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(crédito: Ana Rayssa/CB/D.A Press) |
Número de trabalhadoras que deixaram de exercer
atividades remuneradas, por conta da pandemia, é bem maior do que o de homens.
Muitas não conseguirão voltar quando o pior passar
A taxa de desocupação entre mulheres (16,4%), no
quarto trimestre de 2020, foi maior do que entre homens (11,9%), segundo dados
da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, e apresentou
aumento em relação ao início de 2020, quando era de 14,5%. Mas o número que
chama mais atenção é o de pessoas fora da força de trabalho — aquelas que não
estão trabalhando nem tomando providência efetiva para conseguir emprego — que
cresceu de modo significativo durante a pandemia do novo coronavírus.
Pesquisadores apontam que essa é uma característica da
crise sanitária — o crescimento do número de pessoas que deixam a atividade por
doença ou por outros motivos, e não retornam imediatamente ao mercado de
trabalho. Dentre essas pessoas, as mais atingidas são as mulheres, sobretudo as
mães solos. Entre o quarto trimestre de 2019 e o mesmo período do ano passado,
6,6 milhões de mulheres deixaram a força de trabalho, enquanto no caso dos
homens, o número foi de 4,2 milhões.
Moradora de Guarulhos (SP), Susana Mattos, 29 anos, é
uma das brasileiras que está fora da força de trabalho. Ela perdeu o emprego em
abril do ano passado, em consequência de uma demissão em massa feita pela
empresa na qual trabalhava. Como estava empregada havia menos de seis meses,
não recebeu o seguro-desemprego, e a casa passou a depender 100% da remuneração
do marido, que cuida das despesas essenciais. Susana diz contar também com um
auxílio-merenda de R$ 80 e com doações. “Nossa alimentação é meio precária.
Apenas o básico”, diz.
Sem poder recorrer a creches, e com os filhos fora da
escola, devido à suspensão das aulas, ela passou a cuidar deles, ficando apenas
em casa, sem exercer nenhuma atividade remunerada. “Queria trabalhar, mas não
tenho com quem deixar meu filho mais novo, e tenho ficado com ele em casa desde
então. No começo da pandemia, fiquei bem perdida, me cobrava demais. Mas fiz
duas mentorias sobre organização do lar e gestão do tempo, e estou me saindo
melhor. Porém ainda fico muito triste por não ter encontrado uma saída, uma
outra renda. Me sinto incapaz”, conta.
Crise
atípica
A pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) Joana Costa afirma que “a crise econômica gerada pela pandemia
é muito atípica, por aumentar não só o desemprego, como a inatividade, em
especial, em relação às mulheres”. “Essa não é uma característica do Brasil; é
do mundo inteiro”, diz. Um dos fatores que explicam o fato de as mulheres
estarem em casa e sem procurar emprego é o fechamento de creches e escolas,
sobrecarregando o trabalho doméstico que, segundo a pesquisadora, por uma
questão social, acaba ficando sob responsabilidade maior das mulheres.
Com o vírus circulando, não é possível contar com
amigos ou familiares para ficarem com os filhos enquanto a mulher trabalha.
“Tudo isso contribui para que a mulher tenha sofrido um impacto maior no
mercado de trabalho com a crise”, relata. Joana frisa que as diferenças por
gênero no mercado de trabalho não foram criadas com a crise. “A crise só
reforçou a desigualdade”, diz.
Doutora em economia e professora da Faculdade de
Economia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Diana Gonzaga comenta que,
como ainda são atribuídas às mulheres boa parte das atividades domésticas,
muitas que são mães e que não puderam trabalhar remotamente acabaram desistindo
do emprego ou escolheram não retornar, entrando para a estatística do
contingente de pessoas consideradas “fora da força de trabalho” (inativas).
Apesar do agravamento das dificuldades enfrentadas
pelas mulheres, no ano passado, o Ministério da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos deixou de executar recursos, chegando ao final de 2020 com um
saldo de mais de R$225 milhões, como aponta um estudo do Instituto de Estudos
Socioeconômicos (Inesc). A assessora política do instituto, Carmela Zigoni,
explica que a análise observou o fenômeno ocorrendo mesmo em um cenário de
crise econômica e social.
Mais
afetadas
Daniela Freddo, professora do Departamento de Economia
da Universidade de Brasília (UnB), afirma que, entre as mulheres, as mais
afetadas são as mães de crianças pequenas. Pesquisa do IBGE aponta que
residências com crianças de até três anos de idade têm menor nível de ocupação
de mulheres. Neste cenário, a professora ressalta que, no caso das mulheres que
não são chefes de família, fica comprometida a independência que elas vinham
conquistando em relação ao marido como provedor.
Economista e pesquisadora do Ipea, Maria Andreia
Lameiras explica que a pandemia aprofundou as diferenças, e o caminho será mais
árduo rumo à igualdade no mercado de trabalho. Assim, quando a economia começar
a retomar o crescimento, e houver abertura de mais vagas de emprego, a mulher
demitida durante a pandemia, ou que teve que deixar a força de trabalho para
cuidar dos filhos ou familiares, irá concorrer com homens mais qualificados que
não deixaram o mercado. “A mulher com baixa qualificação, baixa escolaridade,
que estava sem trabalhar, vai demorar mais a ser absorvida”, diz.
Correio
Braziliense
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