A última década não foi nada fácil para
a Motorola. A fabricante americana pioneira na telefonia celular teve cinco
presidentes e trocou de mãos duas vezes: foi vendida ao Google em 2011 e,
depois, à chinesa Lenovo em 2014. A competição acirrada com a Apple, com a
sul-coreana Samsung e com as novatas chinesas Huawei e Xiaomi só complicou o
cenário, e a Motorola teve uma sequência de resultados negativos.
Foi nesse ambiente que o brasileiro Sergio Buniac assumiu a presidência global da Motorola em abril de 2018, em busca de uma virada. Buniac, que está na empresa desde 1996, cortou custos, reduziu o intervalo de lançamento de smartphones e focou seus maiores mercados: a América do Norte, a Europa Ocidental e, principalmente, a América Latina, onde a Motorola é a segunda maior fabricante, atrás da Samsung.
A estratégia deu certo. No ano fiscal de 2019, encerrado em março, a Motorola teve o primeiro lucro anual em dez anos, e os números têm sido positivos desde então. Em entrevista a EXAME, Buniac conta como a experiência no Brasil ajudou a Motorola a prosperar mundo afora.
A Motorola foi comprada pelo Google em 2011 e vendida à Lenovo em 2014. Como isso afetou a empresa?
O Google nos deu uma forte cultura de mercado de consumo. Antes, nosso foco estava em clientes comerciais. Já a Lenovo trouxe a força da cadeia de fornecimento, por ser uma companhia global, algo que nos dá um potencial ilimitado.
Por que o lucro virou raridade na Motorola na última década?
Os anos sem lucro deixaram um sentimento de frustração entre os funcionários. Por mais que cortássemos custos, não conseguíamos bons resultados. A estrutura de custo nunca era reduzida. Se diminuíamos o gasto em pesquisa, aumentávamos em marketing. Desse modo, as perdas se perpetuaram.
Como a empresa fez a virada para a lucratividade?
Alinhamos os custos com nossa expectativa de lucratividade. Mudamos processos, reduzimos nossa presença em países nos quais não éramos lucrativos e diminuímos o número de produtos e componentes. Fora isso, nos voltamos para o desejo do consumidor, fazendo muitas pesquisas de opinião. Nos negócios, focamos regiões como América Latina, Estados Unidos e Europa Ocidental. Fomos cautelosos em mercados emergentes. Com isso, melhoramos trimestre a trimestre.
Foi preciso mudar a estratégia de produtos da Motorola?
Sim. Antes, tínhamos as linhas Moto E, Moto G, Moto X e Moto Z, que ganhavam novos modelos perto de datas tradicionais de vendas. No último ano, criamos o Motorola One e aceleramos o ritmo de lançamentos. Na segunda geração dele, sete meses depois, usamos um processador da Samsung pela primeira vez. Três meses depois, o terceiro modelo chegou com uma câmera de ação.
Em setembro, já lançamos um celular com zoom óptico. E vamos lançar mais produtos até o fim do ano, seguindo o ritmo acelerado de inovação do setor. Em 18 meses, a empresa reduziu 35% do tempo entre um projeto inicial e o lançamento do produto.
O senhor é o primeiro brasileiro a liderar uma empresa de celulares no mundo. Como avalia isso?
Estou na empresa há muito tempo. Quando liderei a operação da Motorola na América Latina, de 2012 em diante, a região virou uma das mais rentáveis. A ideia da Lenovo foi levar a mentalidade de lucro para o nível global.
A experiência no mercado brasileiro também ajudou?
Sim. O Brasil é um mercado difícil. Quem vence aqui está pronto para encarar 95% dos demais países do mundo. O país sempre esteve entre os três maiores mercados, tanto em volume quanto em faturamento.
A Samsung lidera o mercado brasileiro de celulares. A Motorola almeja o topo?
Nossa meta não é aumentar a participação de mercado. Se isso acontecer, será uma consequência do trabalho para aumentar a satisfação dos clientes. Estamos há cinco anos em segundo lugar em número de vendas no Brasil e temos crescido anualmente, com calma e estabilidade.
Qual foi o maior caso de sucesso recente da Motorola?
Foi a linha Moto G. Desde 2013, vendemos 40 milhões de unidades só no Brasil. Mas a família de produtos que mais cresce agora é a Motorola One.
Qual é sua expectativa para o mercado global de celulares?
O mercado se retrai agora pela primeira vez, e isso é natural. O setor cresceu muito em pouco tempo. Embora mais lento, o mercado deve voltar a crescer. Minha expectativa para 2019 é levemente positiva.
A conexão 5G ajudará o setor?
O impacto vai variar de país para país. Mas não vejo a retomada do crescimento global ligada a essa tecnologia.
Como enfrentar as chinesas Huawei e Xiaomi, que crescem a ritmo acelerado desde o ano passado?
Apesar de ser chinesa, a Lenovo é uma empresa global, presente em 137 países. Não estamos focados na concorrência.
O que esperar da Motorola além de smartphones?
Temos alguns projetos piloto, como um televisor com sistema operacional Android que lançamos na Índia. Estudamos outras categorias, mas mantemos o foco primário no smartphone.
O que fazer para que a empresa se mantenha lucrativa nos próximos anos?
Não posso dar detalhes. Mas o que já anunciamos, no passado, é que o objetivo era ter lucro por quatro ou seis trimestres e, depois disso, voltar a crescer, entrar em novos mercados e continuar a inovar.
Por Lucas Agrela, na Revista Exame
Para saber mais, clique aqui. |
Para saber mais, clique aqui. |