O principal evento esportivo de inverno do mundo
realizará sua 24ª edição praticamente sem neve - a natural, pelo menos.
Mais de 222 milhões de litros de água serão usados para
criar neve artificial para os Jogos Olímpicos
de Inverno de Pequim.
Serão os primeiros a contar quase 100% com neve
produzida por máquinas, mas não chegam a ser um ponto fora da curva.
Um relatório divulgado pelo Sport Ecology Group, que
reúne cientistas de todo o mundo em prol da sustentabilidade do esporte,
destacou que as mudanças climáticas causadas pelo aquecimento global ameaçam o
futuro dos esportes de neve e reduzem o número de locais adequados para futuras
Olimpíadas de Inverno.
O trabalho, realizado por pesquisadores ligados à
Universidade de Loughborough, no Reino Unido, e à organização Save Our Winters,
apontou que, dos 20 locais que já sediaram os jogos desde 1924, apenas 10
teriam a "adequação climática" e os níveis naturais de neve
necessários para sediar um evento em 2050.
Maddy Orr, uma das líderes do estudo, intitulado
Slippery Slopes, pontuou que Pequim não é a única cidade que enfrenta problemas
devido à falta de neve. "Esse é um problema recorrente em áreas
montanhosas ao redor do mundo."
Nas Olimpíadas de Inverno de Sochi, na Rússia, em 2014,
o equivalente a mais de mil campos de futebol foram cobertos com neve
artificial.
"Nosso objetivo não era apontar o dedo para
Pequim, mas queríamos ilustrar os desafios enfrentados pelo avanço dos esportes
de neve e quem sabe iniciar uma conversa sobre como os eventos esportivos podem
se adaptar a um clima em mudança", acrescentou a pesquisadora.
Pequim disputava com a cidade cazaque de Almaty a vaga
para sede dos jogos de 2022.
O Comitê Olímpico Internacional chegou a alertar em um
documento de avaliação da candidatura chinesa que as instalações do distrito de
Yanqing e da cidade de Zhangjiakou tinham "nível de precipitação de neve
anual mínima e dependeriam inteiramente de neve artificial".
Ao final, Pequim foi vista como uma aposta segura por
ter sediado as Olimpíadas de 2008.
Prejuízo
ambiental
A capital da China é uma das cidades com maior escassez
de água no mundo.
Fazer neve artificial, por sua vez, é um processo que
demanda muita água e energia - um obstáculo para o compromisso do país de
sediar jogos "verdes" com 100% de energia renovável.
Esse não é, entretanto, o único ponto controverso da
neve artificial.
O produto geralmente leva aditivos químicos ou
biológicos para melhorar sua qualidade e rendimento, retardando seu
derretimento, por exemplo. Assim, a água tratada quimicamente pode causar danos
à biodiversidade e à vegetação. O derretimento lento, por sua vez, pode
prejudicar o ciclo de crescimento das plantas.
Peter Speight, campeão britânico de freestyle e atleta
olímpico de inverno, acredita que a neve artificial não deve ser vista como uma
solução para combater as mudanças climáticas.
"É útil para criar neve física para as pessoas
usarem", disse ele. "Mas usa enormes quantidades de água e energia e
não ajuda a resolver as mudanças climáticas."
"Precisamos resolver as mudanças climáticas em vez
de depender de soluções focadas na mitigação."
Perigo
para os atletas
O relatório destaca ainda que os atletas correm maior
risco ao competir na neve artificial, que tende a criar uma superfície mais
dura e em que os equipamentos deslizam de forma mais rápida. Nesse contexto, a
ocorrência de quedas poderia levar a lesões mais graves.
A esquiadora britânica de estilo livre Laura Donaldson,
que competiu nos Jogos Olímpicos de Inverno de Salt Lake City em 2002,
concorda.
"Se os supertubos de estilo livre são feitos por
máquinas de neve em uma temporada fraca de neve, as paredes do tubo serão
sólidas, o gelo, vertical, e o piso do tubo, de gelo sólido", afirmou.
"Isso é perigoso para os atletas."
BBC
News
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