Com a adesão de 18 unidades da
federação, programa vai criar plataforma de identificação única para melhorar o
acesso e aprimorar a gestão
Uma rede colaborativa para promover a transformação digital dos estados e do Distrito Federal já recebeu a adesão de 18 unidades da federação. A iniciativa foi lançada em maio por representantes estaduais no Conselho Nacional de Secretários de Estados de Administração (Consad) em conjunto com a Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Tecnologia da Informação e Comunicação (Abep).
“A crise fiscal, que é comum a todos, impõe aos gestores públicos uma agenda de eficiência na prestação de serviços”, diz Thiago Ávila, coordenador do Grupo de Transformação Digital, o GTD.Gov. Até o fim do ano, o grupo apresentará um plano de ação para os governos estaduais. “Não vamos nos limitar a digitalizar os serviços, queremos integrar o cidadão em uma plataforma de identificação única que permita a ele ter acesso aos diversos serviços públicos e às políticas de assistência social”, diz.
A plataforma integrada de dados também permitirá aos gestores públicos conhecer as diferentes demandas dos cidadãos, facilitando o planejamento de suas ações. O acesso em tempo real de registros de casos de saúde endêmicos, por exemplo, pode ser um alerta para vários órgãos públicos trabalharem em conjunto e evitar um alastramento epidêmico. “O poder público que age de forma reativa poderá, com o uso da tecnologia, ser mais proativo em suas políticas”, diz Ávila. O cruzamento de informações também permitirá aprimorar o combate a fraudes.
A transformação digital nos estados e municípios também é apoiada pela iniciativa Rede Nacional de Governo Digital (Rede Gov.Br), criada pela Secretaria de Governo Digital do Ministério da Economia. A Rede tem como objetivo criar um ecossistema colaborativo entre os diversos entes federais para a troca de experiências e busca de soluções inovadoras para o serviço público.
No governo federal, a transformação digital ganhou impulso nos dois últimos anos. Os serviços realizados por meio de ferramentas de tecnologia da informação e comunicação (TICs) saíram de 322 no final de 2017 para 1.583 em outubro último, representando 48% dos 3.311 serviços públicos prestados por 182 órgãos da administração. Entre os serviços digitalizados estão a requisição de aposentadoria, a carteira de trabalho e o alistamento militar. A expectativa do governo é digitalizar todos os serviços federais até 2022.
O orçamento da Secretaria de Governo Digital em 2019 é de R$ 95 milhões para custeio e investimentos. As ferramentas tecnológicas digitais são desenvolvidas principalmente pelo próprio governo junto com as empresas públicas de tecnologia, como o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) e a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev) ou por meio de parcerias com empresas privadas.
Em 2019, os recursos já permitiram a transformação digital de 406 serviços federais, o que deve gerar uma economia para o governo de R$ 351 milhões por ano, informa o secretário de Governo Digital, Luis Felipe Salin Monteiro. Segundo dados oficiais, enquanto o atendimento presencial de uma demanda do cidadão apresenta um custo, em média, de US$ 14, o valor do atendimento on-line é de apenas US$ 0,39. Uma redução de 97%.
A principal economia vem com a redução da mão de obra. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recebe 730 mil solicitações por ano do Certificado Internacional de Vacinação ou Profilaxia (C1VP), que comprova que o viajante internacional está imunizado contra doenças como a febre amarela, um documento exigido por mais de 100 países. Antes da digitalização, a Anvisa mantinha 600 funcionários para a prestação do serviço. No Ministério da Economia, onde o índice de digitalização dos 370 serviços prestados chega a 80%, a estimativa é de que cada R$ 1,00 investido em transformação digital gere uma redução de gastos de RS 420,00.0 benefício não é só econômico. Tatiana Ribeiro, diretora-executiva do Movimento Brasil Competitivo (MBC), diz que a digitalização também gera maior transparência aos serviços públicos e uma melhor relação entre administração e o cidadão, sem filas e com maior agilidade no atendimento.
