Eis que a Lava Jato
não será tão veloz como o seu nome sugere. Se for aceita a oferta do exministro
Antonio Palocci, ao juiz Sérgio Moro - e tudo indica que sim -, de abrir nova
vertente de denúncias, focada no sistema financeiro, mais um ano de
investigações e escândalos se descortina. É o que Palocci avalia.
Todo o alvoroço até
aqui provocado na vida pública brasileira envolveu basicamente agentes públicos
(parlamentares, prefeitos, governadores, presidente e ex-presidentes da
República, juízes) e empresas do setor de infraestrutura. Roubalheira
monstruosa, cuja devassa equivale a uma revolução desarmada.
Mas há mais, muito mais.
O que se depreende
da Era PT (que inclui seus parceiros do PMDB e PP - e, em graus variados, todo
o espectro partidário) é que, em síntese, nenhum cofre público restou ileso.
Fundos de pensão, imposto sindical, bolsa família, verbas da cultura, reforma
agrária, Receita Federal, merenda escolar, presídios - nada escapou.
O secretário de
Saúde de Sérgio Cabral, por exemplo, contrabandeava prótese e material
cirúrgico; no mesmo segmento, descobriu-se contrabando de sangue em Pernambuco,
ao tempo em que o Ministério da Saúde estava sob o comando do hoje senador
petista Humberto Costa. O ex-senador Gim Argelo lavava dinheiro de propina com
doações a uma igreja em Brasília; idem o ex-deputado Eduardo Cunha, ambos
reconhecidamente homens de fé.
Paulo Bernardo,
quando ministro do Planejamento de Dilma, cobrava um adicional dos empréstimos
consignados aos aposentados. A roubalheira, com apoio logístico do PT, rendeu
R$ 100 milhões.
Mas tudo isso é
varejo. Nada se compara em extensão e profundidade ao que ocorria na área das
empreiteiras, onde reinou um cartel, em que pontificava a Odebrecht. Destroçou,
entre muitas outras, a Petrobras, a Eletrobras, o Dnit, os Correios e
respectivos fundos de pensão. Ali, a roubalheira era na escala dos bilhões.
Mas o mundo das
finanças, em que Palocci, exministro da Fazenda de Lula e da Casa Civil de
Dilma, circulou com total desenvoltura - e que conhece como poucos -, ainda
carece de devassa. O que se sabe não passa de vislumbres.
Há dias, por exemplo,
o Ministério Público denunciou falcatrua na aquisição pela Caixa Econômica de
ações do Banco Panamericano (cerca de R$ 800 milhões), em 2011 - governo Dilma.
A Caixa Econômica
está quebrada, idem o Banco do Brasil. O TCU examina contratos irregulares do
BNDES, a maior parte em obras no exterior, que somam R$ 1,3 trilhão. O governo
Temer acenou com o saneamento da máquina estatal, mas o máximo que conseguiu -
se é que conseguiu - foi estancar a sangria.
Nada revelou sobre
o que houve, de como se chegou a esse resultado. As caixas pretas continuam
lacradas. O que se sabe veio das delações premiadas e das investigações da Lava
Jato.
É compreensível. O
governo Temer é o segundo escalão do PT. E a lei permite que o réu se poupe de
fornecer informações que o comprometam. Os esclarecimentos estão vindo pela via
judicial. Os petistas roubavam em nome da causa revolucionária, que, mesmo não
se consumando, oferecia-lhes pretexto moral; os peemedebistas prescindiam de
causa e pretexto; bastava-lhes o produto.
Enquanto os
interesses convergiram, mantevese a aliança, que não recusava auxílio eventual
aos adversários, o que explica a ausência de oposição ao longo de todo esse
período.
Tudo iria bem se o
país, a certa altura, não tivesse falido, na reta final do primeiro governo
Dilma. A Lava Jato já estava em ação, mas poucos a percebiam, o que permitiu a
reeleição de Dilma.
Deve-se à Força
Tarefa e ao juiz Sérgio Moro a reviravolta que se operou na política
brasileira, colocando em cena a população, em megamanifestações sem precedentes
na história.
O PT foi apeado do
governo pela pressão das ruas, não de seus adversários políticos. O impeachment
veio apesar deles. PSDB e PT se uniram para evitá-lo. FHC, por exemplo,
avalizou a honestidade de Dilma com uma veemência superior à dela própria.
O desmentido veio
pelas delações dos parceiros: empreiteiros, parlamentares e exministros. O
estrago da Odebrecht ainda está sendo assimilado e o STF anuncia que terá de
pedir auxílio a outros magistrados para lidar com a montanha de inquéritos que
dali resulta. Mas há ainda as delações da Andrade Gutierrez, OAS, Queiroz
Galvão, UTC, Delta etc. O país oficial está no banco dos réus.
Em meio a isso,
Palocci entra em cena - e com ele os bancos.
Por Ricardo Noblat, em O Globo
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O livro contém o texto original de Nicolai Gogol, a peça teatral “O inspetor Geral”. E mais um ensaio e 20 artigos discorrendo sobre a realidade brasileira à luz da magnífica obra literária do grande escritor russo. Dessa forma, a Constituição brasileira, os princípios da administração, as referências conceituais da accountability pública, da fiscalização e do controle - conteúdos que embasam a política e o exercício da cidadania – atuam como substrato para o defrontar entre o Brasil atual e a Rússia dos idos de 1.800.
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