Startups são requisitadas
para apresentar soluções para os desafios do mercado, enquanto Aneel discute o
aperfeiçoamento da resolução normativa do programa de P&D
O setor energético tem direcionado cada vez mais sua
atenção para os investimentos em inovação. Empresas têm aberto programas para
encontrar soluções de negócios, e a Aneel busca tornar o seu programa de
pesquisa e desenvolvimento (P&D) mais voltado à inovação.
Para ajudar as organizações a resolverem seus desafios
através de inovação colaborativa, a consultoria global Beta-i atente há 11 anos
clientes de diversos setores, mas sobretudo de energia. Original de Portugal, a
empresa começou a operar uma unidade em São Paulo no início de 2020. No último
ano, 260 startups entraram nos programas da empresa no país.
A CEO e co-fundadora da Beta-i Brasil, Renata
Ramalhosa, disse à Brasil Energia que o foco das em presas de energia em
relação a projetos de inovação tem sido principalmente na fidelização do
cliente, para serem mais que fornecedoras de energia. As companhias querem ter
soluções de mobilidade, eficiência energética e descarbonização, entre outros.
“Os sistemas regulatórios podem ser mais ou menos flexíveis para que a inovação
exista nos setores. No Brasil, isso foi muito visível no financeiro. O
regulador teve a capacidade de abrir o mercado para que a inovação fosse
naturalmente desenvolvida nas entidades financeiras. Isso fez com que as
startups da área, as fintechs, acompanhassem essa evolução”.
A especialista pondera que o programa de P&D da
Aneel tem sido uma ferramenta muito importante para desenvolver a parte de
pesquisa em áreas que são o futuro para a energia. “Mas menos eficiente para
responder os desafios atuais que são de curto e médio prazo. Desafios que
muitas vezes estão dentro da empresa, como desburocratização de processos,
tentar dar um serviço melhor para o cliente e a descarbonização do setor com
tecnologias que já existem".
Na avaliação de Renata, o programa da agência seria
mais beneficiado se permitisse uma flexibilidade maior de tempo para que as
empresas gastem os recursos. “Obviamente, dentro de regras claras e que
defendam o consumidor”, sinaliza. Ela espera que com um novo modelo regulatório
a inovação seja mais aberta, com o ocorre na Europa.
Revisão regulatória A Aneel recebeu até o último dia
20/12 contribuições à consulta pública para discutir o aperfeiçoamento da
resolução normativa e dos Procedimentos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação
(Propdi). A consulta foi aberta após uma análise técnica da agência identificar
a necessidade de elaborar uma nova regulamentação para a aplicação dos
princípios constitucionais e dos conceitos legais de inovação, que não estão
plenamente refletidos na regulamentação atual do programa de P&D.
Para Sandoval Feitosa, diretor da Aneel, apesar de ter
uma performance satisfatória no âmbito da ciência e tecnologia, o desempenho do
programa de P&D tem sido limitado em relação ao incentivo à inovação e à
aplicação prática na indústria. Pela proposta, as alterações na regulação do
programa terão vigência a partir de 1º de janeiro de 2023. Até lá, deverá ser
elaborado o primeiro Plano Estratégico Quadrienal de Inovação (PEQuI), voltado à
adaptação dos agentes à transição energética, à modernização desse setor e ao
desenvolvimento do país.
Os Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs) consideram
que as propostas de mudanças na normativa precisam ser revistas para que o
objetivo de estimular a realização de projetos mais inovadores e com potencial
de aplicação em indústrias seja atingido de forma mais eficaz. Alguns dos
pontos de mudança propostos pela agência são a definição de alocação de
recursos por instrumento de inovação; a contratação de startups; a devolução de
recursos em caso de cancelamento do projeto pela instituição pesquisadora; e
novas regras no processo de prestação de contas.
O presidente da Associação Brasileira das Instituições
de Pesquisa Tecnológica e Inovação (Abipti), que representa os ICTs, Paulo
Rogério Foina, considera que a resolução normativa apresenta uma evolução para
o setor e, com ajustes, pode impactar grandemente a sociedade. “Pesquisas
mostram que, para cada real colocado em pesquisa tecnológica, retornam 3,6
reais na form a de im postos para as três esferas de governo. Isso significa
que investimentos em pesquisa tecnológica em ICTs não são despesas, mas
investimentos. Além disso, geram um impacto 15 vezes maior na economia. Por
isso a importância nos ajustes da resolução normativa”.
