domingo, 31 de maio de 2020

A CONTRAPROVA DA ROCHE - os testes para a Covid-19



O grupo suíço Roche, um dos maiores conglomerados de medicamentos e equipamentos médicos do mundo, com receita de US$ 57 bilhões no último ano fiscal, vem testando com mais empenho o crescente mercado de saúde no Brasil. 

A divisão voltada a laboratórios, a Roche Diagnostica, está prestes a receber o sinal verde da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para iniciar a distribuição do primeiro lote de 500 mil testes para a Covid-19 que já estão em território brasileiro. 

Segundo o presidente da empresa, o mexicano Antonio Vergara, o produto foi desenvolvido no tempo recorde de três meses nos centros de pesquisa do grupo na Alemanha e nos Estados Unidos, algo que antes levaria cerca de onze meses. 

O novo teste de anticorpos da companhia, o Elecsys Anti-SARS-CoV-2, tem ajudado os mercados americanos e europeus no combate à pandemia. Ele também determina se um paciente foi exposto ao coronavírus e se desenvolveu anticorpos. 

“A testagem em massa é fundamental para conter o avanço do vírus, mas é preciso ter um protocolo adequado para isso", diz Vergara. 

Para ele, com a pandemia, o segmento passou a ter mais valor do que nunca. "Enquanto o diagnóstico representa 2% dos gastos médicos globais com saúde, o Brasil desembolsa apenas 0,4% com exames que são responsáveis por 70% das decisões médicas", afirma. 

A Roche investe, anualmente, 20% de sua receita com pesquisas, um orçamento que supera US$ 11 bilhões. Neste ano, a companhia já produziu 8,5 milhões de testes moleculares e 10 milhões de testes sorológicos. No Brasil, 70% dos clientes são da saúde privada. 

“A pandemia está unindo os setores públicos e privados em um mesmo objetivo. E queremos ser parte de uma solução global para a crise." Será uma nova contraprova para a Roche no Brasil.

Da Isto é Dinheiro








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sábado, 30 de maio de 2020

NEGÓCIOS - E agora, Embraer?


Abandonada no altar pela Boeing, a Embraer busca um plano B. O curto prazo vai ser duro. Mas o futuro pode até ser promissor

A fabricante de aviões brasileira Embraer terá um 2020 para desfazer o que fez em 2019. Depois de fechar um acordo para vender sua unidade de jatos comerciais — a mais antiga e lucrativa da companhia — à americana Boeing, por 4,2 bilhões de dólares, a companhia passou 2019 reorganizando as operações. Construiu uma nova sede, gastando 30 milhões de dólares, a 20 quilômetros da primeira, em São José dos Campos, no interior de São Paulo. Na antiga matriz ergueu uma parede no meio do galpão de testes de aeronaves, que passaria a compartilhar com a nova empresa, na qual teria uma participação de 20%.

Planejou como transferir metade de seus 11.000 funcionários para o empreendimento com a Boeing e mudou a linha de montagem dos jatos executivos para a cidade de Gavião Peixoto, onde já eram fabricados os militares. Cada movimento embutia, para seus orgulhosos trabalhadores, a dor da separação e da despedida, e também a animação de começar outro ciclo aos 50 anos. Conforme os meses e a transação avançavam, porém, o clima ficava mais tenso.

Corria nos escritórios e nas unidades industriais que a Boeing andava hesitante por causa da demora em conseguir reabilitar seu avião 737 MAX, envolvido em dois acidentes entre o final de 2018 e o início de 2019 que mataram seus 346 passageiros. A Embraer seguiu com o processo, obteve a aprovação dos reguladores no Brasil e nos Estados Unidos, e ficou esperando apenas a autorização dos europeus neste início de 2020. Até que, nos últimos dias de abril, a americana desistiu do negócio. Para a Embraer ficou uma conta de 485 milhões de reais com os preparativos e uma dúvida — qual é o futuro da companhia?

