O que se
sabe sobre os casos de reinfecção por coronavírus e por que eles não têm o
potencial de anular a imunidade trazida pela vacina
Há quatro meses, pesquisadores de Hong Kong
anunciaram a confirmação do primeiro caso no mundo de reinfecção pelo novo
coronavírus, em um homem de 33 anos que se contaminou novamente por uma
linhagem diferente do vírus num intervalo de quatro meses e meio. A descoberta,
que foi amplamente divulgada e publicada no periódico científico Clinical
Infectious Diseases, aumentou o desafio dos cientistas para tentar compreender
melhor o comportamento do vírus sars-CoV-2 e como enfrentar a Covid-19 ante
suas mutações. No Brasil, o Ministério da Saúde confirmou neste mês dois casos de reinfecção — o
primeiro, de uma profissional de saúde do Rio Grande do Norte que testou
positivo para o coronavírus 116 dias depois de receber o primeiro diagnóstico;
e o segundo, de uma mulher de Fernandópolis, no interior paulista, que testou
positivo 145 dias depois da primeira infecção. No mundo, já há 30 relatos de
reinfecção por sars-CoV-2 comprovados, segundo o rastreador mantido pela
agência de notícias holandesa BNO News.
Ao longo do ano que passou, a comunidade científica
e as populações mundiais ansiavam pelos testes de eficácia das vacinas
apostando que em 2021 os grandes desafios se dariam em torno da distribuição
dos imunizantes. Novas preocupações, contudo, se colocaram rapidamente: não só
passou a existir a possibilidade de reinfecção, como também surgiram novas
variantes do coronavírus, como a detectada há poucos dias no Reino Unido, e que
tem uma capacidade de disseminação até 70% maior do que os tipos mais
conhecidos do sars-CoV-2, sobretudo em decorrência da maior circulação de
pessoas. Esses dois fatos prenunciam que, a despeito de as vacinas estarem se
tornando realidade para grande parte das populações afetadas, o coronavírus
ainda não poderá ser considerado um inimigo inteiramente abatido no ano que
começará.
Além de Hong Kong e do Brasil, países como Estados
Unidos, Holanda, Peru, México, Bélgica e Equador confirmaram a reinfecção, o
que fez surgir questionamentos sobre quais são os riscos de uma nova
contaminação e qual o impacto disso no combate à pandemia nos anos que virão.
Embora as pesquisas sobre os possíveis casos ainda estejam em andamento, o que
se sabe até agora é que uma reinfecção pode acontecer, apesar de rara. “Os
casos estão comprovados e eles acontecem em todas as infecções virais. Não é
uma particularidade do coronavírus. E podemos dizer que, aparentemente, são
raros. Provavelmente ocorre um a cada 300 mil”, afirmou o imunologista Luiz
Vicente Rizzo, diretor de Pesquisa da Sociedade Beneficente Israelita
Brasileira Albert Einstein.
A ciência ainda não consegue explicar o que causa a
reinfecção — se é a diminuição da imunidade adquirida após a primeira infecção,
a mutação do vírus ou as duas coisas associadas. De acordo com Adriano Abbud,
diretor do Centro de Respostas Rápidas do Instituto Adolfo Lutz, alguns estudos
referentes à Covid-19 sugerem que a produção de anticorpos começa após dez dias
da contaminação e, por isso, ainda há dúvidas se pessoas assintomáticas ou com
sintomas leves chegam a desenvolver esse tipo de estratégia. “Ainda existem
algumas perguntas sem respostas, como a razão de algumas pessoas não
desenvolverem anticorpos após a primeira infecção, o que parece ser o caso nas
reinfecções pelo sars-CoV-2”, afirmou o pesquisador.
Até o momento, o Ministério da Saúde recebeu 58 notificações de
casos suspeitos de reinfecção por Covid-19, em nove estados brasileiros. As
amostras coletadas são analisadas em um dos três laboratórios de referência
nacional para casos de coronavírus no país: no Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da
Fiocruz, no Rio de Janeiro; no Instituto Evandro Chagas (IEC), em Belém; e no
Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo. Segundo a pesquisadora Paola Cristina
Resende, do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do IOC/Fiocruz,
para ser confirmada a reinfecção por Covid-19 é necessário que o caso suspeito
apresente dois resultados positivos de RT-PCR (o exame do cotonete no nariz) em
tempo real para o vírus, com intervalo igual ou superior a 90 dias entre os
dois episódios de infecção, independentemente da condição clínica observada.
