Associação da
Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da
União alerta para shutdown no
governo se o Orçamento de 2021 for sancionado pelo Planalto sem vetos, porque
tira recursos de despesas obrigatórias para bancar emendas parlamentares
Ainda sem uma definição sobre o futuro do Orçamento da
União em 2021, com entidades e políticos preocupados diante da demora para a
solução do impasse, a Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU) divulgou nota, ontem, na qual aponta apreensão com risco de
paralisação da máquina pública, caso a peça orçamentária seja sancionada sem vetos -- ou "sem o
devido controle de constitucionalidade e legalidade", como afirmaram os
auditores.
Economistas e especialistas da área frisam que a peça aprovada no Congresso é
um "orçamento de ficção", impraticável. Isso porque o documento não
prevê algumas despesas obrigatórias, como gastos com a Previdência, e tem um
valor total elevado, acima do montante de recursos disponíveis para pagar os
gastos que o próprio texto prevê, além de um volume significativo de verbas
direcionado a emendas parlamentares.
"Embora o Poder Legislativo desempenhe papel preponderante nas escolhas
alocativas, ele não é o único protagonista do processo orçamentário",
destaca a nota assinada pelo presidente da associação, Nivaldo Dias Filho; pela
vice-presidente, Débora Costa Ferreira; e pela segunda vice-presidente, Glória
Maria Merola da Costa Bastos, ressaltando ser necessário prevalecer "a
comunhão de vontade do Poder Executivo e do Legislativo".
Débora Ferreira disse ao Correio que a peça torna inexequível o Orçamento.
"Têm despesas obrigatórias que não podem ser cortadas como foi feito para
acrescentar em despesas não obrigatórias, que são as emendas
parlamentares", enfatizou. "É um retorno das maquiagens fiscais. Você
tira ainda mais a transparência, porque promete fazer um Orçamento que não tem
condição nenhuma de executar."
A vice-presidente explicou que o shutdown apontado pela associação é "a
completa insustentabilidade da relação de receita e despesa". "É como
você na sua casa começar a gastar com cheque especial e aí quebrar, porque o
banco vai parar de te emprestar dinheiro ou pegar tudo que você tem, com juros
altíssimo", comparou.
Responsabilidade
Na nota, a associação ressalta que, após sancionado o Orçamento, cabe ao TCU "fiscalizar, com
independência e imparcialidade, a sua execução à luz das regras
constitucionais". E comentou sobre a configuração de possíveis crimes de responsabilidade
por parte do governo federal. "Deve o Poder Executivo, na avaliação da
compatibilidade jurídico-constitucional do autógrafo que lhe foi submetido,
mensurar possível risco de descumprimento de regras constitucionais e/ou da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) no curso da execução orçamentária e financeira de
2021", apontou.
Cientista político e pesquisador da consultoria política Team Decipher, Carlos
Eduardo Novato de Carvalho disse que "as decisões relacionadas ao
Orçamento são políticas, apesar de existir um corpo técnico no Congresso".
"Além disso, o sistema de pesos e contrapesos permite que outros Poderes
interfiram nas decisões do Legislativo", destacou.
Governo tenta manobrar
Em meio ao impasse sobre o Orçamento de 2021, o governo estuda saídas para não
se indispor com o Congresso por eventuais vetos ao texto. Uma das opções
cogitadas, nos últimos dias, pela equipe econômica, é a elaboração de uma
proposta de emenda à Constituição (PEC) que autorize o Executivo a gastar mais
do que é permitido pelo teto de gastos -- norma que limita o crescimento da
despesa pública à inflação do ano anterior --, com algumas demandas pontuais,
sobretudo às que estão relacionadas ao enfrentamento da pandemia da covid-19.
A estratégia pode ser utilizada para viabilizar novas rodadas do Programa
Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e do
Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm). Os dois
projetos foram instituídos pelo governo federal, no ano passado, para garantir
empregos e evitar a falência ou o fechamento de empresas. De acordo com
integrantes do Ministério da Economia, outras despesas com saúde que envolvam o
combate à crise sanitária também podem ser incluídas na PEC.
O Executivo já reconhece a necessidade de retomar o Pronampe e o BEm, visto que
a restrição ao funcionamento do comércio por parte de alguns estados e
municípios, devido ao recrudescimento da pandemia, tem fechado postos de trabalho. A PEC, portanto,
possibilitaria que deputados e senadores indicassem emendas parlamentares para
bancar os dois programas e as demais demandas que o governo julgar necessárias
para o atual momento do país.
Em 2020, a aplicação do Pronampe e do BEm só foi possível por conta do decreto
de estado de calamidade pública, que permitiu ao governo federal aumentar o
gasto público e descumprir metas fiscais. Estabelecer um novo decreto está fora
de cogitação pela Economia. A pasta entende que a medida seria um "cheque
em branco" para qualquer tipo de despesa fora do teto, o que seria muito
perigoso para o futuro fiscal do país.
Por Augusto Fernandes, João Vitor Tavarez e Sarah
Teófilo, no Correio Braziliense
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