A resposta mais precisa, neste início de maio, é: ninguém sabe. A Embraer vai enfrentar o pior cenário para a aviação mundial de que se tem registro na história com a desvantagem de ter separado suas operações. O professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP) Oscar Malvessi estima, com base em dados do balanço da Embraer, que o custo total, considerando despesas e perdas de eficiência, tenha sido superior a 800 milhões de reais.

“Essa é minha interpretação quando comparo o balanço integrado da empresa em 2018 com a soma das partes em 2019”, disse ele. Esse custo total, segundo o professor, reflete também os dois anos que a companhia dedicou à transação com a Boeing, e não à melhora de sua competitividade. A Embraer terminou o mês de dezembro com 11,2 bilhões de reais em caixa, ante uma dívida total de 13,7 bilhões. De acordo com os cálculos de Malvessi, tem 177 dias de cobertura de liquidez.

Agora, tudo o que transitar de uma Embraer para a outra, de peças e equipamentos, vai gerar pagamento de impostos, pois as empresas têm CNPJ diferente e a transferência será classificada como transação comercial. Mantê-las separadas, portanto, será um trabalhão. Juntá-las, por sua vez, demandará dedicação — e dinheiro — em meio à crise.

A divisão de jatos comerciais da Embraer, incluindo o centro logístico de Taubaté, a subsidiária de equipamentos Eleb e a fábrica de peças em Évora, Portugal, seria transferida para a Boeing Brasil-Commercial, a parceria entre a Boeing e a Embraer. Outra sociedade foi estabelecida para a comercialização do cargueiro militar KC-390, com participação de 51% da brasileira e 49% da Boeing, que teve sua primeira unidade entregue à Força Aérea Brasileira em setembro de 2019.

A Embraer que ficou pretendia investir mais em negócios inovadores, como o desenvolvimento de aviões elétricos, satélites e sistemas de monitoramento de fronteiras. Não se sabe se os novos projetos serão mantidos. Sem a Boeing, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também será um dos protagonistas no auxílio à Embraer.

Os valores discutidos variam de 1 bilhão a 1,5 bilhão de dólares, numa cesta de crédito mais capital (ações ou bônus de subscrição), em proporções não definidas até o fechamento desta edição da EXAME, em 5 de maio. O vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, deu declarações de que o governo, como dono de uma golden share, buscaria um novo comprador para a empresa e indicou que potenciais parceiros estariam na China — a China Commercial Aircraft (Comac) é tida como a principal interessada.

O mercado de aviação que emergirá da crise pode ser bastante diferente daquele que levou a administração da Embraer a buscar um negócio com a Boeing em 2017. Apesar do bom desempenho financeiro da companhia, faltava ritmo de expansão. A receita líquida da Embraer passou a última década oscilando entre 5,1 bilhões e 6,3 bilhões de dólares. A companhia se dedica ao desenvolvimento e à fabricação de jatos regionais, um mercado que representa menos de 10% de toda a indústria.

O setor vinha registrando expansão cada vez mais concentrada nos aviões de maior porte, e tornava-se crucial ter acesso a uma carteira de clientes tão vasta quanto a da Boeing, um colosso que fabrica 800 aviões por ano. Além disso, o peso de um gigante fazia falta diante do movimento da Airbus, que em 2017 havia comprado a família de jatos regionais C-Series da canadense Bombardier (maior concorrente da Embraer).

Em 2018 e 2019, a Embraer subiu no palanque para justificar quanto dependia de um acordo com a Boeing para, dessa forma, amenizar as críticas dos investidores frustrados com o preço fechado no negócio. Agora o desafio está em convencer o mercado do contrário. É comum que após crises econômicas o mercado de aviação comece a reaquecer com os aviões menores. Contudo, como aponta Renato Mimica, diretor da EXAME Research, braço de análises de investimentos da EXAME, é muito difícil prever quando a demanda por novos aviões será retomada.

“Haverá um grande mercado de aviões usados à disposição para arrendamentos como resultado da queda na demanda e do ajuste de frota das companhias aéreas”, diz. As apostas para a retomada do mercado à normalidade variam de dois a cinco anos. Crescimento mesmo — quando novos aviões são vendidos — não se tem ideia de quando vai ocorrer de novo. Nem mesmo o megainvestidor Warren Buffett, reconhecido por seu foco no longo prazo, achou por bem pagar para ver. O único setor do qual sua empresa, a Berkshire Hathaway, se desfez de todas as ações em razão da pandemia foi o de aviação, num total de 6,5 bilhões de dólares.

