1.
Introdução
Apesar da
constante negativa dos técnicos do governo, resta evidente que a situação
fiscal da economia brasileira tem se deteriorado nos últimos anos. Tanto isso é
verdade que, desde 2011, a equipe econômica do governo vem anunciando seguidos
ajustes fiscais. Por exemplo, no início de 2011 o governo anunciou um ajuste da
ordem de R$ 50 bilhões. Já em fevereiro de 2012 outro pacote fiscal foi
anunciado, desse feita da ordem de R$ 55 bilhões.Em 2015 novo pacote de ajustes
foi anunciado. A rigor nenhum desses ajustes foi levado a termo, contudo seu
simples anúncio denota a preocupação das autoridades nacionais.
Em favor da
estabilidade das contas públicas pode-se fazer referência aos seguidos
superavits primários obtidos. Contudo, três observações se fazem necessárias
nesse assunto: 1) boa parte do superávit tem sido obtida por meio de aumento na
arrecadação de tributos, e não com a redução do gasto; 2) ocorreu uma
verdadeira operação de maquiagem das contas públicas; e 3) mesmo se levando em
consideração os itens 1 e 2, ainda assim o superavit primário tem se reduzido,
tendo se convertido em déficit a partir de 2014. Isto é, a sustentabilidade
fiscal da economia brasileira suscita dúvidas pertinentes.
Do ponto de
vista macroeconômico não restam dúvidas de que o lado fiscal desempenha papel
importante no desenvolvimento econômico de longo prazo do país. Certamente
existem agendas políticas e econômicas distintas. Contudo, é consenso geral de
que o equilíbrio fiscal é uma meta de política econômica a ser perseguida. No
momento em que escrevemos esse texto, nossa compreensão do cenário atual sugere
a necessidade de um forte ajuste fiscal na economia Brasileira.
Este ensaio
é apartidário, não se refere a nenhum candidato ou preferência ideológica
específica. Aqui constatamos apenas que um forte ajuste fiscal terá que ser
levado a cabo nos próximos anos. Este texto é então um guia prático para a
realização de tal ajuste. Além dessa introdução, na Seção 2 apresentamos um
panorama geral do ajuste fiscal necessário para colocar a economia brasileira
numa trajetória sustentável. A Seção 3 traz mais detalhes sobre cada proposta
elaborada na seção anterior.A Seção 4 conclui este ensaio.
2. Panorama Geral do Ajuste Fiscal
O orçamento
federal para o ano de 2012 era de R$ 866 bilhões, com o “corte” anunciado de R$
55 bilhões ele se reduziu para R$ 811 bilhões. Contudo, dependendo de
considerações técnicas, o governo federal teve uma despesa primária no ano de
2011 entre R$ 724 e R$ 757 bilhões. Isto é, o Brasil passou a ser o primeiro
país no mundo que anunciou um ajuste fiscal que aumentava em mais de 50 bilhões
de reais (ao invés de diminuir) o gasto público.Mesmo em termos reais, o
anunciado ajuste fiscal implicava aumento de despesas! No ano de 2015 não tem
sido diferente, o governo anuncia cortes em relação ao orçamento, mas tem pouca
capacidade de cortar os gastos em relação ao executado no ano anterior. No
Brasil, ajuste fiscal deve ser feito por cortes de gastos em relação ao ano
anterior, e não por anúncio de cortes orçamentários (que tal como no exemplo
acima, podem implicar aumento de gastos).
Quando se
conhece a estrutura do gasto público no Brasil, o primeiro detalhe que chama a
atenção é a impossibilidade de se fazer grandes cortes de gastos num único ano.
Assim, qualquer pacote fiscal deve ter em mente um horizonte mínimo de 3 a 4
anos. Grandes ajustes dependem de consistentes alterações ao longo dos anos.
Essa é a única maneira de se produzir um ajuste fiscal sério no país. Junto com
a redução do gasto público deve ser realizada uma reforma que reduza a carga
tributária no Brasil.
Quem conhece
contas públicas sabe que só existem 5 maneiras de se realizar grandes cortes
orçamentários num único ano: 1) cortar investimentos; 2) cortar gastos sociais
e transferências; 3) congelar o salário mínimo; 4) aumentar impostos; e 5)
inflação. Estou desconsiderando a possibilidade de aumentar os restos a pagar,
pois isso apenas transfere a dívida de um ano para outro – ainda assim, o
Governo Dilma utilizou reiteradamente este instrumento.
