Após o TCU manifestar
'perplexidade' ao avaliar o chamado 'orçamento secreto', escândalo revelado
pelo Estado no início de maio, agora foi a vez de a CGU apontar 'risco
extremo de sobrepreço' nos convênios firmados pelo MDR para aquisição de
tratores e equipamentos agrícolas com recursos provenientes daquela artimanha
engendrada no Palácio do Planalto para comprar apoio congressual para o
presidente Jair Bolsonaro.
Para relembrar o caso: o governo federal se
assenhorou de ao menos R$ 3 bilhões do Orçamento da União para distribuir este
montante a parlamentares da base aliada - ou para cooptar quem dela ainda não
fazia parte - fora de quaisquer mecanismos de controle republicano. A um grupo
de deputados e senadores foi dado impor, secretamente, o destino de emendas
direcionadas a projetos fajutos ligados ao MDR. Grande parte destes recursos
foi destinada à compra de maquinário pesado por preços muito acima da tabela de
referência do próprio Ministério. Toda essa dinheirama foi direto para as bases
eleitorais dos parlamentares agraciados.
Na conclusão de um relatório de auditoria, os técnicos da CGU afirmam
que, 'diante dos fatos apresentados, e considerando que os convênios (do MDR)
verificados poderiam se enquadrar nas irregularidades relacionadas a
preços apontadas pela reportagem de O Estado de S. Paulo', foi possível
concluir que 'em uma amostra de 115 convênios', disseram os auditores, 'o risco
de sobrepreço foi considerado 'alto' (entre 10% e 25%) ou 'extremo' (25%) pela
equipe de auditoria'. No final do documento, a CGU admite que 'há
necessidade de melhorias e/ou implementação de novos procedimentos de controle
por parte do MDR' para novos direcionamentos de recursos provenientes de
emendas parlamentares.
Ao fim e ao cabo, foi muito bom para o País - e para o jornalismo profissional
- que esta tenha sido a conclusão de mais um órgão de controle que se debruçou
sobre a prática do 'orçamento secreto'. Convém lembrar que no fim de maio o
ministro-chefe da CGU, Wagner Rosário, afirmou que o 'orçamento secreto'
era uma 'mentira', uma 'ilação' do Estado. Rosário não foi a única autoridade
do primeiro escalão do governo federal a desqualificar não apenas a reportagem deste
jornal, mas o jornalismo profissional, a começar pelo presidente da República,
o maior beneficiário daquele cambalacho. Com seu jeito muito peculiar de lidar
com o que lhe desagrada, Bolsonaro chamou de 'jumentos' e 'idiotas' os
jornalistas desta casa que, por dever de ofício, lançaram luz sobre mais um de
seus desvios das leis e da Constituição. O então ministro-chefe da Casa Civil,
Luiz Eduardo Ramos, foi outro que classificou como 'mentirosa' a informação de
que a Secretaria de Governo (Segov), da qual era chefe, participou da
distribuição do butim à sorrelfa.
Diante das evidências cada vez mais robustas de práticas lesivas ao erário e à
moralidade pública, um grupo de parlamentares acionou o TCU para
pedir a suspensão de licitações que o MDR realizou no fim do ano
passado para comprar mais de 6. 240 máquinas pesadas com recursos suspeitos de
compor o 'orçamento secreto'. A CGU identificou sobrepreço de R$ 130
milhões nestes processos. Além disso, o senador Alessandro Vieira
(Cidadania-SE) e os deputados Tábata Amaral (sem partido-SP) e Felipe Rigoni
(PSB-ES) representaram à Procuradoria-Geral da República (PGR) para que
investigue o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e
Tiago Pontes Queiroz, responsável pela Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional
e Urbano, órgão que conduziu o processo de compra das máquinas.
A investigação do MDR já seria um bom começo. Mas já está claro que o
'orçamento secreto' se converteu em uma espúria 'política' de governo que se
espraiou por outros Ministérios, como da Agricultura, da Defesa e da Justiça e Segurança
Pública. Bolsonaro costuma pontificar que a verdade liberta. Que assim seja.
"São cada vez mais robustas as evidências de que ele é uma política de
governo"
O Estado de S. Paulo
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