“A digitalização nos permitiu reduzir entre 60% e 70% o tempo de tramitação de cada processo administrativo", diz Daniel Annenberg, secretário municipal de Inovação e Tecnologia da cidade de São Paulo. Ele relata que a prefeitura paulistana lida com aproximadamente 340 m il novos processos administrativos por ano - como pedidos de poda de árvore e serviços de zeladoria pública, recursos a multas e contagem de tempo para a aposentadoria dos servidores.
Em 2019, o índice de digitalização desses processos chegou a 88%. “Antes, cada solicitação tramitava em papel de mesa em mesa, agora a informação está disponível on-line para todos os agentes públicos", afirma.
A busca por soluções digitais para a administração pública entrou no radar dos empreendedores inovativos. O BrazilLab, um hub de inovação que tem a proposta de acelerar e conectar startups com o poder público, contabiliza em três anos de atividade mais de 650 propostas de empreendimentos. Destas, 55 projetos foram selecionados para o programa de quatro meses de capacitação e mentoria nos quais as startups aprimoram suas propostas e as ajustam para a venda ao setor público. A expectativa do hub, que está com inscrições abertas, é selecionar para 2020 mais 35 startups para o programa.
Leticia Piccolotto, fundadora do BrazilLab, diz que 85% das 55 iniciativas acolhidas até 2019 prosperaram como negócios, mas apenas 14 se tomaram govtechs, ou seja, vendem de fato para governos. As demais se firmaram ao redirecionar seus negócios para a iniciativa privada. “Vender para o governo não é simples”, diz Leticia.
Entre as dificuldades enfrentadas pelas govtechs está o excesso de burocracia no processo de decisão e compra. A legislação sobre licitações, Lei 8.66G, é de 1993, muito antes do boom das startups e, na opinião de Leticia, precisaria ser atualizada para criar oportunidades adequadas para empresas iniciantes que desenvolvem soluções inovadoras. Muitas govtechs só conseguem seus primeiros contratos por meio de mecanismos como carta-convite e encomenda tecnológica, um sistema destinado à contratação de soluções inovadoras que ainda não estão disponíveis no mercado, mas pouco empregado.
Tatiana Ribeiro, do MBC, diz que a contratação de soluções inovadoras é vista como risco pelo gestor público. Caso o sistema adquirido não apresente os resultados esperados, o gestor responsável pela aquisição pode ser responsabilizado civilmente pela transação. “Não há hoje mecanismos para distinguir erros gerados pela negligência ou má-fé daqueles erros cometidos com o intuito de acertar", diz. O problema já chegou ao Tribunal de Contas da União (TCU), que criou um grupo de trabalho para discutir mecanismos para facilitar a contratação de startups pelos governos.
A startup mineira Gesuas, acelerada pelo BrazilLab, conseguiu superar as barreiras burocráticas e hoje fornece para mais de 90 municípios em dez estados. A empresa desenvolveu um software para a gestão digital do Sistema Único de Assistência Social (Suas). A plataforma padroniza o registro das informações e cria um cadastro único dos programas sociais que permite ao gestor obter informações georreferenciadas das pessoas em situação de vulnerabilidade social, seu histórico de problemas e dificuldades, e ainda acompanhar em tempo real os projetos e benefícios oferecidos.
O sistema também agiliza a prestação de contas ao governo federal e, consequentemente, o repasse de recursos. Segundo lgor Guadalupe, sócio-fundador da Gesuas, a tarefa de elaborar relatórios e fazer a prestação de contas de forma manual leva em média três dias, tempo reduzido para 15 minutos quando digitalizado. “Sobra mais tempo para o assistente social se dedicar ao atendimento às pessoas", afirma. Com o apoio da tecnologia, um assistente social amplia entre duas a três vezes o número de pessoas atendidas por mês, calcula Guadalupe.
Apesar de conseguir demonstrar os ganhos de seu sistema, a Gesuas levou cinco anos para se consolidar. Segundo Guadalupe, para uma startup vender para o setor público não basta ter uma proposta qualificada, ela precisa também estar apta a atender todas as exigências burocráticas, como certidões negativas, e ainda ter fôlego financeiro para superar a lentidão do processo de contratação. “O setor público ganharia muito se adotasse processos mais ágeis para contratar soluções inovadoras”, diz o empreendedor.
