sexta-feira, 26 de maio de 2017

Feijão, arroz e sem sobremesa


Os ex-governadores Arruda e Agnelo, além do ex-vice-governador Filippelli, ocupam celas de 6 metros quadrados na carceragem da Superintendência da PF e não têm direito a banho de sol. Advogados tentam revogar as prisões
Os ex-governadores José Roberto Arruda (PR) e Agnelo Queiroz (PT), além do ex-vice governador Tadeu Filippelli (PMDB), convivem há mais de 24 horas com restrições impostas pela carceragem da Superintendência da Polícia Federal, em Brasília. Em celas de 6 metros quadrados, cada detento divide o espaço com mais duas pessoas. Respeitar as regras estabelecidas é uma premissa básica na vida atrás das grades (veja Na cadeia). Todos dormem em beliches de concreto com colchão. Apenas Arruda recebeu lençóis da família.
Ontem, os investigados na Operação Panatenaico receberam a visita dos advogados e de alguns familiares. A assessoria da Polícia Federal informou que, 'por respeito à intimidade daqueles sob sua custódia, não divulga detalhes da rotina dos encarcerados.' O Correio apurou que, nas celas, não há televisão ou qualquer aparelho eletroeletrônico. Caso os detentos precisem usar banheiro, têm de pedir ao plantonista para serem levados ao sanitário, que fica do lado de fora. Para tomar banho, só com água fria. Tampouco há banho de sol. No dia a dia da carceragem da Superintendência da PF, os presos têm direito a café da manhã, almoço e jantar. Não há sobremesa.
Estratégia
O advogado de Filippelli entrou com pedido de liberdade provisória do cliente na 10ª Vara Federal. Segundo o defensor do peemedebista, Alexandre Queiroz, o magistrado Vallisney de Souza Oliveira quer ouvir o Ministério Público Federal e a PF antes de decidir sobre a revogação da prisão. 'Acredito que essa decisão só deve sair na sexta-feira. Aí, praticamente se completam os cinco dias (da prisão temporária), mas hoje (ontem) não dá mais (para o juiz decidir). Avaliamos a prisão desnecessária, uma vez que todas as diligências requeridas pela polícia foram realizadas. Não é porque simplesmente um acusa o outro que a pessoa
tem de ser presa', alegou. Filippelli foi exonerado ontem do cargo de assessor especial do presidente Michel Temer.
O advogado de Arruda, Paulo Emílio Catta Preta, entrou com pedido de revogação de prisão temporária do ex-governador no fim da tarde de ontem. 'Vamos comprovar que o meu cliente não tem qualquer participação em irregularidades na construção do estádio', afirmou. Ele acrescentou que, 'uma vez encerradas as investigações, não haverá mais sentido de Arruda aguardar até os cinco dias de prisão temporária'.
O defensor de Agnelo, Paulo Guimarães, não quis adiantar a estratégia para interceder em favor do ex-governador. Limitou-se a dizer que 'a defesa do ex-governador será feita no momento certo.' No momento da prisão, na terça-feira, Agnelo ficou abalado e chegou a passar mal. Ele deixou a casa onde mora, no Setor de Mansões Dom Bosco, depois de ser atendido por um médico; por isso, foi o último dos 10 investigados a chegar à PF.
André Carlos da Silva, advogado de Nilton Martorelli, ex-presidente da Novacap, também entrou com pedido de revogação da prisão do cliente no início da tarde. 'O juiz quer ouvir o Ministério Público e a Polícia Civil para emitir a decisão final', explicou. Ele ainda informou que trabalha no sentido de 'conhecer o teor das delações para que possa definir qual será a tática de defesa', concluiu.
Após eleger um governador, deputado federal, distrital ou qualquer outro cargo público, o cidadão precisa acompanhar os atos desses políticos e garantir que eles não esqueçam as promessas de campanha e saibam o que estão propondo e votando. Confira algumas das ferramentas que o brasileiro tem para fiscalizar esses gestores e parlamentares, flagrar casos de corrupção e denunciar desvios, abusos e outros crimes:
FISCALIZAÇÃO
»Lei de Acesso à Informação (LAI) » A Lei 12.527 entrou em vigor em 16 de maio de 2012 e obriga órgãos e entidades públicas do Legislativo, Executivo e Judiciário de todas as esferas a prestar informações produzidas para qualquer um que solicitá-las.
» Essas instituições devem informar detalhadamente todo o tipo de informação que produz, como gastos e investimentos, quantidade de funcionários, serviços oferecidos ou desativação de setores.
» Qualquer município com mais de 10 mil habitantes precisa disponibilizar os dados públicos via internet, com atualização constante.
» Os salários pagos aos servidores estão entre os dados produzidos que devem ser informados. Um deputado federal, por exemplo, tem que especificar todos os gastos e apresentar notas fiscais para receber a verba indenizatória. Em posse desses dados, um eleitor pode comparar o preço de um determinado produto comprado pelo parlamentar e quanto ele gastou, ou se a empresa que prestou um determinado serviço existe, e se o valor cobrado está dentro do previsto para o mercado.
