sábado, 6 de maio de 2017

Combate à corrupção: acordo americano inspira o brasileiro


A metodologia usada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ) para calcular a multa cobrada da Odebrecht vai ajudar a empresa a negociar o seu acordo de leniência com o governo brasileiro. Retomadas após a divulgação das delações premiadas, as negociações entre a Odebrecht e a CGU poderão chegar a um desfecho positivo nos próximos 60 dias.
A empresa anunciou em dezembro do ano passado um acordo de leniência com a forçatarefa da Lava-Jato no Ministério Público Federal (MPF), pelo qual se comprometeu a pagar US$ 2,6 bilhões em três países: Brasil, Estados Unidos e Suíça. A métrica utilizada pelos americanos para chegar a essa quantia vai servir de referência para a CGU calcular o valor que será cobrado da empresa.
Caso a quantia levantada seja parecida, há chance de que o acordo com a CGU seja assinado sem a necessidade de novos desembolsos por parte da empresa. A Odebrecht garante que o valor do acordo feito com o MPF é o limite do que a empresa consegue pagar sem o risco de quebrar.
Ao calcular a multa da empresa, o DoJ chegou à cifra mínima de US$ 6 bilhões, valor que recebeu um desconto de 25%, caindo a US$ 4,5 bilhões. A Odebrecht, no entanto, alegou que só podia pagar US$ 2,6 bilhões. De acordo com o DoJ, uma análise independente feita nas contas da empresa comprovou que aquele era mesmo o teto.
Para chegar ao número, o órgão americano adotou uma série de variáveis, como o nível de gravidade dos crimes, o volume das propinas, o valor da vantagem ilegal auferida, a posição hierárquica dos executivos envolvidos, o número de empregados da empresa, a prática de obstrução de justiça, entre outras ponderações.
Essa é a principal diferença entre esse acordo e os que o MPF firmou com Andrade Gutierrez e Camargo Correa. Naqueles casos, o critério para definição do valor foi muito menos "científico". Para a Andrade, por exemplo, os procuradores alegaram que o montante de R$ 1 bilhão acertado era "o encontro entre o valor máximo que a empresa aceitava pagar e o valor mínimo que o órgão aceitava receber".
Devido ao uso de critérios mais frouxos para esse acordo, a CGU terá que usar sua própria sistemática para chegar ao valor que será cobrado da Andrade Gutierrez.
A falta de uma metodologia comum para o cálculo dos ressarcimentos é um dos grandes entraves dos acordos de leniência. Cada órgão federal com prerrogativa de acionar as empresas para recuperar valores usa suas próprias ferramentas, o que resulta em um pântano de insegurança jurídica para quem quer acertar os ponteiros com o poder público.
A CGU, por exemplo, montou uma equipe de técnicos exclusivamente dedicados a analisar os balanços das empresas para detectar a real capacidade de pagamento. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) debate internamente três formas de calcular os valores. O Tribunal de Contas da União (TCU) criou um parâmetro que aplica 17% sobre o valor dos contratos investigados pela Lava-Jato como "sobrepreço médio".
"Independentemente de qual a solução mais adequada, é imprescindível que haja uma convivência de entendimentos institucional. O que não podemos é continuar com entendimentos distintos, de modo a gerar essa falta de transparência e de segurança jurídica", opina o advogado Beto Vasconcelos, professor da FGV-Rio e ex-secretário nacional de Justiça.

Por Murillo Camarotto, no Valor Econômico




 Conforme o momento histórico, Shakespeare foi construindo nuvens com peças dotadas de diferentes características, propriedades específicas para cada fase de sua produção literária. “Medida por Medida” e “Bem está o que bem acaba” integram o que se convencionou denominar “comédias sombrias”, peças onde tensão e situações cômicas as categorizam em desacordo com outras comédias do dramaturgo como “A comédia dos erros”, “As alegres comadres de Windsor” e “Sonho de uma noite de verão”. E a explicação é singela: foram elaboradas no mesmo período em que o autor escreveu Hamlet e Otelo, grandes obras da literatura universal que elevam a tragédia ao ápice do gênero teatral. 

Na peça “Medida por Medida”, com inusitada habilidade, Shakespeare discute administração pública, direito e corrupção de maneira magistral. 

O universo da administração pública adotado na peça é largo e profundo. Entrelaçados às cenas emergem assuntos como

- o autoritarismo oriundo do poder divino do rei, as prerrogativas do monarca e a antecipação do liberalismo;
- a descentralização administrativa;
- o abuso do poder na administração pública;
- os limites da delegação de competência;
- accountability, fiscalização e controle;

Quanto ao direito, lança um forte debate sobre quesitos por demais importantes para a humanidade: 

- a aplicabilidade das leis mesmo quando se apresentam fora de uso por um longo tempo, gerando disfunções de toda ordem;
- a execução da pena quando esta resulta de uma lei extremamente dura;
- a discricionariedade do juiz na aplicação da lei, a subjetividade do magistrado e a fragilidade dos paradigmas que orientam o sistema de decisões no judiciário;
- a distribuição da justiça.

Especial enfoque o Bardo dá ao tema da corrupção, mostrando:

- a moral e a ética corroídas pelos interesses pessoais e pelo tráfico de influência;
- a força do poder para alterar o caráter dos administradores.

Neste aspecto Shakespeare nos faz refletir sobre a utilização do Estado enquanto instrumento de satisfação dos interesses pessoais.

E todo este universo é entrecortado por discussões sobre o amor e o ódio, a moral e o imoral, o sexo e a abstinência, a clausura e a liberdade, a prisão e a salvação, a vida e a morte.

O presente livro, além de disponibilizar a versão original de “Medida por medida” de Shakespeare, apresenta um conjunto de ensaios contextualizando a peça teatral às questões que incendeiam os panoramas contemporâneos brasileiro e latino-americano como corrupção, estado e administração pública; controle e accountability; direito e administração da justiça. 

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