sexta-feira, 21 de março de 2014

Burocracia & gestão – excesso de servidores?



“Perguntas a razão da burocracia?, a razão das arapucas?, a razão das armadilhas?, pois eu te respondo, moleque-cidadão, pirralho insosso, assunte, compreenda e anote: trata-se, servo demente e ignóbil, de criar dificuldades para que então, se possa vender as facilidades”                        

Da peça teatral “Confiscaram meu estado” de Rodoux Faugh

Com as eleições, certamente, os caçadores de marajás tornarão a ganhar evidência, a capitanear a cena política.

Os jargões, as palavras de ordem, os factoides, as reiteradas declarações que, de tão repetidas, se incorporam como mácula indelével ao imaginário popular: a propaganda política-partidária.

Para os problemas complexos, emergirão um tsunami de soluções simplórias e , por consequência, ineficazes, efêmeros balões de ensaio para iludir, embair, enganar.

Mas, diante de tanto artificialismo, falácia e demagogia nos programas partidários e nos ‘compromissos’ dos candidatos, por que, então, esta tosca estratégia encontra terreno fértil e viceja impávida em nossas plagas?

O questionamento já traz explícita uma resposta: o Brasil tem sido campo fértil para o proselitismo rasteiro, a política venal, o fisiologismo e o clientelismo institucionais. Mantida à margem de políticas públicas sustentáveis, privado do acesso à educação de qualidade, a população amarga a posição de armento que se tange para onde se quer tocar.

É bastante raro se deparar com um cidadão comum que não tenha passado por algum tipo de constrangimento ao tentar acessar um serviço público qualquer.

A burocracia tem sido, por demais, atroz para com todos nós.

Dentre as diversas definições do termo burocracia, o “Aurélio” chega a registrar “...complicação ou morosidade no desempenho do serviço administrativo...” .

Desde os primórdios, o estado brasileiro tem passado por um vigoroso processo de sucateamento.

O quadro de recursos humanos é bastante rígido, defasado, carente de capacitação e de um ideário voltado para a qualidade. Patrimônio sempre sucateado e em decomposição, fluxos e rotinas inamovíveis, calcificados e ultrapassados. Não bastasse, é permanente a hipertrofia dos controles, em contraposição à atrofia dos setores de planejamento, execução e avaliação. Os sistemas de inspeção e controle se debruçam, quase que somente, sobre o processo enquanto procedimento burocrático, ignoram o produto ou resultado final da ação governamental. Ou seja, a verificação incide sobre a formalização e instrução do processo. Se os objetivos propostos resultaram efetivamente no atendimento das demandas sociais, é uma questão de somenos para a burocracia.

É mais que evidente: este cenário não é resultado de um suceder de coincidências. A realidade é que parte das elites políticas provoca e se beneficia da desorganização do Estado.

excesso de servidores x concentração

No que se refere aos recursos humanos, essas elites sempre utilizaram o estado como instrumento de manutenção e ampliação de poder. Resulta daí o clientelismo e o nepotismo, o popular “cabide de empregos” beneficiando amigos, parentes, correligionários e potenciais eleitores. Este cenário forja uma categoria de servidores amorfa, facilmente transformada em massa de manobra, tangida com vara curta, embrutecida na pior das ignorâncias.

Mas, como não há mal que dure para sempre, esses servidores,  paulatinamente, se organizam, fortalecem suas representações, desatam laços históricos de passividade e submissão, passando da posição de agentes a cooptar à senhores da recuperação e renovação do estado nacional. De adorno e massa de manobra, tornam-se protagonistas das transformações.

Daí. todo este contexto moldado para transformá-los em bode expiatório das mazelas do Estado.

Investem forte na falácia do excesso de servidores, do inchaço da máquina estatal, o que definitivamente não procede.

Estudos recentes demonstram que o número de servidores públicos nas três esferas de poder - municipal, estadual e federal, está bem aquém do verificado nos países desenvolvidos, aquém do verificado nos vizinhos latino-americanos, compatível, portanto, com as demandas de um país em vias de desenvolvimento.

Portanto, não existe excesso e sim concentração de servidores em determinadas áreas administrativas, núcleos e pólos urbanos.

Não obstante esta constatação, providencialmente, a falácia do excesso de servidores é mantida, divulgada à exaustão, de modo a conseguir o apoio da população às políticas de arrocho salarial e de depreciação dos recursos humanos do estado.

Já quanto à burocracia, quanto às teias e entraves que infernizam a vida do cidadão comum, um terrífico ditado foi cunhado a ferro e fogo nas entranhas das elites políticas – devidamente internalizada na cultura estatal, e que, a personagem Benício Gama, da peça “Confiscaram meu estado” de Rodoux Faugh explica com esmero e precisão cirúrgica: “Perguntas a razão da burocracia?, a razão das arapucas?, a razão das armadilhas?, pois eu te respondo, moleque-cidadão, pirralho insosso, assunte, compreenda e anote: trata-se, servo demente e ignóbil, de criar dificuldades para que então, se possa vender as facilidades”