quinta-feira, 18 de maio de 2017

JBS e capitalismo de Estado


Nas eleições gerais de 2014, o grupo JBS (Friboi) doou R$ 366,8 milhões para os candidatos de diferentes partidos. A informação consta de declaração ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Para efeito comparativo, os delatores da Odebrecht na Lava Jato afirmam que, em 2014, a doação política teria sido de R$ 300 milhões. No legislativo a chamada "bancada do bife" teria eleito 162 deputados federais. Candidatos aos governos estaduais, ao Senado e às presidenciais receberam milionários recursos para suas campanhas. Paralelamente a essa fartura de dinheiro para políticos, o JBS ocupa, entre as empresas ativa no mercado, o primeiro lugar como devedora da previdência social. A sua dívida junto ao INSS é de R$ 1,8 bilhão (a maior dívida histórica no sistema previdenciário é da Varig que deixou um passivo de R$ 3,7 bilhões, mas com a falência tornou-se impossível a cobrança do débito).
O grupo JBS, o maior devedor do sistema previdenciário, justifica que já propôs pagá-la com créditos que acumula junto à Receita Federal. Oficialmente disse: "A JBS não pode ser penalizada pela demora da Receita Federal em ressarcir seus créditos. O Fisco não reconhece a correção dos créditos da companhia, de outro, tenta exigir os débitos tardiamente, corrigidos e com multa". O conflito envolvendo a empresa, a previdência e a receita federal chega a ser surrealista, pela objetiva razão do nível de relacionamento privilegiado que, a partir de 2007, aquele grupo empresarial vem tendo do governo brasileiro, particular mente junto ao BNDES que alavancou recursos na escala de bilhões de reais para transformá-la na maior empresa mundial de proteína animal.
Na sua composição acionária o BNDES, através a BNDESpar detém 20,4% das suas ações e a Caixa Econômica Federal de 6,9%. O restante da sua composição acionária é assim distribuído: 42,4% pertencem ao acionista controlador; 25,5% aos acionistas minoritários; e, 4,8% de ações na Tesouraria. A fonte é o próprio grupo empresarial. Não obstante os dois agentes públicos serem subscritores de 27,3% do seu capital, em 2016, o governo foi obrigado a impedir a transferência da sede da empresa para a Irlanda. A organização, através a subsidiária JBS Foods Internacional, pretendia fixar o seu domicílio fiscal no Reino Unido, ficando a parte que opera no Brasil como subsidiária.
O BNDES ao vetar a operação considerou que a proposta significaria "desnacionalização da empresa ao transferir para o exterior ativos que representam 85% de sua geração de caixa operacional." A justificativa da transferência para o Reino Unido representaria cinicamente aumento do seu valor de mercado e acesso a empréstimos internacionais mais baratos. Alegavam que a empresa é tratada como integrante de mercado emergente por banqueiros e investidores internacionais. A operação foi desmontada e cancelada. Se concretizada, os seus acionistas brasileiros ficariam submetidos à legislação estrangeira.
Integrante da estratégia (governos Lula e Dilma) de estruturar "campeãs nacionais" do desenvolvimento, o JBS tem sua origem em pequeno frigorífico de Goiás, na década de 50. A partir de 2007, alavancado com recursos do BNDES, além de expandir-se no mercado interno, começou agressivo plano de inserir-se no mercado internacional. No mesmo ano, comprou "Swift Foods" e em 2009, a "Pilgrinís", as duas norte-americanas. No mesmo pacote foi comprada a "Smithfield Beef", consolidando posição no mercado de carne bovina e de aves nos EUA. Detém liderança no setor, inclusive no mercado de carnes na Austrália e em outros países. Para esse gigantismo empresarial teve a âncora segura do BNDES, e do ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, na condição de consultor econômico.
Agora, dez anos depois, o TCU (Tribunal de Contas da União), em julgamento que teve unanimidade, constatou que na compra do grupo "Swift Foods", o BNDES fez aporte de 750 milhões de dólares para viabilizar a compra. No seu relatório técnico atesta a existência de irregularidade na aprovação daqueles recursos públicos que representariam R$ 2,4 bilhões em valores atuais. Levando o Ministério Público e a Polícia Federal a deflagrar a "Operação Bullish" (valorização do mercado financeiro) envolvendo o banco de fomento e o grupo JBS que teria recebido R$ 8,1 bilhões para a sua expansão mundial, entre os anos de 2007 e 2011. E um retrato sem retoque do capitalismo estatal brasileiro, muito bem definido pelo economista Rogério Werneck, professor da PUC/Rio: "O segredo da prosperidade é estabelecer sólidas relações com o Estado, ser financiado pelo Estado, apropriar-se do patrimônio do Estado, receber doações do Estado, transferir passivos para o Estado, repassar riscos para o Estado e conseguir favores do Estado."

Por Hélio Duque, em Bem Paraná/PR




 Conforme o momento histórico, Shakespeare foi construindo nuvens com peças dotadas de diferentes características, propriedades específicas para cada fase de sua produção literária. “Medida por Medida” e “Bem está o que bem acaba” integram o que se convencionou denominar “comédias sombrias”, peças onde tensão e situações cômicas as categorizam em desacordo com outras comédias do dramaturgo como “A comédia dos erros”, “As alegres comadres de Windsor” e “Sonho de uma noite de verão”. E a explicação é singela: foram elaboradas no mesmo período em que o autor escreveu Hamlet e Otelo, grandes obras da literatura universal que elevam a tragédia ao ápice do gênero teatral. 

Na peça “Medida por Medida”, com inusitada habilidade, Shakespeare discute administração pública, direito e corrupção de maneira magistral. 

O universo da administração pública adotado na peça é largo e profundo. Entrelaçados às cenas emergem assuntos como

- o autoritarismo oriundo do poder divino do rei, as prerrogativas do monarca e a antecipação do liberalismo;
- a descentralização administrativa;
- o abuso do poder na administração pública;
- os limites da delegação de competência;
- accountability, fiscalização e controle;

Quanto ao direito, lança um forte debate sobre quesitos por demais importantes para a humanidade: 

- a aplicabilidade das leis mesmo quando se apresentam fora de uso por um longo tempo, gerando disfunções de toda ordem;
- a execução da pena quando esta resulta de uma lei extremamente dura;
- a discricionariedade do juiz na aplicação da lei, a subjetividade do magistrado e a fragilidade dos paradigmas que orientam o sistema de decisões no judiciário;
- a distribuição da justiça.

Especial enfoque o Bardo dá ao tema da corrupção, mostrando:

- a moral e a ética corroídas pelos interesses pessoais e pelo tráfico de influência;
- a força do poder para alterar o caráter dos administradores.

Neste aspecto Shakespeare nos faz refletir sobre a utilização do Estado enquanto instrumento de satisfação dos interesses pessoais.

E todo este universo é entrecortado por discussões sobre o amor e o ódio, a moral e o imoral, o sexo e a abstinência, a clausura e a liberdade, a prisão e a salvação, a vida e a morte.

O presente livro, além de disponibilizar a versão original de “Medida por medida” de Shakespeare, apresenta um conjunto de ensaios contextualizando a peça teatral às questões que incendeiam os panoramas contemporâneos brasileiro e latino-americano como corrupção, estado e administração pública; controle e accountability; direito e administração da justiça. 

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