“(...)‘a legitimidade do Estado Democrático está ligada a
um controle efetivo sobre a atividade financeira, pois a proteção dos direitos
e garantias individuais está diretamente relacionada ao fato de não haver
prepotência do Estado e os atos de seus dirigentes forem realizados em favor da
sociedade e direcionados ao bem comum(...)”
Em 7 de novembro de 1890, sustentado no ideal republicano de freios e
contrapesos, o Decreto nº 966-A criou, por iniciativa do notável Rui Barbosa, o
Tribunal de Contas da União (TCU). Cabia à nova Corte 'o exame, a revisão e o
julgamento de todas as operações concernentes à receita e despesa da Republica'
(art. 1º da norma), sendo que 'todos os decretos do Poder Executivo, ordens ou
avisos dos diferentes Ministérios, susceptíveis de criar despesa, ou interessar
as finanças da República, para poderem ter publicidade e execução, serão
sujeitos primeiro ao Tribunal de Contas, que os registrará, pondo-lhes o seu
visto"" (art. 2º da norma de criação, ortografia da época).
Foi, portanto, um nascedouro intenso e prontamente complexo, em que o
Tribunal exercia um controle prévio e preventivo sobre todo e qualquer gasto de
dinheiro público, podendo vetá-lo quando a previsão de dispêndio violasse
disposição legal ou excedesse os créditos autorizados pelo Poder Legislativo.
Após 130 anos, e tendo sido o modelo da União replicado nas legislações
estaduais e distrital, as Cortes de Contas vivenciam hoje um conjunto de
atribuições incrementado pela modernidade, visto, merecidamente, como
sustentador da democracia e dos valores republicanos.
Compete a elas não só julgar as contas de administradores e demais responsáveis
pelo trato com o dinheiro público, mas também apreciar atos de admissão e
aposentadoria na administração direta e indireta; realizar inspeções e
auditorias, ainda que de ofício; advertir órgãos e entidades sobre falhas
identificadas no exato cumprimento da lei; sustar a execução dos atos do Poder
Público impugnados, mesmo no início do procedimento apuratório, prevenindo a
ocorrência de dano ao erário; e apoiar o resgate de verbas públicas desviadas.
Esse tipo de atuação vem focado na boa gestão, não apenas para encontrar e
punir responsáveis, mas também para orientar acerca da correta modelagem e,
especialmente, na construção de soluções que viabilizem a legítima operação de
políticas públicas.
O Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), que, no mês passado,
completou 61 anos de edificante história, atua por exemplo na fiscalização da
eficiência das medidas de combate à covid-19, no acompanhamento de obras de
grande impacto para nossas cidades e na conferência da lisura dos concursos
públicos. Atividades de reconhecida importância para assegurar higidez,
probidade e eficiência à máquina pública.
E os reflexos da firme atuação do TCDF bem como do Ministério Público de
Contas, na melhoria das empresas públicas do Distrito Federal são visíveis,
constatando-se a implementação ou incremento de processos de gestão de riscos,
de estruturas autônomas de compliance, de auditorias internas operacionais e de
maior zelo como interesse público nas decisões cotidianas.
Apenas para destacar três delas, tem-se que a Terracap (Companhia
Imobiliária de Brasília) ganhou em todos os últimos cinco anos o prêmio de
Transparência Ativa concedido pela valorosa Controladoria-Geral do Distrito
Federal; a Novacap (Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil) atingiu
elevado grau de organização interna que lhe habilita a construir escolas e
hospitais de campanha; e o BRB (Banco de Brasília) tem alcançado sucessivos
recordes de lucratividade, revertida em benefícios à população, face à boa
gestão que produz alta credibilidade mercadológica.
A existência, a valorização e a plena operacionalidade das Cortes de
Contas são, portanto, requisitos essenciais ao profícuo e adequado
funcionamento do Estado; e as suas decisões, diretrizes e orientações servem
atualmente não só à fiscalização, mas também - e sobretudo - configuram norte
seguro sob os pontos de vistas jurídico e econômico para a atuação dos
condutores da administração pública e para a efetividade na implementação e
execução de projetos e programas que beneficiem os diversos setores da população.
Como conclui a profº Fernanda de Carvalho Lage, doutora em direito pela
Universidade de Brasília, em substancioso estudo sobre a natureza jurídica da
Corte de Contas (http://www.publicadireito.com.br/artigos/cod?=57e5cb96e
2254600), ‘a legitimidade do Estado Democrático está ligada a um controle
efetivo sobre a atividade financeira, pois a proteção dos direitos e garantias
individuais está diretamente relacionada ao fato de não haver prepotência do
Estado e os atos de seus dirigentes forem realizados em favor da sociedade e
direcionados ao bem comum’.
Leonardo Mundim,
no Correio Braziliense / Opinião
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