Abaixo estão
especificadas as medidas necessárias para a promoção de um ajuste fiscal
duradouro na economia Brasileira. Frisamos novamente que a estrutura do gasto
público impede sua redução se não forem feitas reformas importantes. De pouco adiantam
medidas pontuais aqui. É fundamental que tanto a sociedade quanto a classe
política compreendam que sem esse ajuste a situação de longo prazo de nossa
economia tende a patamares inviáveis. Muitas vezes ouvimos a grande mídia
repercutir sobre os ajustes fiscais ocorridos em alguns paises europeu, tais
como na Grécia, como se os mesmos fossem uma questão de escolha política. Não,
tais ajustes não foram questão de escolha, foram a consequência inevitável do
colapso fiscal de determinados países.
No ritmo em
que caminha a situação fiscal brasileira, em breve seremos obrigados a fazer
ajustes dolorosos, independente de vontade ou negociação política. Sendo assim,
sugerimos que devemos realizar tais ajustes antes do colapso fiscal, isto é,
devemos realizar esses ajustes enquanto ainda existem margens de manobra e
espaço para negociação política.
3. O Ajuste Fiscal Proposto
Dividimos
essa seção em duas partes: a) redução do tamanho do Estado na economia pelo
lado da despesa; e b) redução do tamanho do Estado na economia pelo lado da
receita.
A. REDUÇÃO DO TAMANHO DO ESTADO NA ECONOMIA:
LADO DA DESPESA
Medida 1: Tesouro – BNDES.
A mais fácil
medida a ser tomada para o ajuste fiscal é o fim imediato das operações entre
Tesouro Nacional e BNDES. Tais operações geram pesados ônus ao erário, e ao
mesmo tempo fragilizam a situação fiscal do país.
De acordo
com relatório do TCU, em 2011, o valor dos subsídios decorrentes das operações
Tesouro-BNDES foram de R$ 19,2 bilhões (mais R$ 3,6 bilhões de custo
orçamentário). Dados da Secretaria do Tesouro Nacional indicam que tais
subsídios foram de R$ 7,6 bilhões em 2010, e R$ 1,4 bilhão em 2009. Observem a
velocidade da evolução desses custos. Em 2014, após a aprovação da MP 633, o
BNDES (e a FINEP) tiveram autorização para emprestar mais R$ 50 bilhões de
reais a juros subsidiados. O custo para o contribuinte, apenas em relação a equalização
de juros da expansão de R$ 50 bilhões, será de R$ 12,3 bilhões. No ano de 2015
outros R$ 30 bilhões foram transferidos do Tesouro para o BNDES. Tais
transferências precisam parar imediatamente.
Medida 2: Substituir Investimento Público por
Parcerias ou Concessões
Reduzir os
gastos com investimento público. Essa é a maneira mais efetiva de se diminuir
gastos no curto prazo. Em compensação o estímulo a parcerias público-privadas,
ou a concessão a entes privados, pode ser uma política muito mais efetiva para
melhorar a infra-estrutura do país.
Sem incluir
empresas estatais, o investimento do governo central, estados e municípios é de
aproximadamente de 2,3% do PIB.
Medida 3: Acabar com a regra atual de
reajuste do salário mínimo.
Tal regra
implica um pesado ônus para as contas públicas. Além disso, os efeitos
deletérios dessa política sobre o mercado de trabalho podem parecer pequenos
quando a economia está aquecida e a taxa de desemprego está baixa. Contudo,
numa situação de retração econômica e de desemprego alto, esta regra de
reajuste tem potencial para aumentar a taxa de desemprego entre os
trabalhadores menos qualificados.
Congelar o
salário mínimo ajuda muito nas contas da previdência e nas contas de alguns
estados e municípios. Cada 1 real de aumento no salário mínimo pode impactar
nas contas públicas em algo em torno de 350 milhões de reais/ano.
Medida 4: Minimizar os custos decorrentes da
Copa do Mundo de 2014.
A escolha de
sediar a Copa do Mundo foi um equívoco. Os recursos destinados à construção de
estádios poderiam ter sido melhor utilizados numa série outra de programas.
Dado que essa alternativa não é mais viável, faz-se necessário uma política
pública que minimize os custos de manutenção com estádios. Nesse sentido,
propomos duas frentes: a) recuperar o investimento público que foi feito por
meio de empréstimos para a construção de estádios; e b) repassar a
administração dos estádios a iniciativa privada.
Medida 5: Minimizar os custos decorrentes de
sediar as Olimpíadas de 2016.
