Levantamento do
Correio revela que em 20 das 27 unidades da Federação há denúncias de malfeitos
contra conselheiros dos tribunais de contas. No Rio, cinco dos sete julgadores
estão atrás das grades
A prisão de cinco
dos sete conselheiros do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro em um
desdobramento da Operação Lava-Jato chamou a atenção de todo o país. Nos
últimos anos, no entanto, é cada vez mais comum ver integrantes das cortes
responsáveis por fiscalizar os gastos públicos envolvidos em casos de
corrupção. Desde 2010, 20 dos 27 órgãos de controle das unidades da Federação
se envolveram em episódios polêmicos.
No Tribunal de
Contas da União (TCU), dos nove ministros, quatro estão na mira da Polícia Federal.
Dois deles, Aroldo Cedraz e Raimundo Carreiro, tiveram os sigilos bancário e
fiscal quebrados pela Polícia Federal por serem investigados pela Lava-Jato.
Eles foram citados pelo delator e empreiteiro da UTC Ricardo Pessoa e,
supostamente, venderiam informações privilegiadas por intermédio do filho de
Aroldo, Tiago Cedraz. Outro que é citado na Lava-Jato é o ex-senador Vital do
Rêgo. O quarto, Augusto Nardes, teria recebido propina e é um dos investigados
na Operação Zelotes.
Nos tribunais de
contas estaduais, as maracutaias vão das mais sofisticadas às mais simples. Em
Sergipe, por exemplo, neste mês, o conselheiro UIices Andrade foi denunciado
pelo Ministério Público daquele estado sob acusação de usar um veículo oficial
em benefício próprio. Ele teria pegado um carro da Secretaria de Educação para
transportar pedras de mármore que seriam usadas na construção da sua casa.
A cobiça de
deputados estaduais Brasil afora para assumir função, que é vitalícia, tem
direito a vários assessores e geralmente recebe o teto constitucional, algo em
torno de R$ 33 mil, é inevitável. No Mato Grosso, o ex-parlamentar Sérgio
Ricardo é acusado de comprar a vaga no Tribunal de Contas por R$ 4 milhões. O
Ministro da Agricultura e ex-governador daquele estado, Blairo Maggi, também é
réu no caso.
Para diminuir os
desvios nos tribunais, o presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de
Contas do Brasil (Atricon), conselheiro Valdecir Pascoal, defende o cumprimento
do texto constitucional no momento em que ocorrer a indicação para a Corte. “No
modelo atual, dois terços dos conselheiros são indicados pelo Poder
Legislativo. A Constituição Federal prevê que essa indicação deve respeitar
alguns requisitos, como a idoneidade moral e notável saber. Caso esses itens
não sejam cumpridos, o correto a se fazer é negar a posse. As indicações que
acontecem com viés meramente político têm que acabar, pois causam prejuízos à
sociedade”, ressalta.
Atualmente, tramita
no Congresso uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que prevê mudanças nas
escolhas dos conselheiros que serão nomeados pelo Poder Legislativo. Hoje em
dia, qualquer pessoa — mesmo sem ensino superior, mas que supostamente tenha
notável saber — pode ocupar o cargo. Se a PEC for aprovada, os conselheiros
seriam eleitos dentro da classe dos auditores de Controle Externo do tribunal,
e que tenham sido aprovados em concurso público há pelo menos 10 anos ou
estejam entre os integrantes vitalícios do Ministério Público de Contas.
A Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) discute ações para impedir as indicações às cortes de
contas. A instituição estuda apresentar uma arguição de descumprimento de
preceito fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal contra os
apadrinhamentos nos órgãos de controle. Felipe Santa Cruz, presidente da OAB no
Rio de Janeiro, onde mais da metade dos membros foi presa nesta semana, destaca
que a corrupção dentro dos tribunais de contas, fruto da politização dessas
instituições, aprofunda a crise pela qual passa a nação. “Esse assunto já vem
sendo debatido nos últimos anos e agora deve ser enfrentado como forma de
diminuir os episódios de corrupção”, defende o jurista.
Investigação
Os quatro
conselheiros presos na Operação O Quinto do Ouro, da Polícia Federal, no Rio de
Janeiro, foram transferidos para a Cadeia Pública Pedrolino Werling de
Oliveira, no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu. A Justiça vai
decidir se eles continuam presos ou se serão colocados em liberdade.
Inicialmente, os conselheiros foram submetidos a prisão temporária, que tem
duração de cinco dias, mas é possível que o Judiciário decida alterar para
preventiva, que não tem prazo para terminar.
Além do processo
penal, sob acusação de terem recebido pagamentos indevidos, os conselheiros
devem enfrentar processo administrativo. Quem avalia punições administrativas é
a corregedora no TCE, Marianna Montebello Willeman. Ela é quem vai definir se
seus pares devem ser ou não responsabilizados pelos crimes imputados. O
advogado Paulo Fernando, professor de direito constitucional da UDF, explica
que os conselheiros têm foro privilegiado. “De acordo com a Constituição, eles
são julgados pelo Superior Tribunal de Justiça. Caso sejam condenados a mais de
dois anos de prisão na esfera penal, perdem os direitos políticos e o cargo na
administração pública. Outra possibilidade para a perda do cargo é em uma
eventual condenação pela corregedoria do tribunal”, destaca.
“Esse assunto
(indicação para corte de contas) já vem sendo debatido nos últimos anos e agora
deve ser enfrentado como forma de diminuir os episódios de corrupção” Felipe
Santa Cruz, presidente da OAB no Rio de Janeiro
Pelo país
Denúncias contra
conselheiros dos Tribunais de Contas (TC) se espalham pelas unidades da
Federação
Alagoas
Há duas semanas, o
Ministério Público daquele estado denunciou os conselheiros Isnaldo Bulhões e
Luiz Eustáquio Toledo por envolvimento na Operação Rodoleiros, da Polícia
Federal, que investiga desvio de recursos na Corte de Contas. Em agosto do ano
passado, o conselheiro Cícero da Silva foi afastado pela Justiça por um ano.
