Por Paulo Springer e Fernando Meneguin*
A teoria econômica tradicional nos ensina que um ambiente perfeitamente
competitivo e sem falhas de mercado gera uma situação eficiente, definida como
aquela em que não se pode melhorar a situação de um agente econômico sem piorar
a de outro (ou, no jargão econômico, um ótimo de Pareto). O fato de os mercados
competitivos e sem falhas de mercado gerarem uma situação eficiente é uma visão
idealizada do sistema. Na realidade, entretanto, os pressupostos de
concorrência perfeita e ausência de falhas de mercado são frequentemente
violados na vida real, o que impede que ocorra uma alocação que seja ótima de
Pareto (sobre “falhas de mercado” ver, neste site, o texto “Por que oGoverno deve Interferir na Economia?”).
Neste artigo iremos discutir algumas
dessas falhas no mercado de crédito, que impedem (ou dificultam) o atingimento
de uma alocação que seja Pareto-eficiente. A principal falha em questão é a
assimetria de informações, ou seja, o emprestador não conhece bem as
características do potencial tomador de empréstimo.
A assimetria informacional pode ser
vista sob duas perspectivas: seleção adversa e risco moral.
O fenômeno da seleção adversa
acontece porque os bancos não têm pleno conhecimento da capacidade de pagamento
dos tomadores. Por exemplo, duas pessoas físicas, que trabalham em uma mesma
empresa e ocupam cargos semelhantes. Uma pode estar em vias de ser demitida e
outra não. Ambos os funcionários conhecem (ou, pelo menos, têm uma noção
razoável) de sua probabilidade de ser demitido, mas o banco não tem acesso a essa
informação e por isso não têm como selecionar o indivíduo que terá maior
capacidade de pagamento de um empréstimo no futuro próximo. Podemos também
utilizar um exemplo de dois microempresários, suponhamos duas padarias. Uma é
reconhecida em seu bairro pela boa qualidade do pão que produz, a outra não: a
boa padaria tem melhores perspectivas financeiras futuras, mas o banco não
detém essa informação. O mesmo raciocínio é válido para grandes empresas. A
empresa conhece melhor que o banco emprestador os lançamentos que pretende
fazer nos próximos anos ou a chance de ser bem sucedida em uma negociação
envolvendo a transferência de terrenos para a construção da planta industrial.
O problema de seleção adversa surge, portanto, da incapacidade de o
banco conhecer bem o tomador do empréstimo. Já o risco moral, a segunda forma
de assimetria de informações que estamos analisando, deriva do fato de o
tomador do empréstimo passar a se comportar de forma diferente – e mais
arriscada – justamente porque conseguiu o empréstimo. Expressões como “muito
grande para quebrar” refletem uma situação de livro-texto de risco moral. O
tomador sabe que, se quebrar, poderá criar uma cadeia dedefaults, com
consequências desastrosas para a economia. Como o nome sugere, o risco moral nesse
caso é mais alto para grandes tomadores, sejam países ou grandes corporações.
Os bancos, cientes de que o não pagamento da dívida por parte desses tomadores
pode gerar forte prejuízo, acabam se sentindo obrigados a renegociar as
condições do financiamento.
Mas o risco moral também envolve
pequenos tomadores. Por exemplo, uma empresa está endividada e se defronta com
duas alternativas de investimento. Uma pouco arriscada, mas com retorno baixo,
e outra muito arriscada, mas com retorno elevado. Se utilizasse o capital
próprio, a empresa poderia optar pela estratégia menos arriscada. Mas, se o
capital é de terceiros, ela pode optar pelo investimento mais arriscado pois,
se ganhar, paga o empréstimo e obtém um lucro elevado, se perder, perde os
recursos de outrem, que eventualmente serão cobrados em juízo, mas não
necessariamente pagos ou pagos com defasagem e de forma parcial, conforme
decisão judicial.