“Time kills deals.” A máxima do mundo dos negócios é uma das frases mais repetidas por quem analisa o vaivém da Embraer. Para banqueiros, advogados e até executivos, uma transação que leva mais de dois anos para sair do papel abre espaço para o surgimento de uma série de eventos não previstos que mudam o resultado final. A pandemia do coronavírus, que congelou o setor de aviação, ampliou o tamanho do problema da Boeing com a crise do modelo 737 MAX.

Juntos, esses eventos para lá de extraordinários explicam como a companhia americana saiu de uma posição de pujança para ter de levantar 25 bilhões de dólares em bônus, com vencimento previsto para 2060. A captação ocorreu no fim de abril, logo depois de a Boeing bater em retirada do acordo com a Embraer. A Boeing perdeu 24% de sua receita líquida em 2019, para 76,5 bilhões de dólares, e teve um prejuízo de 636 milhões de dólares, ante um lucro líquido de 10,5 bilhões de dólares em 2018. O valor de mercado caiu de 180 bilhões para 80 bilhões de dólares nos últimos meses.

A união da Boeing com a Embraer foi especialmente longa por envolver pontos sensíveis. O governo brasileiro, na época liderado pelo presidente Michel Temer (PMDB-SP), não queria entrar para a história como aquele que se desfez da companhia que ganhou fama internacional por sua tecnologia de ponta. Somente para ajustar os planos ao desejo do governo brasileiro foram oito meses até que um primeiro memorando de entendimento fosse assinado em julho de 2018. Um ano foi gasto até que as empresas assinassem um acordo que pudesse ser submetido a seus acionistas, em assembleias, condicionado à aprovação de órgãos da concorrência — segundo executivos próximos, a própria Boeing esticou os prazos com os reguladores europeus após a crise com o 737 MAX.

Com o negócio desfeito, o amor virou guerra. No dia em que anunciou a desistência da transação, a manhã do sábado 25 de março, a Boeing apontou que a Embraer deixou de cumprir condições precedentes que seriam necessárias para que o negócio fosse concluído. A Embraer reagiu. Antes da abertura dos mercados na segunda-feira 27 de abril, informou que estava dando a largada em uma arbitragem, nos Estados Unidos, contra a Boeing por produzir “falsas alegações” e “fabricar argumentos” para “quebrar” o acordo de forma unilateral.

“A Boeing trabalhou diligentemente por mais de dois anos para finalizar a transação com a Embraer. Nos últimos meses, tivemos produtivas porém frustradas tentativas de negociação a respeito de cláusulas não cumpridas do acordo”, afirmou em nota Marc Allen, presidente da Embraer Partnership & Group Operations, executivo da Boeing que liderava o processo de combinação das empresas. A EXAME apurou que o principal descumprimento alegado pela Boeing seria a Embraer não ter alcançado a meta de investimento no segmento de aviação comercial — da ordem de 200 milhões de dólares — com a qual teria se comprometido até que a Boeing assumisse o negócio. A Embraer afirmou, em nota, que acredita “estar em total conformidade com suas obrigações previstas”. Para a Embraer, o real motivo da desistência da Boeing é a crise interna da empresa. As duas companhias não deram entrevista.

Entre as condições precedentes para o acordo também estava a bênção dos órgãos de concorrência. A operação já havia recebido o aval prévio nos Estados Unidos, no Japão, na China e no Brasil. Faltava, contudo, a análise da Comissão Europeia, que no fim do ano passado ainda aguardava uma longa lista de documentos solicitados às companhias.

Poucos dias antes do prazo final das empresas, o órgão europeu adiou a data final de seu parecer para 7 de agosto, o que levou a especulações de que também o prazo para a assinatura do acordo poderia se modificar. A Boeing reduziu seu engajamento para a aquisição da Embraer já no segundo semestre de 2019, mas levar as conversas até a data final teria sido apenas uma estratégia de reputação adotada para evitar, além da multa, problemas legais que poderia enfrentar ao assumir a desistência por interesse próprio.