Uma rede colaborativa para promover a transformação digital dos estados e do Distrito Federal já recebeu a adesão de 18 unidades da federação. A iniciativa foi lançada em maio por representantes estaduais no Conselho Nacional de Secretários de Estados de Administração (Consad) em conjunto com a Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Tecnologia da Informação e Comunicação (Abep).
“A crise fiscal, que é comum a todos, impõe aos gestores públicos uma agenda de eficiência na prestação de serviços”, diz Thiago Ávila, coordenador do Grupo de Transformação Digital, o GTD.Gov. Até o fim do ano, o grupo apresentará um plano de ação para os governos estaduais. “Não vamos nos limitar a digitalizar os serviços, queremos integrar o cidadão em uma plataforma de identificação única que permita a ele ter acesso aos diversos serviços públicos e às políticas de assistência social”, diz.
A plataforma integrada de dados também permitirá aos gestores públicos conhecer as diferentes demandas dos cidadãos, facilitando o planejamento de suas ações. O acesso em tempo real de registros de casos de saúde endêmicos, por exemplo, pode ser um alerta para vários órgãos públicos trabalharem em conjunto e evitar um alastramento epidêmico. “O poder público que age de forma reativa poderá, com o uso da tecnologia, ser mais proativo em suas políticas”, diz Ávila. O cruzamento de informações também permitirá aprimorar o combate a fraudes.
A transformação digital nos estados e municípios também é apoiada pela iniciativa Rede Nacional de Governo Digital (Rede Gov.Br), criada pela Secretaria de Governo Digital do Ministério da Economia. A Rede tem como objetivo criar um ecossistema colaborativo entre os diversos entes federais para a troca de experiências e busca de soluções inovadoras para o serviço público.
No governo federal, a transformação digital ganhou impulso nos dois últimos anos. Os serviços realizados por meio de ferramentas de tecnologia da informação e comunicação (TICs) saíram de 322 no final de 2017 para 1.583 em outubro último, representando 48% dos 3.311 serviços públicos prestados por 182 órgãos da administração. Entre os serviços digitalizados estão a requisição de aposentadoria, a carteira de trabalho e o alistamento militar. A expectativa do governo é digitalizar todos os serviços federais até 2022.
O orçamento da Secretaria de Governo Digital em 2019 é de R$ 95 milhões para custeio e investimentos. As ferramentas tecnológicas digitais são desenvolvidas principalmente pelo próprio governo junto com as empresas públicas de tecnologia, como o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) e a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev) ou por meio de parcerias com empresas privadas.
Em 2019, os recursos já permitiram a transformação digital de 406 serviços federais, o que deve gerar uma economia para o governo de R$ 351 milhões por ano, informa o secretário de Governo Digital, Luis Felipe Salin Monteiro. Segundo dados oficiais, enquanto o atendimento presencial de uma demanda do cidadão apresenta um custo, em média, de US$ 14, o valor do atendimento on-line é de apenas US$ 0,39. Uma redução de 97%.
A principal economia vem com a redução da mão de obra. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recebe 730 mil solicitações por ano do Certificado Internacional de Vacinação ou Profilaxia (C1VP), que comprova que o viajante internacional está imunizado contra doenças como a febre amarela, um documento exigido por mais de 100 países. Antes da digitalização, a Anvisa mantinha 600 funcionários para a prestação do serviço. No Ministério da Economia, onde o índice de digitalização dos 370 serviços prestados chega a 80%, a estimativa é de que cada R$ 1,00 investido em transformação digital gere uma redução de gastos de RS 420,00.0 benefício não é só econômico. Tatiana Ribeiro, diretora-executiva do Movimento Brasil Competitivo (MBC), diz que a digitalização também gera maior transparência aos serviços públicos e uma melhor relação entre administração e o cidadão, sem filas e com maior agilidade no atendimento.
“A digitalização nos permitiu reduzir entre 60% e 70% o tempo de tramitação de cada processo administrativo", diz Daniel Annenberg, secretário municipal de Inovação e Tecnologia da cidade de São Paulo. Ele relata que a prefeitura paulistana lida com aproximadamente 340 m il novos processos administrativos por ano - como pedidos de poda de árvore e serviços de zeladoria pública, recursos a multas e contagem de tempo para a aposentadoria dos servidores.
