Passava
das 16h quando o mundo político brasileiro virou pelo avesso. Exatos 27 dias
após a entrega ao Supremo Tribunal Federal dos 83 pedidos de inquéritos feitos
pelo Ministério Público, a famosa lista do fim do mundo transformou o Congresso
Nacional em um deserto no último dia útil antes do feriado de Páscoa. Na
Câmara, sem acordo para a votação da renegociação da dívida dos estados, o
presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) encerrou a sessão por volta das 17h. Os
senadores ainda aprovaram o projeto que cria o documento de identificação
nacional que reunirá em um só a identidade, o Cadastro de Pessoa Física (CPF),
a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e o Título de Eleitor. Mas encerraram
os trabalhos antes do início da noite. E depois também desapareceram.
A
lista já era esperada e o seu conteúdo especulado desde que os ex-executivos da
Odebrecht acertaram o acordo de delação premiada. Mas nada disso foi suficiente
para impedir o estrago político em Brasília. A angustia era evidente. São oito
ministros do governo Michel Temer que passarão a ser investigados pelo Supremo
Tribunal Federal (STF). No Congresso, mais de 25 senadores e cerca de 40
deputados serão esquadrinhados pelo relator da Lava-Jato, ministro Edson
Fachin.
Não
é só o Congresso que está na berlinda. São quatro ex-presidentes citados:
Fernando Henrique, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, além de Fernando
Collor, que virou senador. Metade dos governadores será investigada, três deles
pelo STF: Renan Filho (PMDB-AL), Robinson Faria (PSD-RN) e Tião Viana (PT-AC).
Outros nove tiveram seus processos remetidos ao Superior Tribunal de Justiça
(STJ). Os presidentes das duas Casas, Eunício Oliveira (PMDB-CE) e Rodrigo Maia
(DEM-RJ), estão na lista. O relator da principal reforma do governo Temer — a
da Previdência —, o deputado Arthur Maia (PPS-BA), também. Presidentes de
partidos, como Aécio Neves (PSDB-MG), Romero Jucá (PMDB-RR), Ciro Nogueira
(PP-PI) e o presidente da Força, Paulo Pereira da Silva, foram listados pelo
procuradorgeral da República, Rodrigo Janot. Também será investigado o ministro
do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo.
Os
rumos da sucessão em 2018 ficaram mais nebulosos a partir de ontem. Lula, a
grande aposta do PT, está marcado. Toda a linha sucessória oficial tucana
também — além de Aécio, serão investigados o governador de São Paulo, Geraldo
Alckmin e o senador José Serra (PSDB-SP). O abalo sobre o trio pode reforçar a
tese da candidatura presidencial de João Doria, que, por enquanto, é prefeito
de São Paulo e cotado a concorrer ao governo do estado no ano que vem.
Há
quem possa dormir tranquilo a partir de hoje. Escolhido ministro da Secretaria
de Governo, Antonio Imbassahy teve um processo contra si arquivado. O mesmo
aconteceu com o ministro da Defesa, Raul Jungmann, os deputados Benito Gama
(PTB-BA), Cláudio Cajado (DEM-BA), Orlando Silva (PCdoB-SP) e o senador Romário
(PSB-RJ). Três inquéritos foram devolvidos, a pedido da ProcuradoriaGeral da
República, para novas análise. Outros oito foram remetidos para nova
averiguação pela PGR.
Essa
hecatombe acontece às vésperas da apresentação do relatório da reforma da
Previdência na Comissão Especial da Câmara. “Tudo vai ficar prejudicado. O
relator, agora, em vez de se ater ao texto de uma proposta impopular, terá que
se defender. Eu acho que está na hora de se separar o joio do trigo. Com a
tranquilidade de quem conseguiu se defender de uma acusação injusta, espero que
muitos dessa lista consigam comprovar a inocência”, afirmou o deputado Júlio
Delgado (PSB-MG).
Foro privilegiado
O
senador Álvaro Dias (PV-PR) afirmou que a divulgação da lista dos políticos que
serão investigados no âmbito da Lava-Jato obriga o Congresso a aprovar o fim do
foro privilegiado. “Com a quantidade de inquéritos que serão abertos, será
humanamente impossível para o Supremo julgar todos os casos a médio prazo, e
isso fará com que paire na sociedade um sentimento de impunidade.” Questionado
se um congresso que tem 29 senadores e 42 deputados sob investigação teria
coragem de derrubar o foro privilegiado, ele respondeu: “Ainda existem números
suficientes nas duas casas para aprovar uma PEC. São esses políticos que têm
que fazer isso”, defendeu Álvaro.
Do
Correio Braziliense