As primeiras consequências da decisão dos eleitores britânicos de deixar a União Europeia foram sentidas logo após a divulgação dos resultados do plebiscito, na última sexta-feira: o primeiro-ministro David Cameron anunciou sua renúncia, a libra esterlina sofreu uma queda histórica e os mercados financeiros mundiais somaram perdas da ordem de US$ 2 bilhões.
E isso foi só o começo. Logo a agência Moody's informou que tinha rebaixado a nota de crédito do Reino Unido de "estável" para "negativa" e foi noticiado que várias multinacionais estavam se preparando para fechar postos de trabalho em Londres. Somou-se a isso a confirmação pelo governo escocês de que estava se preparando para um segundo plebiscito sobre sua independência.
Diante disso, muitos analistas e eleitores passaram a se perguntar: é possível reverter o Brexit, o processo de saída do Reino Unido da União Europeia?
Possível, mas pouco provável
A resposta curta é: sim.
Mas a resposta longa é que, embora não seja impossível, parece altamente improvável, dado que a maioria dos eleitores britânicos falou claramente a favor de dizer adeus à UE.
"O povo britânico votou a favor de deixar a União Europeia e sua vontade deve ser respeitada", disse Cameron, que fez campanha a favor da permanência, ao anunciar sua renúncia.
Também é certo que a consulta de 23 de junho não é juridicamente vinculativa.
Isso significa que a decisão final sobre deixar ou permanecer no bloco europeu terá que ser tomada por um parlamento com uma maioria de deputados contrários ao Brexit.
E enquanto o Reino Unido não invocar o artigo 50 do Tratado da União Europeia, que estabelece procedimentos para a saída de um Estado membro, as negociações para efetivar a saída nem podem começar.
Os perigos do tempo
Os líderes europeus disseram esperar que o Reino Unido ative o mecanismo de "o mais rápido possível", com alguns até mesmo chegando a dizer que deveria ser uma questão de dias.
Mas, em seu discurso, Cameron disse que era uma tarefa para seu sucessor.
O processo para eleger um novo primeiro-ministro, no entanto, vai exigir um tempo no qual muitas coisas poderiam acontecer.
Por ter maioria parlamentar, o partido de Cameron sozinho pode escolher por si só o próximo ocupante da 10 Downing Street sem chamar novas eleições.
"Neste momento, não precisamos de um calendário preciso, mas na minha opinião deveríamos definir como objetivo ter um novo primeiro-ministro antes do início da reunião anual do Partido Conservador em outubro", disse Cameron em seu discurso de renúncia.
Mas se os conservadores não conseguem superar suas divisões internas, novas eleições poderiam ser inevitáveis.
E várias vozes já estão aparecendo para insistir que a tarefa histórica de tirar o Reino Unido da União Europeia depois de 43 anos exige um novo governo com um mandato claro.
Caixa de Pandora?
Novas eleições, no entanto, também dariam aos eleitores a oportunidade de apoiar uma mudança de rumo no que diz respeito à UE.
E muitos daqueles que não apoiaram o Brexit parecem acreditar que uma nova votação - uma nova consulta ou novas eleições generais - produziria resultados diferentes.
Um de seus argumentos tem a ver com a taxa de participação relativamente baixa dos jovens, uma grupo amplamente favorável a permanecer na União Europeia que poderia mobilizar-se ao perceber que "a coisa é realmente séria".
Mas muitos também parecem convencidos de que boa parte dos que votaram para a saída da UE foi enganada por políticos que já começaram a renegar suas promessas de campanha ou a ser desmentidos pela realidade.
E não falta quem pense que a verdadeira razão pela qual grandes apoiadores do Brexit disseram que não há pressa para ativar o artigo 50 é, basicamente, que não se atrevem a começar um divórcio que pode ter consequências desastrosas para o país.
"A Escócia se separaria, haveria caos na Irlanda, uma recessão, os acordos comerciais seriam quebrados. E Boris Johnson sabe", diz um participante de um fórum de leitores do jornal The Guardian.
"Quando Boris Johnson disse que não havia necessidade de ativar o artigo 50 'ainda' realmente quis dizer 'nunca'", continua o comentário, referindo-se ao favorito para suceder David Cameron.
Frustração e descontentamento
O argumento do ex-prefeito de Londres e de seus aliados, no entanto, é que o Reino Unido só precisa de tempo para se preparar e ser capaz de negociar a separação nas melhores condições possíveis para o país.
E muitos daqueles que votaram a favor da Brexit acreditam que os pró-europeus estão errados ao apresentá-los como ignorantes manipulados que nem saberiam o que era a UE antes da votação. O desconhecimento foi sugerido após a divulgação de que "o que é a União Europeia" tenha sido a segunda consulta mais popular no Google.uk no dia após o referendo.
Além disso, não há nada que sugira que os testemunhos dos arrependidos que dizem ter votado a favor da UE sem realmente entender o que estava em jogo passem de uma anedota.
E o nível de frustração que levou a decisão histórica de 23 de junho, certamente, não deve ser desconsiderado.
Ao mesmo tempo, a incerteza sobre o futuro do Reino Unido e da União Europeia não agrada ninguém, assim que uma decisão sobre o tema não pode ser adiada indefinidamente.
E, embora a UE não possa forçar Londres a iniciar o processo, tudo indica que ele vai começar mais cedo ou mais tarde.
Tudo isto significa que, no momento, é difícil ver o Brexit como mais do que uma realidade inevitável.
O que ainda não está claro, no entanto, é como ele será produzido, quando e com que consequências.
Da BBC-mundo
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