O Starship, da SpaceX, deverá ser
testado em órbita apenas em março, mas especialistas já dizem que ele deverá
ser o começo do fim para as empresas concorrentes.
Na noite desta quinta-feira (10/02), numa base de
lançamento em Boca Chica, no Texas, o bilionário fundador da SpaceX, Elon Musk,
deu uma atualização sobre o Starship, um poderoso foguete que alguns dizem que
transformará a indústria espacial de maneira que muitos sequer podem imaginar.
E essa falta de imaginação pode representar um problema para outros
concorrentes do setor.
"Neste momento, sinto-me altamente confiante de que
entraremos em órbita neste ano", disse Musk, referindo-se ao Starship.
O foguete estava em exibição nas instalações de teste
chamada Starbase durante o discurso de Musk. Localizado sobre o seu
impulsionador gigante, chamado de Super Heavy, o Starship mede quase 120 metros
de altura.
Isso o torna mais alto que Saturn V, o foguete da Nasa, a
agência espacial americana, de cerca de 110 metros de altura, usado para as
missões lunares Apollo nas décadas de 1960 e 1970, atualmente o maior foguete
operacional já usado. O Starship deve ser totalmente reutilizável e ter
capacidade de transportar mais de 100 toneladas para Marte e a Lua.
"Espera-se que os sistemas totalmente reutilizáveis
do Starship e Super Heavy permitam atividades
espaciais que antes não eram possíveis", escreve a SpaceX no guia de
usuário do Starship.
O Starship seria um grande passo em direção ao objetivo
da SpaceX de viabilizar a vida interplanetária. A enorme capacidade de carga
útil do foguete, juntamente com sua reusabilidade, pode mudar drasticamente as
questões financeiras referentes ao envio de seres humanos e objetos ao espaço.
O discurso de Musk focou nos desenvolvimentos técnicos do
Starship, mas ele permaneceu vago quanto aos projetos a empresa poderia estar
preparando.
"Haverá alguns anúncios futuros que vão deixar as
pessoas bem entusiasmadas", disse o empresário. "Muitos clientes
adicionais que vão querer usar o Starship. Eu não quero me antecipar, pois eles
farão seus próprios anúncios."
Explosões e acidentes
Em 2021, o projeto do foguete Starship recebeu um apoio
importante, depois que a Nasa ofereceu à SpaceX um contrato de 2,9 bilhões de
dólares para levar astronautas à Lua.
Isso ocorreu depois que, em 2020, a SpaceX se tornou a
primeira corporação privada a enviar astronautas ao espaço ao transportar
astronautas da Nasa para a Estação Espacial Internacional no Falcon 9, o
primeiro foguete reutilizável de classe orbital do mundo.
A atualização desta quinta-feira sobre a Starship foi a
primeira em mais de dois anos. O foguete havia sido programado para fazer seu
primeiro voo de teste orbital em janeiro ou fevereiro, mas houve um adiamento
devido a avaliações ambientais pela Administração Federal de Aviação dos EUA
(FAA, na sigla em inglês), além de alguns problemas de hardware.
Segundo Musk, ambos os problemas estarão resolvidos
dentro de alguns meses. Porém esta não foi a primeira vez que o projeto sofre
atrasos. "Vai soar totalmente louco, mas acho que queremos tentar alcançar
a órbita em menos de seis meses", contou Musk na última atualização sobre
o Starship, em 2019.
E ele tinha meia razão: o objetivo era irreal. Nos dois
anos que se passaram, os protótipos do Starship sofreram acidentes e explosões,
e o voo orbital não foi possível.
Para piorar as coisas, uma tempestade solar no fim de
semana destruiu dezenas de satélites que a SpaceX lançara na semana anterior,
destinados a integrar a Starlink, uma ampla rede de comunicações pela internet.
"Elevador" para o espaço
Musk ganhou a fama de estabelecer cronogramas
excessivamente ambiciosos, o que pode explicar por que grande parte do setor
espacial ainda não espera um Starship funcional, e tudo mais o que ele
representaria.
