![]() |
Tanques para água residual de Fukushima deverão estar cheios em 2022 |
Nove anos após acidente que contaminou costa de Fukushima,
restos de testes de bombas atômicas, lixo radioativo em barris avariados e até
mesmo submarinos nucleares afundados continuam a poluir os mares.
Quase 1,2 milhão de litros de água residual radioativa da
usina nuclear de Fukushima deverão ser descartados no mar: foi o que um comitê
consultivo do governo japonês sugeriu nove anos após o desastre nuclear na
costa leste do Japão, em 11 de março de 2011. Desde então, essa água tem sido
usada para resfriar os blocos destruídos do reator, a fim de evitar mais
derretimentos.
A água é mantida em grandes tanques, mas que deverão estar
cheios em 2022. O tema é polêmico, porque o desastre nuclear em 2015 levou a
uma contaminação extrema na costa de Fukushima. A água radioativa fluiu
"diretamente para o mar, em quantidades que nunca vimos no mundo
marinho", diz Sabine Charmasson, do Instituto de Proteção Radiológica e
Segurança Nuclear (IRSN) da França.
Os níveis de radiação do mar perto de Fukushima superaram em
1 milhão de vezes o limite de 100 becqueréis. Até hoje, substâncias radioativas
podem ser detectadas na costa japonesa e em outras partes do Pacífico. Até
mesmo na costa oeste dos Estados Unidos elas podem ser medidas, mas em
proporções muito pequenas e significativamente "abaixo da quantidade
nociva determinada pela Organização Mundial da Saúde", afirma Vincent
Rossi, oceanógrafo do Instituto de Ciências Marinhas do Mediterrâneo (MIO) da
França.
Mas isso não deixa de ser perigoso, explica Horst Hamm, da
organização não governamental Nuclear Free Future Foundation. "Um único
becquerel que pode adentrar nosso corpo é suficiente para danificar uma célula,
que eventualmente se tornará uma célula cancerígena."
Um estudo do Parlamento Europeu chegou a uma conclusão
semelhante: "Mesmo a menor dose possível, um fóton que atravessa um núcleo
celular, apresenta risco cancerígeno. Embora esse risco seja extremamente
baixo, ainda é um risco."
E esse risco aumenta, porque a poluição radioativa dos
oceanos em todo planeta não vem somente crescendo desde Fukushima.
Radiação provocada pelo
homem
Em 1946, os Estados Unidos foram os primeiros a testar uma
bomba atômica numa região marinha, o Atol de Biquíni, no Pacífico. Nas décadas posteriores,
seguiu-se um total de mais de 250 testes nucleares em alto-mar. A maioria (193)
foi realizada pela França na Polinésia Francesa, como também pelos EUA (42),
muitos nas Ilhas Marshall no Pacífico Central.
Até o início dos anos 1990, no entanto, o mar não foi usado
somente como área de treinamento para uma guerra nuclear, mas também como um
gigantesco depósito de lixo radioativo de usinas nucleares.
De 1946 a 1993, mais de 200 mil toneladas de resíduos em
parte altamente radioativos foram lançados nos oceanos, a maioria em barris
metálicos, segundo relata a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).
Também foram afundados vários submarinos nucleares, incluindo munição nuclear.
A maior parte do lixo nuclear despejado nos oceanos veio do
Reino Unido e da antiga União Soviética. Até 1991, os Estados Unidos afundaram
mais de 90 mil barris e pelo menos 190 mil metros cúbicos de líquido radioativo
no Atlântico Norte e no Pacífico. Bélgica, Suíça, Holanda e França também
descartaram toneladas de resíduos radioativos no Atlântico Norte nas décadas de
1960, 70 e 80.
"No espírito 'longe dos olhos, longe do coração', o
descarte de lixo nuclear foi a maneira mais fácil de livrar-se dele no
início", aponta Horst Hamm. Até hoje, cerca de 90% dessa radiação provém
de barris no Atlântico Norte, estando a maioria armazenada ao norte da Rússia
ou na costa da Europa Ocidental.
"Os barris estão por toda parte", diz Jannik
Rousselet, do Greenpeace da França. Ele estava presente quando, no ano 2000, a
organização ambiental mergulhou com submarinos em busca de tonéis de lixo
despejados a poucas centenas de metros da costa norte da França, e os encontrou
a uma profundidade de 60 metros. "Ficamos surpresos com a proximidade da
costa. Eles estão enferrujados e vazando, a radiação aumentou claramente."
Participação alemã
Segundo o relatório da Agência Internacional de Energia
Atômica, a Alemanha também despejou 480 barris na costa portuguesa em 1967. Em
2012, Berlim respondeu a uma consulta dos verdes sobre a condição desses
barris.
"Os barris não foram projetados para garantir a
contenção permanente dos radionuclídeos no fundo do mar. Nesse sentido, deve-se
supor que pelo menos alguns deles não estejam mais intactos", respondeu o
governo alemão em relatório.
Nem a Alemanha nem a França querem resgatar os barris. Até o
ativista do Greenpeace Jannik Rousselet diz não ver até agora "nenhum
método seguro de içar os barris enferrujados para a superfície". Assim, os
resíduos nucleares continuarão contaminando o fundo do mar nas próximas
décadas.
Para Horst Hamm, as consequências de longo prazo são claras.
A radiação é "absorvida pelos animais marinhos ao redor. Eles acabarão nas
redes de pesca e finalmente nos nossos pratos", afirma.
No relatório, no entanto, o governo alemão classifica o
risco de peixes contaminados para os seres humanos como
"insignificante". Rousselet discorda: "Toda a área da costa está
contaminada com radioatividade. Pode-se medi-la não apenas no mar, mas na grama,
na areia, em todo lugar."
O descarte de resíduos nucleares em barris foi proibido em
1993 pela Convenção de Londres sobre a Prevenção da Poluição Marinha por
Alijamento de Resíduos e Outras Matérias. No entanto, a descarga de líquidos
radioativos no oceano ainda é permitida internacionalmente.
Em Fukushima, a operadora da usina nuclear, Tokyo Electric
Power Company (Tepco), garante que, antes do planejado descarte do líquido de
resfriamento no mar, todos os 62 elementos radioativos serão filtrados da água
a um nível seguro – exceto o isótopo trítio.
Em Tóquio, o grêmio consultivo diz considerar a descarga da
água de resfriamento no mar como "mais segura" em comparação com
outros métodos, como a evaporação da água. Quão prejudicial o trítio seja para
os seres humanos é motivo de controvérsia. Segundo a Tepco, a quantidade de
trítio nos tanques coletores é muito maior do que na água de resfriamento
convencional de usinas nucleares.
"Os pescadores e residentes locais não podem aceitar o
descarte da água", disse em comunicado Takami Morita, do Instituto
Nacional de Pesquisa em Ciências da Pesca. Embora a poluição da pesca esteja
hoje abaixo do limite, a demanda por peixes da região caiu para um quinto em
relação à anterior ao desastre.
Na Deutsche Welle![]() |
Para saber mais, clique aqui. |
![]() |
Para saber mais sobre o livro, clique aqui. Teatro completo |
