Em janeiro do ano de 2022...
Ícone da luta contra o apartheid morreu aos 90 anos. Cerimônia de despedida foi marcada pela ausência de ostentação - seguindo instruções deixadas pelo arcebispo.
Desmond Tutu foi um "cruzado pela liberdade, justiça e paz", disse o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, durante o funeral oficial realizado neste sábado (01/01) no qual os sul-africanos tiveram a oportunidade para se despedir do arcebispo emérito, uma figura notável da luta contra o sistema racista do apartheid.
Com uma missa de réquiem celebrada na Catedral
Anglicana de São Jorge, na Cidade do Cabo, a África do Sul se despediu de Tutu,
que morreu no dia 26 de dezembro naquela mesma cidade aos 90 anos.
Ramaphosa destacou o apoio do arcebispo a uma longa
lista de causas, o que levou "grupos de ativistas do clima e
LGBTQIA+" a homenagear aquele que foi "um ser humano humilde e
corajoso que falou pelos oprimidos (...) de mundo", disse o presidente.
Seguindo a vontade de Tutu, que havia pedido que não
fosse gasto dinheiro desnecessariamente em seu funeral, o caixão escolhido foi
um modelo de madeira simples.
A leitura do sermão na cerimônia coube ao ex-bispo
Michael Nuttall, um amigo próximo. Ele lembrou que Nelson Mandela descreveu
Tutu como "a voz dos que não têm voz", uma voz "às vezes
estridente, muitas vezes terna, nunca assustada e raramente desprovida de
humor".
O caixão havia permanecido na catedral pelos dois dias
anteriores, para que milhares de pessoas pudessem prestar homenagens. Na
cerimônia deste sábado, estiveram presentes amigos íntimos, como a
ex-presidente irlandesa Mary Robinson; a viúva de Nelson Mandela, Graça Machel;
Letsie III, o rei do vizinho Lesoto; a
viúva do último presidente branco do país, FW de Klerk; além de um
representante do Dalai Lama, que não pôde comparecer devido à sua idade
avançada e às restrições da covid.
Naomi Tutu, filha do arcebispo, agradeceu as
expressões de carinho recebidas durante esses dias. "Nós compartilhamos
(Tutu) com o mundo e vocês compartilharam conosco um pouco do amor que sentimos
por ele", disse a filha de Desmond Tutu, visivelmente emocionada.
Para o seu funeral, o pastor Tutu escolheu, para sua
última mensagem, a passagem do Evangelho segundo João em que Jesus se dirige
aos seus discípulos depois da última ceia. Uma mensagem de amor.
"Meu mandamento é este: Amai-vos uns aos outros
como eu vos amei."
Trajetória
Ao lado de Nelson Mandela, Tutu foi uma das vozes mais
importantes contra o antigo regime da minoria branca conhecido como apartheid.
O clérigo anglicano também chefiou a Comissão de Verdade e Reconciliação do
país na era pós-apartheid. Ele era visto por muitos como a consciência de uma
nação conturbada.
Tutu ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1984 por seus
esforços para liderar a luta não-violenta contra o apartheid.
Enquanto outros líderes, como Mandela, foram
encarcerados, Tutu viajou e discursou amplamente, usando seu cargo importante
na Igreja Anglicana e a estima que o Prêmio Nobel da Paz trouxe para promover
sua mensagem anti-apartheid em todo o mundo e valorizar as histórias e vidas
dos sul-africanos negros.
Depois da libertação de Mandela da prisão, após 27
anos detido, Tutu o conduziu a uma varanda na prefeitura da Cidade do Cabo,
onde Mandela proferiu seu primeiro discurso público.
Tutu comparou a votação nas primeiras eleições
democráticas do país em 1994 a "apaixonar-se". Quando Mandela tomou
posse como o primeiro presidente negro do país, Tutu estava ao seu lado.
Sonho de uma "nação
arco-íris"
Enquanto Tutu pregava contra a tirania do apartheid,
ele continuava a ser igualmente crítico em relação às elites políticas negras
após a queda do regime branco.
Ele até criticou publicamente seu aliado Mandela sobre
o que o clérigo descreve como uma "mentalidade de trem da alegria" do
partido de Mandela, o Congresso Nacional Africano. Mais tarde, Tutu também
condenaria Mandela por seu caso com Graça Machel, com quem Mandela depois se
casaria.
Em 2013, Tutu retirou seu apoio ao partido de Mandela,
descrevendo a África do Sul como "a sociedade mais desigual do
mundo". Em seus últimos anos, o arcebispo falou com pesar que o sonho de
uma verdadeira "nação arco-íris" ainda não havia sido realizado.
jps (AFP, dpa, Reuters), DW
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