"Um Starship totalmente funcional tornaria todos os
sistemas de lançamento tão obsoletos, que eles poderiam nunca ter
existido", opinou, em entrevista à DW, Casey Handmer, físico e fundador da
startup de captura de carbono Terraform Industries, que escreve regularmente em
seu blog sobre os avanços das viagens espaciais.
O Starship poderia "permitir uma capacidade
logística de esteira rolante para a órbita baixa da Terra", escreveu Handmer.
Quem estiver em condições de explorar essa grande mudança prosperará, enquanto
todos os demais desaparecerão rapidamente na obscuridade, acrescentou.
Especialistas em finanças parecem concordar.
"Pensamos em foguetes reutilizáveis como
um elevador para a órbita baixa da Terra", declarou Adam Jonas, analista
de ações do Morgan Stanley, em comunicado, usando outra metáfora. "Assim
como era necessário mais inovação na construção de elevadores antes que os
arranha-céus de hoje pudessem pontilhar a linha do horizonte, também as
oportunidades no espaço amadurecerão por causa do acesso e da queda dos custos
de lançamento."
Investidores miram a Lua
O banco de investimento Morgan Stanley estima que a
indústria espacial global possa gerar mais de 1 trilhão de dólares em receitas
até 2040, acima dos 350 bilhões de dólares atuais. No curto e médio prazos,
grande parte disso provavelmente virá do acesso à internet de banda larga via
satélite, parte da assim chamada economia espaço-Terra.
Mas a consultoria McKinsey relata que tem aumentado
constantemente o investimento em projetos "lunares e mais além". Num
comunicado publicado em janeiro, indicou que tais iniciativas estavam atraindo
entre 10% e 15% de todo o investimento privado de empresas relacionadas ao
espaço – ou cerca de 1 bilhão de dólares. Uma década atrás, essa percentagem
era de menos de 5%. Assim, um foguete como o Starship desempenharia um papel
importante nessa guinada econômica.
E, até agora, não há muitas alternativas comparáveis ao
Starship e seus predecessores da SpaceX. Em dezembro, a empresa ganhou mais
três voos para a Nasa, enquanto a gigante aeroespacial Boeing continuava
lutando para resolver problemas com sua própria espaçonave Starliner. Ambas as
empresas assinaram contratos com a agência espacial americana para transportar
seus astronautas até a Estação Espacial Internacional.
A empresa espacial europeia ArianeGroup também tenta
recuperar o atraso: seu sistema de lançamento Maïa está programado para se
abrir ao mercado de lançamento de satélites em 2026 e está sendo projetado para
ser reutilizável.
Em tamanho, no entanto, ele será ofuscado pelo Starship e
poderá lançar apenas 1 tonelada métrica em modo reutilizável para a órbita
baixa da Terra – contra as 100 toneladas métricas planejadas para o Starship.
Curiosamente, o ministro das Finanças da França, Bruno Le
Maire, chamou o sistema de lançamento Maïa de "nosso Falcon 9",
comparando-o a um produto da SpaceX que se tornará obsoleto em 2026, se os
planos de Musk forem bem-sucedidos.
"Se não se tomar cuidado, a SpaceX será o único
player", disse Fatih Ozmen, cofundador da empresa aeroespacial americana
privada Sierra Nevada Corp., ao periódico Financial Times, em outubro.
Esta é, porém, uma longa conversa sobre um foguete que
ainda não completou um voo orbital de teste. E, se os contratempos da Tesla, a
empresa de carros elétricos e autônomos de Musk, nos mostraram alguma coisa, é
que grandes projetos podem levar tempo. Mas Musk e seus funcionários não querem
esperar muito.
"A SpaceX tem uma equipe de engenheiros e técnicos
qualificados, motivados e capazes em Boca Chica que trabalham 24 horas por dia
para criar esse futuro", relata Handmer. "Eles têm bons recursos e querem
ter êxito."
Kristie Pladson, DW
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