Seja qual for a causa da informação assimétrica, se seleção adversa ou
risco moral, não há como um banco discriminar cada tomador, cobrando-lhe a taxa
de juros de acordo com o risco específico que esse tomador traz. Sem conhecer
bem o cliente, resta ao banco fixar a taxa de juros em conformidade com um
risco médio, esperado para aquele tipo de cliente. Isso faz com que bons
pagadores, que mereceriam pagar juros mais baixos, sejam onerados mais
fortemente. Dependendo de quão elevado for esse custo extra, o bom pagador pode
desistir de contrair o empréstimo. No limite, o mercado de crédito ficaria só
com os maus pagadores, que seriam aqueles dispostos a pagar taxas mais altas,
pois já têm em mente que não vão pagar o empréstimo tomado. Mas essa não seria
uma situação de equilíbrio, pois, se há somente maus pagadores, a taxa de juros
deveria refletir o risco máximo. No limite, se há somente “maus pagadores” para
os quais o credor não consegue recuperar nada do valor emprestado, então a taxa
de juros deveria ser infinita, e o mercado de crédito deixaria de existir1.
De uma forma geral, contudo, o mercado encontra uma taxa de juros de
equilíbrio, em que o prêmio de risco exigido pelo credor não é tão elevado a
ponto de afugentar os bons pagadores do mercado.
Como resolver os problemas da seleção
adversa e do risco moral? No caso da seleção adversa, um passo inicial é tentar
conhecer melhor o cliente. No caso de pessoas físicas, os tomadores preenchem
cadastros em que suas diversas características – estado civil, posição na
ocupação, tempo na atividade, tamanho da família, idade, etc – são avaliadas e
permitem ao credor inferir o risco de crédito associado àquele indivíduo. Para
firmas, os credores podem analisar balanços e contar com análises setoriais.
Quanto maior for o tomador, maior será o interesse do credor para analisar em
profundidade as características de quem está demandando crédito.
Pesquisas cadastrais e outras formas de análise do tomador contribuem
para reduzir, porém não eliminar o problema da seleção adversa. Em primeiro
lugar, porque há um trade-off. Informação custa dinheiro, portanto,
há um limite de recursos que o credor está disposto a despender para obtê-las.
A partir de determinado nível, é mais eficiente manter-se desinformado.
Em segundo lugar, porque a habilidade
de pagamento de um tomador depende de uma série de fatores não mensuráveis, que
dificilmente são capturados em questionários. Anteriormente demos alguns
exemplos de tais fatores, como a probabilidade de perder o emprego, a qualidade
do produto ou a perspectiva de novos lançamentos.
Diante da incapacidade de resolver o
problema de assimetria de informações, a solução para os credores vem com a
exigência de garantias. As instituições financeiras passam a solicitar, na
maioria dos tipos de empréstimos, garantias para uma futura perda da capacidade
de pagamento dos tomadores. Quanto mais sólida for a garantia, menor será a
taxa de juros cobrada.
Esse procedimento, aliado a outros
como securitização da dívida, cria mecanismos de proteção para o credor. Via de
regra, é solicitado do tomador de empréstimo de 100% a 200% de garantias sobre
o valor financiado. Se o empréstimo é para a aquisição de um bem, normalmente
este próprio bem é a garantia, como exemplo a compra de um automóvel, que, se
não for pago, é incorporado ao patrimônio do credor.
A garantia para um empréstimo tomado
pode ser pessoal ou real. Na garantia pessoal, um garantidor se comprometerá em
arcar com a dívida, caso o devedor principal não o faça. São exemplos de
garantia pessoal: aval e fiança. Na garantia real, o devedor apresenta um bem
que poderá ser vendido pelo credor caso haja o inadimplemento da dívida. São
exemplos de garantia real: penhor, hipoteca, anticrese e alienação fiduciária.
A questão que se coloca é: o mercado
é capaz de encontrar soluções pareto-eficientes para resolver o problema da
assimetria de informações? A resposta é negativa. Se a solução via mercado
envolve algum tipo de garantia, aqueles indivíduos ou empresa que são
potencialmente bom pagadores podem ficar sem crédito se não dispuserem de
garantias suficientes.
Por isso, o Governo muitas vezes
entra para oferecer crédito sem a exigência de garantias ou com garantias
menores do que as que seriam pedidas pelo mercado. Isso seria uma típica
intervenção pública para corrigir uma falha de mercado: a incapacidade do
mercado privado de conceder crédito para bom pagador que não disponha de
garantias para oferecer. Vamos analisar, como exemplo, o problema do crédito
estudantil.
Vários países adotam programas de
crédito subsidiado para estudantes que, por estarem em uma fase da vida em que
não produzem renda, ou têm empregos de tempo parcial, não contam com garantias
a oferecer. Ademais, tendo em vista que a elevação do capital humano decorrente
dos estudos elevará a renda futura do indivíduo, supõe-se que ele será capaz
de, no futuro, pagar o empréstimo que financiará seus estudos.
