Enquanto as atenções se voltam à Copa do Mundo e parlamentares negociam a PEC de Transição, avança no Congresso uma série de pautas de impacto ambiental.
Desde o início do Mundial no Qatar,
houve andamento na tramitação de pelo menos cinco propostas defendidas por
ruralistas e criticadas por ambientalistas na Câmara e no Senado.
Nesta terça-feira (29), a CRA
(Comissão de Agricultura) do Senado deve tentar, pela segunda vez em menos de
uma semana, votar o PL do Veneno -que libera mais agrotóxicos e diminui o
controle sobre eles.
Em pleno dia da estreia da seleção
brasileira, na última quinta (24), a CRA tentou deliberar sobre o projeto, mas
a oposição conseguiu adiar a decisão.
Já a proposta que isenta o Estado de
responsabilidade na fiscalização sanitária do agronegócio, aprovada na comissão
em junho, já tem seu relatório pronto e aguarda ser pautada no plenário do
Senado. Tentando evitar que isso aconteça, a oposição conseguiu, na quarta
(23), aprovar uma nova sessão de debates sobre o tema (que deve acontecer em
dezembro).
Apelidada por críticos de PL do
Autocontrole, a proposta determina que o controle sobre o armazenamento de
produtos, como a carne nos frigoríficos, fica a cargo da iniciativa privada.
As duas propostas integram a série de
pautas de impacto ambiental que, como mostrou a Folha de S.Paulo, são
criticadas por especialistas ao mesmo tempo que tramitam de forma acelerada ou
sem apreciação por todas as comissões temáticas, como a do Meio Ambiente.
Na Comissão de Meio Ambiente da
Câmara dos Deputados, avançaram três propostas criticadas por ambientalistas e
que têm tramitação conclusiva -ou seja, não precisam passar pelo plenário,
apenas pelos grupos temáticos. Elas flexibilizam o Código Florestal e a Lei da
Mata Atlântica.
Para especialistas ouvidos pela
reportagem, o andamento dessas propostas acontece não somente porque as
atenções da política e da população estão voltadas à PEC da Transição e para a
Copa do Mundo.
Os aliados de Jair Bolsonaro (PL)
tentam avançar os projetos enquanto ainda não contam com eventual resistência
do governo federal -o que pode acontecer quando Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
assumir o poder.
"Os ruralistas têm pressa em
aprovar projetos que estão em fase final de tramitação, e que podem ainda ser
sancionados por Bolsonaro neste fim de ano. É o saldão do governo na sua reta
final, tentando aprovar projetos que só os beneficiam", afirma Luiza Lima,
assessora de políticas públicas do Greenpeace.
"É uma espécie de xepa de final
de feira", concorda Kenzo Jucá, consultor legislativo do ISA (Instituto
Socioambiental). "O PL do Veneno foi colocado em pauta no dia da estreia
do Brasil na Copa, algo completamente inusitado na história legislativa para
uma matéria com tantos interesses envolvidos."
A reportagem procurou o presidente da
Comissão de Agricultura do Senado, Acir Gurgacz (PDT-RO), mas não teve resposta
até a publicação deste texto
Presidente da Comissão de Meio
Ambiente da Câmara, Covatti Filho (PP-RS) discorda das críticas e diz que,
durante a COP27 (conferência do clima das Nações Unidas, realizada no Egito),
chegou a retirar da pauta alguns temas sensíveis, em respeito a deputados que
estavam no evento e não poderiam acompanhar o debate em Brasília.
"Desde antes do período
eleitoral já tínhamos combinado que iríamos colocar na pauta todas as matérias
disponíveis para votação. Essa situação da Copa do Mundo é uma desculpa que não
tem lógica. Na pauta temos vários projetos de interesse tanto de ambientalistas
como do pessoal que defende a agricultura", afirmou ele.
De acordo com o deputado, a cobrança
sobre a tramitação dos temas não tem fundamento, uma vez que houve acordo para
que eles fossem deliberados.
O principal projeto que avançou na
Câmara é o que flexibiliza as regras de proteção à mata atlântica. Na prática,
ele concede anistia a uma série de desmatamentos e ainda abre espaço para que
mais florestas tenham a derrubada autorizada.
O relator do texto era o deputado
Nilto Tatto (PT-SP), que recomendou a reprovação da proposta. No entanto, o seu
parecer foi derrubado na sessão, e o tema avançou mesmo assim.
Agora, o projeto vai para a Comissão
de Constituição e Justiça e, se aprovado lá, já vai para o Senado, sem precisar
passar pelo plenário da Câmara --a não ser que haja recurso.
Essa mesma tramitação pode acontecer
com os outros dois projetos aprovados na última sessão: um que permite a
criação de reservatórios de água e barragens dentro de APPs (áreas de
preservação permanente) para uso da agropecuária e irrigação e outro que mais
que dobra a quantidade anual de madeira que pode ser extraída de reservas
florestais em pequenas propriedades rurais --de 15 m³ para 40 m³.
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