Como gestoras e investidores vão empurrar adiante as empresas retardatárias em adotar a responsabilidade ambiental
Em setembro de 2019, 230 investidores institucionais de todo o mundo cobraram de empresas que adotem políticas de desmatamento zero na Amazônia em suas cadeias de fornecimento. Iniciativa conjunta da Ceres, coalizão de investidores e ambientalistas dos Estados Unidos, e dos Princípios para o Investimento Responsável (PRI), da ONU, o documento foi assinado por grandes players, como o francês Amundi (principal fundo europeu, com € 1,4 trilhão sob gestão), as gestoras de BNP Paribas e HSBC e o fundo de pensão da Telefônica. Só duas gestoras brasileiras assinaram o manifesto.
Ante o atual frenesi que
toma conta do mercado de investimentos em torno da agenda ASG — aspectos
ambientais, sociais e de governança
(também designados pela sigla em inglês, ESG) —, parece absurdo que somente
Fama Investimentos e SulAmérica tenham aderido. A baixa participação dos
investidores brasileiros na iniciativa não surpreendeu quem atua na área de
finanças sustentáveis. Grande parte do mercado financeiro no Brasil tem aversão
histórica ao que vê como “temas típicos de ambientalistas e da esquerda”,
observa Fabio Alperowitch, cofundador da Fama, gestora pioneira na agenda ASG,
que lançou em 1997 seu primeiro fundo com o crivo de responsabilidade
ambiental.
Não era só isso que
mantinha a maioria das gestoras do Brasil longe dos investimentos sustentáveis.
As altas taxas de juros vigentes até pouco tempo atrás no país empurravam o
dinheiro para fundos lastreados em títulos públicos e diminuíam a necessidade
de diversificação.
Na nova realidade de juros
reais negativos, os investidores precisam de mais opções — o que abre muitas
possibilidades, inclusive fundos com critérios socioambientais. Essa
necessidade ocorre no mesmo momento em que cresce a demanda, no mundo inteiro,
de responsabilidade ambiental por parte das empresas. Em julho, a gestora
norueguesa Nordea retirou de seus fundos o equivalente a R$ 240 milhões em
ações da JBS. A Nordea justificou a decisão com base no histórico ambiental
(associado ao desmatamento da Amazônia) e a problemas no gerenciamento da
pandemia de covid-19 da maior processadora de carne bovina do Brasil. Esses
sustos, para empresas de todas as áreas, vão se tornar cada vez mais
frequentes.
Num fundo de ações, a
gestora pode aumentar ou diminuir a participação de uma empresa em função de
melhora ou piora no seu desempenho ASG. Ou mesmo excluí-la da carreira, se sua
nota ficar abaixo de um determinado patamar. “O setor financeiro está
absorvendo isso. Vamos falar com os gestores das empresas: qual marca sua
empresa deixa? Como cria valor? Incentivando desmatamento? Então, não tem
investimento”, diz. Gilberto Abreu, CEO da Santander Asset Management. No cargo
desde fevereiro de 2020, ele faz parte de uma nova leva de executivos com a
missão de incorporar a visão socioambiental ao dia a dia dos negócios do setor
financeiro. “Vamos cada vez mais subir essa régua. Por que não subimos a régua
total mente e já? Nossa metodologia exige capturar informações de mercado, e
algumas empresas não publicam dados. Temos buracos de informação, Mas o que
estamos fazendo não é moda. É uma das grandes tendências do século 21."
A cobrança sobre as
empresas irresponsáveis vai aumentar. Para Luciana Nicola, superintendente de
Sustentabilidade do Itaú Unibanco, ninguém mais pode ficar alheio ao desafio.
“Até pouco tempo atrás, a
pressão sobre as empresas para que atuassem na preservação era feita quase que
exclusivamente por ONGs e especialistas. Com os problemas ambientais mais
recentes, isso vem mudando. A pressão ganha a força de outros atores sociais,
como clientes, investidores e colaboradores dessas empresas. Governo e
reguladores têm participado mais ativamente das discussões ASG.”
Nos Estados Unidos, fundos
de sustentabilidade captaram só no primeiro semestre deste ano US$ 20,9
bilhões, quase o equivalente à captação de 2019 inteiro, que por sua vez foi
quatro vezes superior à de 2018, segundo a MorningStar. Ainda não há no Brasil
consenso sobre o tamanho desse mercado. Uma dificuldade decorre da falta de
padronização dos critérios para sabermos o que é um fundo de sustentabilidade.
