Da BBC Brasil
Perto do pleno emprego, Brasil precisa aumentar qualificação de
força de trabalho
Nos anos 80, o Brasil e a Coreia do Sul tinham índices de
produtividade semelhantes. Hoje, o que um coreano produz em um dia, um
brasileiro produz em três, segundo dados da entidade americana de pesquisas
Conference Board.
"O Brasil e outros países da América Latina precisam olhar urgentemente para
experiências de países de fora da região se quiserem impulsionar seus índices de
produtividade”, disse à BBC Carmen Pagés, especialista em mercado de trabalho do
Banco Inter-Americano de Desenvolvimento (BID).
"Há experiências muito valiosas em países como a Coreia e a Austrália que
poderiam ajudar os brasileiros principalmente a alinhar os conhecimentos e
habilidades desenvolvidos em seu sistema educacional ao que as empresas precisam
para produzir mais e melhor."
Em um cenário de taxas de desemprego historicamente baixas, há certo consenso
entre economistas brasileiros de que para acelerar o crescimento será preciso
aumentar a produtividade dos trabalhadores no país.
"Pela primeira vez na nossa história falta mão de obra - o que nos obriga a
aproveitar nossos trabalhadores de forma mais eficiente", diz Hélio Zylberstajn,
professor de economia da Universidade de São Paulo (USP).
É por isso que a "produtividade" tornou-se um dos temas centrais do atual
debate econômico.
"Qualificar melhor os trabalhadores brasileiros é hoje um dos nossos grandes
desafios - e é sempre importante conhecer a experiência dos outros países nessa
área", diz Silvani Pereira, secretário substituto de Políticas Públicas de
Emprego do Ministério do Trabalho e Emprego.
Pereira explica que o ministério tem promovido visitas e parcerias com outros
países buscando se informar sobre seus sistemas públicos de emprego,
qualificação profissional e estratégias de treinamento dentro da empresa.
"Mas é claro que é crucial fazer a ressalva de que nem tudo o que tem sucesso
e ajuda a ampliar a produtividade em um lugar pode ser automaticamente aplicado
em outro em função de especificidades econômicas, históricas e sociais."
Abaixo, a BBC Brasil listou quatro estratégias sugeridas por especialistas em
um evento promovido pelo BID em São Paulo. Segundo eles, poderiam inspirar o
Brasil e outros países latino-americanos em sua busca por mais
produtividade.
Eles ressaltam que não se tratam de experiências que poderiam ser implantadas
automaticamente por aqui, mas soluções que podem ajudar o país e a região a
encontrarem respostas originais ao problema do ajuste das habilidades dos
trabalhadores às necessidades das empresas:
Para tirar uma carteira de motorista, em geral o candidato faz um teste de
direção. Se mostrar que sabe dirigir, recebe o documento, se cometer muitos
erros, não recebe. Não interessa se ele aprendeu a dirigir com o avô e estudou
sozinho as leis de trânsito ou se fez 30 aulas em uma auto-escola.
Na Coreia do Sul, um sistema de certificados nacionais para o ensino técnico
parece funcionar de uma maneira semelhante, como explicou Joon-Chul Eom, do
Ministério do Emprego e Trabalho da Coreia do Sul, em evento promovido pelo BID
em São Paulo.
Os candidatos fazem uma série de provas orais e escritas após comprovar que
têm experiência prática ou estudaram determinada área. Se passarem, recebem
certificados nacionais que atestam suas habilidades e conhecimentos
específicos.
Um trabalhador pode ser certificado em gastronomia coreana, por exemplo.
Outro, em serviços de engenharia elétrica ou mecatrônica. As provas são rígidas,
e os índices de aprovação podem chegar a 10% em alguns casos.
No caso do ensino técnico, a certificação fica a encargo do Ministério do
Trabalho, mas também há certificados para as profissões de nível superior, que
são em geral administrados por outros ministérios.
O sistema é uma forma de garantir e padronizar a qualidade dos profissionais
formados no país, facilitar a busca e a colocação no mercado de trabalhadores
com habilidades específicas e ao mesmo tempo estimular os coreanos aprimorarem
suas habilidades - uma vez que elas podem ser formalmente "reconhecidas".
É claro que há críticas. Um estudo da OCDE de 2012, por exemplo, defendia que
as certificações de ensino superior seriam uma "duplicação desnecessária", uma
vez que os alunos já seriam avaliados em sua instituição de ensino.
"Trata-se de um sistema interessante e que mereceria ser estudado mais a
fundo, embora no Brasil acho que seria impensável implantar algo nessa escala",
diz Hélio Zylberstajn, da USP. "Quem ficaria encarregado dos
certificados?"
O australiano Peter Holden, da entidade governamental Tafe, diz que em seu
país uma das experiências mais bem sucedidas na área de formação do trabalhador
são as parcerias com empresas para o fornecimento de cursos dentro do ambiente
de trabalho.
"Há cursos em áreas específicas ou de formação mais básica. Algumas empresas
nos indicaram um grupo de funcionários que gostariam que recebessem noções de
aritmética, por exemplo", diz Holden.
Segundo Holden, o esquema é financiado conjuntamente pelo governo e as
empresas.
"Muitos trabalhadores viram seus trabalhos mudarem completamente em função da
adoção de novas tecnologias - e esses esquemas não só aumentam a produtividade
das empresas, mas também evitam que sejam demitidos e aumentam suas chances de
uma promoção."
Para Zylberstajn, da USP, os esquemas de treinamento dentro das empresas
estão entre as experiências que mais poderiam ser aproveitadas no Brasil.
"Um dos problemas do nosso ensino técnico é que as instituições de ensino e o
setor privado conversam pouco, então o que os alunos aprendem na sala de aula
nem sempre é válido para o mercado", diz o economista.
Silvani Pereira, secretário substituto de Políticas Públicas de Emprego do
Ministério do Trabalho e Emprego, concorda que é preciso fazer avanços nessa
área.
"O treinamento do trabalhador dentro da empresa contribui para promover
ganhos de produtividade já que o alinhamento entre o que é ensinado e o que as
empresas precisam é perfeito. Além disso, tal sistema contribui para uma redução
da rotatividade dos trabalhadores", diz.
Nessa área, a Alemanha parece ser, de longe, o grande modelo. Lá os jovens
têm a possibilidade de aprender um trabalho dentro de um programa de
aprendizagem conforme cursam o ensino fundamental.
Os alunos dividem seu tempo entre as escolas e as empresas, onde são
orientados por um profissional mais experiente para aprender um entre os 344
ofícios oferecidos pelo programa. Eles recebem um salário e, ao finalizar o
curso, têm a opção de seguir a carreira na área.
Segundo Geoff Fieldsend, do British Council, esse é um dos muitos esquemas
adotados para melhorar a questão da empregabilidade dos jovens, mas seus
resultados ainda precisam ser avaliados.