Temer vai acelerar
venda de terras da União a assentados
Reforma Agrária. Presidente edita MP para entregar 280 mil
títulos de domínio até o fim de 2018; propriedade será paga em 10 anos e poderá
ser comercializada após o período
O presidente Michel
Temer editou uma medida provisória para agilizar a concessão de títulos de domínio
para assentados e acelerar a venda de terras da União para beneficiários do
Programa Nacional da Reforma Agrária. A meta de Temer é entregar 280 mil
documentos até o fim de seu mandato, em 2018. Serão priorizados os
assentamentos já existentes - são 9.332 mil em todo o País, onde vive 1 milhão
de famílias.
A MP 759/2016, em
vigor desde sexta-feira passada, altera a política de reforma agrária
implementada pelas gestões Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva
e Dilma Rousseff. De acordo com informações do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (Incra), entre 2000 e 2002, a gestão tucana
emitiu 62.196 títulos e, de 2003 a 2015, os governos petistas reduziram as
emissões para 22.729. Se cumprir a meta proposta, Temer expedirá, em dois anos,
12 vezes mais titulações do que as gestões do PT.
A proposta que
ainda será analisada pelo Congresso Nacional prevê que o assentado pague pelo
lote para receber o título de domínio. Os ocupantes que ainda não têm a
titulação e não pagaram pelo lote terão de regularizar o pagamento para ter a
posse definitiva. Os pagamentos serão parcelados em até dez anos, mas também
podem ser quitados à vista. A base de cálculo será a Planilha de Preços
Referenciais (PPRs) do Incra, com desconto variável entre 20% para os lotes
maiores e 60% para as áreas menores. Após dez anos da concessão, o assentado
poderá negociar a terra.
A MP permite que o
beneficiário ocupe cargo, emprego ou função pública, desde que após sua seleção
e homologação. A medida mantém a proibição para ingresso na reforma agrária de
agentes públicos, mas apenas até a aquisição do lote. A medida libera o já
assentado para, por exemplo, prestar concurso público ou concorrer a cargos
eletivos.
Em razão de um
acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU), que identificou distorções na
distribuição de lotes, como agentes públicos entre os beneficiários, o Incra
estava impossibilitado de encaminhar o processo de titulação. Em setembro, com
a suspensão do bloqueio pelo TCU, o órgão deu início ao levantamento das
famílias que estão aptas à titulação. Os primeiros 300 títulos foram repassados
a famílias do Assentamento Mercedes I e II, em Tabaporã, em Mato Grosso, no dia
29 do mês passado, sem a presença do presidente.
Critérios. A MP muda também os critérios de cadastro
e seleção das famílias beneficiárias, excluindo do processo a necessidade de o
assentado estar acampado, o que na prática elimina a intermediação dos
movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),
historicamente ligado ao PT. A medida foi antecipada pelo Estado no dia 8 de
outubro.
Família mais
numerosa, família que reside há mais tempo no município do projeto de
assentamento e família chefiada por mulher são algumas das prioridades das
regras para escolha dos beneficiários da reforma agrária. Caberá aos municípios
a organização dos projetos de assentamento.
Além de destoar da
política de reforma agrária de seus antecessores, Temer quer transformar a
titulação de terras na marca da nova gestão do Incra - será a “reforma da
reforma agrária". De acordo com o instituto, a titulação é importante por
dar segurança jurídica aos assentados, além de possibilitar acesso a políticas
públicas do governo. Com o documento, o assentado pode recorrer ao Programa Nacional
de Agricultura Familiar (Pronaf) e a bancos públicos ou privados para financiar
a produção.
Novos assentamentos. Segundo o Incra, a MP define também
as formas de aquisição de terras para criar novos assentamentos, embora, em
momento de ajuste fiscal, a prioridade do governo seja reorganizar e
regularizar os assentamentos existentes.
Neste ano, assim
como no ano passado, o governo federal não adquiriu terras para novos
assentamentos. Nos últimos dias de seu governo, a presidente cassada Dilma
assinou 25 decretos de desapropriação de imóveis rurais para a reforma agrária
e regularização de territórios quilombolas, totalizando 56,5 mil hectares, mas
o processo não avançou.
O Incra informou
que os decretos assinados por Dilma não tinham previsão orçamentária. “Em 2015,
a ex-presidente não assinou nenhum decreto de desapropriação para fins de
reforma agrária”, informou o órgão, em nota. “O congelamento dos recursos da
reforma agrária não se deu no atual governo.” Segundo Alexandre Conceição, da
coordenação nacional do MST, um decreto legislativo articulado com o governo
suspendeu os decretos para atender à bancada ruralista. “Com o fim do MDA
(Ministério do Desenvolvimento Agrário), as políticas públicas do ministério
também foram reduzidas, sendo transformado em uma secretaria sem estrutura e
orçamento para a execução de políticas para a agricultura familiar.”
Críticas. Em nota divulgada pelo MST, Miguel Enrique
Stédile, da coordenação nacional, afirmou que a titulação é uma “reforma
agrária às avessas”, que ampliara a concentração de terras. “Hoje, os
beneficiários recebem a concessão do uso da terra, podendo passá-las para os
filhos, mas não podem mercantilizar porque a terra é da União, afirmou. “Com a
titulação, os assentados se tornam proprietários, porém, terão de pagar o preço
de mercado atualizado das terras que receberam. Ou seja, o assentado vai ficar
com a dívida e, sem infraestrutura para produzir, em pouco tempo venderá a
terra.”
• Conflito
“Hoje, os
beneficiários recebem a concessão do uso da terra, podendo passá- las para os
filhos, mas não podem mercantilizar.” Miguel Enrique Stédile, coordenador do MST
“O congelamento dos
recursos não se deu no atual governo.” Presidência do Incra, em nota
José Maria Tomazela, em O Estado de S. Paulo
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