais (REPAC), encarregou-se da comunicação do município com o Tribunal de Contas da União (TCU), no âmbito do Programa Nacional de Prevenção à Corrupção (PNPC), e agendou visita técnica à Controladoria-Geral do Município de São Paulo, a ser realizada no mês de setembro. O site da CGM-RP também já é acessível ao público, pela página oficial da prefeitura de Ribeirão Preto, sendo o veículo pelo qual o cidadão poderá ter acesso às atas das sessões do conselho de controle interno do município e acompanhar, na íntegra, os trabalhos desempenhados.

Portanto, à vista da experiência encontrada no município de Ribeirão Preto, a implementação de uma controladoria municipal depende, antes de tudo, de corretas premissas na sua lei instituidora: vinculação direta ao prefeito municipal, exigência de requisitos técnicos para provimento dos cargos e funções, previsão de mandato para seus dirigentes, prerrogativas e garantias efetivas para a independência e autonomia técnica de seus membros, assim como a centralização das macrofunções (auditoria, ouvidoria, correição e integridade pública) nas atribuições da unidade de coordenação do sistema de controle interno.

Essas providências demandam uma observação acurada do cenário jurídico local e capacidade interpretativa do redator para atingir o intento de suprir lacunas, promover atualizações e, ao mesmo tempo, conceber uma arquitetura normativa factível à realidade administrativa do município, provendo disciplina concreta e eficaz dos procedimentos a permearem a atuação da controladoria. Convém, também, ser proativa na interlocução institucional, integrando-se às redes intermunicipais, aos fóruns de debates, às iniciativas de capacitação e aos programas nacionais de cooperação e prevenção à corrupção.

Centralização das macrofunções do controle interno e vinculação direta ao prefeito, premissas corretas na lei instituidora, diagnóstico circunstanciado, atualização normativa, disciplina de procedimentos, interlocução institucional e transparência: essas são as palavras de ordem dos primeiros passos para a implementação de uma controladoria municipal, e a experiência de Ribeirão Preto bem ilumina esse virtuoso caminho.

Gustavo Ungaro é advogado, doutor e mestre pela USP, professor da Graduação e Pós-Graduação da Universidade Nove de Julho, vice-presidente da Comissão Científica do Conselho Nacional de Controle Interno, membro da Comissão de Direitos Humanos da USP, da Congregação da Faculdade de Direito da USP e da Comissão Justiça e Paz de SP, foi controlador geral do município de SP, ouvidor geral e corregedor geral do Estado de SP, dentre outras funções públicas exercidas.

Óthon Castrequini Piccini é doutorando em Direito Financeiro pela FD-USP, advogado licenciado, diretor do Departamento de Promoção da Integridade da Controladoria Geral do Município de Ribeirão Preto/SP (CGM-RP), foi bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pela qual desenvolveu iniciação científica sobre o controle interno na administração municipal.

Por Gustavo Ungaro Óthon Castrequini Piccini, na revista
Consultor Jurídico  


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segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Nova Lei de Licitações é um novo momento para as parcerias público-privadas

 


É notória a importância social e econômica das parcerias entre o setor público e o privado na execução de obras, bens e serviços de infraestrutura, habitação e transportes, setores determinantes para o crescimento sustentável do país. Recentemente, o PL 4.253/2019 estabeleceu normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas. A nova lei indica a intenção de resgatar a confiança dos investidores e a segurança jurídica do procedimento licitatório baseadas na tecnologia, na transparência dos atos administrativos e ocorrerá no prazo de dois anos.


