terça-feira, 22 de setembro de 2020

IGREJAS - Veto da boca para fora



Temendo um processo de impeachment, Bolsonaro impede anistia de contribuições e multas para templos religiosos, mas recomenda a derrubada do próprio veto e promete total imunidade tributária aos evangélicos

 

Altamente dependente da bancada evangélica para levar adiante seus planos de governo e aprovar projetos da sua agenda econômica, o presidente Jair Bolsonaro não quer se indispor com seus aliados de primeira hora. Por isso, ele tira benefícios fiscais para os religiosos com uma mão, mas promete dar com a outra. Foi o que ele fez com a proposta de lei que concede anistia em tributos a serem pagos pelas igrejas.

Bolsonaro vetou o perdão de uma dívida tributária, que equivale a R$ 1 bilhão, e, para não melindrar os evangélicos, prometeu alguma medida que livre seus aliados de impostos de uma vez por todas. O que Bolsonaro instituiu foi uma espécie de “veto brando”, em que demonstra seguir as orientações do Ministério da Economia para garantir um verniz de responsabilidade fiscal para seu governo e acena com benefícios e isenções futuras para agradar seus pares. No domingo 13, a Secretaria-Geral da Presidência informou que o presidente é favorável à não tributação de templos e que o governo irá propor “instrumentos normativos a fim de atender a justa demanda das entidades religiosas”.

Jogo de cenaO veto ao perdão tributário das igrejas foi recomendado pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, e foi puro jogo de cena. Bolsonaro seguiu a recomendação porque se tivesse concedido o perdão poderia ser questionado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e, inclusive, ser alvo de um pedido de impeachment por incorrer em crime de responsabilidade. Para compensar, sugeriu a derrubada do veto no Congresso e também se mostrou disposto, caso a decisão não seja revertida, a enviar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para garantir a isenção das igrejas. Nas mídias sociais, o presidente confessou que “caso fosse deputado ou senador, por ocasião da análise do veto que deve ocorrer até outubro, votaria pela derrubada do mesmo”. “No mais, via PEC a ser apresentada nessa semana, manifestaremos uma possível solução para estabelecer o alcance adequado para a imunidade das igrejas nas questões tributárias”, afirmou. O veto foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) na segunda-feira 14. Dois dias depois, o presidente se reuniu com membros da bancada evangélica para dizer seus pleitos, de um jeito ou de outro, serão atendidos.

Bolsonaro sancionou, porém, outro dispositivo que estabelece que valores pagos a religiosos não podem ser considerados remuneração para fins de contribuição previdenciária e invalida autuações da Receita Federal. Na prática, o projeto concede anistia retroativa à cobrança de impostos previdenciários nas remunerações pagas a membros religiosos, como os pastores. A proposta tenta fazer valer o entendimento que os valores pagos não são remunerações. Mas para o Fisco, trata-se apenas de uma manobra tributária. Algumas igrejas pagam salários para seus funcionários seguindo o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Outras, que trabalharam pela mudança das regras, consideram a remuneração como doações, na tentativa de se livrar de qualquer contribuição.

Proteção tributáriaA proposta de anistia dos tributos das igrejas foi criada pelo deputado federal David Soares (DEM-SP). Ela altera a lei que instituiu a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), em 1988, e tira os templos religiosos da lista de pessoas jurídicas que devem pagar o tributo, além de anular autuações que envolvam a cobrança da contribuição. David Soares é filho do pastor R.R. Soares, fundador da Igreja Internacional da Graça de Deus, uma das principais devedoras do governo. A justificativa para a proposta é que a Constituição dá proteção tributária às igrejas, um argumento que é contestado, já que a isenção é limitada a impostos e não atingem contribuições sociais. Além disso, há ressalvas feitas pelos auditores da Receita Federal sobre as vantagens indevidas que a proposta representa. O Sindifisco, entidade sindical que reúne os auditores, considera a proposta “um atropelo na lei para beneficiar alguns contribuintes”.

A Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional é formada por 195 dos 513 deputados federais e por 8 dos 81 senadores. O presidente da bancada religiosa da Câmara, Silas Câmara (Republicanos-AM), diz ter maioria para reverter o veto presidencial e manter o perdão às igrejas do pagamento de dívidas com a Receita Social e a isenção do pagamento da CSLL. Na terça-feira 15, houve uma reunião da bancada em que se definiu a estratégia que será adotada de agora em diante. Deputados presentes ao encontro disseram que a maioria é favorável à derrubada do veto e à abertura de um diálogo sem atritos com o governo para a construção de uma proposta à emenda da Constituição que pacifique as questões relativas à imunidade tributária das igrejas. Para derrubar um veto presidencial é necessário o apoio da maioria absoluta dos parlamentares das duas casas: 257 votos na Câmara e 41 votos no Senado. E pelo jeito, não será difícil para a bancada evangélica atingir seus objetivos.

Por Vicente Vilardaga, na Revista Isto é    


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