A metodologia usada
pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ) para calcular a multa
cobrada da Odebrecht vai ajudar a empresa a negociar o seu acordo de leniência
com o governo brasileiro. Retomadas após a divulgação das delações premiadas,
as negociações entre a Odebrecht e a CGU poderão chegar a um desfecho positivo
nos próximos 60 dias.
A empresa anunciou
em dezembro do ano passado um acordo de leniência com a forçatarefa da
Lava-Jato no Ministério Público Federal (MPF), pelo qual se comprometeu a pagar
US$ 2,6 bilhões em três países: Brasil, Estados Unidos e Suíça. A métrica
utilizada pelos americanos para chegar a essa quantia vai servir de referência
para a CGU calcular o valor que será cobrado da empresa.
Caso a quantia
levantada seja parecida, há chance de que o acordo com a CGU seja assinado sem
a necessidade de novos desembolsos por parte da empresa. A Odebrecht garante
que o valor do acordo feito com o MPF é o limite do que a empresa consegue
pagar sem o risco de quebrar.
Ao calcular a multa
da empresa, o DoJ chegou à cifra mínima de US$ 6 bilhões, valor que recebeu um
desconto de 25%, caindo a US$ 4,5 bilhões. A Odebrecht, no entanto, alegou que
só podia pagar US$ 2,6 bilhões. De acordo com o DoJ, uma análise independente
feita nas contas da empresa comprovou que aquele era mesmo o teto.
Para chegar ao número,
o órgão americano adotou uma série de variáveis, como o nível de gravidade dos
crimes, o volume das propinas, o valor da vantagem ilegal auferida, a posição
hierárquica dos executivos envolvidos, o número de empregados da empresa, a
prática de obstrução de justiça, entre outras ponderações.
Essa é a principal
diferença entre esse acordo e os que o MPF firmou com Andrade Gutierrez e
Camargo Correa. Naqueles casos, o critério para definição do valor foi muito
menos "científico". Para a Andrade, por exemplo, os procuradores
alegaram que o montante de R$ 1 bilhão acertado era "o encontro entre o
valor máximo que a empresa aceitava pagar e o valor mínimo que o órgão aceitava
receber".
Devido ao uso de
critérios mais frouxos para esse acordo, a CGU terá que usar sua própria
sistemática para chegar ao valor que será cobrado da Andrade Gutierrez.
A falta de uma
metodologia comum para o cálculo dos ressarcimentos é um dos grandes entraves
dos acordos de leniência. Cada órgão federal com prerrogativa de acionar as
empresas para recuperar valores usa suas próprias ferramentas, o que resulta em
um pântano de insegurança jurídica para quem quer acertar os ponteiros com o
poder público.
A CGU, por exemplo,
montou uma equipe de técnicos exclusivamente dedicados a analisar os balanços
das empresas para detectar a real capacidade de pagamento. O Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade) debate internamente três formas de
calcular os valores. O Tribunal de Contas da União (TCU) criou um parâmetro que
aplica 17% sobre o valor dos contratos investigados pela Lava-Jato como
"sobrepreço médio".
"Independentemente
de qual a solução mais adequada, é imprescindível que haja uma convivência de
entendimentos institucional. O que não podemos é continuar com entendimentos
distintos, de modo a gerar essa falta de transparência e de segurança
jurídica", opina o advogado Beto Vasconcelos, professor da FGV-Rio e
ex-secretário nacional de Justiça.
Por Murillo
Camarotto, no Valor Econômico
Conforme o momento histórico, Shakespeare foi construindo nuvens com peças dotadas de diferentes características, propriedades específicas para cada fase de sua produção literária. “Medida por Medida” e “Bem está o que bem acaba” integram o que se convencionou denominar “comédias sombrias”, peças onde tensão e situações cômicas as categorizam em desacordo com outras comédias do dramaturgo como “A comédia dos erros”, “As alegres comadres de Windsor” e “Sonho de uma noite de verão”. E a explicação é singela: foram elaboradas no mesmo período em que o autor escreveu Hamlet e Otelo, grandes obras da literatura universal que elevam a tragédia ao ápice do gênero teatral.
Na peça “Medida por Medida”, com inusitada habilidade, Shakespeare discute administração pública, direito e corrupção de maneira magistral.
O universo da administração pública adotado na peça é largo e profundo. Entrelaçados às cenas emergem assuntos como
- o autoritarismo oriundo do poder divino do rei, as prerrogativas do monarca e a antecipação do liberalismo;
- a descentralização administrativa;
- o abuso do poder na administração pública;
- os limites da delegação de competência;
- accountability, fiscalização e controle;
Quanto ao direito, lança um forte debate sobre quesitos por demais importantes para a humanidade:
- a aplicabilidade das leis mesmo quando se apresentam fora de uso por um longo tempo, gerando disfunções de toda ordem;
- a execução da pena quando esta resulta de uma lei extremamente dura;
- a discricionariedade do juiz na aplicação da lei, a subjetividade do magistrado e a fragilidade dos paradigmas que orientam o sistema de decisões no judiciário;
- a distribuição da justiça.
Especial enfoque o Bardo dá ao tema da corrupção, mostrando:
- a moral e a ética corroídas pelos interesses pessoais e pelo tráfico de influência;
- a força do poder para alterar o caráter dos administradores.
Neste aspecto Shakespeare nos faz refletir sobre a utilização do Estado enquanto instrumento de satisfação dos interesses pessoais.
E todo este universo é entrecortado por discussões sobre o amor e o ódio, a moral e o imoral, o sexo e a abstinência, a clausura e a liberdade, a prisão e a salvação, a vida e a morte.
O presente livro, além de disponibilizar a versão original de “Medida por medida” de Shakespeare, apresenta um conjunto de ensaios contextualizando a peça teatral às questões que incendeiam os panoramas contemporâneos brasileiro e latino-americano como corrupção, estado e administração pública; controle e accountability; direito e administração da justiça.
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