Para Gustavo Pimentel, diretor executivo da Sitawi (ONG de consultoria e
pesquisa), o patrimônio líquido (PL) dos fundos de ações brasileiros com algum
nível de critérios ASG vai alcançar cerca de RS 100 bilhões até o fim de 2020,
dez vezes mais que o montante de 2015. A participação desses fundos no PL total
dos fundos de ações também aumentou bem, segundo a estimativa de Pimentel — de
7% em 2015 para 20% este ano. O executivo da Sitawi faz uma ressalva: suas
estimativas incluem um leque abrangente de situações, como a própria designação
ASG. A Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de
Capitais) trabalha com outros critérios, mas também estima que o PL dos fundos
de sustentabilidade e governança
tenha crescido 20% em 2020 em relação ao ano anterior.
Diferentemente da primeira
onda dos investimentos verdes no Brasil, nos anos 2000, a atual é muito mais sólida,
avaliam executivos financeiros e especialistas no segmento. A onda anterior
ficou mais concentrada nos grandes bancos (Santander, Itaú, Bradesco e Banco do
Brasil). Agora, ela é puxada por outros players, como XP e as participantes da
iniciativa Investidores pelo Clima (IPC) — Constellation, JGP, Quasar e a
gestora do BTG Pactual (a IPC foi lançada em outubro de 2019 pela Sitawi. Leia
mais no quadro da página 90).
Desta vez, as gestoras
independentes se mexeram primeiro, diante da demanda renovada do mercado por
produtos ASG, avalia Pimentel, da Sitawi. De olho nessa segunda onda, os quatro
maiores bancos do país voltaram a se mexer, relançando produtos, revisando e
trocando metodologias de avaliação das empresas investidas. Desde 2018, foi
lançada quase uma dúzia de fundos de ações ASG no Brasil, a maior parte este
ano (nos Estados Unidos, 23 fundos de ações ASG estrearam no primeiro
semestre). Todos correm para fechar 2020 mais preparados para “descarbonizar”
suas carteiras. “Estamos fazendo as últimas revisões nos ratings ASG e vamos
comunicar as empresas nas próximas semanas”, afirmou no fim de novembro Ricardo
Almeida, CEO da Bradesco Asset Management (Bram). Bradesco e Itaú foram os
primeiros bancos brasileiros a assinar o protocolo internacional TCFD
(Força-tarefa de Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima), para orientar
companhias no esforço de “limpeza” das operações.
Entre os investidores
externos, a demanda foi sentida primeiro e com mais força. Eles são
pressionados em seus países por diversos atores, como acionistas, governos e
ambientalistas. Esses atores querem a retirada de investimentos de fundos
brasileiros com ações de companhias associadas, de alguma forma, a desmatamento
e queimadas. Empresas brasileiras interessadas em acessar o capital e os
consumidores mundo afora têm de acompanha r as regras desse jogo. Investidores
brasileiros também terão acesso crescente a opções de investimento em outros
países. “Uma oferta global, com histórico mais longo e teses já avaliadas em outros
mercados, pode ajudar o mercado brasileiro não somente a ampliar as opções para
os investidores, mas também agregar conhecimento e tecnologia ao mercado
local”, diz Carlos Takahashi, CEO no Brasil da BlackRock, maior gestora de
recursos do mundo, com quase US$ 7 trilhões em ativos.
Carlos, ou Cacá, como é
mais conhecido no mercado, está perto do epicentro da mudança (leia mais sobre
ele na página 30). Um marco no debate ocorreu em janeiro de 2020, com a carta
anual enviada pelo cofundador e presidente da BlackRock, Larry Fink, aos CEOs
das maiores companhias do mundo. A carta anunciou que a BlackRock deixaria de
incluir nas carteiras de seus fundos empresas que “apresentam um risco alto
relacionado à sustentabilidade”, como as usinas termelétricas movidas a carvão.
“As evidências sobre os riscos climáticos estão obrigando investidores a
reavaliar premissas importantes sobre as finanças modernas”, escreveu Fink.