As contribuições dos institutos para a proposta de
mudanças no Propdi podem ser resumidas nos seguintes pontos: assegurar a
participação dos ICTs na elaboração do PEQuI; equilibrar a participação de
diferentes instrumentos de inovação nos projetos; aplicar condições à
participação de startups para evitar conflito de interesse; flexibilizar a
devolução de recursos em caso de cancelamento de projeto; e simplificação dos
processos de prestação de contas. Com as mudanças sugeridas, as instituições,
que têm ampla vivência em projetos de P&D, visam garantir o equilíbrio
entre os atores do ecossistema de inovação do setor, o estímulo a projetos
baseados em tecnologias disruptivas, a diminuição da burocracia e o aporte de
recursos para o financiamento de projetos inovadores.
Transparência O Tribunal de Contas da União (TCU)
divulgou em meados de novembro do ano passado relatório apontando que a Aneel
deverá adotar as providências necessárias para dar maior transparência aos
projetos elaborados com recursos do seu programa de P&D. A análise foi
constatada em uma auditoria operacional, realizada sob a relatoria do ministro
Jorge Oliveira, para avaliar a política pública de investimentos em P&D no
setor elétrico brasileiro, instituída pela Lei 9.991/2000.
O tribunal ainda determinou que a agência deve elaborar
um relatório sobre o andamento da campanha de fiscalização para verificar a
regularidade dos recolhimentos dos recursos de P&D. As deliberações devem
ser atendidas dentro do prazo de 180 dias. Além disso, o TCU recomendou que a
Aneel incorpore indicadores que permitam aprimorar a avaliação do seu programa
de P&D, utilizando como base o referencial de controle de políticas
públicas do tribunal. Outra sugestão é que a agência reguladora realize a
fiscalização com enfoque na reversão das receitas das empresas do setor
elétrico em prol da modicidade tarifária. Isso poderia ser alcançado com a
comercialização de direitos de propriedade dos projetos realizados com
recursosdo programa.
Iniciativas corporativas Nos últimos meses, diversas
empresas do setor lançaram iniciativas voltadas à inovação. É o caso da Copel,
que lançou um projeto voltado para startups nacionais e internacionais, com a
pretensão de investir R$ 1,5 milhão no financiamento de cinco provas de
conceito e na geração de soluções voltadas ao mercado de energia, com o
objetivo de desenvolver novos negócios tanto para a Copel como para as empresas
contempladas. A Beta-i é a gestora deste programa, que envolve temáticas como relacionamento
com o cliente, com foco em soluções digitais; novas matrizes energéticas;
eletromobilidade e armazenamento de energia.
Já a Vibra Energia criou um hub de inovação aberta que
visa conectar startups e scale-ups (empresas com modelo escalável de
crescimento) para o desenvolvimento de soluções para os grandes desafios do
mercado. O projeto, denominado como Vibra co.lab, pretende investir entre R$
140 milhões e R$ 160 milhões em temas como mobilidade, conveniência, novas
fontes de energia e outras tecnologias emergentes.
A Energy Future, por sua vez, lançou um hub digital,
semelhante a um marketplace, com o objetivo de facilitar a conexão entre
empresas e fornecedores de soluções voltadas ao setor de energia. O projeto,
segundo a empresa, visa promover a troca e a colaboração na busca de soluções
tecnológicas incrementais e disruptivas, conectando empresas, institutos de
tecnologia, startups, consultorias e a indústria para expandir negócios e a
inovação no setor.
Líderes em inovação aberta A 100 Open Startups divulgou
em agosto de 2021 um ranking com as corporações líderes em inovação aberta com
startups no Brasil, as Top Open Corps 2021. Na categoria Top 5 energia
elétrica, as empresas premiadas foram a EDP, AES, Energisa, CPFL e Enel, que
juntas, foram responsáveis por 71% dos relacionamentos com startups
identificadas no setor. Ainda na categoria de energia, o ranking identificou 27
empresas que praticam inovação aberta com startups no Brasil, sendo que 14
delas se relacionaram com startups pela primeira vez no último ano. No total,
as corporações do setor estabeleceram 258 relacionamentos de negócios com 146
startups no período.
Já na categoria energias renováveis, as cinco empresas
que levaram o prêmio foram a Raízen, Neoenergia, Solvi, Engie e CTG Brasil. As
companhias foram responsáveis por 87% dos relacionamentos identificados no
setor. Nesta categoria, o ranking identificou 32 corporações que praticam
inovação aberta com startups no Brasil, sendo que 19 delas se relacionaram com
startups pela primeira vez no último ano. No total, as corporações do setor
estabeleceram 420 relacionamentos de negócios com 213 startups no período.
Thais
Custodio, Revista Brasil Energia
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