quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Enquanto os governantes roubam, o Ministério Público dorme em berço esplêndido?


Legado de abandono
O Parque Olímpico do Rio de Janeiro, seis meses após a realização dos Jogos de 2016, mais parece um cenário de filme pósapocalíptico. A ruína em diversas estruturas, as quais, em agosto, foram palco de performances memoráveis de atletas do mais alto nível mundial, causou grande repercussão na mídia internacional nas últimas semanas. Entulhos, arenas fechadas, piscinas abandonadas compõem a paisagem chocante para quem passa pelo local, que antes fervilhava com competições. O legado positivo, assegurado pelos governos federal, estadual e municipal, desmorona diante dos olhos do contribuinte e provoca indignação. Mas não se pode dizer que há surpresa nesse processo.
A Copa do Mundo de 2014 já mostrara a falta de preocupação das autoridades com a herança de grandes eventos esportivos, bem como a negligência com o dinheiro público. Estádios erguidos a peso de ouro se transformaram em imensos depósitos de marasmo, resultado da ganância politiqueira que levou o campeonato futebolístico ao máximo de cidades, mesmo aquelas em que, nitidamente, seria difícil cumprir uma agenda de eventos para bancar as pesadas despesas. Os estádios sugaram mais de R$ 8 bilhões dos cofres públicos, e a maioria deles gera prejuízos milionários. Dados de 2015 apontam que apenas o BeiraRio, em Porto Alegre, e a Arena Corinthians, em São Paulo, obtiveram receitas operacionais superiores aos dispêndios.
Previsivelmente, a síndrome do `elefante branco' também atingiu em cheio as Olimpíadas. As imagens que percorreram o mundo evidenciam o contraste gritante entre o que se viu durante os Jogos e o que se constata agora. Cai por terra o compromisso de legado social e de desenvolvimento do esporte.
O planejamento do país-sede precisa estabelecer metas e prazos para a posteridade, levando em conta os gastos com manutenção, os investimentos contínuos para manter as estruturas produtivas e atrativas à sociedade. Todavia, reina a impressão de que, no último dia de evento, findam as responsabilidades do governo e esse lava as mãos. Mas é justamente naquele ponto em que a atuação das autoridades deve ser de protagonismo, a fim de garantir à população o usufruto de um patrimônio tangível.
O Tribunal de Contas da União (TCU) reclamou a preservação do Parque Olímpico à Prefeitura do Rio de Janeiro. Em severa crise financeira, a administração municipal ainda não deu resposta concreta quanto ao que será feito para resolver o quadro de abandono. Já o Ministério do Esporte minimiza o problema, atribuindo o atual estado a um 'natural período de transição'. As incumbências são divididas entre o Ministério do Esporte, a Prefeitura, a Concessionária Rio Mais e o Comitê Rio 2016.
O discurso de que as instalações podem ser convertidas em centros de excelência para a prática esportiva e, assim, trazer ganho social valioso, esbarra na ausência de um plano concreto que viabilize tal promessa. A recessão pode ser usada como justificativa imediata para o desamparo às obras provenientes da Copa e Olimpíada, mas ressalta-se que não houve zelo em relação ao dinheiro quando o País se propôs a sediar dois eventos gigantes no intervalo de dois anos.
É certo que o Mundial e os Jogos do Rio conseguiram impulsionar o turismo e executar algumas obras de infraestrutura que perduram. Não obstante, o saldo é desastroso. O Brasil quis vender ao mundo uma imagem de sucesso, no entanto, os contribuintes pagaram caro demais por esse ufanismo oco.

No Diário do Nordeste
_____________  

O que ensina Shakespeare sobre a corrupção no Brasil de hoje? Para saber, clique aqui.
Para comprar o livro, clique aqui.