No Brasil, o FIES (Fundo de
Financiamento Estudantil) concede crédito estudantil em condições bastante
privilegiadas. Até 2015, a taxa de juros era de 3,4% a.a, com período de
carência de 18 meses após a conclusão do curso e o período de amortização era
de três vezes o período de duração regular do curso, acrescido de doze meses. A
partir do segundo semestre de 2015, a taxa de juros subiu para 6,5% ao ano.
Mesmo essa taxa é extremamente baixa se considerada a taxa Selic, atualmente em
mais de 14% a.a. e a inflação, que nos últimos anos têm se situado em torno de
6% anuais, sendo que, em 2015, provavelmente ultrapassará os 9%.
A questão que se coloca é, com base
nas falhas de mercado, justifica-se a concessão de crédito subsidiado para a
educação superior? Usualmente os estudantes são jovens e não possuem ativos
para oferecer como garantia. A única garantia que poderiam oferecer é o próprio
trabalho (futuro). Vários países (incluindo o Brasil), entretanto, impõem
restrições legais para o indivíduo comprometer parte da renda futura para
pagamento de dívidas. Além de restrições legais, comprometer a renda futura
pode gerar incentivos incorretos, por questões de risco moral: o indivíduo
tenderá a preferir ocupações por conta própria ou outras em que a verificação
da renda é mais difícil de ser verificada.
Diante das restrições institucionais e do risco moral, é justificável
criar programas de crédito educativo? Que características do mercado de
educação o tornariam diferente do mercado de crédito para adquirir outros bens
ou serviços? Nos outros mercados, de venda de sapatos, móveis ou pacotes
turísticos também há assimetria de informações. Por que, via de regra, não se
advogam intervenções governamentais no mercado de móveis e utensílios domésticos,
por exemplo2?
Há algumas respostas para isso. Em primeiro lugar, o risco de crédito
pode ser excessivamente alto para o financiamento estudantil (ausência de
garantias, longo prazo para pagamento, dificuldade de conhecer melhor o
tomador), a ponto de inviabilizar o mercado. No caso dos móveis, o conjunto de
tomadores de crédito é formado por indivíduos sobre os quais é possível inferir
com maior acurácia a probabilidade dedefault. São pessoas já inseridas
no mercado de trabalho, que já possuem alguns bens, já há um histórico de
adimplência, etc. Ou seja, a assimetria de informação é substancialmente menor
para os demais mercados, tornando mais provável haver uma taxa de juros que o
equilibre.
Em segundo lugar, observe-se que a interferência governamental não
contribui para reduzir o risco. O que a interferência do governo consegue
fazer, no máximo, é transferir o risco, do pool de tomadores
para outrem (mais especificamente, para os contribuintes de uma forma geral).
No caso do mercado de móveis de nosso exemplo, é difícil encontrar
justificativa para transferir para o contribuinte a responsabilidade pelo
pagamento do risco de crédito.
Já para a educação, argumentos
baseados em igualdade de oportunidades e externalidades positivas geradas pela
educação podem ser facilmente utilizados.
Desse raciocínio, temos a terceira
justificativa para a criação de programas de crédito educativo. O mercado
financeiro pode ser pouco competitivo, levando a uma taxa de juros muito alta.
Em países com forte concentração de renda, como o Brasil, a educação tende a
oferecer uma taxa de retorno muito mais elevada do que a taxa básica da
economia. Se o mercado financeiro for pouco competitivo, os estudantes estariam
dispostos a pagar até o limite do retorno obtido com a educação. Nesse caso,
contudo, todo o incremento de renda que obteriam em função de fazer um curso
superior seria apropriado pelo sistema financeiro. O governo, ao oferecer
crédito subsidiado (digamos, cobrando taxa de juros igual à Selic), está, em
verdade, dando ao estudante o valor presente correspondente à diferença entre o
retorno que obtém com os anos a mais de estudo e a taxa Selic. Novamente,
argumentos de igualdade de oportunidade podem justificar essa política.