A carta foi enviada uma
semana antes da edição 2020 do Fórum Econômico Mundial (FEM), que teve mudanças
climáticas como um dos temas principais. Realizado em Davos, na Suíça, o evento
reúne anualmente líderes empresariais, do setor público e da sociedade civil
para discutir desafios globais à luz do relatório da entidade sobre riscos
globais. Pela primeira vez, as preocupações com o meio ambiente estavam entre
os cinco principais riscos mundiais de longo prazo (em termos de probabilidade
nos próximos dez anos), segundo a pesquisa de percepção realizada entre membros
do FEM e incluída no relatório anual da organização. O fracasso nas ações de
adaptação e mitigação das mudanças climáticas aparece como segundo maior risco
global. Destruição da biodiversidade é percebida como o quarto.
No Brasil, gestores,
investidores e empresas têm de fazer esforço extra em responsabilidade ambiental,
a fim de compensar a atuação do governo federal. Em atos e em intenções
tornadas públicas, a gestão Jair Bolsonaro mostrou hostilidade às pautas de
preservação. A insatisfação dos investidores internacionais ficou evidente no
manifesto de setembro de 2019 e em carta enviada em junho de 2020 a embaixadas
brasileiras na Europa por 29 gestores de ativos.
O descuido ambiental no
país se tornou evidente também com a tragédia de Brumadinho (MG), em janeiro de
2019, quando o rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão causou a morte
de ao menos 270 pessoas e a contaminação da bacia do rio São Francisco. Por
isso, o Norges Bank, banco central da Noruega, retirou papéis da Vale, dona da
mina, do fundo soberano do país (o banco retirou do fundo também papéis da
Eletrobras. Os dois movimentos somaram US$ 449 milhões em papéis brasileiros
dispensados). A catástrofe de Brumadinho abalou vários investidores
institucionais, como a JGP, que sofreu com o desabamento no valor das ações da
Vale.
Com ativos de R$ 35 bilhões
sob gestão, a gestora deu- se conta de que estava desprezando riscos sérios. “A
JGP começou a se preocupar com ASG logo após Brumadinho. Começamos a estudar
seriamente a questão ambiental e as mudanças climáticas", conta Marcos di
Tullio, analista de investimento, que se tornou o ponto focal sobre o tema na
equipe de equity. Atualmente. ASG é dimensão obrigatória em todas as análises
da gestora. Para apoiá-la no assunto, a JGP contratou a Sitawi por cerca de
seis meses em 2019 e aderiu à iniciativa Investidores pelo Clim a (IPC). Em
maio, lançou seu primeiro fundo de ações com viés de sustentabilidade e, no
inicio de novembro, um fundo de crédito ASG.
Há problemas a resolver,
para que se consolide a onda ASG no segmento de investimentos. Um dos
principais é a necessidade de tornar os fundos mais transparentes para os
investidores e a sociedade em geral. Varia muito entre as instituições
financeiras o significado de termos como exclusão de empresas, filtros
negativos e positivos, integração ASG e investimento de impacto. Isso torna
difícil para o cliente entender a abordagem que seu fundo emprega na avaliação
das empresas investidas.
“Precisamos definir padrões
mínimos a cumprir, para dizer que um fundo é de sustentabilidade”, diz Almeida,
CEO da Bram. Ele defende a autorregulação do segmento de investidores (gestoras
e family offices, por exemplo) para o estabelecimento de critérios
transparentes de classificação dos fundos. Seria como definir um selo para os
que cumprissem um conjunto de requisitos.
Cacá, da BlackRock, alerta
que há muito trabalho a fazer.
"Há etapas a percorrer antes de pensarmos na regulação, como conhecer as
boas práticas internacionais de países mais desenvolvidos no tema e entender o
grau de maturidade local.” Cacá também coordena o grupo consultivo de
sustentabilidade da Anbima.
Na falta de padronização
dos critérios, algumas gestoras desenvolvem suas próprias metodologias. É o
caso da Constellation e das gestoras do Santander (SAM) e do ltaú (IAM), A
asset do ltaú aplica sua metodologia para integrar questões socioambientais à
avaliação de empresas desde 2010. Das oito dimensões consideradas, quatro
referem-se a potenciais impactos ambientais das empresas — água, energia e
materiais; biodiversidade e uso do solo; manejo de resíduos; e mudanças
climáticas, Os analistas avaliam o impacto das variáveis no fluxo de caixa ao
longo do tempo e definem uma nota ASG, adicionada à nota principal da companhia
investida. Essa nota orienta a asset a alocar mais ou menos ações da empresa
num fundo de investimento.
