Governo tenta manobra para financiar programa Renda
Brasil, perde a aposta e custo com fundo do ensino sai maior que o previsto
inicialmente.
“Foi um tiro no pé do governo”. Assim algumas fontes ligadas ao ministro Paulo
Guedes definiram a aprovação na Câmara dos Deputados do Fundo de Desenvolvimento e
Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). O texto, que
amplia o desembolso da União para o ensino dos atuais 10% para 23% até 2026 foi
aprovado após o governo propor um “puxadinho” na proposta inicial. Explico. No
sábado (18), a toque de caixa, o ministério enviou aos parlamentares um texto
que mudava o cálculo do Fundo. O pedido era de que os congressistas adiassem a
votação, que aconteceu na terça-feira (21), para 2022 e que até lá houvesse
fatiamento dos recursos, que seriam aplicados por meio do programa Renda
Brasil, que iria substituir o Bolsa Família. O texto foi a arma que a oposição
precisava para convencer o centrão que a medida seria mal vista em ano
eleitoral e abrir caminho para uma vitória esmagadora (499×7) em uma mudança na
Constituição que custará R$ 173 bilhões ao País em seis anos.
O motivo do gasto, no entanto, é bom. Trata-se de um fundo que dá garantia de
acesso à educação para mais de 17 milhões de crianças brasileiras que vivem em
cidades em que os recursos municipais não suprem as demandas do ensino. Com as
novas regras, 2.745 municípios receberão recursos adicionais da complementação
da União no financiamento do ensino, segundo cálculos do Todos pela Educação.
Hoje, a complementação da União só vai para nove Estados, considerando os
valores investidos em educação por cada governador. Isso significa que um
município pobre de um Estado rico fica sem receber a fatia extra. Uma cidade
rica de um Estado mais pobre, por outro lado, recebe a complementação.
Para se ter uma ideia de cifras, em 2019, o Fundeb possuía R$ 15,3 bilhões e,
segundo a Consultoria de Orçamento da Câmara, o aumento dos recursos destinados
ao Fundeb (que crescerá dos atuais 13% para 26% em seis anos) poderá ter um
custo total de R$ 173 bilhões até 2026, fator considerado problemático por
Paulo Guedes que tentou, por meio de sua equipe econômica, a manobra pouco
convencional de tentar adiar a votação e substituir o fundo por uma aplicação
no programa já anunciado, mas sem orçamento, Renda Brasil. Segundo uma fonte
próxima ao ministro, a manobra poderia ser considerada pedalada fiscal e
dividiu os assessores técnicos de Guedes. O plano, no entanto, foi abatido em
pleno vôo e o “puxadinho” do Fundeb morreu antes mesmo de nascer oficialmente.
O motivo para esse olhar atento ao recurso do Fundeb, que este ano deve ter
R$16,5 bilhões, é que ele não é carimbado pelo Teto de Gastos, permitindo que
haja aumento do valor sem ferir a lei que congela as despesas por 20 anos. Para
o economista e professor convidado da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFMG), Caio Cassin, a manobra de Guedes seria ruim para a educação. “Seria uma
medida eleitoreira e paternalista”, disse. A reportagem teve acesso à proposta
enviada pelo governo aos deputados, e nela continha informações que contradizem
o discurso liberal de um governo que quer diminuir a interferência nos Estados
e municípios. O texto deixa claro que o objetivo seria garantir o Renda Brasil,
que apesar de anunciado por Bolsonaro, não tem espaço no orçamento.
SENADO Com aprovação na Câmara, agora é hora do Senado avaliar o Fundeb.
Entre os senadores o discurso é de que o texto será chancelado com facilidade.
Segundo a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Simone Tebet
(MDB-MS), qualquer tipo de modificação no texto seria complexo de aprovar.
“Difícil fazer alteração para voltar para a Câmara. O texto já chegou
praticamente pronto, foram muitas modificações com a participação de todos os
partidos e isso está muito claro na votação da Câmara, que foi quase
unanimidade”, afirmou. Agora recai no novo ministro da Educação, Milton
Ribeiro, o desafio de resolver esse impasse entre Executivo e Legislativo e
tentar montar um novo Fundeb que atenda estados, municípios, parlamentares e
Guedes. Para Cassin, da UFMG, o recado da Câmara mostra a opinião do
Legislativo, também é sabida a opinião de Guedes. “Até agora ninguém tem ideia
de qual é o ponto de vista do Ministério da Educação”, disse.
Por Paula Cristina, na Revista
Isto É Dinheiro
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