Tudo indica que as práticas de governança de ambas as empresas sofrerão um escrutínio maior a partir de agora. A Embraer é, desde 2006, quando aderiu ao Novo Mercado da B3, uma companhia sem controlador definido. Atualmente, a maior acionista da Embraer é a gestora de recursos Brandes, com 15% do capital. Depois, na lista de acionistas relevantes, ou seja, com 5% ou pouco mais, estão BNDES, BlackRock e a casa fundamentalista americana Hotchkis & Wiley. Esse modelo dá superpoderes ao conselho de administração, de onde partiu a idealização do negócio com a Boeing.

O colegiado e os executivos estão, agora, pressionados a buscar uma solução ao mesmo tempo que devem ter suas políticas escrutinadas. O conselho da Embraer custa, em salários fixos, quase o mesmo valor da diretoria estatutária. Acessar recursos do BNDES exigirá que os executivos abdiquem de seus bônus — estará na cartilha do banco de fomento para os resgates. Na assembleia de acionistas, a companhia aprovou um pacote global de remuneração para 2020 de 63 milhões de reais — 17% maior do que o total pago no ano passado, sem pandemia e com Boeing.

Na Boeing, o grande ponto a ser atacado na governança serão as agressivas recompras de ações. O saldo em tesouraria que a Boeing mantinha de suas próprias ações estava em 55 bilhões de dólares no fim de março (registradas pelo valor de custo, e não pelo de bolsa), comparado a um caixa disponível de 15 bilhões de dólares. Como uma empresa que foi tão a fundo nas recompras agora não tem caixa para consumar o negócio com a Embraer? Ficar sozinha pode não ser o fim do mundo para a empresa brasileira, apesar da tormenta de reunir o que estava separado.

Se antes dizia que precisava da parceria com a Boeing para sobreviver, agora a Embraer consegue enxergar outro futuro, sozinha. “Quando esta crise passar, o mercado de aviação será muito diferente. Com menos passageiros e menos viagens longas, a demanda por aviões de médio porte vai crescer mais do que se previa anteriormente”, diz um alto executivo da Embraer. Segundo esse raciocínio, as companhias aéreas vão priorizar os aviões que têm até 150 lugares, especialidade da fabricante brasileira. Um novo modelo, o E195-E2, já foi entregue à Azul. Não há vencedores no trágico negócio entre brasileiros e americanos. Mas a Embraer pode estar numa encruzilhada menor do que a Boeing.

Por Denyse Godoy, Graziella Valenti, na Revista Exame







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sexta-feira, 29 de maio de 2020

Brasil, mostra a tua cara


Subdesenvolvimento não se improvisa. É obra de séculos, dizia Nelson Rodrigues. A piada continua válida, mas o presidente resolveu acelerar o processo. A sua ação política e pessoal, que nega a luta pela vida e ignora medidas como o isolamento social, aumenta o drama vivido pelo País. O índice de adesão à quarentena no País vem caindo desde março, e atingiu seu número mais baixo na última quarta-feira, segundo a plataforma In Loco — 41,7%, enquanto os especialistas recomendam 70%. O desgoverno de Bolsonaro tornou o País um pária na comunidade internacional, na rabeira do combate global à pandemia. Na última semana, o Brasil ultrapassou a barreira de mil mortes diárias. Mais de 20 mil brasileiros já perderam a vida.
Os mais de 300 mil casos confirmados colocaram o País na terceira colocação mundial no ranking de infectados. O número de novos casos diários, na casa de 20 mil, já se aproxima dos EUA, líder mundial nesse quesito. A Universidade de Washington (EUA) prevê que o Brasil poderá ter 90 mil mortes até a primeira semana de agosto. Esse número pode chegar a 194 mil. Os números assustadores também devem se reproduzir na economia. O tombo do PIB vai ser maior do que no resto do mundo, e a retomada será mais difícil. As ações antiambientais do mandatário já haviam afastado os investidores. Agora, a pandemia tirou o País do mapa do capital internacional pelos próximos anos.

