Carta pede ao STF que "assegure a liberdade de opinião e expressão bem como a inviolabilidade da liberdade acadêmica" |
Em carta ao STF, acadêmicos de várias universidades alemãs denunciam tentativa de intimidar Conrado Hübner Mendes e limitar a liberdade acadêmica e de opinião no Brasil. Professor é alvo de ações de Aras e Nunes Marques.
Um grupo de intelectuais de diferentes universidades
da Alemanha enviou uma carta ao presidente do Superior Tribunal Federal (STF),
Luiz Fux, em defesa do acadêmico e colunista do jornal Folha de S. Paulo
Conrado Hübner Mendes, alvo de ações na Justiça por seus textos.
Por diferentes artigos em sua coluna no jornal, Hübner
Mendes, que é professor de direito constitucional da USP e doutor em direito e
ciência política, foi pivô de duas ações: uma movida pelo ministro do STF
Kássio Nunes Marques, e outra pelo procurador-geral da República, Augusto Aras.
"Uma tentativa inaceitável de limitar a liberdade
acadêmica e de opinião", escrevem os acadêmicos na carta, endereçada a Fux
e com data desta terça-feira (03/08). "E não só de Hübner Mendes, mas das
vozes críticas de maneira geral", complementam.
"Hübner Mendes, jurista de ilibada reputação
internacional e intelectual público agudo e coerente, é ademais um importante
pilar das relações acadêmicas entre o Brasil e a Alemanha", afirma a
carta. "Com seus textos de opinião, ele presta um serviço cívico em defesa
das instituições democráticas e pela impessoalidade da justiça."
Em 24 de julho, o ministro Nunes Marques acionou o
chefe do Ministério Público Federal contra Conrado Hübner Mendes, sob o
argumento de que o colunista fez afirmações "falsas e/ou lesivas" à
sua honra, o que, na visão dele, podem configurar os crimes de calúnia, difamação
e injúria.
O ministro anexou no ofício o artigo O STF come o pão
que o STF amassou, publicado em abril na Folha de S. Paulo. Nele, o colunista
aborda a decisão do ministro que liberava a realização de cultos e missas no
país em meio a medidas restritivas relacionadas à pandemia de covid-19.
Sobre este caso, a carta dos intelectuais alemães diz:
"Nunes Marques foi criticado por Hübner Mendes por ter decidido, em ato
monocrático, liberar os cultos religiosos em um dos momentos mais graves da
pandemia que vem ceifando milhares de vida no Brasil. A decisão deste mesmo STF
de revogar a medida confirma que a crítica foi justa e oportuna. Mas, como a
decisão monocrática foi tomada pouco antes dos cultos de Páscoa, a suspensão da
medida não evitou que muitos se contagiassem durante as festas
religiosas."
Tomada na noite de 3 de abril, um sábado, a decisão
inicial de Nunes Marques foi derrubada pelo plenário do STF posteriormente, por
nove votos a dois.
"Tentativa
inaceitável de limitar a liberdade acadêmica"
Hübner Mendes também foi alvo de ações do próprio
Aras. O procurador-geral acionou o Conselho de Ética da USP com objetivo de
punir o professor da universidade, além de ter ajuizado na Justiça Federal do
Distrito Federal uma queixa-crime contra o acadêmico.
Em maio, Hübner Mendes havia criticado, em artigos e
postagem nas redes sociais, o procurador-geral por omissão e por servir ao
governo Bolsonaro.
Os acadêmicos alemães dizem que a crítica a Aras é
"contundente, mas fundamentada e objetiva". "As omissões do
procurador neste âmbito são sobejamente conhecidas, e a crítica proferida nos
parece justa e justificada", afirmam.
"As ações em curso contra ele têm, em nosso
entendimento, o claro sentido de intimidação e representam uma tentativa
inaceitável de limitar a liberdade acadêmica e de opinião não só de nosso
colega, mas das vozes críticas de maneira geral", diz o texto.
"Pedimos a esta Corte que, dentro de suas
incumbências constitucionais, assegure a liberdade de opinião e expressão bem
como a inviolabilidade da liberdade acadêmica tanto no caso particular do Prof.
Dr. Conrado Hübner Mendes quanto de todas e todos colegas que se manifestem
contra a instrumentalização da justiça brasileira para fins pessoais ou
projetos autoritários de poder", completa.
O texto é assinado por nove intelectuais da
Universidade de Freiburg, Universidade Livre de Berlim, Universidade de Bremen,
Universidade de Giessen, Universidade de Koblenz e Universidade Humboldt de
Berlim.
No fim de julho, uma carta aberta assinada por mais de
280 professores de universidades estrangeiras, na Alemanha, Espanha, Estados
Unidos, Reino Unido e outros países, já havia saído em defesa de Conrado
Hübner. O texto afirmava que perseguições como a sofrida pelo acadêmico podem
aproximar o Brasil de uma autocracia.
"Se a liberdade acadêmica for prejudicada e
intelectuais respeitados como o professor Conrado Hübner Mendes forem
ilegitimamente punidos, o Brasil dará mais passos rumo à autocracia e ao
autoritarismo, tornando ainda mais difícil deter essa tragédia", dizia o
manifesto.
Deutsche Welle
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