Observe-se que essa política não sai
de graça para o contribuinte. Quanto maior for o volume de crédito subsidiado,
maior o endividamento do governo e, portanto, maior deverá ser a taxa Selic. Na
prática, o impacto sobre a taxa Selic deve ser marginal, mas como esse impacto
incide sobre toda a dívida pública, o valor do subsídio pode não ser tão
insignificante. Mesmo assim, a sociedade pode estar disposta a pagá-lo, em nome
da igualdade de oportunidades e do aumento do capital humano, que aumentará a
produtividade futura da economia.
Em quarto lugar, tomar empréstimos
envolve riscos. Um tomador mais avesso ao risco pode optar por não se financiar
(e não estudar), mesmo que seja, potencialmente, um excelente aluno. Mais uma
vez, pode-se utilizar o argumento de igualdade de oportunidades: aversão ao
risco é uma boa justificativa para negar a alguém o acesso à universidade?
Pode-se, portanto, construir
argumentos defendendo a intervenção governamental no mercado de crédito
educativo. A questão seguinte é: uma vez garantida a oferta de crédito, qual
deve ser a taxa de juros? Cabe pensar em subsídio? Deve-se embutir um prêmio
pelo risco?
Se pensarmos exclusivamente sobre a
questão do crédito, o ponto de partida deve ser a taxa básica de juros da
economia. Se o retorno privado do investimento em educação for inferior ao da
taxa básica de juros da economia, então não deveria haver financiamento. Essa
conclusão pode ser alterada caso se entenda que a educação superior gera
externalidades suficientemente elevadas, de forma que o retorno social da
educação seja superior à taxa de juros da economia, ainda que o retorno privado
seja menor. É reconhecido que educação traz externalidades, embora elas sejam
mais elevadas para os níveis iniciais de ensino, enquanto o crédito educativo
concentra-se no ensino superior.
O subsídio atual do Fies (mensurado como a diferença entre a taxa Selic
e a taxa de juros cobrada dos participantes do programa), em torno de 8% ao
ano, parece ser bastante elevado, muito acima do que seria justificável pelas
externalidades3. É claro que não se pode descartar a existência de
externalidades significativas, mas, diante da magnitude dos valores, entendemos
que o subsídio não deveria ser concedido sem um estudo mais aprofundado sobre a
relevância das externalidades geradas.
Não se pode também descartar a
possibilidade de se fixarem taxas diferenciadas, com custo mais baixo para cursos
em que, por alguma idiossincrasia qualquer, gere mais externalidades do que
outros. Alternativamente, pode não ser necessário conceder subsídios para
cursos que geram alto retorno privado, mesmo que gerem externalidades
relevantes. Nesse caso, a demanda pelos cursos seria relativamente inelástica
aos subsídios.
Partindo da Selic como base, a
segunda questão que se coloca é o prêmio de risco. Quem deve pagar pelo risco,
o tomador do empréstimo ou o contribuinte? Para responder a essa pergunta,
devemos dividir o risco em dois grupos: os riscos idiossincráticos e os não
idiossincráticos.
Os riscos não idiossincráticos são
aqueles que são comuns a todos os tomadores de crédito e estão fora do controle
do indivíduo. Por exemplo, o estudante pode vir a falecer antes de poder pagar
o empréstimo. A economia pode entrar em colapso durante o período de
amortização. A profissão associada à formação escolhida pode se tornar
obsoleta. Do ponto de vista social, o custo do financiamento deve ser entendido
como o custo da taxa básica da economia acrescido do risco não idiossincrático.
Por esse motivo, são os estudantes que deveriam pagar por esse risco. Do
contrário, a sociedade estaria financiando uma atividade que, do ponto de vista
social, traria menos retorno do que o valor investido.
Em relação à alocação dos riscos
idiossincráticos, a resposta dependerá das preferências da sociedade. Riscos
idiossincráticos são aqueles que decorrem da capacidade de o indivíduo pagar o
empréstimo em decorrência de características pessoais. Essas características
envolvem habilidades natas e adquiridas, atitudes em relação ao trabalho,
disposição para honrar compromissos, etc.
A forma mais simples de entender como
se processaria o pagamento pelos riscos é imaginar que há um fundo, que faz um
chamamento de recursos sempre que uma prestação não é paga. Os recursos desse
fundo podem ser aportados pelos tomadores ou pelo Tesouro. No primeiro caso,
dizemos que o risco idiossincrático é pago pelos participantes do Fies. No
segundo caso, pelos contribuintes. Conforme explicamos anteriormente, se os
riscos forem não idiossincráticos, entendemos que são os participantes do Fies
que devem fazer os aportes necessários. E para os riscos idiossincráticos?