» A determinação é que os órgãos solicitados respondam ao cidadão ou entidade imediatamente, de forma gratuita e sem necessidade de justificar o pedido.
» Se não for possível uma resposta imediata, o ente público tem um prazo de 20 dias.
» Algumas informações, porém, podem ser negadas, desde que sejam consideradas secretas, ultrassecretas ou reservadas. São dados que poderiam oferecer risco à defesa, soberania e integridade do território nacional, ou a vida, segurança ou saúde da população.
DENÚNCIAS
Organizações não governamentais e observatórios sociais
Há diversas ONGs e organizações da sociedade civil de interesse público (Oscip) que educam, recebem e direcionam denúncias feitas pela população.
» A Contas Abertas, por exemplo, atende denúncias e pedidos de orientações para criar grupos sociais de fiscalização. Eles recebem, principalmente, denúncias das esferas federais, mas também dão encaminhamento a reclamações locais. O contato da organização é o 3347-0058 e o ca@contasabertas.org.br. A ONG Adote um Distrital faz um trabalho semelhante, mas voltado para o Distrito Federal. Os contatos são o 3224-4368.
Ouvidorias
» As ouvidorias de entidades públicas existem para receber sugestões, elogios e reclamações, mas, principalmente, para registrar denúncias de abuso de autoridade, desvios de função, atos de corrupção, assédios e improbidade administrativa. Tanto usuários quanto funcionários do órgão podem fazer uso do dispositivo. A ferramenta deve ajudar o denunciante, ainda, a fiscalizar e nortear a administração pública. É possível ter acesso aos contatos e endereços de ouvidorias nos sites de todos os órgãos dos executivos e legislativos locais e federais.
» No GDF, as ouvidorias atendem pelo número 162. A Ouvidoria do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios atende às solicitações relacionadas à entidade, mas também registra denúncias contra gestores públicos e parlamentares, por exemplo, além de orientar o denunciante para promotorias específicas, se for o caso.
» Na Câmara Legislativa, o reclamante pode procurar a ouvidoria pelo e-mail ouvidoria@cl.df.gov.br, pelo telefone 3348- 8283, ou pessoalmente no 2º andar do prédio da Câmara, no Eixo Monumental, em frente ao Memorial JK. O cidadão também pode fazer denúncias direto na Comissão de Ética ou na presidência do órgão.
» De acordo com o artigo 21-A do regimento da Câmara dos Deputados, compete à ouvidoria da Casa, dentre outras coisas, 'encaminhar ao Tribunal de Contas da União, à Polícia Federal, ao Ministério Público, ou a outro órgão competente as denúncias recebidas que necessitem maiores esclarecimentos'. O telefone é 0800-619619 e, pela internet, o acesso é feito pelo endereço eletrônico www2.camara.gov.br/participe/faleconosco/ouvidoria. A ouvidoria do Senado, por sua vez, atende pelo www12.senado.leg.br/institucional/ouvidoria.
Precauções para fiscalizar e denunciar
» Existem algumas atitudes que podem ajudar o denunciante. Caso ele procure uma ouvidoria, por exemplo, se tiver medo de retaliação de um chefe ou de uma autoridade, o cidadão pode solicitar o sigilo de dados, para se resguardar e, ainda assim, manter contato com o órgão, saber o andamento da denúncia e prestar novas informações, caso seja necessário.
De olho nos políticos
» LUIZ CALCAGNO
O cidadão, na maioria das vezes, é o olho dos órgãos de fiscalização. Quem avalia é a presidente do Conselho Nacional de Ouvidores do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), a promotora Rose Meire Cyrillo. “Mesmo com a ajuda de entidades fiscalizadoras e de combate à corrupção, não há gente suficiente para controlar todas as possibilidades de abuso, desvio e outros crimes. São quase infinitas”, explica. Por isso, ela recomenda que o brasiliense faça uso das ouvidorias dos órgãos públicos, de instituições como o próprio MPDFT, do Tribunal de Contas local e da Lei de Acesso à Informação para cobrar, monitorar e denunciar as ações dos políticos. Para a promotora, essas ferramentas são “poderosas” se usadas corretamente pela população.
Fundador e secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco destaca que, além dos caminhos institucionais, interessados em fiscalizar e denunciar políticos também podem procurar observatórios sociais, grupos que recebem, apuram e encaminham denúncias aos órgãos públicos. “No DF, a pessoa pode procurar a Câmara Legislativa, o Tribunal de Contas local, o MPDFT ou as ouvidorias do Executivo e Legislativo. Se as pessoas têm medo de buscar esses órgãos, pois, muitas vezes, o poder se protege, podem pedir ajuda a organizações ou da imprensa para, efetivamente, trazer o assunto à tona e provocar uma mudança”, sugere.
Solicitação
Coordenador da ONG Adote um Distrital, Olavo Santana concorda: “Não deveria ser assim, mas, muitas vezes, um órgão público tem muito mais presteza em atender a uma solicitação nossa do que a de um cidadão”.

Por Isa Stacciarini e Paula Pires, no Correio Braziliense