Alheio à emergência, o presidente continua sua cruzada contra as medidas de isolamento social. No domingo, 17, voltou a se encontrar com apoiadores em frente ao Palácio do Planalto, acompanhado de onze ministros. Desta vez, usou máscara e adotou tom conciliador. Mas continuou a transferir para os governadores e a imprensa a culpa pela expansão da doença. Ao sair do Palácio da Alvorada, em direção à manifestação, repreendeu o general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) por falar com jornalistas. Depois, divulgou que o ato tinha sido pacífico: “Nenhuma faixa, nenhuma bandeira que atente contra a nossa Constituição”. O tom ameno não se deve a uma mudança de atitude. Acontece pelo receio de que o inquérito aberto após as denúncias feitas pelo ex-ministro Sergio Moro levem o ministro Celso de Mello, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), a divulgar na íntegra a fita da reunião do dia 22 de abril. Essa gravação preocupa o presidente, pois pode confirmar a tentativa de interferência na Polícia Federal e tem potencial de escancarar à opinião pública os ataques de ministros aos outros Poderes, brigas no seio do governo e críticas a países aliados. A barafunda da administração Bolsonaro já levou à demissão de 11 ministros, sem contar os quatro titulares da Secretaria da Cultura — a última titular, Regina Duarte, foi exonerada na última quarta-feira, menos de três meses depois de assumir a função.


Insistência na cloroquina


Por culpa de Bolsonaro, a política de combate à doença permanece disfuncional. Além de ignorar a recomendação de especialistas, ele ataca os governadores que estão na linha de frente. Sua ações desorganizam o sistema de saúde já em dificuldades. Médicos da rede pública se dizem pressionados pela crescente recomendação para que prescrevam a cloroquina, apesar do alerta das entidades médicas com a falta de comprovação dos efeitos positivos e o risco de efeitos colaterais. O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, previu que seu uso indiscriminado poderá aumentar o número de mortos em casa. A sabotagem à quarentena estimula atitudes inconsequentes pelo País.


Em várias cidades, a população sai às ruas ignorando os riscos. Com a expansão da doença, vários municípios em situação dramática, sem leitos de UTI disponíveis, no Rio de Janeiro, Pará, Tocantins, Amapá, Roraima e Paraná, precisaram impor o lockdown. Mas seus prefeitos precisam confrontar o discurso do presidente, que anuncia pílulas milagrosas e menospreza o perigo da doença. A Justiça tenta reagir. O ministro Rogério Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou um habeas corpus impetrado pela deputada bolsonarista Clarissa Tércio, que pedia o fim do isolamento em Pernambuco. Em sua sentença, o juiz aponta o desgoverno na área da saúde e diz que os governos regionais estão carentes de “uma voz nacional que exerça o papel que se espera de um líder democraticamente eleito, responsável pelo bem-estar e saúde de toda a população, inclusive da que não o apoiou ou apoia”. A anarquia gerencial do governo Bolsonaro impede que o País discuta um plano para a retomada programada da economia. O mandatário ainda está atrapalhando os gestores que, sem recursos, tentam desesperadamente salvar vidas.


Enquanto a espiral de números assombra e enluta a população, Bolsonaro aprofunda a crise. Demitiu dois ministros da Saúde em 29 dias, em plena pandemia. Depois de exonerar Mandetta, forçou a demissão do novo titular da pasta, Nelson Teich, na sexta-feira, 15. O cargo permanece vago, e o presidente disse que poderia continuar assim “por muito tempo”.


