A Holanda é de fato um país incrível, multicultural e com grandes lições para ensinar a outros que se interessem, inclusive ao Brasil.
Quero compartilhar a
análise de como os holandeses combinam os temas inovação, blockchain e
coalizão. No início de 2019, li uma reportagem sobre como a Holanda conseguiu
reduzir o tempo de abertura das empresas de 13 semanas para 13 minutos. Essa
resposta é o ponto de partida para qualquer pessoa que se interessa por
desenvolvimento econômico e inovação.
De
forma resumida, tratava-se de uma entrevista com Marloes Pomp, chefe de
projetos de blockchain do governo da Holanda. Pomp destacava como o país estava
investindo em blockchain, uma tecnologia que é considerada ainda recente, mas
com grande poder de transformação nos serviços prestados por governos.
A
leitura daquele conteúdo despertou em mim o interesse em conhecer a fundo a
iniciativa holandesa. Graças a uma colega de trabalho, que realizou o contato
com a Marloes Pomp, consegui, após três dias, uma videoconferência com ela.
Gentilmente ela tirou minhas dúvidas e explicou como funcionava o Dutch
Blockchain Coalition e o papel do governo holandês.
O
Dutch Blockchain Coalition (DBC) é a forma como a Holanda resolveu encarar o
desafio de inovar utilizando uma tecnologia com potencial disruptivo. A DBC é
uma joint venture que reúne o governo, as instituições de conhecimento e o
setor privado. O objetivo da instituição, segundo o seu site, é 'desenvolver
aplicativos de blockchain confiáveis, robustos e socialmente aceitos, criar as
melhores condições possíveis para permitir o surgimento de aplicativos de
blockchain e utilizar o blockchain como uma fonte de confiança, bem-estar,
prosperidade e segurança para cidadãos, empresas, instituições e órgãos governamentais'.
A DBC é a primeira iniciativa mundial de coalizão entre governo e iniciativa
privada para a construção de soluções em blockchain.
Diversos
autores e pesquisadores de blockchain colocam que essa tecnologia tem potencial
de transformar a forma como o governo opera. Mas afinal, o que é blockchain?
Provavelmente você já ouviu falar sobre blockchain relacionado à bitcoin,
todavia blockchain vai muito além das criptomoedas.
Segundo
no sumário executivo do Tribunal de Contas da União (TCU), 'uma blockchain é um
livro de registro de transações público, digital e seguro (um livro-razão).
'Block' (bloco) descreve a forma como este livro-razão organiza transações em
blocos de dados, que são então organizados em uma 'chain' (cadeia) que os liga
a outros blocos de dados. Os links tornam fácil a tarefa de detectar se alguém
alterou qualquer parte da cadeia, o que ajuda o sistema a se proteger contra
transações ilegais'.
A
segurança contra fraudes, a transparência e a capacidade de certificação da
informação são algumas das características que tornam a blockchain tão
interessante. Com dito, a Holanda identificou essas potencialidades e tem
trabalhado, a partir da DBC, para solucionar problemas públicos que podem ser
resolvidos com aplicação de blockchain ou serviços que podem ser aperfeiçoados
pela tecnologia. Os principais cases da coalização são: a identidade soberana,
o uso de blockchain para logística no Porto de Roterdã, certificação de
diplomas educacionais, pensão e repasse de subsídios. Essas iniciativas são
construídas em parceria com a iniciativa privada e com suporte das
universidades. O governo aporta recursos financeiros e de pessoal para que as
empresas desenvolvam soluções por meio de rodadas de aceleração.
E
como o Brasil pode aprender com tudo isso? Existem diversos aprendizados que
podem ser retirados da experiência holandesa e adaptados à nossa realidade,
todavia, gostaria de destacar a forma como a DBC tem utilizado a blockchain e a
coalizão governo, iniciativa privada e as instituições de ensino e pesquisa.
O
governo holandês não utiliza a blockchain como a única ferramenta capaz de
resolver todos os problemas públicos do país, mesmo que tenha um grande
potencial. A blockchain é aplicada somente em problemas públicos em que de fato
irá contribuir com um ganho de performance, por exemplo, a segurança dos dados
dos documentos apresentados no porto ou a possibilidade ou dar agilidade nos
processos de pedidos de pensão e aposentadorias. A DBC inverteu a lógica de
resolução de problemas público. Ao invés de procurar soluções para um
determinado problema, eles têm uma solução e buscam quais dificuldades combinam
com essa solução e onde ela pode gerar os melhores resultados.
Desta
forma, é possível acelerar a curva de aprendizagem. Essa seria a primeira lição
holandesa a ser aprendida. A segunda lição seria inovação feita com coalizão. A
DBC é a materialização da Hélice Tríplice de blockchain. Segundo estudos de
Henry Etzkowitz e Chunyan Zhou, a Hélice Tríplice seria como um modelo de
inovação em que a universidade, a indústria e o governo se relacionam a fim de
fomentar o desenvolvimento econômico por meio da inovação e do
empreendedorismo. A DBC, por meio das rodadas de aceleração, consegue fomentar
o setor privado, não só do ponto de vista econômico, mas também no
amadurecimento da tecnologia, apoiados pelas universidades e demais
instituições de ensino.
Outro
ponto é que o governo utiliza seu poder financeiro para incentivar a inovação
de tecnologia de ponta via demanda. É fazer uma integração entre público,
privado e universidades e todos os lados compartilharem dos benefícios gerados.
Blockchain é sim uma tecnologia ainda recente, mas tem se mostrado promissora e
com grande potencial para o setor público. O caminho é longo e ainda temos
muito o que estudar, discutir e desenvolver.
A
fim de quebrar qualquer estereótipo e senso comum sobre a capacidade de
inovação do Estado Brasileiro, há de se destacar que as nossas instituições
públicas estão na vanguarda do uso dessa ferramenta, com exemplos no Governo
Federal e no Governo de Minas Gerais. Por fim, é importante destacar como uma
coalizão governo, setor privado e universidades pode ser uma alternativa para a
superação de desafios complexos, assim como os que temos enfrentados nesta
pandemia.
Existem
diversas iniciativas promissoras de diversas organizações com o uso de
blockchain, contudo acredito ser um bom momento para fomentar a nossa 'coalizão
brasileira', pois sozinhos podemos ir mais rápido, mas juntos vamos mais longe,
Ubuntu.
Por
Jonathan Henrique Souza, em O Estado de S. Paulo [Humberto Dantas]
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