sábado, 12 de junho de 2021

A crise da saúde: terreno fértil para a desinformação



A desinformação e as teorias da conspiração têm proliferado nas mídias sociais durante a pandemia. Chá preto, folhas de nim e sopa de pimenta foram apontados como curas milagrosas para a COVID-19, na África e em outros lugares. Para combater essa infodemia, as plataformas digitais devem ser mais responsabilizadas, as notícias falsas devem ser rastreadas e denunciadas, e a alfabetização midiática deve ser desenvolvida.

 

Jornalista e pesquisadora de saúde do site de língua francesa Africa Check, sediado em Dacar, no Senegal. A organização sem fins lucrativos é a primeira organização independente de verificação de fatos da África.

A COVID-19, uma doença desconhecida até 2020, causou uma crise de saúde mundial sem precedentes. Muitas questões sobre esse novo vírus ainda permanecem sem resposta por parte dos cientistas – incluindo a natureza da imunidade daqueles que foram infectados, a sazonalidade do vírus e sua capacidade de mutação. Nossa falta de conhecimento sobre essa doença e sua evolução provocou uma sede por informação, na África e em outros lugares. Também levou à proliferação de rumores, notícias falsas e desinformação – com as redes sociais servindo como caixas de ressonância disso tudo.

O escritório de língua francesa da Africa Check(link is external) tem trabalhado para combater a desinformação desde o início do surto. Utilizando especialistas e pesquisadores para verificar fatos e histórias, o site, sediado em Dacar, publicou cerca de 50 artigos relacionados à COVID-19

Na ausência de tratamentos eficazes para a doença, artigos e mensagens sobre supostas curas milagrosas proliferaram. Após pesquisas e alegações de um médico francês especialista em doenças infecciosas, Didier Raoult, sobre o uso da hidroxicloroquina como cura para a COVID-19, a informação de que as folhas da árvore de nim continham cloroquina se espalhou pelo WhatsApp e pelo Twitter em vários países da África Ocidental. Isso provocou uma corrida alucinada por essas folhas. No entanto, o derivado do quinino não provém de uma planta, mas é obtido por meio de síntese química. Da mesma forma, o chá preto, a sopa de pimenta, a vitamina C e o alho também foram apontados nas redes sociais como alimentos que ajudam a prevenir ou curar a doença. A Organização Mundial da Saúde (OMS(link is external)) refutou essas alegações. 

Teorias da conspiração

Ao mesmo tempo, a epidemia levou à disseminação de imagens e vídeos que foram manipulados ou retirados de contexto. Alguns deles alegavam, por exemplo, que as campanhas de vacinação poderiam ser forçadas, e que, na verdade, elas foram concebidas para espalhar o vírus. Outros buscam espalhar a discriminação, enfocando, particularmente, cidadãos chineses. Um vídeo mostrando o incêndio de um prédio comercial em Ibadan, capital do estado de Oyo, na Nigéria, foi erroneamente retratado como uma represália contra seu proprietário chinês. Contudo, um tweet do governo do estado de Oyo esclareceu que o prédio era, na verdade, de propriedade de um nigeriano, e que 80% dos empregados no local eram nigerianos.

Em uma tentativa espúria de explicar o surgimento da pandemia e sua disseminação, histórias de uma conspiração ocidental contra a África foram divulgadas por usuários de internet em todo o continente. Isso foi feito, em especial, por meio da apropriação das palavras do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, que, em uma entrevista(link is external) à Radio France Internationale (RFI), realizada em 27 de março de 2020, alertou que a COVID-19 poderia matar milhões na África sem uma ação imediata. A teoria sobre uma vacina financiada pela Fundação Bill & Melinda Gates para controlar as populações africanas também se espalhou como fogo. Essa informação não é apenas flagrantemente falsa – é concebida de forma deliberada para induzir ao erro .

A circulação de rumores e suas consequências não é específica da crise do coronavírus. Em 2014, notícias falsas provocaram resistência à estratégia de resposta para o combate ao vírus ebola em alguns dos países afetados.

Em um artigo(link is external), “The ‘exceptionality’ of Ebola and popular ‘reticences’ in Guinea-Conakry” (A “excepcionalidade” do ebola e as “hesitações” populares na Guiné), publicado em 2015 no jornal Anthropologie & Santé, Sylvain Landry Faye explica que os primeiros casos de mortes devido ao vírus em uma mesma família foram interpretados como um sinal de punição mística, ou uma maldição provocada pelo cometimento de um roubo ou adultério. Esses rumores alimentaram a crença de que a doença não era real – o que fez com que comunidades desenvolvessem atitudes de rejeição à estratégia de resposta adotada pelo Estado e seus parceiros para conter a epidemia. Outros rumores retratavam os Centros de Tratamento do Ebola (Ebola Treatment Centres – ETCs) como locais de contaminação – locais de morte, onde corpos e órgãos eram traficados..

