A contaminação dos
TCs
Três anos de ampla
e diligente investigação sobre corrupção na gestão da coisa pública, trabalho
de que a Operação Lava Jato é símbolo, revelam o óbvio a uma nação perplexa: a
má política, incapaz de distinguir o público do privado e sempre disposta a colocar
o interesse pessoal acima do interesse público, é a principal responsável pela
roubalheira generalizada que se coloca como um dos entraves ao desenvolvimento
econômico e social do País. Recentemente, um lamentável episódio confirmou essa
triste realidade, no âmbito de uma instituição que existe exatamente para
fiscalizar as contas dos governantes: cinco dos sete conselheiros do Tribunal
de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ) foram presos numa operação policial de
combate à corrupção.
Longe de ser uma
exceção, esse episódio revela o que parece ser a regra do funcionamento dos
tribunais de contas (TCs) no País, de acordo com levantamento feito pela ONG
Transparência Brasil. Os tribunais de contas não integram o Poder Judiciário.
São órgãos auxiliares do Poder Legislativo. Os TCs subsidiam o trabalho do
Congresso Nacional e das Assembleias Legislativas na fiscalização das contas
dos governos federal e estaduais. Existem ainda, excepcionalmente, dois
tribunais de contas municipais, nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Essas duas exceções
correm por conta de uma curiosa interpretação legal: a Constituição Federal
estabelece, em seu artigo 31, que “é vedada a criação de Tribunais, Conselhos
ou órgãos de Contas Municipais”. Como o texto constitucional proíbe apenas a
“criação”, não a “existência”, os dois tribunais municipais que já existiam em
1988, quando a Carta Magna foi promulgada, continuam funcionando. A União, os
26 Estados, o Distrito Federal, mais os municípios de São Paulo e Rio compõem
um conjunto de 30 tribunais de contas que somam um total de 233 ministros e
conselheiros ao longo do tempo em que a pesquisa se realizou. Desses, de acordo
com o levantamento da Transparência Brasil, 53 são alvo de 104 acusações na
Justiça ou nas próprias cortes. Ou seja: cerca de 25%, ou um em cada quatro
conselheiros, respondem a processo ou já foram condenados na Justiça por
ilegalidades que vão do peculato à improbidade administrativa, passando por
rica variedade de atos de corrupção.
Para a ONG, a
grande incidência de atos ilegais praticados no exercício de suas funções por
quem deveria fiscalizar as contas públicas é consequência da “forte
politização” no processo de nomeação dos conselheiros. No universo de 233
conselheiros e ex-conselheiros incluídos na pesquisa, metade deles é composta
por exdeputados estaduais; 91 foram secretários estaduais ou municipais, 48
exerceram mandato
de vereador e 22
são ex-prefeitos. Cerca de 60 têm relação de parentesco com políticos,
inclusive governadores. Para as cortes estaduais de contas, a designação de um
dos sete conselheiros é de livre escolha do governador. Outros quatro são
indicados pelas assembleias legislativas.
Os dois restantes
devem provir dos quadros técnicos do próprio tribunal: um do corpo de auditores
e outro do Ministério Público de Contas. No Tribunal de Contas da União, seis
dos nove ministros são escolhidos pelo Congresso Nacional, um pelo presidente
da República e dois indicados entre auditores e procuradores da própria corte.
Independentemente do nível do tribunal, a nomeação dos titulares, de acordo com
a Constituição, deve atender aos óbvios requisitos de “idoneidade moral e
reputação ilibada”, além de “notórios conhecimentos” pertinentes à avaliação de
contas públicas e “mais de dez anos de experiência”.
Essa é a teoria. Na
prática, a nomeação dos ministros de contas no nível federal e dos conselheiros
no estadual e municipal está contaminada pela prevalência de injunções
políticas, quando não estritamente pessoais – exatamente a mesma praga que
compromete o desempenho dos quadros administrativos do poder, frequentemente
desvirtuando esse desempenho a serviço de interesses privados ou partidários. É
o aparelhamento do poder, uma das faces da má política, prática que levada a
extremos pelos governos do PT contribuiu vigorosamente para o caos do qual o
País luta hoje para se recuperar.
O Estado de São
Paulo
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O livro contém o texto original de Nikolai Gogol, a peça teatral “O inspetor Geral”. E mais um ensaio e 20 artigos discorrendo sobre a realidade brasileira à luz da magnífica obra literária do grande escritor russo. Dessa forma, a Constituição brasileira, os princípios da administração, as referências conceituais da accountability pública, da fiscalização e do controle - conteúdos que embasam a política e o exercício da cidadania – atuam como substrato para o defrontar entre o Brasil atual e a Rússia dos idos de 1.800.
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