terça-feira, 16 de setembro de 2014

LEAN NA GESTÃO PÚBLICA: A EXPERIÊNCIA DOS PAÍSES BAIXOS


DEPARTAMENTO RESPONSÁVEL PELA INFRAESTRUTURA DA REGIÃO IMPLANTOU UM PROGRAMA DE GESTÃO ENXUTA PARA CONSTRUIR UM DEPARTAMENTO MAIS RÁPIDO E MENOR

Por José Roberto Ferro, na revista Época negócios

José Roberto Ferro, presidente e fundador do Lean Institute Brasil (Foto: Divulgação)
JOSÉ ROBERTO FERRO, PRESIDENTE E FUNDADOR DO LEAN INSTITUTE BRASIL (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Governos de todo o mundo têm sido cada vez mais pressionados a reduzir de tamanho e a contribuir mais para a sociedade.
Na semana passada, estive visitando o Departamento (“Rijkswaterstatt”) responsável pelo projeto construção, gestão e manutenção da infraestrutura dos Países Baixos, ligado ao Ministério da Infraestrutura e Meio Ambiente.
Trata-se de um país de 17 milhões de habitantes densamente distribuídos por 41.500 quilômetros quadrados, que ficam totalmente abaixo do nível do mar. Esse departamento cuida de uma complexa malha de 3.000 quilômetros de estradas, 2.000 quilômetros de hidrovias e 5.000 quilômetros de canais.
Há seis anos, ele tem procurado melhorar seu desempenho através de novas práticas e métodos de gestão enxuta (lean).
A necessidade veio das decisões do governo central de fazer uma redução de 10% do pessoal empregado, com base na não substituição de aposentados e pessoas demissionárias e também visando a redução de cerca de 17% do orçamento até o ano de 2020, ao mesmo tempo em que se demanda melhor qualidade e volume dos serviços e dos investimentos.
Esse departamento definiu que seus principais objetivos são “manter os pés secos” dos cidadãos, o que significa reduzir a quantidade de inundações em um país que luta há séculos para evitá-las, garantir água limpa para todos, melhorar o fluxo de transporte e segurança nas estradas, canais e hidrovias e garantir informações confiáveis e úteis aos cidadãos.
Os canais e estradas não podem parar de funcionar nunca em uma sociedade que não aceita problemas como bloqueios ou paradas em seus fluxos de movimentação de pessoas e materiais.
Para construir um departamento mais rápido, menor e oferecendo melhor qualidade nos produtos e serviços, estabeleceram um programa intitulado KR8, inspirado na gestão enxuta (“lean management”), sendo K destacando a importância da relação com clientes, R implicando no respeito pelos colaboradores, e 8 significando os tipos de desperdícios que serão gradualmente eliminados.
Alguns dos principais líderes do departamento foram visitar empresas que estavam implementando o sistema lean (“ver para crer”) e ficaram impressionados. Ao presenciarem essas experiências em empresas privadas, notaram o entusiasmo e o engajamento das pessoas, chamando a atenção para como elas resolviam problemas e melhoravam constantemente o desempenho.
Embora reconhecendo que há muitas diferenças entre o ambiente da iniciativa privada e do governo – no qual a influência politica é grande, e há instabilidade e possibilidades de mudanças substanciais após ciclos de quatro anos, definidas pelas eleições e mudança de governo –, resolveram seguir em frente por acreditar que os princípios e métodos seriam úteis.
Assim eles têm conseguido um esforço para estabelecer um processo de definição e desdobramento de metas, um sistema de gestão visual dos indicadores, um esforço para aumentar a transparência e entender e melhorar os processos, além de procurar aproveitar melhor a experiência e o conhecimento dos colaboradores, ajudando-os a melhorar a cada dia.
Nesse contexto, a gestão dos projetos tem passado por mudanças no sentido de atribuir responsabilidades mais claras aos gerentes, assim como ampliar o escopo de suas ações.
Tive a oportunidade ver várias iniciativas interessantes, como o esforço para reduzir tempo e custos e melhoria da qualidade do trabalho de cálculos, fundamental para estabelecer propostas de licitação bem elaboradas, base para muitos dos trabalhos do departamento.
Os projetos de construção e manutenção de pontes metálicas passaram a ter uma preocupação mais ampla, não apenas visando a redução do investimento, mas também objetivando melhorar a confiabilidade e durabilidade, reduzindo os custos de manutenção ao longo do ciclo de vida da utilização dessas construções.
A melhoria da gestão tem contribuído para projetar, construir e manter equipamentos de infraestrutura adequados ao uso, mais baratos e de melhor qualidade na construção e na manutenção.
Outros países estão tendo iniciativas igualmente interessantes com a gestão lean no governo. Há pouco tempo, tive a oportunidade de comentar a iniciativa da cidade de Melbourne, na Austrália. Vários estados e municípios dos EUA estão tendo iniciativas semelhantes.
Esperamos o momento em que, no Brasil, os governos e partidos reverterão as suas expectativas de usar as administrações para servir aos próprios interesses para passar a servir aos interesses de quem efetivamente paga as contas e espera bons serviços: nós, os contribuintes.
(José Roberto Ferro é presidente do Lean Institute Brasil