Para que a confirmação ocorra, as respectivas
amostras clínicas precisam ser encaminhadas para o laboratório de referência
para confirmação dos resultados preexistentes. “Não basta o paciente ter um PCR
positivo para ser considerado um caso de reinfecção. Além de dois resultados
positivos nos exames RT-PCR dentro do intervalo de tempo mínimo de 90 dias, é
preciso fazer análises complementares, entre elas o sequenciamento do genoma
completo do vírus, quando possível, ou até mesmo o isolamento viral com cultura
de células. Mas isso é muito difícil de ser feito, pois nem sempre conseguimos
amostras de boa qualidade referentes à primeira infecção”, explicou a
pesquisadora, sugerindo que esses complicadores podem resultar em alguma
subnotificação nos casos de pessoas que desenvolvem pela segunda vez a doença.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu esse
intervalo porque alguns pacientes infectados podem continuar excretando
partículas virais por até quase 60 dias. Assim, uma nova confirmação de
infecção num período mais curto significaria que o paciente ainda pode ter
rescaldos da primeira, e não uma nova infecção. “No caso de não haver diferença
nas sequências obtidas das duas amostras do paciente, não é possível confirmar
a reinfecção, pois poderia ser uma reinfecção pela mesma variante do sars-CoV-2
ou, por exemplo, uma redetecção do mesmo agente encontrado em período
anterior”, explicou Abbud, do Instituto Adolfo Lutz.
Além da dificuldade de conseguir amostras com
qualidade, o descarte de exames pelos laboratórios responsáveis pela primeira
coleta também dificulta o trabalho.
Sem as amostras da primeira infecção, os cientistas não conseguem sequenciar os
genomas dos vírus que podem ter infectado os pacientes para confirmar que se
trata de duas infecções distintas, o que é considerado essencial para
publicação em periódicos científicos internacionais. “A demanda para diferentes
tipos de exames é muito grande e as amostras precisam ficar armazenadas em
baixas temperaturas. Há casos de hospitais e laboratórios que não possuem
capacidade de armazenamento por longos períodos e as amostras acabam sendo
descartadas dentro de 30 a 60 dias depois da coleta. Isso acaba dificultando
o trabalho”, disse Resende,
do IOC. Diante dessa dificuldade, afirmou, é possível que existam outros casos
de reinfecção no país, mas que não conseguirão ser comprovados por meio de
análise laboratorial.
No caso da paciente do Rio Grande do Norte, por
exemplo, as amostras da primeira infecção foram coletadas na Paraíba e enviadas
para a Fiocruz, onde os testes do RT-PCR em tempo real foram repetidos e, além
disso, foi possível fazer o sequenciamento genômico viral da amostra,
comprovando que se tratava de uma nova infecção por uma mutação diferente no
genoma do vírus. “Nesse caso específico, confirmamos que a paciente se
contaminou por linhagens diferentes do vírus. Mas não significa que para ser
uma reinfecção precisa ser de linhagem diferente. Basta ter mutações pontuais,
mesmo que pequenas, que caracterizem diferenças entre uma cepa e outra”,
explicou a pesquisadora.
Um fator que tem confundido muitos pacientes é a
crença de que houve uma segunda infecção sem um diagnóstico feito pelo exame de
RT-PCR na primeira vez. O imunologista Rizzo, do Einstein, contou que nas duas
últimas semanas foi chamado para investigar cinco casos de suspeitas de
reinfecção, todos negativos. “Na primeira suposta infecção, após sintomas
leves, esses pacientes fizeram testes de anticorpos. Na segunda infecção, com
sintomas mais fortes, fizeram o RT-PCR, que deu positivo, e todos acreditaram que
foram reinfectados. Grosso modo, muito provavelmente, a primeira atividade de
anticorpos foi uma reação cruzada por problemas semelhantes ao coronavírus, mas
não se tratava de uma infecção por Covid-19”, afirmou Rizzo.
Apesar das dúvidas relacionadas aos casos de reinfecção, ainda não há indícios
de que mutações possam interferir na imunização. “As mutações dos vírus existem
para defendê-los de nosso sistema imune, e os vírus fazem isso o tempo todo.
Mas o que sabemos até o momento é que essa não é uma estratégia comum do
coronavírus. As mutações têm ocorrido por outros motivos, e não para se livrar
do sistema imune. Assim, isso não significa que as vacinas não vão funcionar”,
disse Rizzo. Abbud, do Adolfo Lutz, reiterou que ainda não há evidência científica
de que as diferentes linhagens de vírus demandariam novas respostas imunes. “É
bem provável que neste momento as linhagens circulantes sejam todas suscetíveis
às vacinas”, avaliou.
Em razão da baixa
recorrência de reinfecção e do advento das vacinas, pesquisadores hesitam em
fazer alarde sobre a possibilidade de pessoas voltarem a adquirir a doença num
ritmo mais rápido que o da imunização. Acreditam que a importância de estudar e
identificar os casos de reinfecção está, do ponto de vista científico e
epidemiológico, em entender a dinâmica do vírus na população, como ele se
comporta quando comparado com outros vírus respiratórios, por quanto tempo dura
a imunidade nos pacientes infectados e se esses pacientes produzem anticorpos
neutralizantes. Não se trata, pelo menos ainda, de uma nova tormenta.
Por Fernanda Bassette, na Revista
Época
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