Dados oficiais divulgados nesta quinta-feira (18) pelo Unearthed, site de notícias do Greenpeace, mostram que Alemanha, França e Bélgica registraram de setembro a dezembro do ano passado a exportação para o Brasil de mais de 1.500 toneladas de inseticidas neonicotinóides, proibidos na União Europeia, por serem prejudiciais às abelhas.
Os produtos, dependendo da concentração nos insetos,
podem prejudicar a atividade locomotora, reduzindo a velocidade de voo, e
também afetar capacidade de as abelhas encontrarem fontes de alimento e de se
localizarem, levando ao declínio das colmeias ao longo do tempo.
Estudos científicos mostram que os neonicotinóides
afetam também as abelhas nativas.
A redução no número de abelhas por causa da
intoxicação por químicos usados na agricultura prejudica a produção e a
biodiversidade, já que elas são responsáveis por fazer a polinização de várias
espécies vegetais.
Além da União Europeia, as agências da ONU para saúde,
OMS, e para alimentação e agricultura, FAO, afirmam que há consenso crescente
de que é preciso "restringir severamente" o uso de neonicotinóides,
por representarem "alto risco ao meio ambiente".
Segundo a FAO, o número de insetos polinizadores está
em queda em várias regiões do mundo, em parte por causa do uso de produtos
químicos na agricultura.
No total, de acordo com os dados, oito membros do
bloco europeu e o Reino Unido emitiram planos para exportar 3.800 toneladas dos
produtos químicos a 65 países na América Latina, na África e na Ásia.
Com uma das legislações mais rigorosas em relação a
agrotóxicos, a União Europeia se comprometeu no ano passado a barrar a
exportação de químicos proibidos no bloco, ao lançar sua Estratégia de Produtos
Químicos.
Questionada na manhã desta quinta sobre a implantação
dessa barreira e os prazos previstos, a Comissão não havia respondido até as
15h30 (horário local, 11h30 no Brasil).
Para o Brasil, foram vendidos produtos com os
princípios ativos (imidacloprido, clotianidina e tiametoxam) reconhecidos como
tóxicos para as abelhas por análise feita pelo Ibama (Instituto Brasileiro de
Meio Ambiente e Recursos Naturais), publicada em março deste ano.
Os produtos vinham sendo reavaliados pelo órgão
ambiental desde 2012, após indicações de que eles poderiam ser prejudiciais aos
ecossistemas. O parecer foi enviado ao Ministério da Agricultura --consultado
sobre seu encaminhamento, o órgão não havia respondido até as 11h30 (horário do
Brasil).
De acordo com os dados do último trimestre de 2020, só
da Bélgica estava previsto o embarque de 2,2 milhões de litros do inseticida
Engeo Pleno S (baseado em tiametoxan), que, de acordo com o Greenpeace, seria
"suficiente para pulverizar várias vezes todo o território belga".
Do país saiu o maior volume desses químicos no período
analisado. Ao Unearthed, a ministra do Clima e Meio Ambiente, Zakia Khattabi,
disse que o governo belga estuda formas legais de acabar com as exportações de
produtos químicos proibidos.
Na França, o segundo maior exportador de
neonicotinóides proibidos (depois da Bélgica), lei nacional que proíbe as
exportações de pesticidas proibidos entra em vigor no início do ano que vem.
"É ultrajante que a UE continue a produzir e
exportar produtos químicos que consideramos muito perigosos para uso no
bloco", afirmou a eurodeputada alemã dos Verdes Anna Cavazzini,
vice-presidente da delegação para as relações com o Brasil.
Cavazzini diz que a União Europeia adota um
"duplo padrão, em detrimento das pessoas e a biodiversidade em países como
o Brasil": "O que é perigoso para os cidadãos e a fauna europeus é
muito perigoso para o resto do mundo".
Nesse "duplo padrão", o bloco europeu se baseia
na legislação do comprador para justificar a exportação de químicos proibidos
na UE, mas não considera regras estrangeiras em outras medidas ambientais, como
na proposta que bane importações de soja, carne e outras commodities, divulgada
nesta quarta (18).
O texto, que ainda será votado pelo Parlamento Europeu
e pelo Conselho (que reúne os líderes dos 27 membros da UE), proíbe que
empresas europeias importem produtos ligados a desmatamento, ainda que atendam
a leis ambientais que especificam corte de árvore legal ou ilegal (como é o
caso do Brasil).
Em outubro, eurodeputados franceses que se opõem ao
acordo comercial entre a UE e o Mercosul criticaram o uso no Brasil de
agrotóxicos proibidos pelo bloco --parte deles produzida no bloco e exportada
por seus países-membros, de acordo com os dados obtidos pela Unearthed por meio
das regras de liberdade de informação.
No total as exportações planejadas para os 65 países
continham 702 toneladas dos ingredientes ativos cujo uso ao ar livre foi banido
pela UE em 2018.
Além do Brasil, que lidera o volume importado, os
principais destinos de exportações, em peso de ingrediente ativo, foram Rússia,
Ucrânia, Argentina, Irã, África do Sul, Cingapura, Indonésia, Gana e Mali.
Estudo divulgado naquele ano pela Autoridade Europeia
para a Segurança dos Alimentos concluiu que "a maioria dos usos de
pesticidas neonicotinoides representou risco para as abelhas selvagens e
domesticadas, para zangões e espécies solitárias".
Segundo o especialista nesses insetos Dave Goulson,
professor de biologia da Universidade de Sussex, "parece não haver uso de
neonicotinóides em situações ao ar livre consideradas de baixo risco para todos
os grupos de abelhas".
Ao comentar o relatório, ele afirmou que o dano é não
apenas na pulverização, mas pela contaminação de safras subsequentes e de
flores silvestres nas margens do campo (nos dois casos, considerada de alto
risco).
Ana Estela de Sousa Pinto, Folhapress, no Yahoo notícias
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