A promulgação da Emenda à Constituição 76 - que extinguiu o voto secreto nas votações em processos de cassação de parlamentares e no exame de vetos presidenciais - foi tomada por muitos como uma conquista que prometia alvíssaras. O argumento é que o sistema se tornaria mais transparente e, consequentemente, mais eficaz.
Mas,
poucos atinaram para o fato de que, em algumas votações específicas, o voto
secreto protege o parlamentar do rolo compressor que traduz a diuturna atuação
do Poder Executivo no Congresso Nacional.
Não há
dúvidas: para as votações referentes à cassação de mandato do parlamentar, a Emenda
Constitucional nº 76 é um eloquente avanço. Estivesse em vigor e o presidiário-deputado
Natan Donadon teria, seguramente, perdido o mandato.
Rememorando:
no dia 28 de agosto, com a votação, ainda, secreta, a Câmara dos Deputados livrou
Donadon da cassação. Houve 233 votos favoráveis a cassação. Todavia, eram
necessários 257. Por incrível que pareça, 131 deputados federais votaram contra
a cassação. É um número expressivo, representa mais que um quarto da Câmara.
Pela abstenção, 41 deputados; 54 dos presentes na sessão não votaram; e outros
54 não deram as caras, convenientemente, não compareceram. Não fosse o
presidente da Câmara, e o quadro teria ficado ainda mais dramático: em decisão
solitária, Henrique Eduardo Alves decidiu afastar o condenado por peculato e
formação de quadrilha enquanto o criminoso estiver cumprindo pena em regime
fechado. Por desvio de recursos públicos
o rapace vigarista cumpre mais de 13 anos em regime fechado.
Portanto,
todo o mérito à Emenda 76 quando o assunto é a cassação de mandato parlamentar.
Mas quando
se trata da apreciação dos vetos presidenciais, aí a história muda de figura.
As
relações entre os Poderes, notadamente entre o Executivo e o Legislativo, todos
sabemos, não se dão na redoma do espírito republicano. Pressões ilegítimas, jogo
de interesses e o tráfico de influência, quase sempre, ditam as regras desse folguedo.
E nesta jogatina, raramente o Executivo é derrotado.
Com a
votação secreta – para a apreciação dos vetos presidenciais – o parlamentar se
sentia minimamente protegido dessas gigantescas pressões; mas, agora...
E os fatos estão aí para
demonstrar que, nesta situação, a Emenda não aponta para resultados animadores.
Logo na primeira sessão com voto aberto, já com a Emenda 76 em vigor, o Congresso
manteve o veto presidencial ao programa Mais
Médicos, conforme desejo do Executivo. Doravante, deputados e senadores
votarão diretamente no painel eletrônico do plenário da Câmara e o resultado
será divulgado ao final de cada votação. A apuração manual que era feita pela
Secretaria Especial de Informática do Senado ficou no passado, não haverá mais.
E o receituário se repetiu
com o veto presidencial ao projeto sobre eficiência energética, que foi,
também, mantido no Congresso.
Aqui, o leitor encontra o Projeto
de Lei 6.547/09.
Recapitulemos
o que foi vetado:
"(...)
O
Congresso Nacional decreta:
Art.
1º O art. 31 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, passa a vigorar com
a
seguinte redação:
“Art. 31. A oferta e apresentação de
produtos ou serviços devem
assegurar informações corretas,
claras, precisas, ostensivas e emlíngua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade,
composição, preço, garantia, prazos de validade, origem, eficiência e
consumo energéticos, entre outros dados, bem como sobre os riscos
que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
Parágrafo único. As informações sobre eficiência e consumo
energéticos deverão observar metodologia de aferição conforme
regulamentação do Poder Executivo.” (NR).
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na
data de sua publicação.
Como
pode verificar o leitor, um projeto límpido e cristalino, defendido com
coerência pela bancada ambientalista do Congresso, mas que teve o veto
presidencial mantido sob a justificativa governamental de “por não ser
específica a regra poderia onerar excessivamente alguns setores, sem garantir
correspondente proteção ao consumidor”.
É amigo,
a partir de agora será difícil, senão impossível, derrubar vetos presidenciais
no Congresso Nacional. O tempo mostrará que, neste caso, o discurso da ‘transparência’
não servirá para outra coisa senão para obscurecer o cenário...