Covid-19 lidera as mortes


O general Eduardo Pazuello, titular de facto da pasta, espantou a comunidade internacional na última semana ao omitir a gravidade da situação quando se dirigiu a uma conferência da Organização Mundial da Saúde. Outro general, Luiz Eduardo Ramos, preferiu culpar a imprensa pelo “clima de terror”, pois os telejornais só mostram “imagens de caixão e corpo”. Contra a lógica e o bom senso, o governo tenta criar a narrativa de que o novo coronavírus mata menos do que outras doenças. Para os militares do governo, deve-se divulgar o grande número de pessoas salvas. Foi o que ocorreu na última terça-feira, 19, quando a Secretaria de Comunicação, do notório incompetente Fabio Wajngarten, comemorou a marca de 100 mil brasileiros “salvos” da doença. Numa ironia macabra, no mesmo dia o Brasil ultrapassou a barreira de mil mortes diárias e a Covid-19 se tornou a principal causa de mortalidade nacional, superando as doenças cardiovasculares, o câncer, as doenças respiratórias, os homicídios e acidentes de trânsito. No briefing diário para atualizar os dados da pandemia, nenhuma alta autoridade compareceu. Como numa reafirmação do descaso oficial, a secretária substituta da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Daniela Ribeiro, fez uma explanação sobre aleitamento materno. Um deboche.


No mesmo dia 19, Bolsonaro tratou a doença com chacota. “Quem é de direita toma cloroquina. Quem é de esquerda toma tubaína”, disse rindo em uma live em suas redes sociais. Comentava sua próxima iniciativa para o uso da cloroquina (leia mais à pág. 30). A droga foi liberada para todos os pacientes no dia seguinte, em um documento do Ministério da Saúde — que, significativamente, não trazia nenhuma assinatura. Isso ocorre porque o general Pazuello, assim como os 17 militares que acabou de integrar à pasta, não são médicos. Alguns são bolsonaristas e usaram as redes sociais para defender o presidente e atacar o presidente da Câmara. A militarização da pasta confirma uma gestão alheia à recomendação dos especialistas e voltada para a logística da distribuição da cloroquina, que é produzida pelo Exército. Na América Latina, apenas Bolsonaro e o ditador venezuelano Nicolás Maduro defendem o remédio. No mundo, Donald Trump é voz solitária em sua defesa. O presidente americano, cuja aproximação e amizade Bolsonaro considera seu grande trunfo na política internacional, engrossa a péssima visão internacional do Brasil atualmente. Na última semana, ele voltou a ameaçar a entrada nos EUA de voos provenientes do Brasil. “Não quero pessoas vindo para cá e infectando nosso povo”, disse Donald Trump.


“Politizaram a ciência”, disse com propriedade Mandetta, que foi demitido exatamente por se recusar a prescrever o remédio. Cloroquina é uma tática bolsonarista para enfraquecer a quarentena, que na visão do presidente atrapalha a economia e suas chances de reeleição — cada vez menores. Difundir um medicamento que não tem comprovação científica também é uma cortina de fumaça para a inação do governo, que não está entregando respiradores prometidos aos Estados — 12 capitais já têm ao menos 80% dos leitos públicos de UTI ocupados. Para o presidente, os embustes representam uma forma de fugir das responsabilidades. São uma das razões para a edição da Medida Provisória (MP) 966, batizada de “E daí?” — em referência ao seu comentário quando o País passou das 5 mil mortes, no dia 28 de abril. Essa MP isenta agentes públicos de responsabilização por seus atos durante a epidemia, o que pode beneficiar o próprio presidente em suas iniciativas irresponsáveis. O Supremo Tribunal Federal (STF) já iniciou o julgamento da constitucionalidade dessa medida, e pode barrar mais essa imoralidade. É apenas uma das ameaças que o mandatário enfrenta na Corte. A maior, a partir de agora, torna-se o crime contra a saúde pública. Seu desprezo continuado pela vida humana é o maior argumento para a caracterização de crime de responsabilidade, que pode levar ao impeachment.