As mesmas
ressalvas do item anterior se aplicam aqui. Afinal, num país sem esgoto e sem
água encanada, isso não pode ser prioridade de políticas públicas.
Medida 6: Projeto de Lei que aumente a idade
mínima para aposentadoria para 67 anos.
Não apenas a
idade mínima de aposentadoria por idade deve ser aumentada, com uma regra de
transição, como a aposentadoria por tempo de serviço deve ser extinta
(novamente com regra de transição). Além disso, tanto homens como mulheres
devem se aposentar com a mesma idade. Não se deve tentar corrigir problemas do
mercado de trabalho (como a discriminação e a jornada dupla da mulher) no
sistema de previdência. ESSA MEDIDA É FUNDAMENTAL PARA O EQUILÍBRIO DE LONGO
PRAZO DAS CONTAS PÚBLICAS.
Medida 7: FIM da aposentadoria por tempo de
serviço.
É
simplesmente insustentável permitir que um trabalhador saudável se aposente aos
50 anos de idade.
Medida 8: Não elevação dos gastos com o bolsa
família e implementação de uma regra compulsória de saída.
O problema
do bolsa família não está na falta de recursos e nem em sua abrangência (com
quase 14 milhões de famílias atendidas e orçamento para o ano de 2015 de R$
27,7 bilhões). O problema do bolsa família está na ausência de uma regra de
saída. Além disso, existem limites para o tamanho da população que pode ser
mantida dentro desse sistema. Hoje aproximadamente 1 em cada 4 brasileiros
depende do bolsa família. Não parece ser necessário aumentar ainda mais essa
proporção.
Medida 9: Pente fino na necessidade de se
realizar novos concursos públicos
Em anos de
ajuste fiscal, a contratação de novos servidores deve ser vista com cautela. O
que for possível postergar deve ser postergado.
Medida 10:Congelar o Salário dos Servidores
Públicos.
Cada caso
deve ser analisado separadamente. A regra de ouro aqui é, gradativamente,
diminuir parte da excessiva atratividade do setor público. Salários altos, e
risco, são características do setor privado. Quem quer ir para o setor público
terá menos risco, mas ao custo de um salário menor. Sugestão pontual: congelar
o salário dos servidores em 2016 (economia estimada de R$ 15 bilhões).
Medida 11: Forte redução com gastos de
publicidade.
Deve-se incluir
nessa redução não somente o gasto em publicidade do governo federal, mas também
o gasto das empresas estatais e dos bancos públicos em propaganda.
Medida 12: Proibição do Banco do Brasil e da
CEF de comprarem participação em bancos privados.
Tais
operações costumam ser onerosas e cheias de risco. Se isso não for legalmente
possível, então é melhor vendê-los.
Medida 13: Forte redução na quantidade de
Ministérios.
Não faz o
menor sentido uma estrutura federal composta de 39 ministérios. Tal número deve
ser reduzido com a imediata redução do número de funcionários comissionados não
concursados presentes nos mesmos. Reduzir o número de ministérios para 20,
cortando em torno de 3000 cargos comissionados, e redução de estruturas
físicas, tem o potencial de gerar uma economia entre R$ 500 milhões e R$ 1
bilhão (dependendo de quais estruturase de quais cargos seriam cortados).
Medida 14: Imediata auditoria nos repasses
para todas as ONG´s
Escândalos
recentes mostram como é importante, do ponto de vista de moralidade do gasto
público, verificar com rigor o repasse de entes governamentais a Organizações
Não-Governamentais, abrindo inclusive processo judicial quando se fizer o caso.
Inclui-se aqui também o fim do repasse para qualquer ONG ligada a movimentos
ilegais (tais como as ligadas ao MST).
Medida 15: Revisão das Concessões de
Indenização aos grupos denominados “Perseguidos Políticos”
Já se
aproxima da casa de R$ 1 bilhão de reais por ano o valor de benefícios
concedidos aos anistiados políticos. É fundamental rever o valor das
indenizações que esse grupo recebeu nos últimos anos, inclusive com ações
judiciais para recuperar somas indevidamente pagas. Adicionalmente, devem ser
suspensos novas concessões de indenização a pessoas que dizem ter sido
perseguidas pelo regime militar até que sejam esclarecidas as dúvidas aqui
levantadas (sobre a utilização desse fundo para beneficiar grupos que nada ou
pouco perderam em decorrência da perseguição sofrida durante o regime militar).
Caberia, ainda, cassar as indenizações de quem for condenado em crimes contra o
erário.
