O crescimento dos
gastos com Previdência Social foi um dos fatores que contribuíram para a
explosão das despesas com pessoal nos estados. De 2010 a 2016, a participação
do quanto esses gastos abocanham de todas as receitas arrecadadas cresceu 6,9
pontos porcentuais, para 59,8%. Isso significa que de cada R$ 100 que os
estados arrecadam, R$ 60 pagam despesas com funcionários, aposentados e
pensionistas.
A secretária do
Tesouro, Ana Paula Vescovi, considera o número elevado. Ela destaca a
velocidade desse processo de desequilíbrio fiscal que pode agravar a já
delicada situação das finanças estaduais em um contexto de queda de
arrecadação. 'A consequência disso foi a compressão de investimentos e o
aumento dos desequilíbrios nos orçamentos', explicou a secretária.
Diante dessa
ampliação nas despesas com pessoal, nove estados ultrapassaram em 2016 os
limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para esses gastos. O teto
equivale a 60% da Receita Corrente Líquida (RCL), mas Minas Gerais, Rio de
Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Mato Grosso,
Goiás e Rio Grande do Norte destinaram mais que isso ao pagamento de sua folha
no ano passado.
Minas Gerais lidera
os gastos, com 78,76% de sua RCL comprometida com pessoal. Uma situação altamente
alarmante e que sufoca a capacidade de o governo estadual oferecer os serviços
essenciais que são de sua responsabilidade, como educação e policiamento.
Apenas dois estados
usam o mesmo método do Tesouro para fazer esse cálculo: Rio de Janeiro e Rio
Grande do Norte. O restante recorre a subterfúgios, muitas vezes patrocinados
por seus Tribunais de Contas Estaduais (TCEs), para maquiar as contas e
descontar despesas que deveriam ser consideradas como de pessoal.
'Há diferenças de
apuração e precisamos trabalhar juntos pela convergência', ressaltou. Esse
alinhamento é ainda mais importante para aqueles que pretendem aderir ao Regime
de Recuperação Fiscal (RRF). 'Temos de estar na mesma página do ponto de vista
contábil.'
Estados com pesadas
despesas com servidores inativos, a exemplo do Rio de Janeiro e do Rio Grande
do Sul precisaram adotar medidas de aperto, como a elevação da contribuição
previdenciária, e estão hoje na fila por socorro da União.
O governo
fluminense já protocolou o pedido de adesão ao RRF e a administração gaúcha
está em tratativas para a elaboração do plano de recuperação.
Pelos dados do
boletim, apenas um estado hoje está habilitado a aderir ao RRF, que é o Rio de
Janeiro. Ironicamente, o Rio Grande do Sul, que já está em negociação para ter
o socorro, precisará antes reconhecer que seus gastos com pessoal têm pesado
mais para sua grave situação fiscal do que mostram os dados do próprio estado.
Avanços
Apesar desse
quadro, o Tesouro observou que a situação financeira dos estados melhorou no
ano passado, e eles conseguiram adiar menos despesas. Os atrasos e deficiências
que chegaram a R$ 19,9 bilhões em 2015 caíram a R$ 13,7 bilhões no ano passado.
'Diminuiu o grau de
postergação de despesas para o ano seguinte', avaliou. Segundo ela, houve um
esforço na contenção de despesas com servidores ativos, o que contribuiu para a
melhora nas contas. Em média, o gasto com a folha caiu 3,07% em termos reais em
2016 em relação ao ano anterior.
'O que observamos é
que a situação dos estados melhorou, mas isso não indica uma melhora
definitiva', concluiu.
Apesar dos esforços
dos estados para conter os gastos com servidores ativos no último ano, essa
despesa tem tido crescimento acelerado nos últimos anos. Na média, o avanço
real, já descontada a inflação, foi de 23,7% de 2010 a 2016.
Esse aumento no
gasto com a folha foi liderado por Mato Grosso, Minas Gerais e Rio de Janeiro,
onde essas despesas cresceram mais de 40% acima da inflação no mesmo período.
Na edição do
boletim com dados de 2015, oito estados estavam desenquadrados nos gastos com
pessoal segundo o Tesouro Nacional, mas apenas um reconhecia essa realidade.
Havia ainda a situação irônica do Tocantins, que dizia extrapolar o limite, o
que não ocorria de fato nas contas do governo federal.
Rombo
Os estados
declararam no ano passado um rombo R$ 30 bilhões menor na Previdência do que o
apurado pelo Tesouro Nacional. O boletim anual que será divulgado nesta
quintafeira mostra que os governos regionais informaram déficit de R$ 55 bilhões
com o pagamento de aposentadorias e pensões, mas o Tesouro detectou que o rombo
é de R$ 84,4 bilhões. A prática é condenada pelo Tribunal de Contas da União
(TCU).
Embora usem uma
contabilidade diferente, os estados referendaram os cálculos do Tesouro. A
União faz um acompanhamento anual das contas estaduais para a renegociação de
dívida. E, dentro desse programa de acompanhamento, os Estados admitiram que há
diferenças nas informações.
'Há diferenças de
apuração e precisamos trabalhar juntos pela convergência', destacou Ana Paula
Vescovi. 'Temos de estar na mesma página do ponto de vista contábil.'
O presidente do
Comitê de Secretários de Fazenda dos Estados (Comsefaz), André Horta, reconhece
que há divergências com o Tesouro sobre a classificação de determinadas
despesas, mas diz que os governos estaduais trabalham para adequar as
estatísticas. A renegociação da dívida dos estados previu alguns dispositivos
para tentar tornar essa contabilização menos desigual. 'O mais correto,
provavelmente, é algo entre os dois (modelos)', sugere Horta.
Gravidade
O mais grave é que
a conta para o futuro também está subestimada. Surpreendentemente, o rombo nas
contas da Previdência dos estados já é maior do que as previsões feitas para os
próximos anos pelos próprios governos regionais.
'As decisões do
presente podem estar sendo turvadas por essas estimativas, que estão
minimizando o problema', adverte a secretária do Tesouro. Na sua avaliação, o
retrato mais fiel da realidade dos estados ajuda na tomada de decisões para
resolver os problemas. Hoje, as dificuldades estão escondidas por números
irreais.
Metrópolis/DF
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