A desinformação e as teorias da conspiração têm proliferado nas mídias sociais durante a pandemia. Chá preto, folhas de nim e sopa de pimenta foram apontados como curas milagrosas para a COVID-19, na África e em outros lugares. Para combater essa infodemia, as plataformas digitais devem ser mais responsabilizadas, as notícias falsas devem ser rastreadas e denunciadas, e a alfabetização midiática deve ser desenvolvida.
Jornalista e pesquisadora de saúde do site de língua francesa Africa
Check, sediado em Dacar, no Senegal. A organização sem fins lucrativos é a
primeira organização independente de verificação de fatos da África.
A COVID-19, uma doença desconhecida até 2020, causou uma crise de saúde
mundial sem precedentes. Muitas questões sobre esse novo vírus ainda permanecem
sem resposta por parte dos cientistas – incluindo a natureza da imunidade
daqueles que foram infectados, a sazonalidade do vírus e sua capacidade de
mutação. Nossa falta de conhecimento sobre essa doença e sua evolução provocou
uma sede por informação, na África e em outros lugares. Também levou à proliferação
de rumores, notícias falsas e desinformação – com as redes sociais servindo
como caixas de ressonância disso tudo.
O escritório de língua francesa da Africa Check(link is external) tem
trabalhado para combater a desinformação desde o início do surto. Utilizando
especialistas e pesquisadores para verificar fatos e histórias, o site, sediado
em Dacar, publicou cerca de 50 artigos relacionados à COVID-19
Na ausência de tratamentos eficazes para a doença, artigos e mensagens
sobre supostas curas milagrosas proliferaram. Após pesquisas e alegações de um
médico francês especialista em doenças infecciosas, Didier Raoult, sobre o uso
da hidroxicloroquina como cura para a COVID-19, a informação de que as folhas
da árvore de nim continham cloroquina se espalhou pelo WhatsApp e pelo Twitter
em vários países da África Ocidental. Isso provocou uma corrida alucinada por
essas folhas. No entanto, o derivado do quinino não provém de uma planta, mas é
obtido por meio de síntese química. Da mesma forma, o chá preto, a sopa de
pimenta, a vitamina C e o alho também foram apontados nas redes sociais como
alimentos que ajudam a prevenir ou curar a doença. A Organização Mundial da
Saúde (OMS(link is external)) refutou essas alegações.
Teorias da
conspiração
Ao mesmo tempo, a epidemia levou à disseminação de imagens e vídeos que
foram manipulados ou retirados de contexto. Alguns deles alegavam, por exemplo,
que as campanhas de vacinação poderiam ser forçadas, e que, na verdade, elas
foram concebidas para espalhar o vírus. Outros buscam espalhar a discriminação,
enfocando, particularmente, cidadãos chineses. Um vídeo mostrando o incêndio de
um prédio comercial em Ibadan, capital do estado de Oyo, na Nigéria, foi
erroneamente retratado como uma represália contra seu proprietário chinês.
Contudo, um tweet do governo do estado de Oyo esclareceu que o prédio era, na
verdade, de propriedade de um nigeriano, e que 80% dos empregados no local eram
nigerianos.
Em uma tentativa espúria de explicar o surgimento da pandemia e sua disseminação,
histórias de uma conspiração ocidental contra a África foram divulgadas por
usuários de internet em todo o continente. Isso foi feito, em especial, por
meio da apropriação das palavras do secretário-geral das Nações Unidas, António
Guterres, que, em uma entrevista(link is external) à Radio France
Internationale (RFI), realizada em 27 de março de 2020, alertou que a COVID-19
poderia matar milhões na África sem uma ação imediata. A teoria sobre uma
vacina financiada pela Fundação Bill & Melinda Gates para controlar as
populações africanas também se espalhou como fogo. Essa informação não é apenas
flagrantemente falsa – é concebida de forma deliberada para induzir ao erro .
A circulação de rumores e suas consequências não é específica da crise do coronavírus.
Em 2014, notícias falsas provocaram resistência à estratégia de resposta para o
combate ao vírus ebola em alguns dos países afetados.
Em um artigo(link is external), “The ‘exceptionality’ of Ebola and popular
‘reticences’ in Guinea-Conakry” (A “excepcionalidade” do ebola e as
“hesitações” populares na Guiné), publicado em 2015 no jornal Anthropologie
& Santé, Sylvain Landry Faye explica que os primeiros casos de mortes
devido ao vírus em uma mesma família foram interpretados como um sinal de punição
mística, ou uma maldição provocada pelo cometimento de um roubo ou adultério.