Para facilitar a resposta a essa
pergunta, podemos reformulá-la da seguinte forma: quem deve pagar pelo mau
pagador, o bom pagador ou o contribuinte?
A resposta pode não ser simples.
Suponhamos que a sociedade seja dividida entre pobres e ricos, sendo que
somente esses últimos pagariam impostos. Os pobres não teriam acesso à
universidade se não dispuserem de crédito educativo. É justo exigir do pobre
bom pagador que arque com os custos do pobre que não é bom pagador? Por outro
lado, é justo exigir dos ricos que paguem os custos do pobre que não é bom
pagador?
É bom lembrar que, dado o ambiente de
informação incompleta, necessariamente alguém arcará com os custos do pobre mau
pagador. No exemplo dado, não necessariamente é melhor que os ricos paguem. Por
exemplo, os impostos já podem estar sendo utilizados para pagamento de outros
programas sociais considerados mais prioritários, como apoio à educação básica
ou transferências de renda. O pobre bom pagador pode ter, inclusive, já se
beneficiado de um desses programas.
Não é nosso objetivo sugerir quem deve arcar com o risco
idiossincrático. Mas deveria haver transparência em relação a isso. Em dezembro
de 2014, o banco Morgan Stanley divulgou relatório afirmando que a
inadimplência do Fies estava em torno de 10%, mas poderia chegar a 27% em 20174.
O governo contestou os números e afirmou que a inadimplência estava em torno de
3% ou 4%5. Independentemente dos números exatos, é importante
avaliar melhor qual o nível de inadimplência do Fies e como ele deve ser
alocado. Também entendemos que, independentemente de como é feita a alocação de
riscos, o subsídio embutido nas taxas de financiamento do Fies nos parece
excessivamente generoso. Certamente os 6,5% ao ano atualmente cobrados são
muito inferiores à taxa Selic esperada para a média dos próximos 10 ou 15 anos
(prazo de duração dos contratos) ajustada pelo risco não idiossincrático.
Por fim, há que se considerar quem
efetivamente se beneficia do subsídio creditício. Um programa que ofereça um
grande volume de crédito elevará a demanda por crédito educativo e,
consequentemente, por matrículas em universidades privadas. Esse aumento de
demanda pode resultar em elevação dos valores reais das mensalidades. O
resultado seria a apropriação, pelas escolas privadas, do subsídio creditício,
via mensalidades mais elevadas. O forte aumento das cotações em bolsa dos
principais grupos empresariais ao longo da primeira fase do Fies, e o
desabamento dessas cotações quando dos cortes orçamentários implementados em
2014-15, indica que a possibilidade de captura do subsídio pelas escolas não é
mera especulação intelectual. Assim, um programa de crédito educativo deve se
preocupar, também, em não adquirir dimensões que afetem os preços praticados no
mercado de educação.
_____________
1A situação de default total é extrema. Muitas vezes o
mau pagador é somente aquele que atrasa as prestações ou que renegocia os
débitos, permitindo que o credor recupere parte substancial do capital
empatado.
2Em verdade, o Programa Minha Casa Melhor, extinto no final de 2014,
financiava, a juros subsidiados, itens de mobiliário e eletroeletrônicos.
Poucos analistas, contudo, consideram que aquele programa era justificável.
3 Em verdade, o cálculo correto do subsídio deveria considerar a
diferença entre os 6,5% a.a. que o Fies cobra e a taxa Selic durante toda a
vigência do contrato, e não somente o valor atual. Ainda que o subsídio possa a
vir cair no futuro, é pouco provável que a taxa Selic fique abaixo de 6,5% ao
ano nos próximos dez anos.
4 Vide reportagem sobre o tema em: http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2014/12/uma-sombra-sobre-o-fies-banco-afirma-que-inadimplentes-aumentaram-mas-mec-contesta-4671429.html .
5 Vide reportagem: http://educacao.uol.com.br/noticias/agencia-estado/2014/09/26/mec-rejeita-hipotese-de-alta-inadimplencia-no-fies.htm
Paulo Springer e Fernando Meneguin
1) Doutor em Economia. Professor do Programa Mestrado em Economia do Setor Público, do Departamento de Economia da UnB. 2) Doutor em Economia.