O Supremo Tribunal
Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm em seus acervos nove
processos que podem ter um impacto total de mais de R$ 500 bilhões para a
União, ao longo dos anos. Sete deles estão destacados no anexo de Riscos
Fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, aprovada em
dezembro pelo Congresso Nacional.
No anexo de Riscos
Fiscais são apresentadas as ações com impacto financeiro mínimo de R$ 1 bilhão
com avaliação de perda "possível". As perdas "prováveis"
devem ser provisionadas pela Secretaria do Tesouro Nacional, seguindo o Ofício
nº 171, de 2014, do Tribunal de Contas da União. O relatório pondera que nem
sempre é possível estimar com clareza o valor real envolvido nas demandas
judiciais.
Os temas mais
representativos seguem os indicados na LDO de 2016. A ação de maior valor é a
que discute, no Supremo, a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da
Cofins. Poderá gerar impacto nos cofres públicos de R$ 250 bilhões,
considerando-se o intervalo entre 2003 e 2014. O julgamento, em repercussão
geral, ainda não foi iniciado.
No STJ tramita uma
outra disputa bilionária: o conceito de insumo para a obtenção de crédito de
PIS e Cofins. O julgamento foi iniciado pela 1ª Seção. Por enquanto, há quatro
votos contra a interpretação restritiva adotada pela Receita Federal e um a
favor. A seção é composta por dez ministros. O impacto pode chegar a R$ 50
bilhões.
A coordenadora da
atuação da ProcuradoriaGeral da Fazenda Nacional (PGFN) no STF, Alexandra
Carneiro, espera que três temas sejam incluídos na pauta do primeiro semestre.
Somente um deles está indicado na LDO - ICMS na base do PIS e da Cofins.
Outra ação que a
PGFN espera ser julgada discute a possibilidade de incidência de PIS e Cofins
sobre as receitas de instituições financeiras. A discussão, não listada na LDO,
é antiga e o impacto é calculado em R$ 26,9 bilhões, considerando apenas o ano
de 2016, e em R$ 135,69 bilhões para os últimos cinco anos. O julgamento ainda
não foi iniciado no Supremo.
Há também a expectativa
de que seja retomado o julgamento sobre o direito a créditos de IPI na
aquisição de insumos isentos provenientes da Zona Franca de Manaus. A análise
foi suspensa no ano passado por um pedido de vista do ministro Teori Zavascki
após três votos a favor do creditamento. Zavascki já liberou o processo - não
incluído na LDO - para retomada do julgamento. O impacto é de R$ 11,4 bilhões
apenas para o ano de 2016, podendo chegar a R$ 46,2 bilhões tendo em vista os
últimos cinco anos.
Para especialistas,
seria possível antecipar um resultado para os julgamentos. O comportamento dos
ministros em temas de interesse da União pode ser traçado com base no
presidente que os indicou, segundo pesquisa conjunta do coordenador do Centro
de Estudos em Negócios do Insper, Paulo Furquim de Azevedo, com Felipe Lopes,
da Escola de Economia da FGV. Foram analisados cerca de mil julgados até 2013,
especialmente recursos especiais de matéria tributária.
O estudo mostrou
que ministros indicados por presidentes mais liberais, como Fernando Collor e
Fernando Henrique Cardoso, teriam a tendência a votar contra o Estado, em
oposição aos indicados no governo Lula. De acordo com Azevedo, a posição do
ministro não indica alinhamento partidário, mas ideológico. Ministros indicados
durante o governo Lula não mudavam a inclinação pró-Estado ao julgar casos do
Estado de São Paulo, comandado pelo PSDB, por exemplo.
"É um
alinhamento de visão de mundo, não é de dívida ou gratidão a quem o indicou ao
cargo", diz. Azevedo chama esse comportamento de "efeito
preferência": a visão de mundo do ministro faz com que ele tenha uma
preferência e escolha com base no que acha mais correto. "Os ministros
indicados pelos governos Lula e dos militares tendem a ter um comportamento
mais pró-Estado. Os do FHC e Collor, mais antiestado", afirma Azevedo.
Outra conclusão foi que o STF tende a ser mais favorável à União do que o STJ.
"O STF tem, de fato, uma relação mais politizada [que o STJ], tanto que há
casos de ex-ministros que se tornaram ministros de Estado."
Na composição
atual, oito ministros foram indicados durante os governos do PT. Entre os três
restantes, o ministro Gilmar Mendes foi indicação de Fernando Henrique Cardoso,
Marco Aurélio Mello do presidente Fernando Collor e Celso de Mello de José
Sarney. "O STF está com uma composição de indicações que tendem a ser
pró-União. Além disso, independentemente da indicação, o STF já tem um perfil
mais protetor da União do que o STJ", afirma Azevedo.
Outro ponto
observado nos julgamentos que envolvem a União é a possibilidade de modulação
da decisão. Por meio do mecanismo, os ministros podem determinar a partir de
quando vale a decisão, geralmente para impedir impacto retroativo. Nem sempre o
pedido de modulação é aceito.
De acordo com
pesquisa da professora Tathiane Piscitelli, da FGV, a linha que vem sendo
adotada pelo STF para modulação é de que só é possível quando se declara a
inconstitucionalidade. Esse critério, acrescenta, é aplicado de forma
sistemática. Na hipótese de prejuízo da Fazenda a orientação que prevalece é
que os contribuintes que já ajuizaram ação para pedir a restituição de tributo
deveriam ter o direito preservado. Quem não ajuizou, não seria restituído.
"Você preserva quem entrou com a ação. Mas no médio prazo judicializa tudo",
afirma.
Tathiane defende
uma discussão mais profunda sobre a necessidade de provas dos valores
apresentados no anexo de Riscos Fiscais, uma vez que os números podem
influenciar os julgamentos. "O STF tem uma posição técnica em matéria
tributária. Mas percebo que nos casos de impacto, a repercussão nas contas
públicas é considerada de maneira subliminar", afirma.
Por Beatriz Olivon,
Valor Econômico
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