O exemplo furado da Suécia


Para justificar sua conduta, o presidente insiste no sofisma de que a crise atual representa uma luta entre a economia e a saúde. É um argumento que não para em pé. Os países que foram mais ágeis e disciplinados na adoção de medidas de isolamento social não apenas contiveram o avanço da doença mas também atenuaram os danos econômicos. Terão uma retomada mais rápida e eficiente. É o que a China já prenuncia, com o encerramento do lockdown em Wuhan, onde o novo coronavírus se originou. As nações que implantaram testes em larga escala e usaram a tecnologia para acompanhar os contaminados contiveram a expansão, como aconteceu na Coreia do Sul. Em sua política de desinformação, Bolsonaro tenta usar a Suécia como exemplo bem-sucedido de país que não praticou o isolamento social. Ele não viu os dados, ou simplesmente exercita mais uma gazopa. A Suécia enfrenta recessão similar ao resto da Europa — deve ter retração de até 7,1%, enquanto a zona do euro deve cair 7,4%. Com aumento de 27% no número de óbitos, o país se saiu pior do que seus vizinhos nórdicos na resposta à doença, especialmente nos óbitos em clínicas e residências para idosos. Alcançou entre os dias 13 e 20 de maio a maior taxa de mortalidade per capita do mundo (6,08 mortes por milhão). Além disso, não é possível comparar a realidade social brasileira com a sueca, que tem um elevado percentual de pessoas morando sozinhas (56,6% da população, mais que o dobro do índice de Portugal). Seu sistema de saúde é exemplar e a população tem alto poder aquisitivo. Em contraste, Bolsonaro já declarou que o brasileiro pula em esgoto e “não acontece nada”. Como o presidente sabe, a saúde pública no Brasil ainda tem deficiências crônicas, e os hospitais federais no Rio de Janeiro, sob sua responsabilidade, estão em colapso. São prova disso.


Oportunismo político


O oportunismo político não é exclusividade do atual mandatário. Também pode ser medido por seus antecessores. Enquanto a curva de mortes pela doença acelera, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou a tragédia para defender suas propostas para o País, ainda que seu partido tenha arruinado a economia nacional. “Ainda bem que a natureza criou esse monstro chamado coronavírus, porque está permitindo que enxerguem que apenas o Estado é capaz de dar solução a determinadas crises”, disse. A repercussão negativa fez Lula pedir desculpas no dia seguinte, mas não desfez o mal-estar com o baixo nível atual do debate político.


RISCO 


A população ignora a quarentena em diversas regiões do País, o que aumenta a expansão da doença. Isolamento está em queda, obrigando prefeitos a decretarem o lockdown

PERIGO E CONSEQUÊNCIA 


O desrespeito à quarentena acontece em diferentes regiões e classes sociais. Doze capitais já têm ao menos 80% dos leitos públicos de UTI ocupados
O show de horrores bolsonarista não poderia ser previsto nem traduzido pelos grandes intérpretes nacionais, como Sérgio Buarque de Holanda, Raymundo Faoro, Gilberto Freyre e outros. Em ensaios sobre a formação do Brasil, esses intelectuais descreveram com uma prosa elegante a gênese imperfeita do País. Todo esse corpo de conhecimento forjou a identidade nacional e ajudou o Itamaraty a criar uma das políticas externas mais elogiadas do mundo. Mas foi deturpado pela ideologia dos anos petistas e, agora, é aviltado pela indigência intelectual bolsonarista. Em 35 anos de redemocratização, o País permanece prisioneiro da armadilha do baixo crescimento e da balbúrdia política, ainda que suas instituições democráticas tenham mostrado resiliência. Dois dos cinco presidentes eleitos desde a redemocratização sofreram impeachment, e o atual mandatário já acelera acordos espúrios no Parlamento, rifando o discurso ético, com o objetivo de evitar o seu próprio impedimento. Essa é a nova prioridade de uma gestão que não completou nem 18 meses. O Brasil de Bolsonaro, como na canção, virou uma piada no exterior. Não pratica quarentena de verdade, não promove testes em massa, não tem presidente governando e nem ministro cuidando da Saúde. A nação retornou a uma época de crise econômica e cinismo, como os anos 1980, quando Renato Russo e Cazuza traduziram a falta de perspectiva e a indignação com a falência moral generalizada. Que País é esse?


Enquanto isso, no mundo…


DISCIPLINA Quase todos os países tiveram ações para o isolamento social. Suécia não adotou lockdown, mas orientou a população. China já encerrou a quarentena e retomou as aulas

Por Marcos Strecker, na Revista Isto é







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