Em janeiro de 2020, a SAM
deixou de usar um questionário de 23 perguntas na avaliação do desempenho ASG
das companhias da carteira do Ethical, um dos primeiros fundos de investimentos
com crivo socioambiental do Brasil, lançado em 2001. No lugar do questionário,
passou a empregar uma metodologia mais robusta, desenvolvida pela matriz do
banco na Espanha com a participação da analista de sustentabilidade Luzia
Hirata, da SAM Brasil. Diferentemente do que ocorreu até 2019, a nova
metodologia é usada para a avaliação ASG de todas as companhias com papéis nos
fundos administrados pela SAM. Não se limita, portanto, ao Ethical, que foi
relançado oficialmente em outubro já com o novo modelo de avaliação das
empresas de sua carteira.
A nova metodologia, usada
pelo Santander em todos os países em que possui gestoras de recursos, emprega
84 indicadores para medir nove grupos de impactos ambientais, sociais e de governança. Desses, 25 indicadores
medem cinco grupos de impacto ambiental — emissões de carbono, biodiversidade,
gestão de recursos naturais, eficiência energética e consumo e gestão de
resíduos, A empresa investida ganha uma nota ASG, que afeta a nota final da
empresa, não importa em qual fundo ela esteja.
São trabalhos em andamento.
A SAM não havia disponibilizado até o fechamento desta edição esclarecimentos
em seu site sobre a extinção do conselho independente do fundo Ethical nem
sobre a substituição da metodologia de avaliação. Também não há certificação da
avaliação por empresa especializada. O ltaú anunciou recentemente que está
selecionando uma empresa para efetuar essa certificação. “A verificação de
terceira parte também é muito válida, mas para isso é necessário atuar na
definição clara dos critérios de análise das companhias e dos fundos, além da
formação adequada desses profissionais”, explica Luzia, a analista da SAM
responsável pelo contato permanente com a matriz espanhola nesse tema.
Entre as gestoras
independentes que nos últimos dois a três anos incorporaram a agenda ASG às
suas estratégias de investimento, JGP e Constellation também optaram por
desenvolver metodologias próprias de avaliação ASG. Com R$ 15 bilhões sob
gestão nos seus dois fundos de ações, a Constellation atribui às empresas notas
de 1 a 3 (do pior para o melhor desempenho). A gestora, que não conta com
certificação de terceira parte, aderiu em julho passado ao compromisso público
da IPC, Sócio responsável pela área de ASG da Constellation, Eduardo Dumans
enfatiza o estilo amigável do relacionamento da gestora com suas empresas
investidas. “Não somos aquele fundo que chega para brigar. Acho que a gente é
escutado boa parte das vezes. Se notamos que a empresa não está melhorando [no
desempenho ASG] ou não quer melhorar, um caminho é desinvestir, mas ainda não
chegamos a esse ponto.”
Tendo criado sua área de
ASG em maio passado, a XP preferiu estrear no mercado de fundos de investimento
sustentável aplicando uma metodologia da MSCI, maior provedora mundial de
índices destinados a apoiar a avaliação do desempenho socioambiental das
companhias investidas. “A XP tem o papel de influenciar o ecossistema do
mercado de investimentos e juntar nessa jornada os clientes e os parceiros”,
afirma Marta Pinheiro, diretora de ASG da XP.
Na metodologia da MSCI, os
pilares ambiental, social e de governança
são avaliados por meio de dez temas detalhados em 37 tópicos relevantes. No
pilar ambiental, por exemplo, há quatro temas — mudanças climáticas, recursos
naturais, poluição e resíduos sólidos e oportunidades ambientais. O tema do
clima, por sua vez, foi subdividido em quatro aspectos: emissões de carbono,
pegada de carbono dos produtos, impacto ambiental dos financiamentos e
vulnerabilidade às mudanças climáticas. No tema dos recursos naturais, três
tópicos são avaliados — estresse hídrico, biodiversidade e uso da terra e
fornecimento de matéria-prima.
O objetivo da XP é utilizar
a metodologia da MSCI para analisar o desempenho ASG de todas as empresas
investidas. A empresa lançou dois fundos com os novos critérios e criou um
projeto de R$ 100 milhões para fomentar o desenvolvimento de fundos dessa mesma categoria em gestoras
independentes. “A principal dificuldade para analisar as empresas é a falta de
informações sobre os pilares ambiental e social”, conta Marcella Ungaretti,
analista de ASG da XP. Ela também aponta ser difícil avaliar o desempenho socioambiental
de uma companhia considerando suas operações na cadeia de valor como um todo.
Empresas com menor nível de terceirização de sua produção, como a Samsung,
podem ser prejudicadas na comparação com uma que transfere a maior parte de sua
produção a outras companhias, caso da Apple.