Preencher um vazio

No caso do coronavírus, as redes sociais e aplicativos como o Facebook, o Messenger e o WhatsApp deram às notícias falsas um impacto sem precedentes. Além de fornecer acesso mundial às informações, essas plataformas também permitem que todos os seus usuários adicionem ou produzam material e o façam circular em tempo recorde. Publicado em 20 de abril (2020), o vídeo sobre o incêndio em Ibadan foi compartilhado mais de 380 mil vezes em três dias.

Outros fatores também incentivam a circulação de rumores e notícias falsas. No Senegal, por exemplo, o destaque dado pela mídia tradicional ao número de pessoas infectadas pela COVID-19 e as mensagens sobre a melhor forma de impedir a propagação do vírus não satisfizeram completamente as necessidades dos cidadãos – que procuravam notícias mais positivas sobre possíveis tratamentos. Então, as redes sociais foram utilizadas para preencher esse vazio. 

As notícias falsas, que geralmente circulam em grupos ou círculos de indivíduos que pensam de forma semelhante, são facilmente consumidas e consideradas como informação “de fonte confiável”. Mensagens de voz e de texto são frequentemente atribuídas a personalidades, autoridades ou prestadores de serviços hospitalares – que usam sua falsa autoridade para oferecer soluções simples, como beber regularmente água quente ou salgada para desinfetar a garganta. Os chamados líderes religiosos também podem desempenhar esse papel.

Nem sempre é fácil para o cidadão comum distinguir entre as informações da mídia tradicional – que segue o rigor da coleta, do processamento e da verificação das notícias – e as informações disponíveis nas redes sociais, mesmo quando estas são claramente imprecisas ou enganosas. O desejo de acreditar – especialmente em tempos de crise – pode ser maior do que o desejo de estar informado.

Desenvolver o pensamento crítico

A avalanche de notícias falsas nas redes sociais, que a OMS classificou como uma infodemia, levou as plataformas digitais a lançar uma ofensiva para conter a disseminação viral de informações falsas. Isso é realizado por meio da promoção de conteúdo de fontes oficiais, ou da proibição de anúncios que divulgam curas milagrosas. Jornalistas especializados em verificação de fatos, como os da Africa Check e de outros sites de verificação de fatos em todo o mundo, trabalham duro para corrigir fatos e garantir fontes confiáveis de informação..

No entanto, vê-se claramente que esses esforços para conter a avalanche de desinformação não são suficientes. Em maio, a ONU lançou a Verified(link is external), uma campanha mundial que criará um quadro de “socorristas digitais” para compartilhar informações atraentes, claras e precisas sobre a crise, bem como para aumentar a conscientização sobre os riscos da desinformação.

Em 2019, o Facebook lançou uma nova ferramenta de sinalização, que permite que os usuários do Instagram indiquem postagens que acreditam conter notícias falsas. Também pode ser uma boa ideia envolver influentes blogueiros das redes sociais para aumentar a conscientização e treinar seus administradores e moderadores para combater as notícias falsas.

As iniciativas de sucesso podem ser replicadas. Um exemplo é a Wa FM(link is external), uma estação de rádio da internet criada em março de 2020 para combater notícias falsas sobre a COVID-19 na Costa do Marfim. Transmitida principalmente pelo WhatsApp, ela depende de uma rede de aproximadamente 200 jornalistas voluntários, que andam pelas ruas de Yopougon – um bairro da classe trabalhadora em Abidjan – cruzando informações a fim de corrigir notícias falsas nas redes sociais, educar e conscientizar as pessoas.

Para combater as notícias falsas, é necessário utilizar os mesmos canais que as divulgam e alimentam. Na África e em outros lugares, também é preciso estimular o pensamento crítico dos cidadãos sobre as informações que recebem. Isso pode ser feito incentivando-os a questionar as fontes de informação e a identidade de seus autores. Sem esse tipo de educação midiática, as teorias da conspiração e as notícias falsas continuarão a se espalhar sem controle.

Por Diomma Dramé (https://pt.unesco.org/)


- - - - - - -  


Para saber mais sobre o livro, clique aqui



Para saber mais clique aqui





Para saber mais sobre o livro, clique aqui





Para saber mais sobre os livros, clique aqui




Para saber mais sobre a Coleção, clique aqui




Para saber mais sobre o livro, clique aqui


- - - - - -




No mecanismo de busca do site amazon.com.br, digite "Coleção As mais belas lendas dos índios da Amazônia” e acesse os 24 livros da coleção. Ou clique aqui

O autor:

No mecanismo de busca do site amazon.com.br, digite "Antônio Carlos dos Santos" e acesse dezenas de obras do autor. Ou clique aqui


Clique aqui para acessar os livros em inglês