Câncer tem
tratamentos desiguais no SUS
Foi aos 34 anos,
durante um autoexame, que Karla Toledo descobriu um tumor de mama que logo se
espalharia para os ossos e para o sistema nervoso central.
Por causa da
metástase óssea, hoje tem fraturas nas colunas lombar e cervical, o que a
obriga a usar dois coletes. Nos últimos seis anos, Karla passou por sete
protocolos de quimioterapia no SUS e vê diminuírem suas opções terapêuticas a
cada dia.
"Sempre me
informei sobre a doença, mas saber demais tem um lado negativo. Vejo que as
pessoas com planos de saúde, ou que podem pagar, têm acesso a melhores terapias
do que nós, do SUS", diz ela, hoje com 40 anos.
Para Karla, a falta
de equidade é pior que o próprio câncer. "Todos deveriam ter iguais
direitos", afirma.
A quimioterapia
oral que recebe há sete meses não estava disponível no instituto filantrópico
onde se trata em São Paulo e ela a encontrou em outro hospital do SUS.
"Fui eu que
falei com a minha médica sobre essa opção. Ela nem havia sugerido porque o
instituto não dispõe."
A situação de Karla
revela a grande a disparidade no tratamento de câncer no SUS. Em uma mesma
cidade, há hospitais oferecendo terapias inferiores às preconizadas pelo
Ministério da Saúde, enquanto outros até acima.
Essa é a conclusão
do estudo "Meu SUS é diferente do teu SUS", feito pelo Instituto
Oncoguia (ONG que dá apoio a pacientes com câncer) e que será apresentado nesta
terçafeira (27) em um fórum no Hospital Sírio-Libanês (SP).
Os dados foram
obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação e buscam saber se os centros têm
diretrizes para tratamento sistêmico do câncer (com remédios), se estão de
acordo com o padrão SUS e se há diferenças entre centros de uma mesma cidade e
em relação o que é ofertado pela saúde suplementar.
Foram avaliadas
diretrizes para quatro tipos de câncer mais comuns (pulmão, colorretal, mama e
próstata), todas recomendadas pelo ministério. Dos 52 centros que enviaram
informações, 18 não dispõem de diretrizes e 34 têm pelo menos uma. A amostragem
representa todos os Estados brasileiros.
No país, há 288
centros que tratam o câncer no SUS. Os hospitais recebem verbas federais por
meio das APACs (Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade), mas têm
autonomia em decidir quais terapias vão adotar.
Uma portaria do
Ministério da Saúde determina que as diretrizes sejam validadas pelos gestores
de saúde mas, na prática, isso não ocorre.
"Fomos atrás
do Ministério da Saúde, das secretarias estaduais e municipais e todas elas
repetiram o mantra de que não têm acesso às diretrizes, de que era preciso
buscá-las nas unidades habilitadas [centros oncológicos]", explica o
advogado sanitarista Tiago Farina Matos, diretor jurídico da Oncoguia e um dos
autores do estudo.
Muitos desses
centros oncológicos são filantrópicos e não vinculados à Lei de Acesso à
Informação. "Passamos quase um ano entrando com recursos até no TCU
[Tribunal de Contas da União] para conseguir as informações."
O instituto não
revela o nome dos centros pesquisados. "O tratamento sistêmico não
representa a totalidade da atenção oncológica, que também envolve cirurgia,
radioterapia, assistência social, psicológica. Mas é a parte padronizável. E
isso não é respeitado de um Estado para outro, de uma cidade para outra e, às
vezes, dentro de uma mesma cidade", diz o oncologista Rafael Kaliks,
diretor clínico do Oncoguia.
O Ministério da
Saúde informa que "cabe ao gestor público local em suas ações de
auditoria, monitoramento e controle verificar a coerência desses instrumentos
com as normas técnicas federal, estadual e municipal."
DIFERENÇAS
No Estado de São
Paulo, dos 11 centros que tratam câncer de mama, seis dispõem de diretrizes
para quimioterapia. Em um deles, elas estão abaixo das recomendações do
ministério, em dois estão adequadas e em três, acima.
Abaixo recomendado
significa não ofertar, por exemplo, nenhuma terapia anti-Her2 para o câncer de
mama. Essa quimioterapia ataca células que contém a proteína Her2, bloqueando a
sua proliferação. Segundo estudos, ela aumenta o tempo de vida em mais de 18
meses –o que resultaria em 768 mortes a menos em dois anos.