A pioneira Fama, fundada em
1093, é, talvez, a que aplica o filtro ASG mais exigente no mercado de
investimentos responsáveis. Já excluiu mais de 40 empresas da carteira de seu
único fundo, que reúne ativos de R$ 2,6 bilhões. Devido à dificuldade de
encontrar empresas que atendam aos critérios estritos da Fama para incluir
ações em sua carteira ASG, 80% dos ativos do fundo operado pela gestora
pertencem a companhias estrangeiras. Alperowitch, sócio-cofundador da Fama, alerta
para a necessidade de depuração no mercado, para remover o que não for
consistente. Ele chama a atenção para o lado B da onda dos investimentos
verdes. “O mercado europeu foi tão inundado por ASG sem substância que se viu
obrigado a regular. Alguns fundos estão perdendo o direito de usar ASG no
nome.” A União Européia (EU) adotou a taxonomia verde, a ser implementada
gradualmente a partir do próximo ano. Consiste numa ferramenta de classificação
do desempenho ambiental das atividades econômicas. Os reguladores brasileiros
esperam construir um aparato regulatório inspirado nessas medidas, incluindo a
taxonomia verde e a divulgação de riscos financeiros relacionados às mudanças
climáticas. No Brasil, a Febraban realizou recentemente consulta pública sobre um
projeto de taxonomia verde.
Outros desafios precisarão
ser superados nos próximos cinco a dez anos para essa agenda ganhar
musculatura. “O tema ainda está muito concentrado nas áreas técnicas, no nível
dos analistas. E o pulo que tem de ser dado: o tema tem de ser assumido pela
alta administração das empresas”, diz Maria Eugênia Buosi, sócia-fundadora da
Resultante, uma das principais consultorias em finanças sustentáveis no Brasil.
A Resultante responde pela metodologia do índice CDP de Residência Climática
(ICDPR-70), lançado em 31 de março passado. O índice vem batendo o Ibovespa e
considera uma carteira teórica, composta por ações de 34 empresas, selecionadas
entre as cem mais Líquidas do mercado acionário doméstico. A seleção ocorre com
base no questionário sobre mudanças climáticas enviado anualmente a dezenas de
empresas pelo CDP (antigo Carbon Disclosure Project).
Com maior ou menor ênfase
em um ou outro aspecto, especialistas em finanças sustentáveis, analistas e
executivos de instituições financeiras concordam com a necessidade de melhorar
a transparência nas informações sobre os critérios de análise. Também há amplo
apoio à certificação das avaliações ASG por empresas independentes (terceira
parte) e à inclusão dos fatores ASG na análise das empresas que compõem todas
as carteiras das gestoras, não se limitando aos fundos de sustentabilidade.
No governo federal, o BC
(Banco Central) e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) caminham no sentido
inverso ao do Ministério do Meio Ambiente e mostram disposição de avançar na
agenda verde.
A CVM é uma das mães do LAB
(Laboratório de Inovação Financeira). A iniciativa inclui um grupo de risco ASG
e transparência, para fazer evoluir a regulação do segmento. A CVM tornou-se em
fevereiro representante da Iosco (Organização Internacional das Comissões de
Valores) numa rede mundial para fomentar boas práticas ambientais no sistema
financeiro, a NGFS (em tradução livre, Rede de Despoluição do Sistema
Financeiro).
O BC anunciou em setembro a
inclusão da sustentabilidade na sua agenda estratégica, como parte de um
programa regulatório para estimular boas práticas no setor financeiro. A
autoridade monetária pretende que o setor comece em breve a implementar as
recomendações da Força-Tarefa liderada por Michael Bloomberg e Mark Carney,
ex-presidente do Banco da Inglaterra. A iniciativa publicou em 2017 uma espécie
de guia para o relato regular do risco financeiro gerado pela crise climática
aos negócios de bancos, gestoras e detentores de ativos e seguradoras. A agenda
estratégica do BC prevê a realização de testes de estresse, como os que têm
sido efetuados pelos bancos centrais de Inglaterra, França, Holanda e
Cingapura. Nos testes, bancos e seguradoras simulam temperatura 4 graus acima
dos níveis pré-industriais ou um preço de US$ 100 por tonelada de CO2. Assim
começaremos, todos, a sentir o custo real da crise climática.
Por José Alberto Gonçalves Pereira, na Revista
Época Negócios
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