Em 2019, o índice de digitalização desses processos chegou a 88%. “Antes, cada solicitação tramitava em papel de mesa em mesa, agora a informação está disponível on-line para todos os agentes públicos", afirma.
A busca por soluções digitais para a administração pública entrou no radar dos empreendedores inovativos. O BrazilLab, um hub de inovação que tem a proposta de acelerar e conectar startups com o poder público, contabiliza em três anos de atividade mais de 650 propostas de empreendimentos. Destas, 55 projetos foram selecionados para o programa de quatro meses de capacitação e mentoria nos quais as startups aprimoram suas propostas e as ajustam para a venda ao setor público. A expectativa do hub, que está com inscrições abertas, é selecionar para 2020 mais 35 startups para o programa.
Leticia Piccolotto, fundadora do BrazilLab, diz que 85% das 55 iniciativas acolhidas até 2019 prosperaram como negócios, mas apenas 14 se tomaram govtechs, ou seja, vendem de fato para governos. As demais se firmaram ao redirecionar seus negócios para a iniciativa privada. “Vender para o governo não é simples”, diz Leticia.
Entre as dificuldades enfrentadas pelas govtechs está o excesso de burocracia no processo de decisão e compra. A legislação sobre licitações, Lei 8.66G, é de 1993, muito antes do boom das startups e, na opinião de Leticia, precisaria ser atualizada para criar oportunidades adequadas para empresas iniciantes que desenvolvem soluções inovadoras. Muitas govtechs só conseguem seus primeiros contratos por meio de mecanismos como carta-convite e encomenda tecnológica, um sistema destinado à contratação de soluções inovadoras que ainda não estão disponíveis no mercado, mas pouco empregado.
Tatiana Ribeiro, do MBC, diz que a contratação de soluções inovadoras é vista como risco pelo gestor público. Caso o sistema adquirido não apresente os resultados esperados, o gestor responsável pela aquisição pode ser responsabilizado civilmente pela transação. “Não há hoje mecanismos para distinguir erros gerados pela negligência ou má-fé daqueles erros cometidos com o intuito de acertar", diz. O problema já chegou ao Tribunal de Contas da União (TCU), que criou um grupo de trabalho para discutir mecanismos para facilitar a contratação de startups pelos governos.
A startup mineira Gesuas, acelerada pelo BrazilLab, conseguiu superar as barreiras burocráticas e hoje fornece para mais de 90 municípios em dez estados. A empresa desenvolveu um software para a gestão digital do Sistema Único de Assistência Social (Suas). A plataforma padroniza o registro das informações e cria um cadastro único dos programas sociais que permite ao gestor obter informações georreferenciadas das pessoas em situação de vulnerabilidade social, seu histórico de problemas e dificuldades, e ainda acompanhar em tempo real os projetos e benefícios oferecidos.
O sistema também agiliza a prestação de contas ao governo federal e, consequentemente, o repasse de recursos. Segundo lgor Guadalupe, sócio-fundador da Gesuas, a tarefa de elaborar relatórios e fazer a prestação de contas de forma manual leva em média três dias, tempo reduzido para 15 minutos quando digitalizado. “Sobra mais tempo para o assistente social se dedicar ao atendimento às pessoas", afirma. Com o apoio da tecnologia, um assistente social amplia entre duas a três vezes o número de pessoas atendidas por mês, calcula Guadalupe.
Apesar de conseguir demonstrar os ganhos de seu sistema, a Gesuas levou cinco anos para se consolidar. Segundo Guadalupe, para uma startup vender para o setor público não basta ter uma proposta qualificada, ela precisa também estar apta a atender todas as exigências burocráticas, como certidões negativas, e ainda ter fôlego financeiro para superar a lentidão do processo de contratação. “O setor público ganharia muito se adotasse processos mais ágeis para contratar soluções inovadoras”, diz o empreendedor.
Por Domingos Zaparolli, na Revista Valor Setorial
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