Esses rumores alimentaram a crença de que a doença não era real – o que fez com
que comunidades desenvolvessem atitudes de rejeição à estratégia de resposta
adotada pelo Estado e seus parceiros para conter a epidemia. Outros rumores
retratavam os Centros de Tratamento do Ebola (Ebola Treatment Centres – ETCs)
como locais de contaminação – locais de morte, onde corpos e órgãos eram
traficados..
Preencher um
vazio
No caso do coronavírus, as redes sociais e aplicativos como o Facebook, o
Messenger e o WhatsApp deram às notícias falsas um impacto sem precedentes.
Além de fornecer acesso mundial às informações, essas plataformas também
permitem que todos os seus usuários adicionem ou produzam material e o façam
circular em tempo recorde. Publicado em 20 de abril (2020), o vídeo sobre o
incêndio em Ibadan foi compartilhado mais de 380 mil vezes em três dias.
Outros fatores também incentivam a circulação de rumores e notícias
falsas. No Senegal, por exemplo, o destaque dado pela mídia tradicional ao
número de pessoas infectadas pela COVID-19 e as mensagens sobre a melhor forma
de impedir a propagação do vírus não satisfizeram completamente as necessidades
dos cidadãos – que procuravam notícias mais positivas sobre possíveis
tratamentos. Então, as redes sociais foram utilizadas para preencher esse
vazio.
As notícias falsas, que geralmente circulam em grupos ou círculos de
indivíduos que pensam de forma semelhante, são facilmente consumidas e
consideradas como informação “de fonte confiável”. Mensagens de voz e de texto
são frequentemente atribuídas a personalidades, autoridades ou prestadores de
serviços hospitalares – que usam sua falsa autoridade para oferecer soluções
simples, como beber regularmente água quente ou salgada para desinfetar a
garganta. Os chamados líderes religiosos também podem desempenhar esse papel.
Nem sempre é fácil para o cidadão comum distinguir entre as informações da
mídia tradicional – que segue o rigor da coleta, do processamento e da
verificação das notícias – e as informações disponíveis nas redes sociais,
mesmo quando estas são claramente imprecisas ou enganosas. O desejo de acreditar
– especialmente em tempos de crise – pode ser maior do que o desejo de estar
informado.
Desenvolver o
pensamento crítico
A avalanche de notícias falsas nas redes sociais, que a OMS classificou
como uma infodemia, levou as plataformas digitais a lançar uma ofensiva para
conter a disseminação viral de informações falsas. Isso é realizado por meio da
promoção de conteúdo de fontes oficiais, ou da proibição de anúncios que
divulgam curas milagrosas. Jornalistas especializados em verificação de fatos,
como os da Africa Check e de outros sites de verificação de fatos em todo o
mundo, trabalham duro para corrigir fatos e garantir fontes confiáveis de
informação..
No entanto, vê-se claramente que esses esforços para conter a avalanche de
desinformação não são suficientes. Em maio, a ONU lançou a Verified(link is
external), uma campanha mundial que criará um quadro de “socorristas digitais”
para compartilhar informações atraentes, claras e precisas sobre a crise, bem
como para aumentar a conscientização sobre os riscos da desinformação.
Em 2019, o Facebook lançou uma nova ferramenta de sinalização, que permite
que os usuários do Instagram indiquem postagens que acreditam conter notícias
falsas. Também pode ser uma boa ideia envolver influentes blogueiros das redes
sociais para aumentar a conscientização e treinar seus administradores e
moderadores para combater as notícias falsas.
As iniciativas de sucesso podem ser replicadas. Um exemplo é a Wa FM(link
is external), uma estação de rádio da internet criada em março de 2020 para
combater notícias falsas sobre a COVID-19 na Costa do Marfim. Transmitida
principalmente pelo WhatsApp, ela depende de uma rede de aproximadamente 200
jornalistas voluntários, que andam pelas ruas de Yopougon – um bairro da classe
trabalhadora em Abidjan – cruzando informações a fim de corrigir notícias
falsas nas redes sociais, educar e conscientizar as pessoas.
Para combater as notícias falsas, é necessário utilizar os mesmos canais
que as divulgam e alimentam. Na África e em outros lugares, também é preciso
estimular o pensamento crítico dos cidadãos sobre as informações que recebem.
Isso pode ser feito incentivando-os a questionar as fontes de informação e a
identidade de seus autores. Sem esse tipo de educação midiática, as teorias da
conspiração e as notícias falsas continuarão a se espalhar sem controle.
Por Diomma
Dramé (https://pt.unesco.org/)
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