Medida 16: Regra para o “Restos a pagar”
Em grande
parte das ocasiões, “restos a pagar” é uma maneira de o governo enganar a
opinião pública (dizendo que economizou um dinheiro que na verdade gastou). É
fundamental para a transparência das contas públicas a aprovação de uma lei que
regule “restos a pagar”, impondo limites ao montante de despesa que pode ser
postergado para outros exercícios..
Medida 17: Redução nas despesas com saúde
De acordo
com dados preliminares é possível reduzir os gastos federais com saúde numa
magnitude ao redor de 3 bilhões.
Medida 18: Redução dos gastos federais em
educação
De acordo
com dados preliminares é possível reduzir os gastos federais com educação numa
magnitude ao redor de 3 bilhões.
Medida 19: Abandonar, pelos próximos 4 anos,
os grandes projetos tais como o programa Minha Casa Minha Vida ou o PAC
Tais
programas são dispendiosos, e antes de se aventurar neles é fundamental sanar
as contas públicas do país. O governo deve finalizar imediatamente tais
programas, passando imediatamente àiniciativa privada a responsabilidade por
tais obras. Na ausência de interesse do setor privado recomenda-se a extinção
de TODOS esses grandes projetos quando tal alternativa se faça possível.
B. REDUÇÃO DO TAMANHO DO ESTADO NA ECONOMIA:
LADO DA RECEITA
Medida 20: Suspensão de vários dos incentivos
tributários concedidos nos últimos anos
Não há
espaço orçamentário para muitas concessões. Entre os incentivos tributários
concedidos ao longo dos últimos anos, a mais famosa foi a desoneração sobre a
folha de pagamentos, mas um amplo conjunto adicional de medidas foi implementado
para levar benefícios fiscais a setores específicos da economia. Tais
incentivos devem ser revogados. Apenas em 2014 essa conta chegou a R$ 88
bilhões. Pelo menos 1/3 desses benefícios deve ser revisto, gerando uma
economia aproximada de R$ 30 bilhões.
Medida 21: Fim da Isenção de IR para LCI e
LCA
Igualar as
regras de Imposto de Renda que já incide sobre os CDB’s nas Letras de Crédito
Imobiliário (LCI) e nas Letras de Crédito do Agronegócio (LCA). Receita
estimada R$ 5 bilhões.
Medida 22: Grande processo de privatização de
empresas públicas
Captar ao
menos R$ 50 bilhões com a venda de ativos públicos (empresas públicas e
participações acionárias em empresas privadas).
Medida 23: Ampla revisão da legislação
ambiental
Essa
legislação é um embaraço constante a realização de investimentos privados. Além
disso, tal legislação trava também as parecerias público-privadas, e os
próprios investimentos públicos.
4. Considerações Finais
Ajuste
fiscal é isso. Ajuste fiscal corta gastos e corta projetos que talvez sejam
importantes, mas que não são urgentes. As medidas anunciadas aqui são
certamente impopulares, mas são necessárias para colocar o Brasil novamente
numa trajetória fiscal sustentável.
Adicionalmente,
faço um alerta: existe uma maneira política mais fácil de se fazer o ajuste
fiscal. O nome da saída fácil é inflação. Na presença de taxas de inflação
elevadas, os gastos do governo sofrem considerável redução (principalmente a
folha de salários, que corresponde a aproximadamente 4,5% do PIB). Além disso,
não devemos esquecer que o imposto inflacionário também é uma fonte extra de
receita para o governo. Sendo assim, e como o governo é capaz de indexar seus
tributos, altas taxas de inflação melhoram as contas públicas. Espero que
tenhamos a sabedoria de não incorrer nesse caminho fácil. Querer melhorar as
contas públicas por meio de inflação é o mesmo que decepar a mão para se livrar
da unha encravada. De maneira alguma devemos recorrer ao expediente
inflacionário para sanar nossos problemas fiscais.Infelizmente o governo já
está indo nessa direção.
Por fim,
deve-se ressaltar que as contas fiscais dos estados e municípios também estão
em situação precária, com vários dos entes federativos a beira do colapso
fiscal. Em vez de realizar um trabalho sério, e doloroso, de ajuste fiscal, o
governo prefere ajustes fiscais fictícios que se baseiam em aumento da
arrecadação, truques contábeis, e ganhos com o processo inflacionário. Esse não
é o caminho para estabilizar as contas públicas brasileiras no longo prazo.
Por Adolfo
Sachsida, Técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea.
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III – Coleção Educação, Teatro e Democracia (peças teatrais infanto-juvenis):
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Livro 8. Como é bom ser diferente
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