Legado de abandono
O Parque Olímpico
do Rio de Janeiro, seis meses após a realização dos Jogos de 2016, mais parece
um cenário de filme pósapocalíptico. A ruína em diversas estruturas, as quais,
em agosto, foram palco de performances memoráveis de atletas do mais alto nível
mundial, causou grande repercussão na mídia internacional nas últimas semanas.
Entulhos, arenas fechadas, piscinas abandonadas compõem a paisagem chocante
para quem passa pelo local, que antes fervilhava com competições. O legado
positivo, assegurado pelos governos federal, estadual e municipal, desmorona
diante dos olhos do contribuinte e provoca indignação. Mas não se pode dizer que
há surpresa nesse processo.
A Copa do Mundo de
2014 já mostrara a falta de preocupação das autoridades com a herança de
grandes eventos esportivos, bem como a negligência com o dinheiro público.
Estádios erguidos a peso de ouro se transformaram em imensos depósitos de
marasmo, resultado da ganância politiqueira que levou o campeonato
futebolístico ao máximo de cidades, mesmo aquelas em que, nitidamente, seria
difícil cumprir uma agenda de eventos para bancar as pesadas despesas. Os
estádios sugaram mais de R$ 8 bilhões dos cofres públicos, e a maioria deles
gera prejuízos milionários. Dados de 2015 apontam que apenas o BeiraRio, em
Porto Alegre, e a Arena Corinthians, em São Paulo, obtiveram receitas
operacionais superiores aos dispêndios.
Previsivelmente, a
síndrome do `elefante branco' também atingiu em cheio as Olimpíadas. As imagens
que percorreram o mundo evidenciam o contraste gritante entre o que se viu
durante os Jogos e o que se constata agora. Cai por terra o compromisso de
legado social e de desenvolvimento do esporte.
O planejamento do
país-sede precisa estabelecer metas e prazos para a posteridade, levando em
conta os gastos com manutenção, os investimentos contínuos para manter as
estruturas produtivas e atrativas à sociedade. Todavia, reina a impressão de
que, no último dia de evento, findam as responsabilidades do governo e esse
lava as mãos. Mas é justamente naquele ponto em que a atuação das autoridades
deve ser de protagonismo, a fim de garantir à população o usufruto de um
patrimônio tangível.
O Tribunal de
Contas da União (TCU) reclamou a preservação do Parque Olímpico à Prefeitura do
Rio de Janeiro. Em severa crise financeira, a administração municipal ainda não
deu resposta concreta quanto ao que será feito para resolver o quadro de abandono.
Já o Ministério do Esporte minimiza o problema, atribuindo o atual estado a um
'natural período de transição'. As incumbências são divididas entre o
Ministério do Esporte, a Prefeitura, a Concessionária Rio Mais e o Comitê Rio
2016.
O discurso de que
as instalações podem ser convertidas em centros de excelência para a prática
esportiva e, assim, trazer ganho social valioso, esbarra na ausência de um
plano concreto que viabilize tal promessa. A recessão pode ser usada como
justificativa imediata para o desamparo às obras provenientes da Copa e
Olimpíada, mas ressalta-se que não houve zelo em relação ao dinheiro quando o
País se propôs a sediar dois eventos gigantes no intervalo de dois anos.
É certo que o
Mundial e os Jogos do Rio conseguiram impulsionar o turismo e executar algumas
obras de infraestrutura que perduram. Não obstante, o saldo é desastroso. O
Brasil quis vender ao mundo uma imagem de sucesso, no entanto, os contribuintes
pagaram caro demais por esse ufanismo oco.
No Diário do
Nordeste
_____________
O que ensina Shakespeare sobre a corrupção no Brasil de hoje? Para saber, clique aqui.
Para comprar o livro, clique aqui. |