Para
Romero Arruda, agilizar pagamento direto de emendas para Estados e municípios
pode custar 'caro' ao País
O pagamento direto de emendas parlamentares para Estados e municípios, as chamadas
transferências especiais, pode facilitar a corrupção e trazer
problemas para o manejo do dinheiro público, afirmou Romero Arruda, assessor de
orçamento do Congresso Nacional e analista do Instituto Nacional de Orçamento
Público (Inop), em entrevista ao Estadão/Broadcast. Ele apelidou
o repasse de 'PIX orçamentário'.
Ao aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), ontem, o Congresso
autorizou expressamente a transferência direta de recursos das emendas de
bancada para que governos estaduais e municipais apliquem em qualquer área, no
ano eleitoral de 2022, sem fiscalização do Tribunal de Contas da
União (TCU). O mesmo foi feito na LDO de 2021, mas o impasse foi parar no
Supremo Tribunal Federal (STF). A Constituição autoriza esse mecanismo apenas
para emendas individuais. Além disso, o modelo de repasse é
questionamento pela falta de transparência.
Confira os principais trechos da entrevista:
A transferência especial para emendas de bancada aprovada na LDO é
inconstitucional?
Acho válido o questionamento que já está no STF. É certo dizer que a
autorização de bancada serve para a LDO enquanto a transferência especial
obedece a um texto constitucional? A minha opinião pessoal é que não. Na
transferência individual, isso está lá no texto constitucional. Quando você vai
para a modalidade de bancada, além de ausência do texto constitucional
autorizativo, você tem a normatização da Resolução 1/2006 do Congresso
Nacional, que estabelece uma série de critérios sob os quais as emendas de
bancada precisam se adequar. Aí nós estamos falando de obras estruturantes. Uma
emenda de bancada é o avesso daquilo que se pretende com a transferência
especial.
As bancadas terão amparo para indicar emendas nessa modalidade no Orçamento de
2022?
O posicionamento do STF vai dizer muito sobre essa questão. O Congresso também
incluiu na LDO de 2021 a possibilidade de transferência especial de bancada, o
Executivo fez o veto e o Congresso resolveu derrubar o veto. Eu imagino que
agora, para a LDO de 2022, o roteiro tende a ser parecido. Em 2021, as bancadas
resolveram não arriscar, já que não há ainda um posicionamento do STF.
Alguém pode ser responsabilizado por executar o recurso nessa modalidade em
2022?
Temos aqui outro dilema. É o que chamamos no Direito de perigo da demora. Já há
manifestação do Ministério Público Federal de que o texto na LDO fere, sim, a
Constituição. Sem a formação de entendimento do STF, corremos o risco de ter
algum recurso público que seja executado nessa modalidade. É
importante que o STF se posicione porque ele pode trazer luz e facilitar a
tratativa da questão, seja para tirá-la do jogo ou para normatizá-la.
Por que o senhor chamou esse modelo de 'Pix orçamentário'?
O Pix trouxe agilidade, liberdade, menos burocracia. Quando tratamos do
CPF do cidadão, toda essa caracterização cheira a benefício. Mas, quando eu
trago isso para um dinheiro que é público, essa agilidade, essa liberdade, pode
ter um custo caro. Será que o preço de melhorar a agilidade e diminuir
a burocracia nas transferências da União para Estados e municípios é
abrir mão de transparência e controle? Tentar que a saída para a demora seja a
criação do PIX orçamentário pode nos custar caro.
Quais os riscos desse modelo? Pode gerar desvios de dinheiro público?
Quando você abre mão de controle, no mínimo o efeito pode ser o pensamento de
que seja mais fácil o mau uso do dinheiro público, ou seja, rasgado. Você
facilita a corrupção, esse é o perigo. Pode ter milhares que vão fazer bom
uso e vão de fato tentar trazer como benefício a história da agilidade, mas no
mínimo você facilitou a vida para quem queira fazer mau uso do dinheiro
público. Trazer um PIX como transferência e entregar na ponta, nos Estados e
municípios, uma total liberdade pode sim desencadear o mau uso, seja ele por
má-fé, ou seja, por corrupção, ou até mesmo por falta de preparo e
competência técnica no manejo desses recursos.
Daniel Weterman e
Lorenna Rodrigues, O Estado de S.Paulo
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