Aumento exponencial da
demanda por produtos médico-hospitalares usados no combate ao coronavírus expõe
fornecedores sem experiência e governança e compradores irresponsáveis
O caso do governo do Pará, que desembolsou R$ 500
milhões na compra de 400 respiradores, dos quais 152 chegaram com defeito,
mostra bem o nível de risco de se fazer negócios com equipamentos médicos que
ajudam a salvar vidas neste momento. A Polícia Federal está
investigando a aquisição para verificar possíveis irregularidades. Estão
sendo investigadas também compras feitas por outros onze estados para enfrentar
a crise pandêmica. Além de respiradores, outros itens como testes rápidos IGG e
IGM, testes do tipo RT-PCR, roupas de proteção e máscaras estão entre os
produtos que mais aparecem em contratos suspeitos. No mês passado, uma carga
roubada de 15 mil testes estava sendo distribuída em São Paulo por uma
quadrilha de chineses. Além disso, na outra ponta, por causa do estado de
calamidade pública, desde fevereiro as licitações foram dispensadas e
trâmites burocráticos, encurtados, o que impõe um controle redobrado das contas
públicas. Surge uma enxurrada de fornecedores que não cumprem requisitos
técnicos e comerciais e nem têm qualquer experiência com vendas de insumos
hospitalares.
“Estamos enfrentando um mercado selvagem, com concorrentes sem
experiência, governança e compliance”, afirma a farmacêutica Emanuela
Medrades, diretora técnica da Precisa Medicamentos, empresa que acaba de
fornecer 150 mil testes rápidos importados da China para o governo do Distrito
Federal, que encomendou um total de 560 mil testes. “Há grande demanda por
esses insumos e abriu-se um grande espaço para oportunistas e aventureiros
entrarem no negócio”. Entre os problemas mais críticos estão a cobrança de
preços acima da média, demora na entrega e produtos com defeito, imprecisos ou
ineficazes. Atualmente, no mercado internacional, cada teste rápido custa em
torno de US$ 10,00. No Brasil eles começam a ser comercializados no varejo por
preços que oscilam de R$ 100,00 a R$ 200,00 e se aguarda um crescimento
exponencial nas vendas nos próximos meses. Para se ter uma ideia da corrida no
mercado por esses insumos, havia, na quarta-feira 13, 328 pedidos de registros
de testes de coronavírus na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa),
dos quais foram 75 deferidos, 42, indeferidos e os demais (211) ainda estão
sendo analisados. Os testes IGG e IGM são feitos no sangue e detectam a
existência do coronavírus e a presença de anticorpos. Já os RT-PCR examinam a
secreção respiratória e detectam o vírus ativo.
Dependência externa
Há uma dependência quase absoluta, atualmente, de fornecedores da China, que só
fazem negócios com pagamento antecipado e em grande escala, para conseguir
esses insumos básicos. Mais de 90% dos testes deferidos pela Anvisa, por
exemplo, são chineses. Embora tenham tido alguns problemas iniciais de
qualidade revelados em lotes de testes rápidos vendidos em países como Espanha
e Inglaterra, agora a situação parece controlada. Para não correr o risco de
perder credibilidade, a Câmara de Comércio chinesa tem aumentado o controle
sobre os processos de importação e a qualidade dos produtos comprados pelos
clientes brasileiros. Existem três tipos de compradores desses insumos
hospitalares hoje no mercado: os governos federal, estaduais e municipais,
grandes corporações e bancos e farmácias, recentemente autorizadas pela Anvisa
a comercializar testes rápidos. Só o Ministério da Saúde prevê a
aquisição de 46,2 milhões de testes nos próximos meses – 24,2 milhões de RT-PCR
e 22 milhões rápidos. Empresas como Vale e JBS também estão investindo pesado
em testes e outros produtos médico-hospitalares. O momento, porém, é perigoso e
exige muito cuidado com as aquisições. Trata-se de um negócio que precisa ser
feito com ética e exige grande responsabilidade, tanto para quem vende como
para quem compra.
Por Vicente Vilardaga, na Revista Isto é
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