Nesta semana, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão no órgão
no âmbito da Rodoleiros.
Amapá
Em junho de 2015, o
Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceitou denúncia do Ministério Público
Federal (MPF) contra quatro conselheiros do TC acusados de desviar
aproximadamente R$ 100 milhões. Na época, todos foram afastados do cargo.
Bahia
O Ministério
Público Federal acusou o conselheiro Antônio de Castro Neto por tráfico de
influência. O órgão sustenta que os atos dele configuravam o crime de advocacia
administrativa, mas, em 2013, o STJ rejeitou a denúncia.
Ceará
Em 2011, o então
presidente do Tribunal de Contas daquele estado, Teodorico Menezes Neto, foi
afastado do cargo pela Justiça, sob acusação de coordenar um grupo de pessoas
que desviou dinheiro público. Associações ligadas à mulher, ao filho e a
assessores dele foram investigadas no caso.
Distrito Federal
O conselheiro
Manoel de Andrade, conhecido como Manoelzinho dos Táxis”, foi condenado por
improbidade administrativa pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no ano
passado. Ele acabou acusado pelo MP de manipular uma auditoria sobre o trabalho
de taxistas em Brasília. Domingos Lamoglia, envolvido na Operação Caixa de
Pandora, foi afastado em 2009 e, em 2015, renunciou à Corte como manobra para
protelar seu julgamento.
Espírito Santo
Passados 13 anos da
denúncia do Ministério Público Federal, o ex-conselheiro Valci Ferreira foi
condenado pelo STJ a 10 anos de prisão em regime fechado, além de ter que pagar
multa e perder o cargo no TC.
Goiás
O atual presidente
do órgão em Goiás, Kennedy Trindade, foi denunciado pelo MPF por improbidade
administrativa por dispensa indevida de Licitação de três obras. A Justiça
acolheu a denúncia, mas reduziu a pena. Ele segue no cargo. Em 2015, a Justiça
suspendeu a nomeação de Helder Valin para a Corte sob alegação de que ele não
preenchia os requisitos, mas ele reverteu o caso e tomou posse.
Maranhão
O TC daquele estado
exonerou o filho do deputado Waldir Maranhão, que ficou conhecido por ser o
vice-presidente da Câmara dos Deputados quando Eduardo Cunha comandava a Casa,
acusado de ser funcionário fantasma.
Mato Grosso
O conselheiro
Sérgio Ricardo de Almeira foi afastado do cargo em janeiro deste ano. Ele é
acusado de comprar a vaga no TC e teve os bens bloqueados em R$ 4 milhões. O
exgovernador e atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, também é réu neste
caso.
Mato Grosso do Sul
O MP pediu para
investigar 212 integrantes do Congresso Nacional envolvidos no caso da
farra das
passagens. Entre eles, o expresidente Waldir Neves, conselheiro da Corte de
Contas do Mato Grosso do Sul.
Minas Gerais
Três conselheiros
foram apontados pela Polícia Federal como participantes de um esquema de desvio
de verbas do Fundo de Participação dos Municípios. O órgão é alvo frequente de
polêmicas: o MP já denunciou casos de funcionários fantasmas e, em 2002,
servidores do alto escalão foram acusados de forjar um incêndio criminoso para
destruir provas.
Pará
Em 2009,
conselheiros do TC foram acusados de empregar parentes na instituição, mesmo
depois de o STF editar uma súmula proibindo o nepotismo nos Três Poderes.
Paraná O Ministério
Público do Paraná (MP) denunciou, em 2015, três diretores do TC por crimes de
associação criminosa, fraude à Licitação e corrupção ativa e passiva. Quatro
dos sete conselheiros já se envolveram em polêmicas.
Rio de Janeiros
Nesta semana, cinco
dos sete conselheiros foram presos — um em prisão domiciliar por problemas de
saúde — pela Operação Lava Jato.
Rio Grande do Sul O
conselheiro Marco Peixoto foi denunciado pelo Ministério Público pela
contratação de funcionários fantasmas. Outro integrante da Corte, Alexandre
Postal, foi acusado pela imprensa daquele estado de irregularidades no uso de
diárias quando era deputado.
Rondônia
O conselheiro
Edílson de Souza Silva foi preso no âmbito da Operação Dominó da Polícia
Federal. A Justiça acatou parcialmente a denúncia do MPF e mandou soltá-lo.
Roraima
Em janeiro deste
ano, o STJ determinou o afastamento do conselheiro Henrique Manoel Fernandes
Machado. Ele é réu por suspeita de desvio de Recursos Públicos.
Santa Catarina
O conselheiro Cesar
Filomeno Fontes foi alvo de ação penal apresentada pela ProcuradoriaGeral da
República no STJ por falsidade ideológica.
São Paulo
Um executivo da
Andrade Gutierrez que assinou acordo de delação premiada na Operação Lava-Jato
afirmou que pagava propina para que o TC não apontasse problemas em Licitações
de obras, principalmente a do Metrô.
Sergipe
Neste mês, o
conselheiro Ulices Andrade foi denunciado por improbidade administrativa. Na
ação, o MP defendeu a perda de função do integrante da Corte sob acusação de
que ele usou veículo público da Secretaria de Educação em benefício particular.
Ele teria transportado pedras de mármores que seriam usadas na construção da
casa.
Por Matheus Teixeira e Renato Souza, no Correio
Braziliense
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