Do Deutsche Welle
Relatório vê
avanços no acesso ao ensino entre a população mais pobre, elogia o Fundeb como
uma política de sucesso e diz que a solução dos problemas passa pela
valorização dos professores.
Nenhum dos seis
objetivos estabelecidos pela Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) será cumprido globalmente até 2015,
segundo o Relatório de Monitoramento Global Educação para Todos. O
levantamento, divulgado em Brasília e em Adis Abeba, na Etiópia, aponta que 250
milhões de crianças não conseguiram aprender o básico na escola primária e que
um quarto da população jovem do mundo não é capaz sequer de ler parte de uma
frase.
Apontado diversas
vezes como exemplo positivo, o Brasil conseguiu atingir as metas de
"educação primária universal" e "habilidade de jovens e
adultos", mas ainda precisa avançar para melhorar a qualidade do ensino e
diminuir os índices de analfabetismo.
Treze milhões de brasileiros não sabem ler nem escrever, o que faz do
Brasil o oitavo país com maior número de analfabetos.
"O grande nó
crítico do país é a qualidade da educação, especialmente em relação ao
aprendizado. O aluno está na sala de aula, mas não aprende. É uma exclusão
intraescolar: 22% dos alunos saem da escola sem capacidades elementares de
leitura e 39% não têm conhecimentos básicos de matemática. De qualquer maneira,
não podemos negar os grandes avanços que o Brasil apresentou", afirma
Maria Rebeca Otero, coordenadora de educação da Unesco no Brasil.
O Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb) é visto como uma política de sucesso. O
relatório diz que o fundo aumentou em 20% a frequência escolar entre as
crianças mais pobres e elevou o número de matrículas, especialmente no norte do
país. "O Fundeb é tido como um exemplo para o mundo, mas devemos destacar que a gestão dos
recursos ainda é muito deficitária", avalia Otero.
A Unesco critica o
fato de as políticas sociais e educacionais não reduzirem a disparidade de
investimento por aluno no país. Em 2009, o Estado gastou 611 dólares por aluno
do ensino primário na região Nordeste, metade do que é investido em um
estudante do Sudeste. O mínimo de gasto para uma educação adequada seria 971
dólares por aluno, diz a publicação.
Valorização dos professores
É necessário
treinar os professores e oferecer a eles uma remuneração adequada, afirma a
Unesco.
O relatório,
intitulado Ensinar e aprender: atingindo a qualidade para todos,
destaca que cerca de 10% do gasto na educação infantil no mundo é perdido
devido às falhas no sistema de ensino. A crise global do aprendizado custa aos
governos 129 bilhões de dólares por ano. "No estágio atual, os países
simplesmente não podem reduzir o investimento em educação", ressalta o
texto.
A Unesco conclui
que a valorização dos professores pode mudar esse cenário e faz um alerta aos
governos para que ofereçam melhores condições de trabalho a esses
profissionais.
"É preciso atrair melhores
candidatos e preencher as vagas. Eles precisam ser treinados para entender as
necessidades das crianças e também ser valorizados, com melhores salários e
planos de carreira", diz Otero.
O especialista em
políticas públicas de educação Erasto Fortes, membro do Conselho Nacional de
Educação, afirma que o governo deve se comprometer a construir uma política
nacional de formação de professores e oferecer programas de especialização,
como prevê o Plano Nacional de Educação (PNE). "O piso salarial, que é
muito baixo, também precisa corresponder à média paga a outros profissionais
que tenham o nível de formação de ensino superior. Ainda assim, estados e
municípios têm recorrido à Justiça para fazer com que essa lei não tenha
vigência, em função de dificuldades orçamentárias", critica.
De acordo com a
Unesco, será necessário recrutar 5,2 milhões de professores em todo o mundo até
2015.
Ainda sem um Plano Nacional
A dura realidade de ser professor no Brasil
Faltam docentes em várias disciplinas e jovens não têm interesse em
seguir a profissão, que paga baixos salários e é uma das menos valorizadas pela
sociedade. Plano Nacional de Educação pode ser uma saída.
Lei destina
royalties do petróleo brasileiro para saúde e educação
O Brasil está sem um Plano Nacional de
Educação desde 2011. O primeiro, aprovado em 2001, teve vigência de dez anos. O
novo texto que tramita no Congresso Nacional estabelece 21 metas para aprimorar
a educação no país. "O problema principal a ser considerado é o prazo. O
Congresso ainda não cumpriu com sua competência de aprovação do plano e precisa
ser mais ágil", considera Fortes.
O PNE foi aprovado
no Senado em dezembro de 2013, mas, como houve modificações, o texto voltou
para a Câmara dos Deputados. A nova versão é alvo de críticas de movimentos de
educação, que veem um tom "privatista" nas mudanças.
Como exemplo do
impacto do novo texto aprovado pelos senadores, o especialista em financiamento
da educação José Marcelino de Rezende Pinto explica que o Fies, que permite ao
estudante financiar as mensalidades das instituições privadas, e o Prouni, que
oferece bolsas de estudo em universidades particulares, seriam considerados
gastos públicos. "É muito pior, porque infla o gasto e considera todos os
repasses ao setor privado como gasto público. É o velho artifício de incrementar o gasto educacional", diz.
O coordenador
geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, teme que o PNE
não seja aprovado na Câmara antes das eleições, em outubro.
"Durante todo o processo, o governo
federal tentou protelar a votação. Se a pressão das eleições não fizer com o
que o governo aprove o plano, o debate pode ficar para 2015 ou 2016. É um
momento muito delicado", avalia.
Financiamento da educação
Pressionado pelos
protestos de junho do ano passado, o Congresso Nacional aprovou em setembro a
destinação de 75% dos royalties do petróleo para a educação. Para Marcelino, os
recursos não serão suficientes para bancar a elevação de 10% do PIB para gastos
em educação, como prevê o PNE.
No relatório, a
Unesco estabelece que o mínimo a ser investido é 6% do PIB. De acordo com a
entidade, o Brasil destina 5,9%. Segundo Marcelino, esse parâmetro
internacional não pode servir de comparação. "Países ricos gastam cerca de
6% do PIB, mas o montante deles é muito maior. O que deve ser analisado é o
gasto por aluno. Os Estados Unidos, por exemplo, investem seis vezes mais do que o Brasil", diz.
O especialista argumenta que, para cumprir a
meta de 10% do PIB para educação, o Congresso deverá fazer um grande esforço
orçamentário. "O próprio ministro da Educação, Aloísio Mercadante, admitiu
que os royalties não seriam suficientes. Agora, tudo depende da batalha dos
deputados. Só o petróleo não dá. Acho que o exemplo da Copa é interessante:
quando se precisa de dinheiro, ele aparece."