Um manancial de informações da máquina pública que
poderia ser útil ao próprio governo é mantido longe dos olhos da transparência.
O Executivo federal tem 930 bases de dados que já deveriam ter sido divulgadas,
mas permanecem em sigilo
segundo a Controladoria-Geral da União (CGU). Desse universo, 349 estavam
previstas para serem veiculadas ao longo da atual gestão, revela um
levantamento feito pelo GLOBO a partir do Painel de Monitoramento de Dados. A
área mais defasada é a do meio ambiente.
A falha em colocar esses materiais à disposição, segundo especialistas,
afeta a fiscalização e o monitoramento da administração pública por parte da
sociedade civil. Do total de bases atrasadas, destacam-se informações que
deveriam ser prestadas por unidades educacionais: 62 institutos ou
universidades federais sequer têm um plano de divulgação de seus dados.
O painel da CGU, atualizado até agosto deste ano, lista também 39 bases de
dados atrasadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que
monitora dados de desmatamento. O Ibama, por sua vez, tem outras dez bases que
já deveriam estar públicas e não estão. O instituto não publicou, por exemplo,
informações sobre comercialização e registro de agrotóxicos, tema caro ao
Palácio do Planalto.
Interesse
público
A legislação determina que, a cada dois anos, os órgãos federais elaborem
um plano de divulgação de suas informações consideradas de interesse público.
Segundo um estudo feito por organizações como o Instituto de Manejo e
Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Artigo 19 e Instituto
Socioambiental, sete dos dez órgãos com informações ambientais passaram 2020
sem esse plano, que só foi publicado em 2021. O Inpe está entre eles.
Procurado, o instituto disse que a atualização do plano está sob análise da
CGU. O Ibama não respondeu ao contato do GLOBO.
— E mesmo quando há o plano, com muita frequência, ele não é cumprido.
Temos duas bases na área de meio ambiente que foram as mais requisitadas pela
sociedade nas consultas públicas para produção do Plano de Dados Abertos. Uma
delas é a guia de trânsito animal. E eles não são disponibilizados — afirma
Bruno Valle, analista de políticas públicas do Imaflora.
No ano passado, segundo Valle, houve uma espécie de apagão: o Cadastro
Ambiental Rural passou quase um ano sem ser disponibilizado. Ele contém
informações sobre as propriedades rurais no Brasil e permitiria o cruzamento
dos locais em que há infrações na produção de gado com os locais onde há
queimadas e desmatamento.
Segundo Júlia Rocha, coordenadora de Acesso à Informação da organização
Artigo 19, diversos fatores contribuem para o atraso: o primeiro deles é de
infraestrutura. Durante o governo Bolsonaro, os sites da administração federal
foram transferidos para um único sistema. Ao longo da transição, entretanto,
muitos dados se perderam. Procurado, o Inpe foi um que justificou essa mudança
para a dificuldade de acesso a esses dados.
— A questão de infraestrutura sempre houve, mas o principal que acontece é
uma falta de vontade política — diz Rocha.
A dificuldade de acesso a informações públicas aumentou durante o governo
Bolsonaro. Neste ano, por exemplo, o Executivo federal impôs um sigilo de cem
anos nos registros de entrada e saída dos filhos do presidente no Planalto.
Dimitrius Dantas,
O Globo
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