Em relação ao
câncer de pulmão, nove Estados têm centros com diretrizes abaixo das
recomendadas pelo ministério. Segundo uma revisão de estudos, oferecer ou não
uma determinada terapia para câncer de pulmão metastático (com mutação de EGFR)
aumenta o tempo de controle da doença e traz mais tempo de vida e menor
toxidade.
As drogas para esse
tipo de tumor (gefitinibe/erlotinibe) foram incorporadas ao SUS em 2013 mas,
como não houve alteração nos valores dos procedimentos pagos pelo ministério,
cada hospital compra se quiser.
Um ciclo da terapia
custa cerca de R$ 7.000, e o valor da tabela SUS para câncer de pulmão é de R$
1.100.
Segundo o
Ministério da Saúde, só 5% dos pacientes com câncer de pulmão se beneficiam com
esse tipo de terapia. Para os demais, o medicamento indicado custa R$ 150. Ou
seja, ficaria "elas por elas".
"Mas ninguém
controla o que está sendo usado. A gente não sabe se estão pagando mais por
menos ou menos por mais, já que os hospitais são livres para padronizar",
afirma o advogado Matos.
Por CLÁUDIA COLLUCCI, na Folha de S. Paulo
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O livro com a peça teatral Irena Sendler, minha Irena:
A história registra as ações de um grande herói, o espião e membro do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, Oskar Schindler, que salvou cerca de 1.200 judeus durante o genocídio perpetrado pelos nazistas. O industrial alemão empregava os judeus em suas fábricas de esmaltes e munições, localizadas na Polónia e na, então, Tchecoslováquia.
Irena Sendler, utilizando-se, tão somente, de sua posição profissional – assistente social do Departamento de Bem-estar Social de Varsóvia – e se valendo de muita coragem, criatividade e altruísmo, conseguiu salvar mais de 2.500 crianças judias.
"O Anjo do Gueto de Varsóvia", como ficou conhecida Irena Sendlerowa, conseguiu salvar milhares de vidas ao convencer famílias cristãs polonesas a esconder, abrigando em seus lares, os pequeninos cujo pecado capital – sob a ótica do führer – consistia em serem filhos de pais judeus.
Período: 2ª Guerra Mundial, Polônia ocupada pela Alemanha nazista. A ideologia de extrema-direita que sistematizou o racismo científico e levou o antissemitismo ao extremo com a Solução Final, implementava a eliminação dos judeus do continente europeu.
A guerra desencadeada pelos nazistas – a maior deflagração do planeta – mobilizou 100 milhões de militares, provocando a maior carnificina já experimentada pela humanidade, entre 50 e 70 milhões de mortes, incluindo a barbárie absoluta, o Holocausto, o genocídio, o assassinato em massa de 6 milhões de judeus.
Este é o contexto que inspirou o autor a escrever a peça teatral “Irena Sendler, minha Irena”.
Para dar sustentação à trama dramática, Antônio Carlos mergulhou fundo na pesquisa histórica, promovendo a vasta investigação que conferiu à peça um realismo que inquieta, suscitando reflexões sobre as razões que levam o homem a entranhar tão exageradamente no infesto, no sinistro, no maléfico. Por outro lado, como se desanuviando o anverso da mesma moeda, destaca personagens da vida real como Irena Sendler, seres que, mesmo diante das adversidades, da brutalidade mais atroz, invariavelmente optam pelo altruísmo, pela caridade, pela luz.
É quando o autor interage a realidade à ficção que desponta o rico e insólito universo com personagens intensos – de complexa construção psicológica - maquinações ardilosas, intrigas e conspirações maquiavélicas, complôs e subterfúgios delineados para brindar o leitor – não com a catarse, o êxtase, o enlevo – e sim com a reflexão crítica e a oxigenação do pensamento.
Dividida em oito atos, a peça traz à tona o processo de desumanização construído pelas diferentes correntes políticas. Sob o regime nazista, Irena Sandler foi presa e torturada – só não executada porque conseguiu fugir. O término da guerra, em 1945, que deveria levar à liberdade, lancinou o “Anjo do Gueto” com novas violências, novas intolerâncias, novas repressões. Um novo autoritarismo dominava a Polônia e o leste Europeu. Tão obscuro e cruel quanto o de Hitler, Heydrich, Goebbels, Hess e Menguele, surgia o sistema que prometia a sociedade igualitária, sem classes sociais, assentada na propriedade comum dos meios de produção. Como a fascista, a ditadura comunista, também, planejava erigir o novo homem, o novo mundo. Além de continuar perseguindo Irena, apagou-a dos livros e da historiografia oficial, situação que só cessaria com o debacle do império vermelho e a ascensão da democracia, na Polônia, em 1989.
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