quarta-feira, 17 de junho de 2020

CRISE - Deu pane no sistema


População acaba prejudicada; milhões de brasileiros estão na fila para receber auxílios

É inegável que o auxílio emergencial seja um dos programas mais importantes criados pelo governo Jair Bolsonaro. Tanto que a equipe econômica já bateu o martelo sobre a ampliação das parcelas do benefício, que de três devem virar cinco. Enquanto Paulo Guedes, o ministro da Economia, faz contas para ver até onde é possível abrir o cofre, problemas envolvendo o processamento de dados facilitam golpes, fraudes, sem contar que o benefício não contempla quem realmente precisa dos recursos. O Tribunal de Contas da União (TCU) avalia que 10% dos beneficiários da primeira parcela (ou cerca de 5,8 milhões de requisitantes) receberam o auxílio indevidamente. Trata-se de um contingente substancial que, se já é reprovável em condições normais, se torna inadmissível em meio ao caos da pandemia provocada pelo coronavírus, quando o governo raspa os cofres para mitigar os danos causados pela crise sanitária.

Pela estimativa do TCU, caso as fraudes e irregularidades não sejam contidas ou não aumentem no decorrer do pagamento das próximas três parcelas, os recursos desperdiçados podem chegar a quase 11 bilhões de reais. O volume de dinheiro desviado para os bolsos de golpistas seria suficiente para construir pelo menos 1?000 hospitais de campanha com 200 leitos cada um, para o combate ao coronavírus. As falhas que levaram à concessão fraudulenta do auxílio em nome de personalidades como o empresário e apoiador de Bolsonaro Luciano Hang, dono da Havan, e até mesmo o jogador Neymar mostram a precariedade dos bancos de dados do governo e dos cruzamentos de informações feitos pela Dataprev, empresa estatal responsável pela triagem dos requerentes. Em paralelo à farra dos espertalhões, 10,5 milhões de pessoas ainda aguardam o pagamento da primeira parcela de 600 reais, sob o argumento que estão com seu cadastro ainda em análise.

A Dataprev já estava sobrecarregada com o processo de digitalização mal planejada do INSS, que passou a ter o portal da instituição na internet como principal forma de acesso à solicitação dos benefícios previdenciários. Só a fila de quem espera a concessão da aposentadoria chega a 1,8 milhão de brasileiros, de acordo com o balanço mais recente, compilado em março. O INSS, responsável pelos dados, ainda não divulgou quantas pessoas aguardavam na fila em abril — incorrendo em um padrão que está se tornando comum na gestão Bolsonaro, de pouco caso com as estatísticas atualizadas. E a terceira frente da tempestade perfeita se formou com os mais de 2,5 milhões de pessoas que aguardam pelo pagamento do Benefício de Manutenção de Emprego e Renda, o BEm. A empresa, que está incluída no plano de desestatização do governo, passa por um drástico enxugamento. Neste ano, vinte escritórios regionais foram fechados e cerca de 7% do seu quadro foi desligado em programa de demissão voluntária, além de ter sido feita uma troca de comando com a nomeação de Gustavo Canuto, ex-ministro do Desenvolvimento Regional, para a presidência.

O esforço de criar o benefício e pagá-­lo a quase um terço da população brasileira em tempo recorde é louvável, mas houve severos percalços de operação pela falta de estrutura que assola os processamentos de benefícios faz anos. Para realizar a análise e o cruzamento das informações de quem pode ou não pode receber dinheiro do governo, a Dataprev usa bases de dados de outros órgãos e aí esbarra em outro problema: as bases estão desatualizadas ou não são compatíveis entre si. No caso do BEm, voltado para o trabalhador formal, o Ministério da Economia afirma que há benefícios indeferidos por causa de erro nas informações compartilhadas pelas empresas que constam na base do governo. No auxílio emergencial, há o cruzamento de dezessete sistemas, entre eles o Cnis, que reúne informações sobre empregos e benefícios recebidos, dados de servidores públicos e até da Justiça Eleitoral. A Rais, que consolida informações sobre emprego e é utilizada nessas análises, só tem dados até 2018, o que exige parâmetros e consultas adicionais. O procurador da República Álvaro Ricardo de Souza Cruz, que costurou um acordo entre o Ministério Público Federal e o governo para melhorar o processamento do auxílio e dar prazo máximo de vinte dias para resposta aos pedidos, reconhece que é notório o esforço para fazer o programa funcionar, mas as limitações de estrutura levam às falhas. “É nítido o esforço dos servidores da Dataprev para que os programas avancem. Teve quem chegou a chorar quando discutimos os erros. Mas se tornam quase inevitáveis, porque se valem dos problemas estruturais”, avalia Souza Cruz.

Falhas como as que minam a estrutura da Dataprev, além de drenar o dinheiro do contribuinte, põem em xeque a eficácia das políticas públicas. Pesquisa do Instituto Locomotiva revela que 69% das pessoas de classes A e B que fizeram pedido de auxílio emergencial receberam o benefício, sendo que o principal requisito é ter renda individual de até meio salário mínimo (522,50 reais) ou familiar de até três salários mínimos (3?135 reais). Para burlar as regras, tais requerentes omitem os ganhos ao preencher o cadastro, e a Dataprev não consegue detectar a falta de dados sobre vencimentos, mesmo com a Receita Federal à disposição. A Controladoria-Geral da União justifica que está realizando cruzamento de dados do auxílio emergencial, mas não informa o número total de irregularidades encontradas. Já foram identificados, por exemplo, 21?856 CPFs de beneficiários donos de embarcações de luxo e 74?682 sócios de empresas que possuem empregados ativos. Solicitar o coronavoucher com a declaração de informações falsas pode tipificar crimes de falsidade ideológica e estelionato. Mas nada é mais reprovável do que tirar o dinheiro das pessoas mais vulneráveis em meio a uma das piores crises do país.
Por Larissa Quintino, na Revista Veja




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