Entre elogios e críticas, não se pode negar o fato de que a Lei nº 14.133/2021 trouxe algumas inovações que merecem destaque:

- Flexibilização: modelos genéricos de modo que a regulamentação específica de cunho procedimental se dará no edital licitatório e no contrato administrativo (Taylor-made);

- Controle: regras de boas práticas, governança e gestão preventiva de riscos;

- Modernização: uma plataforma unificada que reunirá informações de todas as licitações;

- Alteração das modalidades de licitação: extinguiu a tomada de preços e o convite. Manteve o pregão, a concorrência, o concurso e o leilão, e criou uma nova modalidade, o diálogo competitivo, inspirado nas diretivas de contratações públicas da União Europeia;

- Agente de contratação: cria a figura de uma pessoa designada pela autoridade competente, entre servidores efetivos ou empregados públicos dos quadros permanentes, durante todo o processo até a homologação;

- Inversão das fases do rito procedimental: agora, a habilitação será realizada após o julgamento;

- Contratação integrada: a nova lei consagrou esse regime de contratação de obras e serviços de engenharia;

- Matriz de riscos: obrigatória em contratos para obras de grande vulto e regimes de contratação integrada e semi-integrada;

- Seguro-garantia: elevação dos patamares das importâncias seguradas prevê a possibilidade de inserção no contrato de cláusula step-in rights.

Considerando que o seguro-garantia poderá ser exigido para a execução obras e serviços de engenharia sob o regime de contratação integrada, chama-se a atenção para essa peculiar modalidade de contrato.

Vale ressaltar que durante a tramitação no Congresso do projeto de lei a inclusão do regime de contratação integrada foi alvo de inúmeras críticas do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR). O órgão defendeu que a Lei de Licitações deveria vedar o referido regime e exigir o projeto completo antes da contratação da obra. Sugeriu também que houvesse concurso público apartado para a contratação do projeto completo. O deputado federal Joaquim Passarinho (PSD-PA), inclusive, ressaltou que o regime de contratação integrada torna "ineficaz o controle da qualidade da obra a ser construída, do seu prazo de execução, bem como dos custos envolvidos na implantação, operação e manutenção do bem público em questão", entendimento no sentido de que a escolha pelo regime de contratação integrada deve ser marcada pela sua excepcionalidade e em função dos riscos.

Em pesquisa ao site do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o tema, resulta que a contratação integrada apresentou os piores resultados se comparados aos demais regimes. As críticas não encontraram aderência necessária no Legislativo, prevalecendo o projeto original, sob o pretexto de que a contratação integrada representa grande vantagem para a Administração Pública porque concentra os riscos e as responsabilidades na empresa contratada.

No entanto, se não foram capaz de impedir a inclusão da contratação integrada na nova lei, as reações contrárias propiciaram um inegável avanço, na medida em que contribuíram para o aprimoramento do conceito de anteprojeto de engenharia que deve ser elaborado pela Administração, que passou a fornecer melhores especificações acerca do objeto que será executado para subsidiar o oferecimento de propostas com a correta mensuração e alocação dos riscos pelos licitantes.

Portanto, além dos requisitos já previstos no artigo 9º do Regime Diferenciado de Contratações (RDC), exige-se que o anteprojeto da proposta da concepção da obra contenha, no mínimo, os projetos anteriores ou estudos preliminares.

Nota-se que, após 28 anos de vigência da Lei nº 8.666, há pronunciada frustração de alguns administrativistas, que esperavam avanços mais significativos na nova lei, já que desde 1995 discute-se a necessidade de alteração da antiga. Contudo, há também pontos que trazem um respiro e boas novidades para as parcerias público-privadas.

A predominância do processo licitatório eletrônico e a condição imposta para eficácia dos contratos administrativos à publicação no Portal Nacional de Contratações Públicas, uma plataforma unificada que reunirá informações de todas as licitações e contratações, atende à necessidade de transparência dos atos administrativos de todos os entes federativos.

A elevação do valor do seguro-garantia e a previsão de cláusula de retomada viabilizam ainda mais a utilização desse relevante instrumento como suporte às grandes obras de infraestrutura.

Ao assinar o contrato administrativo, a seguradora passará a ser terceira interessada na regular execução da obra ou serviço de engenharia, objeto do seguro-garantia, e deve designar um representante para fiscalizar a execução do contrato principal e atestar a conformidade dos serviços e dos materiais empregados, bem como o cumprimento dos prazos pactuados.

Enfim, o ciclo de vida do processo licitatório e a gestão do contrato administrativo, desde a sua concepção até o pós-sinistro, devem fazer parte da atividade de toda seguradora que pretenda disputar essa fatia nobre do mercado segurador.

Por Darcio Mota, na
Consultor Jurídico  


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